quinta-feira, 8 de junho de 2006

Guiné 63/74 - P856: Encontro da nossa tertúlia no 10 de Junho, em Belém, Lisboa (Luís Graça)

1. Há uns dias (29 de Maio último), o Hugo Moura Ferreira lançou uma proposta de encontro dos tertulianos pr ocasião do feridado do 10 de Junho, em Lisboa, que eu pus de imediato a circular por e-mail e já recebeu alguns comentários.

Aqui fica o filme dos acontecimentos. Deixem-me dizer que o Hugo tem sido um dos mais entusiastas, entre todos nós, na divulgação do nosso blogue.

Eu por mim vou fazer um esforço por poder estar presente, no local indicado entre as 11 e as 12h, quanto mais não seja para conhecer e dar um abraço àqueles que puderem e quiserem aparecer.

Sei que não é o melhor dia nem o melhor local: muitos dos nossos amigos e camaradas são do Norte; outros costumam tirar férias nesta altura; e, por fim, 0 10 de Junho traz, para alguns de nós, más memórias, pelo seu aproveitamento político-partidário antes e depois do 25 de Abril de 1974... Mas enfim pelos amigos e camaradas da Guiné, faz-se tudo (ou quase tudo).



O meu telemóvel é o 93 281 08 72. E o meu nome é Luís Graça.

2. Mensagem do Hugo Moura Fereira:

Caro Luís.

Estava eu por aqui cogitando e lembrei-me... (para já estou satisfeito porque a caixa dos pirolitos ainda funciona, não quer dizer é que saia coisa de jeito)...

Então pus-me a escrever o que estava a pensar e a fazer uns bonecos. Abre o anexo s.f.f.

Queres fazer o favor de dar uma voltinha e dizer de tua opinião.

Um abraço.

Hugo Moura Ferreira
(Ex-Alf Mil, Cufar - CCAÇ 1621, Bedanda - CCAÇ 6, Novembro de 1966 e Novembro de 1968)



O 10 de Junho…

Seria giro que os Tertulianos que, por acaso se desloquem ao Forte do Bom Sucesso, em Lisboa se encontrassem. Afinal este local da Net até se está a tornar numa grande camarata mista, que integra civis e militares.

Como eu vou sempre todos os anos, com raras excepções, teria muito gosto em conhecer aqueles que comungam nos princípios da Tertúlia, que o Blogue-fora-nada integra.

Se estiveres de acordo e achares que esta ideia interessante, deixo-te aqui a ideia de promover através do Blogue-fora-nada esse encontro, pelo menos daqueles que residem por estes lados, de Lisboa.

Se achares a ideia exequível e interessante deixo então aqui a ideia do local de concentração através da foto que anexo:
Portugal > Lisboa > Forte do Bom Sucesso, junto à Torre de Belém > Local de encontro dos amigos e camaradas da Guiné, no dia 10 de Junho de 2006, das 11h às 12h.

Este local seria aquele em que habitualmente o pessoal da Guiné se reúne com maior concentração.

Para se identificarem uns aos outros e não haver a necessidade de andar a perguntar a uns e a outros, poder-se-ia idealizar um pequeno dístico com o nome, que cada um imprimiria e colocaria na sua lapela quando ali se encontrasse. Uma coisa do género disto:


Ao mesmo tempo era minha ideia poder entregar a todo o pessoal que por acaso ali se encontre e de que se venha a ter conhecimento de que são ex-combatentes da Guiné um recortezinho, com o endereço do nosso blogue. Já tenho isto feito e pela minha parte vou fazê-lo, já que ando sempre com alguns para distribuir, como se fosse um business card.

Anexo - Programa do 13º Encontro Nacional de Combatentes




3. Mensagem do Manuel Pereira (2 de Junho de 2006)

Caramba, não posso mesmo estar presente!

A ideia é óptima e também eu (sempre que possível) participo neste evento. Ficará para outra ocasião o encontro dos tertulianos.

Um abraço,

Manuel Oliveira Pereira

Ex-Fur Mil da CCAÇ 3547 (BCAÇ 3884)

(Guiné, Março de 1972 a Julho de 1974 – Contuboel, Bafatá, Bissau, SareBacar, Sonaco, Nova Lamego, Medina Mandinga, Galomaro e Dulombi)


Contactos> Manuel Pereira

Hospital CUF Infante Santo
Direcção de Produção

Tel. 21 3926 224


4. Mensagem do Torcato Mendonça (2 de Junho de 2006)

Luís Graça: A partir de 9 de Junho conto estar no Algarve, [aproveitando os] feriados – e uma semana faz bem… De qualquer modo não gosto de encontros deste género. Dos 15 da minha Companhia fui a dois.

