Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009
Guiné 63/74 - P3937: Convívios (96): Pessoal do BCAV 3846 e Companhia Independente, dia 15 de Março de 2009 em Ortigosa - Leiria (Delfim Rodrigues)
1. No próximo dia 15 de Março vai acontecer mais um Encontro do Batalhão de Cavalaria n.º 3846, mais Companhia Independente. Este ano comemoram o 36.º aniversário do seu Regresso.
O Almoço será servido no Restaurante "Quinta do Paúl", sito na Estrada Nacional 109 em Paúl - Ortigosa - Leiria.
2. Deixo a Ordem de Serviço, da responsabilidade da Comissão organizadora.
Guiné 1971/73
10 de Fevereiro de 2009
Batalhão Cavalaria 3846
Companhia Independente
Caros amigos
Aos 15 dias do próximo mês de Março do corrente ano de 2009, ficam convocados todos aqueles que pertenceram ao BCav 3846, mais a Companhia Independente para se apresentarem às 12 horas de Domingo, no Restaurante “Quinta do Paul“ sito na Estrada Nacional 109 – Paúl – Ortigosa - Leiria a fim de festejar o 36.º aniversário do regresso das terras da Guiné.
Assustaram-se com esta ordem de serviço? Não vale a pena, isto foi só uma brincadeira, pois após 36 anos a organizar este convivio acho que já temos direito a brincar um pouco e que nos desculpe o Comandante Oliveira Guimarães por este abuso de autoridade.
Mas vamos ao que nos interessa, isto é, o nosso Capelão celebrará uma missa nesse local às 12 horas, onde serão recordados todos aqueles que nos deixaram.
Em seguida realizar-se-à o já tradicional almoço, onde nós esperamos encontrar um novo número de participantes (mais de 150 pessoas). Ainda recordo o desafio que no ano passado alguém ter sujerido de se apresentarem aqueles que sabem tocar algum instrumento musical ou saibam cantar, ou ilusionismo ou qualquer outro tema interessante para nos dedicarem esses tais dotes.
No fundo o que nós queremos é que esteja muita gente, tudo corra bem, e saibamos viver estes momentos bem dificeis com muita alegria e amizade pois é com esse sentido que nós realizamos esta festa.
Um bem haja para todos, um até já.
Os preços praticados serão os seguintes:
Crianças entre os 5 e 10 anos - 14,00 Euros
Para todos os restantes - 28,00 Euros
Para qualquer dúvida ou esclarecimento necessário poderão contactar:
Alberto Toscano – 912 381 293 – albertotoscano@sapo.pt
Carlos Conceição (Xina) 919 489 378 – carlos_m_novoa@hotmail.com
Ten Cor Bernardino Laureano – 966 452 001 - laureano@netmadeira.com
Telefone do Restaurante - 244 613 438
A confirmação da presença deverá ser feita até 8 de Março.
Esperamos poder contar com a presença de todos vós neste dia e até ao nosso encontro, resta-nos desejar uma boa viagem.
Um forte abraço
Toscano, Xina; Laureano, Capelão
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3841: Convívios (94): Pessoal do BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71), no dia 7 de Março de 2009 em Arganil (César Dias)
Guiné 63/74 - P3936: Bibliografia de uma Guerra (43): 14.º Volume da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (V. Briote)
Lançamento do 14º Volume da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961/74)
Dia 10 de Março, às 18h00
Museu Militar de Lisboa
Apresentação a cargo do General A. Soares Carneiro e do Coronel Cmd Jorge Graça, Cmdt do Centro de Tropas Cmds.
Para conhecimento dos antigos Cmds da Guiné e de todos os Camaradas, que queiram e possam estar presentes.
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Nota de vb:
1. Artigo relacionado em
16 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3903: A Compª de Cmds do CTIG, 1965/66. Artigo do General Garcia Leandro na Revista Mama Sume. V. Briote
2. Último artigo da série em
17 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3907: Bibliografia de uma guerra (42): Escritor Combatente: "A Geração do Fim" (Mário Beja Santos)
terça-feira, 24 de fevereiro de 2009
Guiné 63/74 - P3935: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (II): O artigo da Visão e o meu direito à indignação
BANALIDADES DA FOZ DO MONDEGO II > AINDA O POSTE 3925 (*)
[Bold, a cor, da responsabilidade do editor, L.G.]
Comandante Luís Graça,
Sempre preferi o silêncio dos bastidores à luz da ribalta e, para o meu gosto, estou a aparecer demasiadas vezes.
Obrigado pela publicação do meu pobre e singelo comentário (**), mas a singeleza é sinónimo de sinceridade, que tanto prezo e tento manter em tudo o que faço.
Quando hoje reli o comentário do nosso camarada Torcato, que não tenho o prazer de conhecer pessoalmente, comentário esse que referi no texto que te enviei e que me ajudou a escrevinhá-lo na parte que diz respeito ao Gen Spínola, fiquei com a pulga atrás da orelha no que diz respeito a uma citação que ele retira da revista Visão. Como não tinha lido a Visão e a tinha procurado, sem êxito, por Buarcos, pedi a pessoa amiga que fizesse o favor de me enviar o referido texto. Vou completar a citação que o nosso camarada Torcato faz, dando à luz todo o parágrafo:
“ Raramente havia combates frontais, sendo as explosões de minas e os acidentes de viação as principais causas das baixas entre as tropas portuguesas, que recorriam à concentração das populações em aldeias estratégicas, ao uso de napalm e até mesmo aos massacres como armas ditadas pelo desespero.”
Caros camaradas: de que estamos à espera para reagir a um texto destes que diz preto no branco que, para além dos ralis que fazíamos e que pelos vistos provocavam imensas vítimas com os despistes dos nossos bólides, para além de umas minas que explodiam de quando em vez, fomos também assassinos que recorriam a massacres e ao napalm?
Como é possível ficarmos indiferentes a baboseiras destas, se nos lembrarmos de todos os mortos que tivemos em combate, dos camaradas que ficaram estropiados para toda a vida, da fome, do frio, dos paludismos, das condições desumanas em que vivemos, do sacrifício do abandono das nossas famílias, da interrupção dos estudos que poucos retomariam, de famílias desfeitas, de empregos perdidos…
Ataque-se o regime, ataquem-se os governantes de então, ataquem-se os grandes comandantes militares, mas não belisquem nem a honra nem a dignidade dos que eram obrigados a ir combater.
PORRA! NÃO QUERO NEM PEÇO NENHUM RECONHECIMENTO, MAS NÃO ADMITO SER OFENDIDO.
Por favor, camaradas, alguém com capacidade de escrita ensine a esta gente o quão importante foi a nossa geração.
Temos escritos magníficos no nosso blogue; há que juntá-los, há que os publicar, há que os divulgar para fora do nosso círculo, se não por nós, que seja feito em memória dos nossos camaradas mortos em combates frontais!
Um abraço, nervoso, do camarada e amigo
Vasco
2. Comentário de L.G., editor:
Os amigos e camaradas que queiram comentar o texto da Visão, assinado por Luis Almeida Martins (é sempre aconselhável lê-lo primeiro, na íntegra), e em especial o polémico parágrafo citado pelo Vasco da Gama (i), poderão fazê-lo, directamente, no nosso blogue, mas também poderão enviar uma mensagem para o Correio dos Leitores, daquele semanário.
A mensagem a enviar deverá conter até 60 palavras (no máximo), além do vosso nome, morada e tefefone. Deve ser enviada por mail. O endereço electrónico da Visão é: visao@edimpresa.pt
A revista sai às quintas-feiras.
(i) O parágrafo completo é o seguinte (pp. 50-51):
"Principiada em Angola em 1961, a guerra colonial na sua nova faceta menos tribal e politicamente mais organizada estendera-se à Guiné em 1963 e a Moçambique em 1964. Não de tratava de uma guerra de frentes, mas de uma intrincada sucessão de acções de guerrilha, difícil de travar e desafiadora de qualquer planificação eficaz. Raramente havia combates frontais, sendo as explosões de minas e os acidentes de viação as principais causas das baixas entre as tropas portuguesas, que recorriam à concentração das populações em aldeias estratégicas, ao uso de napalm e até mesmo aos massacres como armas ditadas pelo desespero."
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Que imagem vamos passar aos nossos filhos e netos ? Nós fomos combatentes, não fomos assassinos! - é a reacção generalizada dos veteranos da guerra da Guiné, a este excerto de um artigo ("Portugal e o passado"), de Luís Almeida Martins, evocativo dos 35 anos da publicação do livro de Spínola, Portugal e o Futuro , na edição da revista Visão, desta semana (nº 833, 19 a 25 de Fevereiro de 2009, pp. 50-51)...
