terça-feira, 7 de agosto de 2012

Guiné 63/74 - P10233: Cartas do meu avô (16): Décima segunda: com filha e um neto em Ovar e filhos e netos em Berlim, temos de ser pela força do coração, entre Mafra, Ovar e Berlim, uns (e)ternos vagabundos ... (J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)









O J.L. Mendes Gomes e os seus "netos de Berlim"... Alemanha, Berlim, Páscoa de 2012.


Fotos: © J.L. Mendes Gomes (2012). Todos os direitos reservados.

A. Continuação da publicação da série Cartas do meu avô, da autoria de J.L. Mendes Gomes, membro do nosso blogue, jurista, reformado da Caixa Geral de Depósitos, ex-Alf Mil da CCAÇ 728, que esteve na região de Tombali (Cachil e Catió) e em Bissau, nos anos de 1964/66. As cartas, num total de 13, foram escritas em Berlim, onde vivem os netos, entre 5 de março e 5 de abril de 2012. (*)




B. Décima segunda carta: Como Saltimbancos


Os dois anos que faltavam à minha mulher para a sua reforma passaram. Ela podia ter continuado a trabalhar até aos setenta anos. E gostaria de fazê-lo. Mas, a meu pedido, resolveu cessar a actividade de que gostava. A biologia molecular. Era mais feliz do que eu. Na área das leis. Minha área não tinha nada de molecular.

Os filhos estavam todos a navegar. À excepção do mais novo que se encontrava entusiasmado, em Manchester, a tirar engenharia aero-espacial. Nós podíamos agora dispor de todo o tempo do mundo. Não houve recanto nos arredores de Lisboa que não revisitássemos, descontraidamente.

Entretanto a filha mais nova deu-nos o primeiro neto. Um rapaz. Viviam ao pé, na zona de Algés. Outra missão acabava de se revelar. Esplendorosa. A de avós. Outra dimensão se nos abria. A da ternura pelos netos. Era a nossa vez de os assistir enquanto os   pais iam trabalhar. O João ia para o infantário, mas havia que estar por perto, para o que fosse preciso.

Serenou-se-nos a febre do calcorrear a estrada, como pássaros vadios. Depois, as sortes do emprego ditaram a sua partida para o Porto. Eles acabaram por assentar arraiais em Ovar. A meio caminho entre o Porto e Aveiro. Ali nasceu outro neto, o Tomás.

Tínhamos acabado de comprar um apartamento na baixa de Algés. Tivemos de rever a nossa vida. Alugámos um pequeno apartamento mobilado em Aveiro e passamos a cirandar entre Lisboa e o centro. Umas semanas num lado, outras noutro. Arrastados irresistivelmente, pelos netos.

Depois, o Luís foi parar à Rolls-Royce de Berlim. Como engenheiro. A Leonor também, por razões, bem diferentes. As do desemprego fatal e abrupto para os dois. Tiveram de fugir de novo para donde, jubilosos, tinham saído três anos antes, por regressarem às origens. Sol de pouca dura. Caíram ambos no desemprego.

Foi um corre-corre para os conseguir repor lá. Em Berlim. Os dois filhos haviam nascido lá. Felizmente para todos. Não foi tão difícil a sua reinserção. No espaço de um ano, conseguiram casa, emprego, e os miúdos, chegados, com apenas quatro e seis, já falam alemão e estão perfeitamente ambientados.

A Alemanha funciona na perfeição. Dá gosto permanecer dentro da sociedade alemã. Tudo está sob exacto controlo. Aqui, vive-se plenamente. Desde a infância à velhice.

A vida acaba por ser mais barata que em Portugal. Nitidamente. A alimentação e a habitação são acessíveis e de qualidade. Só a língua dificulta um pouco as coisas.

Por isso, com filha e um neto em Ovar e filhos e netos em Berlim, temos de ser pela força do coração, entre Mafra, Ovar e Berlim uns errantes vagabundos…

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Nota do editor:

Último poste da série > 28 de julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10202: Cartas do meu avô (15): Décima primeira (Parte III): a reforma, :a escrita, um ano em Perpigna, o regresso a Almada e à Caparica, e por fim... à justiça disse nada... (J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)

3 comentários:

Luís Graça disse...

Joaquim:

Ainda não tenho, como tu, a alegria de ser avô... E às vezes pergunto se terei o jeito, a vocação, a pachorra, o tempo... Mas revejo-me, em grande parte, na tua história de vida e da história da tua família. Eu, e muitos de nós que te leem, com gosto e afeto. A tua ternura de saltimbanco comove-me. A autenticidade do teu testemunha fortalece-me. A tua coragem de viver e de ajudar os teus filhos e netos é inspiradora para todos nós. Sem esquecer o grande amor da tua vida que está sempre discretamente presente... Juntos, tu e ela, são o poilão protetor de filhos e netos... Que grande lição de vida e de amor, Joaquim!... Os teus filhos e netos têm orgulho de ti. E os teus camaradas, grã-tabanqueiros, também. Um Alfa Bravo do tamanho da distância Lisboa-Berlim. Luis

Luís Graça disse...

Joaquim: Um dia que leves os teus netos ao Parque Jurássico da Lourinhã (um projeto luso--alemão...), eu quero lá estar contigo e com eles... Até por que ainda não te conheço "ao vivo"... Um xicoração. Luís

Anónimo disse...

FixE!!!...Avisarei e ...abraçar-nos-emos ao vivo.
Mendes Gomes