segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13667: In Memoriam (196): Claúdia Sousa (1975-2014), estudiosa do dari (chimpanzé) do Cantanhez, morre aos 39 anos, de doença. O funeral é amanhã, na Figueira da Foz


Título e toto: Recorde do jornal Público, 29 de setembro de 2014.  (Com a devida vénia...)



1. Foi o João Graça, amigo da Tabanca Grande, médico e músico, que esteve em dezembro de 2009, na Guiné-Bissau e teve o privilégio de ver, ao vivo, no seu habitat natural  o chimpazé (ou dari) do Cantanhez, quem me deu a triste notícia: a professora e investigadora Cláudia Sousa morreu de cancro, esta segunda feira, aos 39 anos.

Não conhecia, pessoalmente, a Cláudia mas sabia que ela era uma jovem e promissora cientista portuguesa que se dedicava ao estudo dos chimpanzés. Era, de resto, minha colega, pertencendo, desde 2001,  à Universidade Nova de Lisboa (NOVA), Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH), Departamento de Antropologia [Vd. aqui o seu currículo académico].

Segundo Teresa Firmino, jornalista do Público, que assina o artigo acima citado, "Cláudia Sousa doutorou-se em 2003 na Universidade de Quioto [, Japão,] sob orientação de Tetsuro Matsuzawa, uma autoridade mundial em primatologia. A sua tese de doutoramento versava sobre a capacidade cognitiva de os chimpanzés acumularem capital ou, por outras palavras, de fazerem um mealheiro. Para tal, em experiências no Instituto de Investigação de Primatas da Universidade de Quioto, a investigadora deu aos chimpanzés tokens (objectos que têm um valor simbólico) para pedirem frutas em troca – e que eles guardavam e só trocavam por alimentos quando queriam.

"Na sua tese de doutoramento Cláudia Sousa mostrou que o sistema dos tokens constituía uma nova metodologia para avaliar as capacidades cognitivas dos chimpanzés. Em particular, observou “a emergência de um comportamento único – ‘economizar’”, lê-se no resumo da tese. Ou seja, compreendem e têm noção do valor simbólico de certos objectos." (..:)

Cláudia Sousa (1975-2014).
Foto: cortesia  da FCSH/NOVA
Para além de experiências em laborório, também fez trabalho no terreno, tendo ido à Guiné-Bissau e à Guiné-Conacri, por diversas vezes,  em expedições científicas. Viu chimpanzés em estado selvagem, pela primeira vez, na sua quarta visita à Guiné-Bissau, acompanhada por Catarina Casanova, outra primatóloga portuguesa. Entre 2007 e 2011, Cláudia Sousa foi presidente da Associação Portuguesa de Primatologia que ajudou a fundar.

Segundo o diretor da FCSH da NOVA, João Costa, em comunicado recolhido pela jornalista do Público, "a professora Cláudia Sousa deixa-nos um testemunho importantíssimo de amor à ciência e entusiasmo pela investigação. Mesmo muito fragilizada pela doença, nunca parou de trabalhar com um entusiasmo contagiante e com projectos sempre novos (...). “A sua produção científica foi sempre notável, sendo este ano a vencedora do Prémio Santander de Internacionalização da Produção Científica, que será atribuído postumamente na Festa da FCSH.”

A notícia da sua morte entristece-nos a todos, aqueles de nós que são amigos da Guiné, e todos aqueles que amam a ciência que se faz em Portugal e nos demais paíes lusófonos. Ficamos todos mais pobres,  a começar pela população (ameaçada) de daris da Guiné-Bissau e da Guiné-Conacri...

O corpo encontra-se em câmara ardente na Igreja Matriz da Figueira da Foz, donde a Cláudia era natural. O funeral realiza-se amanhã, terça-feira,  à tarde.



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez > Madina > 10 de Dezembro de 2009 > 7h32 > Um dari (chimpanzé) descendo uma árvore ... Este grande símio (o mais aparentado, do ponto de vista genético, ao ser humano) é muito difícil de observar e fotografar... Contrariamente a outros primatas que existem no Parque, com relativa abundância com o macaco fidalgo (fatango).

Foto: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados [Edição e legendagem:  L.G]

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Nota do editor:

Útimo poste da série > 25 de setembro de 2014 > Guiné 53/74 - P13650: In Memoriam (195): Cap art Manuel Carlos da Conceição Guimarães (1938-1967), morto na estrada Geba-Banjara, região de Bafatá... As suas irmãs, Teresa e Ana descobrem agora, emocionadas, as referências sobre ele no nosso blogue e encontraram-se há dias, em Lisboa, com o A. Marques Lopes, seu amigo e companheiro de infortúnio

2 comentários:

José Marcelino Martins disse...

A tal chamadade Morte, não escolhe os seus alvos.

Atira à sorte e leva quem ainda tinha muito para dar.

As minhas condolências à familia.

Hélder Valério disse...

A notícia da morte de camaradas tem sido recorrente.
Em certa medida, embora nos perturbe, já estamos 'à espera' e não nos surpreende por aí além.
Mas neste caso é totalmente inesperado (porque também não se dispunha de mais informação) e devido à idade fica-se sempre com a sensação de se tratar de 'morte prematura'.
Sem dúvida que a ciência, a cultura, a investigação ficam mais pobres.
À família, os meus pêsames.

Hélder Sousa