Viva o(s) Blogue(s)

Um abraço,

Torcato Mendonça
Apartado 43,

6230-909 Fundão
(ex-Alf Mil da CART 2339, Mansambo, 1968/69):


5. Opinião do Sousa de Castro (2 de Junho de 2006):

É uma excelente ideia, mas nesse dia temos o nosso convívio em Vila Nova de Gaia, no ex-RAP 2. Foi neste Quartel que formámos Batalhão e daqui saímos em Dezembro de 1971 para a Guiné e por lá ficámos até Abril 1974, passando pelo Xime e por Mansambo. O programa do nosso convívio anual já aqui foi divulgado (1).

Saudações tertulianas.


António Manuel Sousa de Castro, Viana do Castelo
(Ex-1º Cabo TRMS (1971/1974)
CART 3494 (Guiné - Xime e Mansambo)


6. Comentário do A. Marques Lopes (2 de Junho de 2006):

Acho a ideia interessante, até porque o Forte do Bom Sucesso foi a primeira sede da Associação 25 de Abril e é, também por isso, uma referência. Lá estaria, se me fosse possível. Mas não vai ser, porque na véspera, dia 9 de Junho, ao fim da tarde e à noite, terei de estar no Salão Nobre dos Paços do Concelho da Câmara Municipal do Porto numa "Sessão Solene de Boas Vindas a Sua Excelência o Presidente da República, Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva", em representação da Associação 25 de Abril. Coube-me a mim... Não dá para seguir para Lisboa.
Mas acho boa ideia. Abraços

A. Marques Lopes , Matosinhos

(Cor, DAF, ex-Alf Mil
CART 1690, Geba, 1967/68; CCAÇ 3, Barro, 1968)

7. Mensagem do José Martins (3 de JUnho de 2006)

Caro Luis!

Oportunidade imperdivel! Que os acompanhantes se identifiquem também.

Um abraço E ATÉ SÁBADO!
José Martins, Odivelas
(ex-Fur Mil Trms, CCAÇ 5, Canjaude, 1968/70)


8. Mensagem do Fernando Franco (3 de Junho de 2006)

Amigo Luis:

Concordo plenamente com a ideia do Hugo e lá estarei, como já vem sendo hábito, desta vez não só pelo acto em si, mas também com todo o prazer em conhecer e trocar ideias com todos vós,com o respectivo dístico, pois acho que todos nós temos algo muito em comum: GUINÉ.

Um forte abraço.

Fernando Franco
BIG - Batalhão de Intendência, Bissau (1973 e 1974)
9. Texto do Albano Costa (6 de Junho de 2006)

Caro LG

Não tenho tido lá muito tempo para escrever ou comentar mas vou sempre dar uma espreitadela ao nosso blogue, e já agora só gostaria de saber se chegaste a receber umas fotos que enviei da ponte Balana actual, que tem pouco ou quase nada a ver do que era antigamente mas quem lá for dá bem para ver os vestigios do antigamente.

Era só para isso é que se por acaso não recebeste eu volto a enviar, é que eu acho que deve ter interesse para eles veres como é hoje a ponte Balana? (2)

Também em relação ao 10 de Junho mais uma vez não vai dar para lá ir neste dia com muita pena minha, sempre ia conhecer mais alguns tertuliano mas fica para uma próxima.

Um abraço, Albano, Guifões / Matosinhos
(ex-1º cabo, CCAÇ 4150, Guidaje, 1973/74)

__________

Notas de L.G.

(1) Vd. pots de 5 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P847: XXI Convívio da CART 3494 (1972/74), no Quartel Serra do Pilar, V.N. Gaia, em 10 de Junho

(2) Vd. pots de 6 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P850: O Álbum fotográfico do Albano Costa (2): a Ponte Balana (Gandembel)

quarta-feira, 7 de junho de 2006

Guiné 63/74 - P855: Do Porto a Bissau (26): leitão à moda de Jugudul (A. Marques Lopes)





Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O antigo aquartalemento das NT, em Jugudul, cujas instalações foram cedidas, a seguir à independência, ao Manuel Simões, guineense branco de Bolama, para a sua fábrica de aguardente de cana.

Fotos: © A. Marques Lopes (2006)
Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O A. Marques Lopes, de pé, mais elementos do grupo do Porto, sentados (onde reconheço o Armindo Pereira e o Manuel Costa), em casa do Manuel Simões.
Foto: © Inês (2006)

Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O Manuel Simões, aqui à direita, fazendo as honras da casa. (LG)
Foto: © Inês (2006)

Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O leitão da região do Oio, feito à moda de Jugudul, em casa do Mauerl Simões, não ficava atrás, bem pelo contrário, do letão à moda da Bairrada. Foi comer e chorar por mais... (LG)
Foto: © A. Marques Lopes (2006)
Texto de A. Marques Lopes, com data de 30 de Maio de 2006:

Desculpem a enchente, mas é que hoje tive tempo... que já se acabou. Mas vou acabar com uma coisa alegre: uma grande almoçarada (um leitãozinho!!) que o nosso amigo Manuel Simões nos ofereceu nas instalações na sua destilaria de aguardente de cana.