Na mesma semana, por ironia, em que há algumas dezenas de homens e até de mulheres, ex-combatentes da guerra colonial (na sua maioria), que seguem, por terra, em caravana, do Porto, de Coimbra e de Portimão, a levar ajuda humanitária a (e a matar saudades de) um povo que eles consideram irmão...
Não vi a imprensa de Lisboa (rádio, televisão, jornais) dedicar 30 segundos ou um parágrafo sequer a este pequeno grande evento, que culmina meses e meses de trabalho, anónimo e voluntário, e que é bem revelador do sentido de nobreza, compaixão, generosidade, ecumenismo fraternidade e solidariedade de um povo... Não são as sobras dos ricos que eles levam em contentores que já seguiram por mar, mas sim artigos essenciais que fazem muita falta às crianças da Guiné-Bissau, na sua maioria material escolar, didáctico e sanitário... E até um parque infantil, o primeiro de Bissau, vai ser montado desta vez! (LG).
Visão nº 833, de 19 a 25 de Fevereiro de 2009 > Artigo de Luís Almeida Martins, "Portugal e o passado" (pp. 50-51). O nosso camarada Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CART 8351 (Cumbijã, 1972/74), não gostou do que o jornalista escreveu, a propósito do quotidiano da guerra colonial:
"Raramente havia combates frontais, sendo as explosões de minas e os acidentes de viação as principais causas das baixas entre as tropas portuguesas, que recorriam à concentração das populações em aldeias estratégicas, ao uso de napalm e até mesmo aos massacres como armas ditadas pelo desespero."...
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Notas de LG.:
(*) Vd. poste de 23 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3925: Efemérides (16): Portugal e o Futuro, de António Spínola, um best-seller há 35 anos
(**) Vd. poste anterior desta série de 24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3929: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (I): Antes que me chamem spinolista...
Guiné 63/74 - P3934: Expedição Humanitária 2009 (6): Já na Mauritânia, a caravana deverá chegar 6ª feira, dia 27 (Carlos Marques dos Santos)
Título e foto da página 7 do Diário As Beiras, de 24 de Fevereiro de 2009.
O nosso camarada e querido amigo Carlos Marques dos Santos que andou pelo sector de Bambadinca, Zona Leste, entre 1968 e 1969, sendo Fur Mil da CART 2339 (juntamente, entre outros, com o Torcato Mendonça, outro querido membro da nossa Tabanca Grande) está a acompanhar, a partir da sua Coimbra natal, a Expediçõ Humanitária 2009 (*) que há-de chegar a Bissau dentro de dois ou três dias.
Eu sei quanto o Carlos gostaria de ir ao lado do Zé Moreira, do Xico Allen e dos demais participantes. É, de resto, um homem do caravanismo, professor de educação reformado... A saúde, porém fala mais alto...
O Carlos acaba de nos mandar um recorte do Diário As Beiras, edição de hoje, com uma peça do Vitor Garcia que está em contacto telefónico com a caravana. Eis um relato do que ele escreveu, na edição de hoje:
"O calor já se faz sentir e o cansaço aumenta. Mas a vontade de continuar e chegar à Guiné-Bissau é maior. Depois das dunas de Marrocos, a Mauritância espera a expedição humanitária".
Citando um dos membros da organização, o Fernando Ferreira, o jornalista diz que a expedição (Missão Humanitária - Memórias e Gente, 2009) deverá chegar à Guiné-Bissau na próxima sexta-feira, ou seja, oito dias depois da partida. "Aí , vai distribuir 25 toneladas de proutos de primeira necessidade. Sete jipes, uma carrinha e mais de duas dezenas de pessoas compõem a expedição".
Imagens: Diário As Beiras / Recortes digitalzados e enviados por Carlos Marques dos Santos (2009) /Edição: L.G.
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Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste da série > 22 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3924: Expedição Humanitária 2009 (5): Ei-los que partem, do Largo da Portagem, Coimbra... a caminho de Bissau (José Moreira)
Guiné 63/74 - P3933: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (4): Cenas, pouco edificantes, de caserna, que não contarei...
Foto: © A. Marques Lopes (2005). Direitos reservados.
1. Mensagem de Cristina Allen, através da sua filha Joana Santos:
Caro Luís Graça,
Junto mais um texto da minha mãe para o Blogue.
Em breve, ela sairá de Bissau, mas eu ainda não acredito.
Um abraço,
Joana
2. Um agradecimento e ... um poema a Bissau (*)
por Cristina Allen
A Vasco da Gama, Luís Graça, Jorge Cabral, Torcato Mendonça, Mário Fitas e Alberto Branquinho,
Vocês são demasiado elogiosos.
Tinha preparado, para este Blogue, um texto hilariante sobre a perseguição nocturna a um coronel, que punha gravata para o jantar, me piscava um olho velhaco e, numa noite em que o Mário se ausentara, entrou, no meu quarto, em cuecas. Tantos anos volvidos sobre o caso, não acho que seja assim tão engraçado.
É que, a esse tempo, o homem teria a idade do meu pai e, nos dias de hoje, já sou mais velha do que ele então seria. Também entrava nessa história o Carlos D’Orey, um amigo que morreu de abandono.
Portanto, nada de graças. Em vez desse texto, mais uma visão de Bissau, da qual não consigo ainda partir.
Bissau, a menos bela,
te cantarei bela
em cada esquina.
Bissau, como te vi,
luzeiro e sombra densa,
Bissau da paz
e luta ardente,
Bissau benvinda,
oculta para sempre.
E se, em sonhos,
farrapos de mim
por ti e só por ti ainda gritam,
são coisas da lembrança,
cidade adormecida,
entre a morte e a vida
bem cumprida,
delgado fio pendente…
E, da suprema traição,
que tão bem viste,
o espanto e a ira,
na tua cor esbatidos,
mais brandos tos retorno,
em meus olvidos,
Bissau, a menos bela,
que cantarei mais bela
em cada esquina.
Cristina Allen
Fevereiro de 2009
__________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes anteriores da série:
9 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3713: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (1): Just married...
8 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3850: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (2): Quarto, precisa-se, por favor!
19 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3913: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (3): Quanta chuva, Mário ?
Guiné 63/74 - P3932: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (23): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte II)
Comentário sobre a apreciação de “ A RETIRADA DE GUILEJE” de António Martins de Matos (Coutinho e Lima)
2ª (e última) Parte (*)
Sobre a maneira de actuar da Força Aérea, foi afirmado:
“…o apoio aéreo em vôo baixo, com metralhadoras e foguetes, ainda que possa aumentar o moral das tropas, é, e será sempre, completamente inadequado”.
O Sr Ten Gen terá que confrontar o Sr General da FA Lemos Ferreira, na altura Coronel Piloto Aviador, Comandante da última parelha de FIAT G-91, que prestou Apoio Aéreo a Guileje, na tarde de 21 MAI 73. No seu depoimento (págs 137/138, resposta à 2ª. Pergunta), declarou:
“…o pedido teve execução com bombardeamento nos locais mais suspeitos e igualmente com metralhamento…”.
Este apoio “completamente inadequado” (na opinião do Sr Ten Gen), foi apreciado, de maneira diversa, por Guileje (pág. 140, último comentário):
“…o pessoal presente na guarnição considerou esta missão de Apoio Aéreo a mais eficaz de todas”.
Não só contribuiu para aumentar o moral das tropas, que tão baixo estava, como também neutralizou o Inimigo, que não mais se manifestou na área bombardeada e metralhada.
“Um homem sem perfil, …”.
Não reconheço ao Sr Ten Gen autoridade para avaliar o meu “perfil”, até por que não me conhece.
Quanto ao “erro de casting” que, segundo o Sr Ten Gen, foi a minha nomeação para o COP 5, não sou a pessoa indicada para comentar.
São ainda apontadas “algumas decisões” que não terão sido as mais correctas”.
Tenho muito prazer em esclarecer tais “decisões”.
“O estabelecimento da sede do COP5 em Guileje em vez de Cacine ou Gadamael”.
Na página 24 do meu livro (nº. 4. Sede do COP 5), está explicada a razão por que a sede foi em Guileje.
“…troca de armamento sem razão aparente…”
Em 24 JAN 73 (3º. dia de existência do COP 5), propus a substituição das 3 Peças de Artilharia de 11,4 cm por 3 Obuses de 14 cm (pág. 25); o motivo desta proposta foi o conhecimento que eu tinha, de que as munições de 11,4cm estavam a acabar, o que não se verificava com as granadas de 14 cm. A proposta incluía também a permanência das Peças, em Guileje, enquanto houvesse munições, juntamente com os Obuses; as Peças regressariam a Bissau, no final da época das chuvas.