Ele é o homem grande branco que eu indico nas fotografias tiradas pela Inês. É um guineense branco, nascido em Bolama, companheiro do Pepito e do Lúcio Soares, também nascidos em Bolama. Foi, mais novo, jogador de futebol e chegou a dirigir o clube Balantas.

Dedica-se à aguardente de cana, mas tem também uma ponta [herdade] onde explora caju. Após a independência conseguiu que lhe cedessem o aquartelamento de Jugudul para a sua fábrica de aguardente, deixando apenas uma parte destas instalações para ser montado um posto da polícia de viação lá do sítio... que ainda não existe.

É um amigo sempre de braços abertos, acolhedor, como vêem. Vale a pena visitá-lo.
Abraços

A. Marques Lopes

Guiné 63/74 - P854: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (10): A retirada de Madina do Boé

X parte do testemunho do Paulo Raposo (ex-Alf Mil Inf, com a especialidade de Minas e Armadilhas, da CCAÇ 2405, pertencente ao BCAÇ 2852 > Guiné, Zona Leste, Sector L1, Bambadinca, 1968/70 > Galomaro e Dulombi).

Extractos de: Raposo, P. E. L. (1997) - O meu testemunho e visão da guerra de África.[Montemor-o-Novo, Herdade da Ameira]. Documento policopiado. Dezembro de 1997. 27-31 (1).


Operação de retirada da guarnição de Madina do Boé (2)

Madina do Boé ficava junto à fronteira da Guiné-Conacri. A companhia que lá estava [ CCAÇ 1790]era flagelada quase todos os dias. Como estavam distantes, a sua capacidade ofensiva tinha sido praticamente anulada pelo IN.

O Comando-Chefe resolveu retirar aquela guarnição. Para a retirada, foi montada uma operação de grande envergadura [Op Mabecos Bravios] . Mais uma vez a nossa companhia [ CCAÇ 2405] foi chamada para tomar parte nessa operação, comandada superiormente pelo então Ten Cor Hélio Felgas [, comandante do Agrupamento 2947, de Bafatá].

Todas as companhias que tomavam parte nesta operação reuniram-se no quartel de Nova Lamego [, a meio caminho, entre Baftá e a fronteira leste, com a Guiné-Conacri]. Lá chegámos todos por fim, jantámos uma ração de combate e dormimos sabe Deus como. Estávamos em Fevereiro de 1969.

Como a operação tinha 10 dias de duração, quando passámos por Bafatá a caminho de Nova Lamego, deitei no correio uma aerograma para os meus pais, para não ficarem preocupados com a ausência de notícias durante aquele período. O aerograma era muito singelo e a minha mãe desconfiou de algo.

Desde que eu embarcara os meus pais escreviam-me todos os dias, além de outros amigos. Era coisa que melhor nos sabia, receber notícias de casa, quando estávamos a sofrer toda aquela adversidade.

No dia seguinte formou-se a grande coluna e largámos para Madina do Boé. Mais uma vez a Força Aérea tinha deslocado muitos meios para protecção. Estava sempre no ar a acompanhar a Coluna dois T6, fora os helis que andavam no seu vai-vem.

Chegados ao Cheche, junto ao Rio Corubal, encontrámo-nos com um destacamento a nível de grupo de combate, comandado pelo Alferes Dinis.

Para a travessia do rio havia uma jangada, que levava um carro pesado de cada vez. Nós fomos os primeiros a passar para montar a segurança no outro lado da margem. Por ali passámos a noite enquanto os carros da coluna iam atravessando o rio. No dia seguinte fizemos a pé o percurso até Madina do Boé. Foram 40 kms.

Aquela estrada parecia um cemitério de Unimog e de GMC. Até Madina havia para cima de 15 carros destruídos por efeito das minas. Geralmente o carro da frente, nas colunas, era chamado o arrebenta- minas. Ia cheio de sacos de areia para absorver a onda de choque da explosão da mina. O condutor, um voluntário, ia por sua vez, sentado em cima de um saco de areia. O problema às vezes era a falta de protecção das pernas.

Logo de manhã um T6, que nos sobrevoava, avisa-nos que havia IN à frente e portanto que devíamos ter cuidado. Por aqueles lados a vegetação era pouco densa e não havia população.

Em determinada altura sofremos um ataque de abelhas do mato. Foi terrível! O Alferes Rijo, [da CCAÇ 2405,] foi o mais massacrado. As abelhas não o largavam, ele bem pedia ajuda, mas ninguém se aventurava. Coitado, mal recomposto lá continuou. Bem podia ter pedido uma evacuação, mas não o fez.

À medida que o dia ia avançando, o cansaço, a fome e a sede iam dando cabo de nós. A noite começou a cair, e tal como é costume em África, caiu depressa. Foi nesta altura que nos começámos a desagregar, uns paravam outros não, e foi assim que começámos a entrar no quartel de Madina do Boé. Entrávamos em pequenos grupos. Se o inimigo andasse por ali, tinha- nos apanhado à mão.

O Capitão José Aparício, que comandava o aquartelamento, foi-nos espalhando pelos abrigos, recomendando para só nos deslocarmos entre abrigos pelas valas que por lá havia.

Como a cozinha já tinha sido desmantelada, deram-nos apenas uma sopa que nos soube muito bem. Os abrigos, onde dormimos no chão, eram muito abafados, devido a terem umas aberturas muito pequenas. Mais uma noite de primeira.

No dia seguinte e com a luz do dia, é que nos apercebemos dos pormenores daquele aquartelamento. Eles viviam com toupeiras. As partes laterais dos abrigos tinham uns troncos de palmeiras deitados para se protegerem quando respondiam ao fogo em caso de ataque.

Estes troncos estavam todos queimados por cima. Nos ataques mais prolongados que tinham tido, e que foram muitos, as armas faziam tanto fogo e ficavam tão quentes que queimavam os troncos de palmeira.

Ainda rebentados da véspera, não nos deram descanso e lá nos mandaram ainda mais para Sul, precisamente para junto da fronteira, para fazer protecção avançada. Ali passámos 24 horas, tempo necessário para as viaturas chegarem e serem carregadas com tudo o que a Companhia tinha.

Estas 24 horas foram passadas no maior silêncio pois o inimigo andava por perto. No nosso rádio bem o ouvíamos, em francês, a incitarem-se para nos atacarem.

No exterior e à volta de Madina do Boé, havia vários abrigos feitos e utilizados pelo inimigo para estarem mais protegidos quando lançavam qualquer ataque ao aquartelamento de Madina.

Por fim veio o regresso. De madrugada deram-nos ordem para fechar a coluna que já estava a serpentear a estrada. Se a nossa companhia fechava a coluna, o meu grupo de combate foi o último. Foi assim que a posição de Madina do Boé foi abandonada.

A nossa progressão até ao Rio Corubal, os mesmos 40 kms, foi novamente penosa, embora não tão perigosa uma vez que íamos todos em bloco. Recordo-me que a coluna à vinda tinha levantado várias minas e, curiosamente, no regresso levantaram-se mais umas tantas, lá colocadas entretanto pelo inimigo.

Estacionámos na margem sul do rio Corubal, nós e a companhia de Madina [CCAÇ 1790], durante toda a noite para protecção. Durante a noite a jangada foi transportando para a outra margem todas as viaturas. Já de madrugada [ do dia 6 de Fevereiro de 1969] e passados todos os carros, foi a nossa vez de atravessar o rio. Como tínhamos por hábito rodar as nossas posições assim que parávamos, a nossa companhia passou para a frente da de Madina e o meu grupo de combate., por sua vez, passou para a frente da minha companhia. Com o meu grupo de combate na frente, a companhia dirigiu-se para a jangada para fazer a travessia. A jangada já estava praticamente cheia e só coube o meu grupo. Para trás ficaram dois grupos da minha companhia [CCAÇ 2405]e toda a companhia de Madina [CCAÇ 1790].

Durante a travessia aproveitámos para nos lavarmos um pouco e encher o cantil de água. Uma vez terminada a travessia a jangada regressou para ir buscar o resto do pessoal. Como ninguém quiz ficar para trás, entre os que estavam do outro lado do rio, entraram juntos na jangada, para a última travessia.

Aqui facilitou-se. Eu estava do outro lado e assisti a tudo. A jangada ainda a poucos metros da margem, adornou para um dos lados (nascente) e atirou à água vários rapazes. Por falta de peso de um dos lados, a jangada adornou de repente para o outro lado, atirando outros tantos rapazes à água.

Depois disto a jangada ficou meio submersa. A meu lado estava um Major que deitou as mãos à cabeça e disse: - Deus meu!.

Como não vi ninguém a gritar ou a esbracejar, pensei para mim que talvez se tivessem afogado um ou dois rapazes. A jangada que estava de reserva, foi por duas vezes buscar o pessoal. No Cheche estavam no chão dois helis que levantaram vôo, nada podiam fazer ou ajudar.