O atraso na substituição do material de Artilharia (em 18 MAI 73 só estavam em Guileje 2 Obuses), conjugado com a ordem para as peças seguirem para Bissau (via Gadamael), antes mesmo de se completar a substituição, diminuiu grandemente o apoio de fogo de Artilharia (a arma mais potente que tínhamos), quer em quantidade, quanto em qualidade; em vez de 3 Peças, passaram a existir 2 Obuses, com a agravante de o tiro das primeiras estar perfeitamente regulado (por observação aérea) e a impossibilidade de regular o tiro dos Obuses, por falta de meio aéreo, para o efeito. O fogo de Artilharia, sem regulação de tiro, mostrou-se pouco eficaz, comprovado na reacção à emboscada do dia 18 MAI.
“Suspensão da actividade operacional”
A palavra “suspensão” é da inteira responsabilidade do Sr Ten Gen; o que eu propus, em 27 ABR 73 (Pág 32, mensagem 588), foi.
“…SOLICITO REDUÇÃO MÍNIMO PARTIR 30 ABR ACTIVIDADE OPERACIONAL CCAV 8350…”
A justificação era a proximidade da época das chuvas e o grande atraso das obras em Guileje.
A resposta da REP/OPER foi:
“…AUTORIZADO, MEDIDA POSSÍVEL DEVE CONTINUAR ABERTURA ESTRADA MEJO”,
o que foi feito.
Ficam assim explicadas as decisões que “contribuíram para o agravamento da situação”, com que discordo totalmente. Tais decisões, nomeadamente a terceira (da minha parte houve apenas uma proposta), quando muito, não permitiram detectar os movimentos do Inimigo, na fase de instalação do seu dispositivo. Se não tivesse havido redução da actividade operacional, poder-se-ia ter constatado, mais cedo, a NÃO EVACUAÇÃO DE FERIDOS GRAVES, se os houvesse.
Importa, relativamente a Guileje, conhecer o que pensava o Comando-Chefe.
Na Reunião de Comandos efectuada em 15 MAI 73, sob a presidência do Sr General Spínola, o Sr Chefe da Repartição de Operações afirmou:
“ Se não forem concedidos os reforços solicitados e as armas que permitam às NF enfrentar o In actual, para lhe evitar, a breve prazo, a obtenção de êxitos de fácil exploração psicológica e graves efeitos tácticos da maior influência no moral das NT, julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista militar se considerem essenciais e que permitam, à luz de outras concepções de manobra, desencadear mais tarde acções ofensivas com forças de grande envergadura para recuperação de posições enfraquecidas, ou estruturar uma manobra de feição caracterizadamente defensiva baseada na implantação de um certo número de pontos de apoio a sustentar a todo o custo…”.
Os reforços solicitados eram tais que, estou certo, o próprio Comando-Chefe estava ciente que não podiam ser satisfeitos pela Metrópole.
A remodelação do dispositivo, preconizada em 15 MAI 73, já devia ter sido feita; com efeito, as hostilidades em Guidage tinham começado em 8 MAI 73 e, no que diz respeito a Guileje, o Comando-Chefe possuía elementos de informação suficientes para prever o seu início, a curto prazo.
O último “cenário” apresentado, parece que seria o preconizado para Guileje, já que o Sr. Comandante-Chefe, ao nomear o Sr Coronel Paraquedista Rafael Durão para novo Comandante do COP 5, alterou a Missão deste (pág 117 – Resposta à 1ª Pergunta):
“…No dia 21 recebi directamente de Sua Excelência o General Comandante-Chefe ordem para manter a todo o custo o destacamento de Guileje, naquele local, para o que devia verificar as necessidades em meios para lá colocar os abastecimentos de toda a ordem, mais de 200 toneladas…”
A missão de “manter a todo o custo”, era a mais exigente e que, no limite, poderia significar que era preciso aguentar até ao último homem; não era esta a Missão que me estava confiada, pois se o fosse, não poderia ser efectuada a retirada.
Não posso deixar de referir que, naquela data (21 MAI), com o aquartelamento de Guileje sujeito a intensas, constantes e prolongadas flagelações, desde as 20 horas do dia 18 MAI, a preocupação era “ colocar lá os abastecimentos…”, em vez de, em primeira prioridade, desarticular o dispositivo do Inimigo, de modo a aliviar a forte pressão que estava a ser exercida sobre as Nossas Tropas.
Na mesma Reunião de Comandos de 15 MAI 73, o Sr. Brigadeiro Leitão Marques, Comandante Adjunto Operacional do Comando-Chefe (oito dias mais tarde seria nomeado para proceder a Auto de Corpo de Delito contra mim), afirmava, conforme consta na acta da referida reunião:
“…No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o In está a preparar as necessárias condições para conquista e destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de socorro (GUIDAGE, BURUNTUMA, GUILEJE, GADAMAEL, etc), a fim de obter os êxitos indispensáveis à sua propaganda internacional e manobra psicológica – isto está já ao alcance das suas possibilidades militares.
Quanto às vantagens para a manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa.
…tal elemento será aproveitado ao máximo para desmoralizar a retaguarda e manter-se-á até serem atingidos os objectivos finais em todas as PU”. (Os negritos são meus).
A decisão de retirar de Guileje tem de ser comparada com a outra modalidade de acção, que era a de permanecer no local. Nas páginas 76 a 82 do meu livro, estão indicados os factores em que baseei a minha decisão.
Embora não dispusesse, na altura, da informação privilegiada do Sr. Comandante Adjunto Operacional, o meu conhecimento das possibilidades do IN, conjugado com a não atribuição de qualquer reforço, a não evacuação de feridos e com os outros factores referidos nas páginas indicadas, levaram-me a considerar a posição insustentável e, em consequência, decidir efectuar a Operação de Retirada.
A alternativa era o cenário exposto pelo Sr. Brigadeiro Leitão Marques. Com a retirada, que foi um êxito, surpreendendo totalmente o Inimigo, foram evitadas as graves consequências, que eu previa como certas, para as Tropas Portuguesas, Milícia e População.
“Todos nós, que estivemos na Guiné, temos alguns fantasmas”.
O Sr Ten Gen faz uma generalização abusiva; na expressão “todos nós”, seguramente que não estou incluído; nunca tive fantasmas.
Também recuso, liminarmente, a designação de “herói”ou “anti-heroi”. Assumi as minhas responsabilidades de Comandante, fiz o que achei que se impunha ser feito e arquei com todas as consequências resultantes da minha decisão.
Relativamente ao que se passou em Gadamael, não quero deixar de fazer algumas considerações, tal como fiz no meu livro (págs 92 a 95 - Comparação entre as situações de GUILEJE e GADAMAEL).
Parece que não se colheram nenhuns ensinamentos do que ocorrera em Guileje. Com a guarnição de Gadamael muito aumentada, em minha opinião, impunha-se a adopção das seguintes medidas:
- Melhoramento das condições de defesa do aquartelamento (vá lá saber-se por que nunca foram construídos abrigos semelhantes aos de Guileje).
- Reforço urgente com tropa especial.
Parece lícito questionar que, se a guarnição de Gadamael tivesse sido reforçada em tempo oportuno (o reforço inicial só foi accionado em 2 JUN 73, sendo que a acção inimiga teve início em 31 MAI, pelas 14 horas), as consequências, para as NT e população, não teriam sido menos graves. Ninguém pensou que as tropas presentes em Gadamael, cujo estado físico e moral foi descrito pelo Sr. Alferes Miliciano Médico Antunes Ferreira (pág. 188), não estavam em condições de enfrentar um ataque em força do PAIGC?
E como se explica a “debandada”, que se verificou em Gadamael, dos Militares e da População, para fora do quartel (matas circundantes e margens do rio).
Responda quem souber.
Um ponto em que estou de acordo com o Sr Ten Gen Martins de Matos, qual é a homenagem ao Batalhão de Caçadores Paraquedistas nº 12, à qual me associo.
Para terminar, quero manifestar o meu apreço e grande consideração pela actuação da Força Aérea Portuguesa; em variadíssimas situações, muitas de extrema dificuldade e risco, tive oportunidade de constatar o seu alto grau de preparação, profissionalismo e espírito de missão. O apoio da FAP, importantíssimo para as Forças Terrestres, é merecedor da nossa maior gratidão.
Coutinho e Lima
Cor Art Ref
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Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior > 18 de Fevereiro de 2009 Guiné 63/74 - P3910: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (22): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte I)
Guiné 63/74 - P3931: As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas (2): Elementos para a sua história (1961-1974) (Cor Manuel A. Bernardo)
Enfermeiras Pára-quedistas na Guerra de África (1961-1974)
Ao consultar o site “Luís Graça e os Camaradas da Guiné”, percebi haver um certo interesse de intervenientes em contactar ou tentar localizar aquelas senhoras, que foram elementos muito importantes para o moral das tropas, nomeadamente durante as evacuações de feridos.
Quer o texto de Luís Nabais e Victor Barata, com o título “Em busca das enfermeiras pára-quedistas”, quer o de Mário Fitas, titulado “As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas” vão nesse sentido. De facto, quando na legenda de uma foto dizem tratar-se da enfermeira Ivone, julgo que é essa a identificação da então Alferes (graduada) Ivone Reis, hoje Capitão na reforma, com quem tenho contactado ao longo dos anos, nomeadamente no âmbito das actividades da AFAP (Associação da Força Aérea Portuguesa).
Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 763 (1965/66) > Uma enfermeira pára-quedista no meio dos Lassas... O ex-Alf Pil Al III, Jorge Félix, membro da nossa Tabanca Grande, identificou esta enfermeira, como sendo a Ivone.
Fotos: © Mário Fitas(2008). Direitos reservados.
Das 47 enfermeiras pára-quedistas que pertenceram a este quadro (uma pós-25 de Abril), 22 foram graduadas em Alferes aquando do seu ingresso nas fileiras militares. Atingiram o posto de Capitão oito oficiais e cinco, o de Tenente.
Quando, em Fevereiro de 1994, os Páras foram transferidos para o Exército, apenas as restantes quatro capitães enfermeiras pára-quedistas seguiram com os camaradas masculinos. As outras já tinham ficado “pelo caminho”, desde 1980, quando fora decretada a extinção progressiva deste quadro. (In Luís A. M. Grão, “Enfermeiras Pára-quedistas; 1961-2002”. Lisboa, Ed. Prefácio, 2004).
Neste livro é feita uma referência à única enfermeira pára falecida em acidente, numa zona de operações (Guiné), em 10-2-1973: Furriel Celeste Ferreira da Costa.
A Furriel Giselda Pessoa, que tem intervido nesse site, refere-se a este caso em depoimento para o livro de José Freire Antunes, “A Guerra de África: 1961-1974”, 2.º vol (pp. 683).
Nesta obra colaboraram também com os seus depoimentos outras enfermeiras pára-quedistas; além da referida Maria Ivone Reis, as Capitães Eugénia Sousa e Maria do Céu Esteves; as Tenentes Maria Arminda Santos e Maria Zulmira André; e a Furriel Maria Piedade Gouveia.
No texto do louvor a título póstumo que foi atribuído a Maria Celeste Ferreira da Costa pelo Comandante da Zona Aérea, e transcrito no livro do Cor Luís Grão, pode ler-se:
"(…) Zelosa e cumpridora das missões que lhe foram confiadas, procurando ser rápida e eficiente no serviço, realizou um número superior a 60 aeroevacuações, nesta Província, prestando assistência a mais de 100 doentes, entre militares e população civil, alguns dos quais feridos graves.
" (…) Em quatro acções de evacuação sanitária da Zona de Operações efectuadas durante contactos de fogo com o inimigo, a Furriel Graduada Enfermeira Ferreira da Costa evidenciou notáveis qualidades de coragem, serenidade e abnegação, o que tornou possível que os militares evacuados fossem conduzidos nas melhores condições de socorrismo ao Hospital Militar a tempo de receberem os cuidados necessários para tratamento das graves lesões que haviam sofrido.
"De trato afável, carácter integro, possuindo em alto grau o sentido do dever e da lealdade, a Furriel Graduada Enfermeira Pára-quedista Ferreira da Costa foi para todos e em particular para os elementos do Serviço de Saúde da Força Aérea, um exemplo a seguir e motivo de prestígio para as Forças Armadas."
Com estas linhas espero ter contribuído para o esclarecimento das pessoas que desejavam saber mais algo sobre estas mulheres, que ao longo de 13 anos da Guerra do Ultramar (criadas em 1961), com grande esforço e abnegação apoiaram os militares combatentes dos três Teatros de Operações: Angola, Guiné e Moçambique.
Cor Manuel Amaro Bernardo
22-2-2009
__________
Notas de vb:
Artigos relacionados em
20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3916: Tabanca Grande (121): Giselda Antunes Pessoa, ex-Enfermeira Pára-quedista (Agosto de 1970 / Maio de 1974)
20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3914: As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas (1): Uma brincadeira (machista...) em terra dos Lassas (Mário Fitas)18 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3912: Iniciativas da ADFA em Lisboa (2): Em busca das Enfermeiras Pára-quedistas (Luís Nabais / Victor Barata)
Guiné 63/74 - P3930: Braima Galissá, grande representante da cultura guineense na diáspora (2): 4ª feira, 25, às 19h, no Institut Franco-Portugais
Guiné 63/74 - P3929: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (I): Antes que me chamem spinolista...
Foto: © Vasco da Gama (2008). Direitos reservados.
1. Mensagem enviada pelo Vasco da Gama:
BANALIDADES DA FOZ DO MONDEGO (I)
[Negritos, a cor, do editor L.G.]
Comandante Luís Graça, meu amigo e camarada da Guiné
Li, como o faço diariamente, o nosso blogue, debruçando-me várias vezes sobre o poste 3925 que recorda o lançamento do livro Portugal e o Futuro, da autoria do Gen António de Spínola (*).
Por falar em recordações, quero também lembrar que passa hoje mais um ano sobre o desaparecimento do Zeca Afonso, vulto grande das canções e que eu me habituei a ouvir desde sempre. Ainda estudante no Porto, havia um conjunto de malta a que eu pertencia, fiel às músicas do Zeca e do Adriano. Nas excursões que então fazíamos aqui e acolá, em grupo entoávamos as cantigas cujas letras eram cuidadosamente policopiadas na secção de texto das Associações Académicas. A malta de Lisboa andava muito à frente mas as novidades chegavam ao Norte num abrir e fechar de olhos. Guardo alguns desses textos religiosamente, assim como uma fotografia do Zeca e de um primo meu que o acompanhou na gravação em Londres de um dos álbuns.
Ao abrir a nossa Tabanca, fiquei admirado ao ver uma fotografia minha com o Gen Spínola, que aliás é o único que segue com o olhar o meu gesto, uma vez que já há algum tempo não escrevo nada para o blogue.
Chatices, desilusões, desenganos, problemas de saúde com familiares próximos, eu sei lá, uma sucessão ininterrupta de aborrecimentos, tudo ao mesmo tempo, remeteram-me ao silêncio, que espero venha a ser quebrado em breve com a continuação de Nhacobá (**).
A que propósito o nosso Comandante publica esta fotografia? Imediatamente descobri a razão, razão essa, que me leva a escrever meia dúzia de palavras, com algum receio, tanto mais que não li a Visão, e ao ler nas várias citações que aparecem no artigo, bem como no resumo do jornal, palavras como “cientista político”, ”intelectuais”, “os media”, sociólogo ”disse para os meus botões:
- Está quieto, rapaz! Bate a bola baixo, pois não tens arcaboiço para isto.
Ao ler os comentários ao poste, logo nas palavras do nosso camarada Torcato encontrei a chave para perder o medo: «concorde-se ou não com o conteúdo, o livro foi uma 'janela de esperança', um 'marco', uma 'bandeira', uma 'pedrada no charco', o problema era 'político e não militar' ...". Isto é honestidade intelectual! Posso não concordar, mas tenho de reconhecer que…
Acrescentar mais o quê? Já agora…
Já falei por diversas vezes no General António de Spínola, que visitou várias vezes a minha CCav 8351. Basta ler esses escritos. O Luís Graça refere-se a dois deles no poste. Fá-lo-ei, pelo menos mais uma vez, quando descrever a sua visita a Nhacobá.
Quero apenas dizer, julgo que já o referi, que foi o primeiro e único oficial, do quadro permanente que conversava com a malta que chegava à Guiné sobre “guerra colonial”, “federalismo” e aceitava respostas onde se falava de independência. Onde estavam todos os outros?
Direi mais, onde estavam oficiais que mais tarde vieram a pertencer ao M.F.A., que foram meus instrutores no curso de capitães em Mafra, éramos então graduados em tenente, que apenas e só debitavam de uma forma extensa, monótona e fastidiosa o saber militar? Algum deles ensinou o que quer que fosse sobre as “províncias ultramarinas”? Algum deles permitia argumentação ao que quer que fosse?....Finais de 1971, princípios de 1972, convento de Mafra….
O sr. dr. Medeiros Ferreira afirma que o livro do Spínola dizia coisas banais e até evidentes. Disse ainda que do seu exílio em Genebra havia enviado um texto para o III Congresso da Oposição Democrática, onde afirmava que “ a questão colonial não tinha solução militar e era necessária a independência das colónias”. É preciso grande visão e grande coragem para tal afirmar!