Uma vez formadas as companhias, é que demos conta da extensão da tragédia: 45 homens afogados de ambas as companhias. Com as botas, o peso da cartucheira, das granadas e ainda a responsabilidade de não perder as armas, aqueles rapazes à medida que iam entrando na água, iam logo para o fundo, agarrando-se uns aos outros.

Pelo menos um dos rapazes da nossa companhia estava em França a trabalhar e regressara a Portugal só para cumprir o seu dever. Ali ficou.

A minha mãe assim que soube da notícia associou com o meu aerograma e ficou muito aflita. Telefonei-lhe de Nova Lamego para a descansar.

Acabada esta operação, quizeram responsabilizar pelo sucedido o Capitão Aparício e o Alferes Dinis. Quem lá estivesse, tinha feito o mesmo. Só quem está metido nelas é que sabe da sua vida.

Acho que as ambições do Brigadeiro Spínola aqui funcionaram em pleno. Ele não quis ficar com aquela nódoa na sua folha de serviço, pois já devia aspirar a voos mais altos, com Caetano no poder e Tomás no fim de um mandato.

Deixo aqui um pormenor que dá bem a ideia das voltas que o mundo dá. Na sequência do 11 de Março de 1975, Spínola segue para o Brasil, exilado. Com o General Eanes na Presidência é combinado o seu regresso a Portugal.

Quem é que o vai buscar ao aeroporto? O Ten Cor Aparício, Comandante Distrital da PSP de Lisboa. Acasos do Destino.

Regressámos à nossa rotina das Tabancas em Auto Defesa.

__________

Notas de L.G.

(1) Vd. último post > 22 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXVIII: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (9): Fome em Campatá e Natal em Bafatá


(...) "Foi em Campata que passámos o primeiro Natal na Guiné. O meu irmão, a pedido da minha mãe foi passar o Natal comigo. De avião em avião, chegou por fim a Bafatá, aonde solicitou autorização ao comando para eu passar aqueles dias com ele em Bafatá.

"O Ten Cor Banazol, que comandava o Batalhão que ali estava sediado, fez deslocar uma auto metralhadora Panhard para me ir buscar. Alugámos um quarto e, entre o cinema, os passeios e a Messe, assim passámos o Natal" (...).

(2) Sobre Madina do Boé temos já mais de três dezenas de referências no nosso blogue; e sobre Cheche existem 25 referências. Eis alguns dos principais posts sober a retirada da guarnição de Madina do Boé e do desastre de Cheche no Rio Corubal:

17 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CIX: Antologia (7): Os bravos de Madina do Boé (CCAÇ 1790)

(...) "Apresentação do livro de Gustavo Pimenta, sairómeM - Guerra Colonial (Palimage Editores, 1999), no Porto, Cooperativa Árvore, em 10 de Dezembro de 1999. Autor do texto: José Manuel Saraiva, jornalista do Expresso" (...)

2 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CXXXIII: O desastre do Cheche, na retirada de Madina ...

(...) "Este documento, que me chegou às mãos através do Humberto Reis, relata aa dramática operação em que participou a CCAÇ 2405, sedeada em Galomaro, e pertencente ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), operação essa que tinha em vista operação essa que tinha em vista retirar as NT da posição insustentável de Madina do Boé, cercada pelo PAIGC" (...)

8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXX: A retirada de Madina do Boé (José Martins)

(...) "O mês de Fevereiro de 1969 tivera inicio há poucos dias quando passou, no aquartelamento de Canjadude, uma coluna cuja missão era retirar a Companhia de Caçadores nº 1790 do seu destacamento de Madina do Boé. Paralelamente a guarnição do posto do Cheche, pertencente à Companhia de Caçadores nº 5, também retiraria e juntar-se-ia à nossa companhia em Canjadude" (...)

8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXI: Comentário de Afonso Sousa ao texto sobre a retirada de Madina do Boé

(...) "Emociona este seu testemunho. Eu só faço uma pequena ideia do sofrimento de todos vocês, naquele momento trágico, nas horas e nos dias seguintes - em terras de solidão, em paragens dos confins da Guiné" (...).

12 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXVI: O desastre do Cheche: a verdade a que os mortos e os vivos têm direito (Rui Felício, CCAÇ 2405)

(...) "Em resumo e concluindo:

"(i) O desastre do Cheche ficou a dever-se, em minha opinião, ao excesso de peso entrado na jangada; (ii) E ela é corroborada por todos aqueles que, como eu, viajavam na jangada e que em conversas a seguir ao desastre manifestaram a mesma opinião;(iii) Note-se que a mesma jangada tinha já feito dezenas de travessias sob as ordens directas do Alf Diniz sem nunca se ter detectado qualquer problema;(iv) Esse problema surgiu de forma trágica na última travessia, ou seja, naquela em que o responsável Alf Diniz não pôde efectivamente proceder segundo o que estava estabelecido, deixando entrar na jangada o dobro da sua capacidade, por ordem do 2º Comandante da Operação a que, pela natureza da hierarquia militar, não poderia opor-se;(v) Mas fê-lo, e disso dei testemunho no âmbito do inquérito que se seguiu, advertindo previamente o seu superior hierárquico para o facto de estar a infringir as determinações que tinha sobre a forma de fazer a travessia do rio e da lotação definida para a embarcação;(vi) E estou convencido que a rapidez do desaparecimento das vítimas nas águas calmas, escuras e profundas do Corubal, se ficou a dever ao facto de todos transportarem consigo pesado equipamento de guerra que lhes tolheu os movimentos e os conduziu para o fundo do rio, de forma tão rápida, com a agravante de que a maior parte deles não sabia nadar" (...)

13 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXIX: A verdade sobre o desastre de Cheche (Paulo Raposo)

(...) "Alf Raposo da CCAÇ 2405, também assisti ao desastre do Corubal, tinha passado com o meu grupo de combate na travessia anterior. Estavamos de regresso da grande operação de Madina do Boé. O meu muito amigo Alf Felício estava na jangada acidentada. O testemunho dele é verdadeiro" (...).

terça-feira, 6 de junho de 2006

Guiné 63/74 - P853: CCAÇ 2571 (Pirada, 1969/71) (Orlando Figueiredo)

Sr. Luís Graça:

Obrigado por esta oportunidade e pela atenção dispensada!

Encontrei casualmente o blogue sobre a Guiné há algumas semanas e, desde logo, tive vontade de me inscrever para fazer parte da lista, que vai crescendo. E concluí que não há outro modo de contacto senão por mail. Pelo menos não encontrei espaço onde pudesse escrever, a não ser em termos de comentário, cujo espaço é reduzido. A isto acresce o facto de ter lido que toda a correspondência passa por si.

Chamo-me Orlando Figueiredo, natural de Alvarenga, Arouca. Pertenci à companhia madeirense, independente, [CCAÇ] 2571 (Águias Negras), que iniciou a comissão no Cacheu em Agosto de 1969, no quartel junto ao cais (havia outro na Arribada, mais acima). Uns tempos depois rumámos a Pirada onde permanecemos até Março de 1971. Os restantes 3 meses ou quase, foram passados no AGRBIS em Bissau, mais conhecido por Adidos.

Há muitas histórias para contar, especialmente de Pirada. Hoje fico-me só pela minha apresentação e pelo envio das melhores saudações a todos quantos aqui figuram e aos demais que virão.

Vivamos todos!

Orlando

Comentário de L.G.:

1. Orlando, deixa o senhor na rua e entra na nossa caserna.

2. És bem vindo, para mais vindo de Arouca e de Pirada!

3. As regras são simples e já deves tê-las lido no sítio da tertúlia.

4. Confirmo que toda a correspondência passa cá, por enquanto, pelo meu SPM.

5. Manda-me uma ciber-aerograma com duas fotos (digitalizadas, de preferência, em formato.jpg...)

6. Conta-nos lá as tuas estórias de Pirada. Em troca oferecemos-te o mapa da região, além da nossa amizade e camaradagem.

7. Camaradas que estiveram em (ou passaram por) Pirada e que são membros da nossa tertúlia... Toma nota:

Fernando Gomes de Carvalho (V.N. Famalicão), Fur Mil, CCAÇ 2401 (1968/70)

Fernando das Neves Ferreira (Braga) (já falecido, represnetado pela filha Ana Ferreira), 1ºCabo, CCAÇ 616, do BCAÇ 619 (1964/66)

João Varanda (Coimbra), Fur Mil, CCAÇ 2636 (1969/71)

8. Podes pesquisar mais coisas sobre eles (ou sobre Pirada), utilizando o Search this blog, disponível no canto superior esquerdo deste blogue.

Guiné 63/74 - P852: Guileje: um homem cercado de arame farpado (João Tunes)

Texto e foto: © João Tunes (2006)

Caríssimos,

Junto foto do meu arquivo referente a uma das alturas em que estive em Guileje, datada de Maio de 1970 (1). Em primeiro plano, a rede de protecção em arame farpado. Atrás, abrigos e porta de armas. Vêm-se ainda os telhados, da esquerda para a direita, da caserna, do refeitório e do posto de transmissões. Talvez interesse ao trabalho do Pepito [da Ad - Acção para o Desenvolvimento]...

Abraços.
João Tunes (2)

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Notas de L.G.

(1) Alf mil transmissões da CCS do BCAÇ 2884, Pelundo, 1969/70; transferido em 1970 mais para a CCS, de outro Batalhão, sito em Catió.