Vou procurar entre os livros do meu pai as Teses da Oposição e recordar o texto do sr dr. Medeiros Ferreira, bem como a porrada que os presentes apanharam em Aveiro após carga policial. Eu também li o livro do Gen Spínola no exílio. Não em Genebra , mas na Guiné, no Cumbijã.
Ri-me com aquela frase onde se dizia que o Gen Spínola tinha “uma corte de admiradores de camuflado que bebiam as suas palavras”. [Visão, nº 833, de 19-25 de Fevereiro de 2009].
Usei camuflado na Guiné, falei algumas vezes com o homem mas nunca bebi as palavras de ninguém! Whisky e cerveja era quanto me apetecesse. Já agora perguntem aos soldados que combateram na Guiné qual a opinião que têm do homem do pingalim e do monóculo. A resposta é capaz de ser bem diferente da dada pelos intelectuais.
Antes que me chamem de Spinolista, pois em Portugal os rótulos interessam mais do que o conteúdo, termino com um abraço respeitoso a todos os meus camaradas da Guiné que sofreram a bem sofrer. Para todos eles um poema da grande Sophia de Mello Breyner Andresen:
«Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo»
Um abraço do Vasco da Gama
_______________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 23 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3925: Efemérides (16): Portugal e o Futuro, de António Spínola, um best-seller há 35 anos
(**) Vd. poste de 15 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3898: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (8): Maio de 1973 na vida da CCAV 8351 - (Parte I)
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009
Guiné 63/74 - P3928: PAIGC: O Nosso Livro da 1ª Classe (Manuel Maia, 2ª CCAÇ / BCAÇ 4610, Cafal Balanta / Cafine, 1972/74)
Imagens do Livro da 1ª Classe do PAIGC... Exemplar capturado pelo nosso camarada Manuel Maia no Cantanhez, possivelmente em finais de 1972 ou princípios de 1973. Vê-se que esse exemplar tinha uso. A capa teve de ser reforçada com uns improvisados adesivos (aparentemente autocolantes, que acompanhavam embalagens de apoio humanitário, vindas do exterior).
Fotos: © Manuel Maia (2009). Direitos reservados
1. Mensagens enviadas por Manuel Maia, ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine (1972/74) (*):
Aqui vai uma imagem que carece de comentários, referente à forma de ensino ministrada às crianças das "regiões libertadas"... Trata-se do livro da 1ª classe do PAIGC, feito pelos nossos "amigos" suecos (**). Foram feitos 20.000 exemplares numa primeira edição.
Foi recolhido durante uma operação no Cantanhez (para lá da bolanha...). Neste mesmo dia apanhei ainda duas cartas, uma escrita em árabe e outra em crioulo que reproduzirei noutra altura.
Um abraço.
Manuel Maia
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Notas de L.G.:
(*) Vd. postes de:
20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3915: Cancioneiro do Cantanhez (1): De Cafal Balanta a Cafine, Cobumba, Chugué, Dugal, Fatim... (Manuel Maia)
14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3890: Tabanca Grande (119): Apresentação de Manuel Maia ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 (Guiné, 1972/74)
13 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3886: Tabanca Grande (118): Manuel Maia, ex-Fur Mil, o poeta épico da 2ª Companhia do BCAÇ 4610/72, o Camões do Cantanhez
(**) Já aqui publicámos textos e imagens de outro livro escolar, do PAIGC, de uma edição de 1966, anterior a esta, referida pelo Manuel Maia, que presumimos seja de 1970, a exemplo do Livro da 2ª classe.
Recorde-se que o livro da 2ª classe foi "elaborado e editado pelos Serviços de Instrução do PAIGC - Regiões Libertadas da Guiné" (sic). Tem o seguinte copyright: 1970 PAIGC - Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Sede: Bissau (sic)... A primeira edição teve uma tiragem de 25 mil exemplares. Foi impresso em Upsala, Suécia, em 1970, por Tofters/Wretmans Boktryckeri AB.
Vd. postes de:
27 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2221: PAIGC: O Nosso Livro da 2ª Classe (1): Bandêra di Strela Negro (Luís Graça / Paulo Santiago)
29 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1899: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (1): O português...na luta de libertação
1 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1907: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (2): A libertação da Ilha do Como (A. Marques Lopes / António Pimentel)
4 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1920: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (3): O mítico Morés
9 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1938: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (4): Catunco
Vd também postes relativos ao livro da 2ª classe, também uma edição sueca, e obedecendo à mesma linha estética do livro da 1ª classe:
27 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2221: PAIGC: O Nosso Livro da 2ª Classe (1): Bandêra di Strela Negro (Luís Graça / Paulo Santiago)
31 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2232: PAIGC: O Nosso Livro da 2ª Classe (2): O Morés e os amigos da Europa do Norte (Luís Graça / Paulo Santiago)
16 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3062: PAIGC: O Nosso Livro da 2ª Classe (3): O Dia da Mulher (Luís Graça / Paulo Santiago)
Guiné 63/74 - P3927: As Grandes Operações da CART 2339 (Carlos Marques Santos) (2): Op: "Grão Mongol", "Firmes e Singulares" e "Sempre Firmes"
Um abraço:
Aqui vai mais um escrito em anexo:
As grandes Operações da Cart 2339.
CMS
CART 2339 – Fá Mandinga e Mansambo – 1968/69
As grandes operações da Companhia ( 1 ) – Op Grão Mongol
As grandes operações da Companhia ( 2 ) – Op Firmes Singulares e Sempre Firmes
12 viaturas. Coluna monstra.
300 auxiliares africanos vão estar na Operação, crianças armadas de Mauser e alguns com G3 e diligramas. Mas que guerra é esta !!!!!!
Cerca de 500 homens em marcha. Sol, calor sede. Barulho tremendo.
É impossível suster esta imensidão de gente.
A 21 de Março de 1968 a CART 2339 com dois meses de Guiné e a sua irmã gémea 2338 iniciaram uma batida no regulado de CHANHA e partir de MANA a sul da estrada Nova Lamego – Piche até ao rio Corubal, um rio também cheio de tradições.
Boa zona para actuar e principalmente para quem acabado de chegar ao Teatro de Operações tinha ouvido contar estórias.
Detectar e aniquilar o IN era a missão.
Mas enfim, era a nossa missão e lá fomos. Longe da nossa casa mãe que era a ex-fazenda experimental do Aristides Cabral, com prédios em cal e tijolo e algum sossego, perto da estrada alcatroada para Bafatá e onde de caminho podíamos adquirir cabritos, leitões e vacas para nossa subsistência.
Participaram na Operação:
O CMD do BCAÇ 2835
Agrup Alfa – A CART 2338 a 4 GComb e Grupo verde de Aux. Mandingas
Agrup Beta – A CART 2339 a 4 GComb e Grupo vermelho de Aux. Fulas.
Saímos em 20 de Fevereiro às 08,00h de Fá para Nova Lamego em coluna auto e em 21 fomos transportados para CAMBAJÃ onde aguardámos as forças auxiliares com carregadores e guias.
A batida iniciou-se em 21 às 07,00h seguindo a nossa Companhia na rectaguarda da coluna.
A ligação entre grupos foi mantida, mas difícil.
Eram centenas de militares e acompanhantes. Nunca, nem pensava, assistir a tamanho folclore, sem esquecer que andávamos na zona do Boé.
Batida a zona entre Cumbijã e Sichã Alfa, pernoitámos.
Em 22 de Fevereiro prossegue-se a batida a caminho de Ganguiró. Já se nota uma grande desorganização e falta de autoridade das chefias das forças auxiliares com desobediência aos seus chefes.
É o CAOS.
À tarde a 5Km de Ganguiró, elementos do Grupo vermelho negam-se a prosseguir por falta de alimentos.
Apesar disso e acalmados os ânimos, pois a ração era para 4 dias, continuámos, mas a noite foi desastrosa. Fogueiras e barulho era o que estava a dar.
Afinal aquilo que tínhamos aprendido nas elementares regras da guerrilha estavam fora de contexto.
Assim, a 23 de Fevereiro o CMDT do Ag Alfa comunicou ao PCV o que se passava e este mandou retirar (suspender a Operação)
Atingimos Nova Lamego ao princípio da noite, depois de marcha extenuante devido à distância.
Quase metade das Companhias ficou inoperacional.
Bolhas nos pés, injectadas com mercuro-cromo, era o que estava a dar.
7 evacuados por Héli, mas chegámos todos.
8 Sem contacto.
Mas não terminámos aí.
Agora só tropa. Pelo menos saberíamos todos como agir.
Como bons militares e obedientes ao PLANO de OPERAÇÕES (bem delineado ???) voltámos à estrada em 25 de Fevereiro, na Oeração Sempre Firmes. Saímos de Nova Lamego para Canjadude a oeste do SIAI onde dormimos. (Canjadude é terra de boa memória para alguns de nós).
A CART 2338 a 58% e a CART 2339 a 60% (pessoal recuperado) a 26 de Fevereiro bateu o caminho para Ganguiró que atingiu às 09,30h, deslocou-se para sul e pernoitou na confluência dos rios Chorade e Bouro.
Em 27 de Fevereiro pelas 07,00h atingimos Dongol Siai cerca das 09,00h, regressando a Canjadude, sem contacto, mas com evidente esgotamento das NT.
Soubemos que esteve programada uma emboscada para o nosso regresso, mas felizmente saímos mais cedo em direcção ao destino – Nova Lamego.
Uma semana em beleza.
Em 28 pelas 06,00h saímos para Fá Mandinga.
Aqui nestas duas acções prenunciava-se o fim de MADINA do BOÉ e o desatre do CHECHE.
UM ANO DEPOIS.
CMSantos
__________
Nota de CV:
Vd. primeiro poste da série de 9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3862: As Grandes Operações da CART 2339 (Carlos Marques Santos) (1): Operação "Grão Mongol", a primeira
Guiné 63/74 - P3926: Efemérides (17): Piche, 22 de Fevereiro de 1971 ou... Carnaval, nunca mais! (Helder Sousa)
1. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa, ex-Fur Mil de Transmissões TSF ( Bissau e Piche, 1970/72):
Caros amigos
O texto que vos envio será um pouco longo, mas verão se tem interesse a sua publicação.
Estive a relê-lo e verifico que a minha preocupação em dar todos os pormenores possíveis faz com que fique extenso e talvez esse não seja o formato que mais resulte em blogues. Será mais apetecível o curto e sintético mas agora já está, e como deu trabalho fazê-lo e principalmente ir rebuscar na memória "apagada" essas imagens, sons e cheiros, não estou com coragem para alterações e depois também se perde a data.
Vou ter mais atenção e nas próximas colaborações serei mais comedido nas palavras.
Um abraço para todos, os amigos, os camaradas, os "camarigos" e até os "bernardos".
Não vai do "tamanho do Cumbijã" porque não o conheci e não sei a que "tamanho" é que o amigo Mário Fitas se refere. Se é ao comprimento, se à largura, se à profundidade. É que me parece que o Corubal é bem mais comprido que o Cumbijã...
Hélder Sousa
2. Efemérides (16) > CARNAVAL OU O MEU CONTACTO COM O PERIGO (*)
por Hélder Sousa
A história que quero partilhar convosco hoje não é propriamente o meu “baptismo de fogo”, pois apesar de não ter sido um “operacional”, como sabem, acontecia a muita boa gente na Guiné ser “contemplada” com a diversidade da oferta que generosamente era distribuída por todo o território (não seria certamente por capricho de alguém que toda a “província” era considerada T.O.).
(i) Chegado a Piche em Dezembro de 1970
Nessa perspectiva, e sem qualquer intuito de me aproximar sequer daquelas situações por que passaram todos os que fizeram patrulhas, emboscadas, assaltos, vigílias, em operações de rotina ou integrados em operações de maior envergadura, da tropa de quadrícula ou de operações especiais, também tive a sensação particular que se tem quando se é alvo de um ataque, quando se ouvem as “saídas” e se espera pelo rebentamento (que se quer longe), quando os segundos parecem minutos, quando a dúvida se instala de modo avassalador (já acabou? ainda não? haverá mais? estes sons agora são dos nossos?, etc.) e isto numa situação de absoluta dependência do valor, da coragem e de eficácia da resposta de outros (os “nossos”) pois, não sendo operacional, não tinha local distribuído a não ser tentar garantir que o rádio funcionaria com uma alternativa qualquer, em caso de “força maior”.
Também me integrei em “colunas” para fazer as estradas do leste (Nova Lamego a Piche, o sentido inverso, por Bafatá, Bambadinca, Xime, novamente ida e volta duas vezes), sempre dependente da sorte e da qualidade dos “operacionais”, pois nem sequer tinha arma distribuída. Essas “viagens”, principalmente entre Nova Lamego e Piche, eram sempre um mundo de apreensões, de dúvidas, de angústia, pelo desejo que acabassem depressa e bem.
Tendo chegado a Piche no início de Dezembro de 1970, salvo erro a 4 ou 5, tive a oportunidade de “saborear” flagelações ainda nesse mês de Dezembro, depois em Janeiro e Fevereiro, ataques com foguetões e morteiros, isto a Piche, em directo, e também ouvir um pouco mais ao longe um ataque a Cambor (em 6 de Janeiro de 71) e a Canquelifá (2 de Fevereiro).
Portanto, já tinha alguma vivência das consequências da vida no “mato”.
(ii) Piche, 22 de Fevereiro de 1971
O que quero então agora referir é uma outra situação, passada exactamente nesta mesma data, 22 de Fevereiro, mas em 1971, portanto há 38 anos e era também época de Carnaval. Nunca falei disto, a não ser com o meu filho mais velho, um dia destes faz pouco tempo.
Nessa ocasião tinham decidido as “altas esferas” desencadear uma forte operação de artilharia, com bombardeamento das zonas das alegadas bases do IN para lá da fronteira. Para isso concentrariam em Piche uma quantidade apreciável de “obus 14”, força essa que depois se deslocaria até sul de Piche, na margem do Corubal e fariam o seu festival de metralha. Seriam escoltados e com segurança pela CCAV 2749, salvo erro (do nosso “tertuliano” Luís Borrega, com quem também estive em Santarém), que era a Companhia pertencente ao BCVA 2922 que estava na sede do referido Batalhão, reforçada pela CART 3332 que nessa ocasião também estava em Piche, não me recordo se só com essa finalidade se por outros motivos operacionais, para além, é claro, do pessoal do PELREC Fox de Bafatá, que tinha um Destacamento em Piche. Tenho também a ideia que estavam por lá, ou passaram, pára-quedistas que teriam por finalidade tentar explorar as esperadas vantagens resultantes da tal operação de artilharia que iria ter lugar.
O principal problema, em minha opinião, é que alguém se deve ter esquecido de fazer uma “fita de tempos” para a preparação da operação, na CAOP ou lá onde fosse. Ou então as coisas correram mal e pronto!
É que os vários “obus 14” não chegaram a Piche, foram chegando..! Para além dos existentes em Piche, vieram peças de artilharia de Canquelifá, de Sare Uale, de Sare Banda, de outros locais e até de Pirada. A questão é que a meio da tarde da véspera da data da operação chegaram uns, ao fim da tarde outros, ao princípio da noite outros e até no dia seguinte, dia da operação, chegaram os de Pirada, se a memória não me atraiçoa, ou seja, não houve uma concertação dos meios para mais facilmente se obter o efeito surpresa.
O movimento de tropas era fora do normal e em número elevado, o tipo de equipamentos era não usual, daí que os elementos informadores do PAIGC tivessem podido suspeitar que algo, e de grande envergadura, estaria para acontecer e, convenhamos, dada a natureza dos equipamentos, não seria de estranhar que concluíssem tratar-se de uma operação de bombardeamento, restando-lhes adivinhar exactamente aonde, embora também não devessem ter muitas dúvidas a esse respeito.
(iii) A Acção Mabecos, sob o comando do Major Mendes Paulo
No livro que eu já referi de Fernando de Sousa Henriques (“No ocaso da guerra do ultramar”), pertencente a uma Companhia do Batalhão que foi render o BCAV 2922, onde o autor faz a história da sua “viagem” pela vida militar e da sua própria Unidade, há lá uma referência ao acontecimento que tenho estado a relatar. Essa referência à Acção “MABECOS” (não é a já várias vezes referida no Blogue “Op , Mabecos bravios”, essa é outra) cuja foto da página envio em anexo, dá conta, de forma resumida e com todo o aspecto de ser coligida do registo oficial das operações, do que se passou “na operação”, ou seja, no acto em si. Não refere os antecedentes nem os subsequentes.
No que podemos ler, sabe-se que as forças das NT foram comandadas pelo Major Mendes Paulo (à data oficial de operações do BCAV 2922, homem muito conceituado no seio da Arma de Cavalaria, da confiança do General Comandante-Chefe, falecido em 6 de Setembro de 2006 e autor dum livro intitulado “Elefante Dundum”), que o IN “composto por brancos e pretos sujeitou as NT a forte emboscada da qual resultou 3 mortos, 1 desaparecido (“apanhado à mão”), 2 feridos graves, 3 feridos ligeiros e a destruição de um Unimog e uma White”, sendo que é indicado terem sido infligidos ao IN 6 mortos e vários feridos.