(2) Vd. post de 6 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXXXII: Os sitiados de Guileje

(...) "Ia para passar uma semana em Guileje, como fazia quase todos os meses, para tratar de problemas com as transmissões e trocar os códigos das cifras da criptografia. E, daquela vez, seria companheiro de viagem do Tenente Aparício. E uma ida a Guileje era sempre uma emoção, pelo risco e por rever os camaradas martirizados e isolados bem junto da fronteira com a Guiné-Conacri. Para mais, com o aviador mais marado da Guiné" (...).

Guiné 63/74 - P851: O Álbum fotográfico do Albano Costa (2): a Ponte Balana (Gandembel)















Texto e fotos: © Albano Costa (2006) (1)

19 de Abril de 2006


Caro amigo Luís Graça

Cá estou eu desta vez para enviar umas fotos da Ponte Balana para poderes ilustrar o texto e satisfazer a curiosidade deste nosso colega tertuliano (2). As legendas podes fazer como achares melhor, eu só vou dar umas dicas: são todas tiradas em Ponte Balana, a ponte em madeira que já foi feita depois do 25 de Abril. Esse sítio é de importância estratégica para a circulação daquela zona.

As fotos foram tiradas por mim, aquando da nossa viagem em grupo, em Novembro de 2000. A estórias que estava a ouvir naquele momento estavam a apaixonar-me, foi realmente uma zona muito complicada no tempo de guerra e eles [os do PAIGG] chegaram a derrubar a ponte para que as nossas tropas não pudessem passar (3).

Um abraço, Albano

PS - Depois vão enviar também fotos de Quebo(Aldeia Formosa). Quanto aos nossos mosqueteiros [o grupo que fez o safari Porto-Bissau, em Abril de 2006... ] eles têm andando pelo mato e não têm internet mas o Hugo já medisse que mal chegue a Bissau irá enviar fotos.

__________

Notas de L.G.

(1) Vd. post de 27 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXCII: Album fotográfico do Albano Costa (1): O Geba

(...) "O Albano Costa já era fotógrafo (profissional) quando fez a sua comissão de serviço, como 1º cabo, operacional, na CCAÇ 4150 (Guidage, Bigene, Binta, 1973/74).

"A sua paixão pela fotografia fez com que ele seja, de longe (com o Humberto Reis), um dos nossos tertulianos com mais documentação sobre a Guiné, de ontem e de hoje.

"Ele já aqui nos contou como, em Novembro de 2000, quebradas as últimas resistências psicológicas, voltou à Guiné, agora como simples turista, revisitando sítios por onde estivera vinte e seis anos antes e conhecendo muitos outros de que só ouvira falar...

"Nessa viagem de 15 dias (...), com um grupo de camaradas, ele não só fez um excelente vídeo (realização, montagem e insorização do Hugo Costa, seu filho) como tirou muitas e óptimas fotografias, que eu já tive o privilégio de ver, em Guifões, Matosinhos, no seu estabelecimento comercial"...

(2) Vd. posts de

19 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXIV: Um sobrevivente de Gandembel/Ponte Balana (Idálio Reis, CCAÇ 2317)

18 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXX: Um pesadelo chamado Gandembel/Ponte Balana (Idálio Reis, CCAÇ 2317, 1968/69)


(3) Vd. post de 29 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXII: A tragédia da ponte sobre o Rio Balana (José M. Samouco)

Guiné 63/74 - P850: Os roncos da CCAÇ 6 em Lanchandé, em aerograma de 22/10/1970, do furriel graduado 'comando' da 1ª CCmds Africanos, antigo cmdt do Pelotão de Milícia de Bedanda, Tala Djaló (Hugo Moutra Ferreira, ex-alf mil, CCAÇ 1621,Cufar, e CCAÇ6, Bedanda, 1966/1968)

 1. O Hugo Moura Ferreira (ex-alferes miliciano de infantaria, CCAÇ 1621 e CCAÇ 6, Bedanda e Cufar, 1966/1968) (1) mandou-cópia de um aerograma de um seu antigo soldado.

O seu autor foi o Tala Djaló, furriel graduado 'comando', da 1ª Companhia de Comandos Africanos, oriundo da CCAÇ 6, sediada em Bedanda. A missiva foi escrita um mês antes da Op Mar Verde (invasão de Conacri, em 22 de novembro de 1970), onde o Djaló foi dado como "desaparecido em combate") (2).

A publicação deste tipo de documentos é muito importante para se conhecer e perceber melhor a mentalidade dos africanos que combatiam o PAIGC sob a nossa bandeira. 

Repare-se como o Djaló, fula ou futa-fula, descreve a entrada da CCAÇ 6 na base de Lanchandé, a sul de Bedanda, em perseguição a um grupo que havia atacado o aquartelamento das NT. Os turras são sinónimo de balantas... Foram apanhados a dormir: 11 foram mortos, à queima-roupa, desarmados (presume-se!), 4 foram capturados... Era a cultura do ronco, em pleno consulado spinolista...