A questão é que “antes” também ocorreram problemas. Com a situação que descrevi de estarem no mesmo aquartelamento muitos mais militares do que estavam normalmente e, tendo em conta que não houve um ritmo sequencial para as diferentes fases da operação (pela tal situação de “irem chegando” os meios), criaram-se alguns atritos entre as “altas esferas” no local, com uns a alegarem que as condições estavam deterioradas (pela falta do elemento surpresa, que já não o era) e outros a insistirem que a operação deveria avançar logo que estivessem todos os meios previstos.
(iv) Um grave acidente, no aquartelamento, provocando uma série de feridos graves
Esta situação, que para alguns foi presenciada “in loco” e para outros, onde eu me incluo, foi o de “ouvir dizer”, gerou um conjunto de ordens e contra ordens com o pessoal a ser mandado equipar para seguir para a operação, depois a ser mandado desequipar, novamente a equipar, novamente a aguardar, sem desequipar, numa caserna, que seria a da Companhia local e onde estava “a monte” todo o pessoal incluindo agora também a CART 3332.
É quando nessa situação há nova ordem para avançar que, dentro da caserna, alguém deixa cair qualquer coisa que deflagra, com um estrondo enorme, ouvem-se de imediato gritos e mais rebentamentos e mais gritos, coisas que deflagram por “simpatia”, balas que são disparadas, enfim, um inferno.
Imediatamente, alguns elementos que estavam fora da caserna, três ou quatro, entre os quais eu me inclui (tinha acabado de almoçar e estava na conversa no alpendre da messe de oficiais e sargentos, mesmo ao lado da caserna onde ocorreu o acidente), corremos e entrámos no local sinistrado para (sabia lá para quê!) retirar de lá os feridos que não conseguiam sair por si.
Recordo-me que ajudei a segurar pelas pernas um militar que parecia mal, estava a ser segurado pelos braços, salvo erro pelo Cap Pissarra, da CCAV 2749, arrastando-o para o exterior e lembro-me de ouvir silvos à volta da cabeça. Deixando-o o chão, no exterior, voltámos a ajudar outros a sair até que a coisa acalmou. Nessa ocasião, quando a tensão principal afrouxou, o cheiro a pólvora e a sangue, a poeira levantada no ar e com as mãos com um líquido viscoso, quente e avermelhado, deram-me volta ao estômago e acabei por vomitar o almoço na vala ali mesmo ao lado. Nessa altura tive vergonha dessa “fraqueza” mas hoje vivo bem com isso, afinal eu não tinha treino de “operacional”!
O resultado desse grave incidente foram vários feridos, tanto quanto me lembro 4 com gravidade, evacuados por meios aéreos que se pediram e utilizando também uma DO que estava na pista. Houve mais cerca de uma dezena de outros elementos que ficaram com ferimentos ligeiros, salvo erro todos da CART 3332 que, como se pode imaginar, ainda antes da operação já estava com a moral “bastante elevada”.
Foi no seguimento da confusão gerada, com as evacuações dos feridos e o reagrupamento das forças físicas e mentais para se iniciar a operação, que se constou que tinha sido pedido para que a DO destinada ao “Comando aéreo” fizesse um voo de reconhecimento mas, constou também, não posso confirmar, que isso foi negado. E constou ainda que foi sob protesto que o Major Mendes Paulo assentou dar o início à coluna. Já se sabe que a mesma foi fortemente emboscada (está no relato do livro do Fernando de S. Henriques) só que reconhecimentos posteriores confirmaram que não só aquele trilho por onde a coluna seguiu como também os outros dois possíveis estavam emboscados, através de sinais que puderam ser detectados. Quer dizer, se tivesse havido reconhecimento aéreo talvez tivesse sido possível evitar a emboscada.
(v) Um major que arranca os galões e que se tranca no quarto… até o Com-Chefe, dois dias depois, o demover
Da operação propriamente dita já se sabe o que consta dos registos mas se já falei do “antes”, houve também um “depois”.
É que no regresso, o Major Mendes Paulo de forma deliberada, ostensiva e quase até teatral, arrancou os seus galões e deitou-os num caixote que se encontrava à porta do seu quarto, recusando-se a sair de lá e a comer, até que alguém com responsabilidades superiores fosse lá falar com ele.
E não é que 2 dias depois o Comandante-Chefe, Sr. General A. Spínola (himself) apareceu por lá vindo do céu para conversar com o Sr. Major (e não só), acabando por “convencê-lo” a terminar a atitude de rebelião e a retomar as funções? Pois foi isso mesmo!
Entretanto, nesses dias que se seguiram ao regresso da operação, a força anímica da maioria do pessoal estava um tanto abalada, o que parece natural, com tudo o que se tinha passado. Os calmantes esgotaram-se e eu próprio cheguei a ajudar o Fur Enfermeiro Santana a dar “genéricos de ocasião” (ou seja, os “vallium” tinham-se acabado mas sempre havia aqueles comprimidos de sal que se colocavam na água e que para quem não estava no seu perfeito entendimento serviam mesmo de calmante). Foi desse modo que consegui que o meu amigo Fur Centeno (homem do Porto, familiar de um vulto da cultura portuense, e não só, Ivete Centeno, e pertencente aos elementos que operavam a artilharia de Piche) ficasse mais calmo pois, obviamente, o remédio que eu lhe estava a dar só podia ter esse efeito...
Tudo isto aconteceu enquanto em Portugal se brincava ao Carnaval. É claro que a festa em si não teve culpa, e até já nessa altura havia um escrito dum alegre poeta, que tinha estado em Angola, que dizia “… em Portugal, na mesma, isto é, a vida corre!”, a propósito da contradição sentida pela vida que se levava nas zonas de combate e a vivida no que se suporia ser a “retaguarda”.
Mas é claro que, para mim, brincar no Carnaval foi coisa que nunca mais me passou pela cabeça. Nem gosto, vá lá saber-se porquê!
Também não é menos verdade que, hoje em dia, friamente, se pode questionar da sanidade mental de quem se “atira” literalmente para uma zona de “inferno na terra” mas, sinceramente, naquelas ocasiões não se pensa, age-se e reage-se. Podia-se ficar paralisado, tolhido, acobardado, esconder na vala ou mesmo fugir para qualquer lado longe do problema mas não foi isso que fiz, o instinto de solidariedade que cultivava e ainda cultivo (malgré tout) foi mais forte que o instinto de sobrevivência e disso também não me envergonho. Simplesmente tive sorte, ou fui contemplado com a protecção divina.
Não será o mais apropriado para enquadrar na série “o meu baptismo de fogo”, mas pode servir.
Um abraço e bom Carnaval, para vocês!
Hélder Sousa
Fur Mil Transmissões TSF
PS - Em anexo remeto fotos já antes enviadas, mas para facilitar a vossa pesquisa, com a página 201 do livro “No ocaso da guerra do ultramar” de Fernando de Sousa Henriques em que se refere a Acção “Mabecos” bem como uma foto do Fur Mil Joaquim Andrade, das Transmissões da CART 3332 que também estava na parada na altura das deflagrações na caserna e que não chegou a ir na operação.
(**) Vd. poste de 9 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2828: Convívios (56): CCS/BCAV 2922, Piche, Buruntuma, Canquelifá (Helder Sousa)
Guiné 63/74 - P3925: Efemérides (16): Portugal e o Futuro, de António Spínola, um best-seller há 35 anos
Foto: © Vasco da Gama (2008). Direitos reservados.
1. Há 35 anos, a 22 de Fevereiro de 1974, era publicado pela editora Arcádia, de Lisboa, o livro Portugal e o Futuro, do General António de Spínola. Nele defendia-se a ideia de que a solução para o problema colonial português passava por outras vias que não a solução militar.
Recorde-se que, a 17 de Janeiro de 1974, Spínola fora nomeado vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, por sugestão de Costa Gomes. Menos de 2 meses, a 14 de Março, os dois generais serão afastado do cargo devido à recusa em participar na manifestação de apoio ao Governo e à sua política ultramarina.
O livro, de 248 páginas, tornou-se um best-seller. Mais de 300 mil exemplares foram vendidos, num ápice, dentro e sobretudo fora do circuito normal do mercado livreiro. Mas poucos leitores, na época, terão tido a pachorra de o ler de fio a pavio. Eu fui um deles. A obra era um estopada. Mesmo assim há quem pense que foi um dos livros que abalou uma época e um regime.
Na revista Visão, desta semana (edição nº 833, de 19 a 25 de Fevereiro de 2009), Luís Almeida Martins publica, a propósito desta efeméride, um artigo com o título (irónico), "Portugal e o passado", e que termina com este parágrafo:
" (...) Poucos dias antes de morrer, a 13 e Agosto de 1996, com 86 anos, [Spínola] foi visitado no Hosital da Estrela por Nino Vieira, presidte da Guiné-Bissua e antigo comandante do PAIGC. Ao sair do quarto, Nino trazia uma lágrima no olho. Os guerreiros têm uma concepção própria da vida e da morte. Não sabem é ler o futuro, como o livro de Spínola demonstrou à saciedade"... (Curiosamente, Nino voltou a referir este episódio, na audiência que concedeu, em 6 de Março de 2008, a um grupo de participantes do Simpósio Internacional de Guiledje).
De qualquer modo, o livro abalou Marcelo Caetano e o seu regime, defende o jornalista da Visão. "Pela primeira vez, um oficial general atrevia-se a discordar da doutrina oficial"... E não era um oficial qualquer. O homem do "pingalim e monóculo" ganhara uma "aura castrense talvez só suplantada pelas de Mouzinho de Albuquerque e de outros chefes militares das campanhas coloniais da viragem do século. Dando uma np cravo e outra na ferraedura, combatia a guerrilha, enquanto, de pingalim na mão, organizava congressos dos povos guineenses e delegava poderes nas autoridades tradicionais. O seu monóculo tornou-se lendário. Alcunharam-no de Caco e tinha uma corte de admiradores de camuflado que bebiam as suas palavras" (...).
O alcance efectivo da obra de Spínola e da sua tese do federalismo e do diálogo com os movimentos de libertação, a começar pelo PAIGC (como solução política para uma guerra que não poderia ter solução militar), ainda é hoje objecto de discussão entre especialistas e historiador. De qualquer modo, importa sobretudo sinalizar a efeméride. Ao fim e ao cabo, Spínola foi o comandante de muitos de nós... A sua figura, a sua conduta, o seu pensamento e a sua estratégia não deixaram ninguém indiferente. (LG)
2. Recortes de imprensa (excertos)
O livro que abalou o regime, por Elmano Madail.
Jornal de Notícias, 22 de Fevereiro de 2009
A manhã despertou estranha há 35 anos. Num país atrasado e prenhe de analfabetos, orçados em 25,9% da população - embora os funcionais ampliassem de sobremaneira a estatística -, havia gente que esperava, à porta das livrarias das principais cidades, pela oportunidade de comprar... um livro!
Um "best-seller" instantâneo que trazia, lá dentro, em páginas densas e cheias de considerações que soariam estranhas a muitos dos ansiosos compradores, o germe do golpe de Estado que fulminou o mais longo regime ditatorial da Europa, chamado de Estado Novo. Na alvura da capa discreta, inscrevia-se a negro "Portugal e o futuro", coroado pelo nome do autor insuspeito: o general de Cavalaria António de Spínola, vice-chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e ex-governador da Guiné Portuguesa. A autoridade que o título hierárquico lhe conferia, a par da fama de guerreiro prestigiado, converteram aquele livro num ícone da Democracia.
Eventualmente mais do que as teses ali defendidas. Volvidos 35 anos, que memória fica desse volume aos que o leram? E que outros livros foram capazes de estimular o público, desassossegar o poder e marcar tempos assim conturbados? E hoje, o livro tem ainda o mesmo poder de mobilização?
Nuno Canavez, dono da Livraria Académica, no Porto, recorda que "a primeira edição esgotou num abrir e fechar de olhos. Foi uma corrida ao livro". Inusitada, não obstante ser habitual, na época, a urgência de comprar obras adversas à doutrina oficial: "Sempre que saía qualquer coisa contra o regime, tinha muita venda e rápida, porque vinha a censura e limpava tudo", garante o livreiro com 60 anos de profissão. E a limpeza podia ser radical.
(..) "Sucede, porém, que "o livro do Spínola não chegou a ser retirado", afirma Canavez. Para ele, "dava a impressão que havia até, por parte de alguns do Governo, uma vontade de mudança". A que viria não estava prevista no livro de Spínola, muito menos radical do que o futuro forjado em Abril. Face a uma guerra colonial, longa de 13 anos e sem termo à vista, que empurrava a juventude para o desperdício de quatro anos em armas, quando não o da própria vida, Spínola advogava a autodeterminação das colónias - mas não a independência -, e a federação dos territórios ultramarinos com a metrópole. Curta ambição.
"O livro do Spínola dizia coisas banais, e até evidentes", considera José Medeiros Ferreira, que foi ministro dos Negócios Estrangeiros no I Governo Constitucional. E, sem retirar méritos à obra, sublinha que, um ano antes, havia enviado do exílio em Genebra, ao III Congresso da Oposição Democrática, "uma comunicação lembrando que a questão colonial não tinha solução militar e que era necessária a independência das colónias. E apontava o possível papel das Forças Armadas no derrube da ditadura e no processo de democratização de Portugal", diz o docente da Universidade Nova de Lisboa.
Alguns intelectuais duvidam mesmo da autoria exclusiva de Spínola, sugerindo que "os autores foram o sobrinho de Mário Soares, José Manuel Barroso, que prestou serviço militar na Guiné sob o comando de Spínola, e o embaixador Nunes Barata. Esses terão participado na discussão e organização do livro, senão até na redacção", cogita o sociólogo e cientista político Manuel Villaverde Cabral. E realça que grande parte do impacto, designadamente enquanto catalisador do Movimento das Forças Armadas, "deveu-se ao eco dado por Soares, que o citou em dois artigos no 'Le Monde'". Após o 25 de Abril de 1974, o livro "perdeu completamente a relevância", circunscrita à qualidade de mobilizador dos capitães golpistas, segundo Villaverde Cabral.
Já Nélson de Matos, editor de longa data, considera que "Portugal e o futuro", a par de "Portugal amordaçado", de Mário Soares - saído em França, em 1972, e em Portugal após a Revolução dos Cravos -, "são as obras fundadores da nossa Democracia". Publicadas na Arcádia, onde trabalhava Nélson de Matos.
(...) E agora? 35 anos após "Portugal e o futuro" ter esgotado edições e inflamado paixões, há ainda espaço para livros doutrinários, filosóficos ou programáticos que sejam mobilizadores? "Se fosse muito claro nas propostas, e correspondesse a uma saída para um problema social grave, claro", admite Medeiros Ferreira. Tal como Veiga, aliás: "Há condições para livros com igual importância e densidade", garante. E Nélson de Matos, que publicou obras "de vários políticos e tendências diversas ao longo da carreira", advoga até o potencial de vendas interessante.
Veiga alerta, porém, para "a perda de influência dessas obras". Por um lado, "porque os media não estão interessados, visto não serem convertíveis em manchetes". Depois, porque "há novos media, como os blogues, que vieram ocupar muito do espaço desses livros", sublinha Medeiros Ferreira.
E, por fim, porque os tempos mudaram. Muito. "Desapareceu o 'maître à penser', pensadores que indicavam caminhos, escreviam obras que fortaleciam convicções e se tornavam referências", diz Miguel Veiga. "Hoje, impera o 'pensamento mole', as sociedades são cinzentas e, com as novas tecnologias, sabe-se cada vez mais e pensa-se cada vez menos". Agora, as revoluções fazem-se no ciberespaço...
__________
Nota de L.G.:
(*) Vd poste de 20 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3765: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (7): A visita do General Spínola
(...)
No dia 14 de Abril, mais uma vez recebemos a visita do General Spínola.
Parei este texto neste parágrafo, vai para mais de quinze dias. Problemas da vida pessoal, mas fundamentalmente o medo de não saber expressar, ou fazê-lo de forma menos correcta, os sentimentos acerca do General Spínola, homem controverso que suscitou, e pelos vistos continua a suscitar, sentimentos de amor e desamor, tão depressa acusado como louvado, que na guerra tentava encontrar soluções ou pela via diplomática junto de Shengor, ou invadindo países vizinhos, como aconteceu com a Operação Mar Verde, autor de Portugal e o Futuro (mais vale tarde que nunca), abandonando o Guileje ou pelo menos não lhe dando hipóteses de uma defesa racional, recusando o convite de Marcello Caetano para ministro do Ultramar em finais de 1973, recusando-se também e juntamente com o General Costa Gomes a fazer parte da Brigada do Reumático que foi prestar vassalagem a Caetano. Este homem, que foi também o primeiro Presidente da República após o dia da libertação – 25 de Abril de 1974 - este homem heterodoxo, será no decurso da história que vou escrevinhando acerca da minha Companhia, analisado apenas e só através de um discurso substantivo que se limitará a descrever a vivência que os Tigres do Cumbijã com ele tiveram.
No dia 14 de Abril de 1973 recebemos então a visita do General Spínola. Recordo-me da primeira pergunta que me fez:
- É do quadro ou miliciano?
Recordo-me da resposta imediata e eventualmente atrevida que lhe dei:
- Neste buraco?… Sou miliciano.
Vi nele o esboço de um sorriso, seguido de nova questão:
- Falta-lhe alguma coisa?
- Tudo!
- Tudo o quê? (...)