Obrigado ao Hugo Moura Ferreira, pela tua sensibilidade e cultura, por teres sabido conservar em arquivo este singelo aerograma que o teu amigo Dajló te enviou para Portugal há 35 anos !!!...







2. Transcrição, revisão  e fixação do texto por L.G., com respeito pelo original (que, além de erros ortográficos, não trazia praticamente nenhuma pontuação).


Fá Mandinga [.] 22/10/70

Caro amigo Moura F[er]reira

Recebi a sua carta na qual fiquei muito contente contigo.

Amigo Moura [.] Eu ainda não esqueço de ti [.] Aquela revista que tu me mandou eu já mostrei aos meus colegas [.] Todo ficamos muito contente e toda a companhia por saber da sua [?][.]

Eu já lhe mostrou a revista [.] Eu quero que tu me manda uma fotografia sua que [é] para eu a mostrar meus colegas todo [.] Já te conheço pela carta e falta pela cara [.] Eu agradeço-te me mandar uma fotografia sua bem tirada [.]
Olha [,] a nossa antiga companhia CC[AÇ] 6 fizeram ronco no [?] tempo os turras venha atacar Bedanda.

(2) Depois quando [a]tacaram[,] retiraram no Lanxandé e depois do ataque o capitão mandou logo sair a companhia atrás dos turras [.] Quando chegaram a companhia no Lanxandé [,] alguns dos turras estavam a dormir e logo chegou a companhia e cercaram a tabanca

(3) em toda a volta[.] Depois [entraram] nas casas dos Balanta [.] Na dentros das casa encontra[vam]-se lá alguns a dormir e logo é só chegar[.] 1ª coisa é [a]panhar ainda armas e, logo a seguir [,] é que se cerca os turras nas cama [.] Resultado [:] foi assim 11 mortos, 4 capturados, 14 armas [a]panhadas

(4) e muitas coisas [a]panhadas [.] Os comandantes daquele grupo foi [a]pnhado e 2ºchefe dele também foi [.] a]apanhado[.] Mais 2 soldados dos turra também foi [a]panhado [.] Amigo Moura Ferreira [,] a companhia de Bedanda continou [a] ser valente no mato [.]

(5) Toda a sua família cumprimento e teu irmão [.] E eu quero que tu me [ar]ranja um boné de sargento mas não é [a]quele branco e [a]quele da farda nº 2 [.] É que eu quero que [ar]ranja nada mais [,] amigo.

Remetente: Manuel Talabiu Djaló, Furriel , SPM 0798.

Destinatário: Hugo Fernando de Moura Ferreira, Stº António, Costa da Caparica

____________

Notas de L.G.

(1) Vd. post de 22 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXCV: CCAÇ 16121 (Cufar); CCAÇ 6 (Bedanda) (1966/68)

2) Vd. post de 1 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P827: 'Retido pelo IN': o caso do meu amigo Tala Djaló (Hugo Moura Ferreira)

segunda-feira, 5 de junho de 2006

Guiné 63/74 - P849: Os que lutaram contra a guerra, mesmo fazendo-a, também fazem parte da nossa história (João Tunes)

Texto do João Tunes, com data de 1 de Junho de 2006:

Caro Luís,


Este blogue é, também, uma caixa de surpresas. Não só pelo que vamos recordando e sabendo, também pela forma viva e fraternal como reconstruímos a camaradagem forjada nos tempos de guerra (agora mais alargada, vencendo as barreiras da quadrícula ou das épocas diferentes em que por lá passámos). E as surpresas não ficam por aqui, pois, entre tantos que fomos, acabamos por nos reencontrar de outros caminhos, outras ocupações, o que, provavelmente, não aconteceria sem este ciber-quartel.

Já disse da minha surpresa no (re)encontro com um antigo colega profissional (o camarada António Levezinho). Estivemos em simultâneo a trabalhar na mesma empresa para aí uns trinta anos, julgo que nunca nos cruzámos, não nos supúnhamos ex-combatentes no mesmo tempo e na mesma guerra e até fomos embarcados no mesmo Cruzeiro conhecido como Niassa. E acabámos por repor este laço comum, via blogue, permitindo-me sabê-lo de boa saúde e disposição no seu retiro algarvio. O que muito me alegra.

Agora, fiquei banzado ao ler o Post nº 823 do camarada Jorge Cabral. Não pelo seu conteúdo, que assino por baixo. Sem espinhas. Mas porque ele disse que me conhecia da recruta na EPI em Mafra e alude a um amigo comum, também recruta, o João Resende. Primeiro, o Jorge mostra ter muito melhor memória que eu (o que não é difícil, diga-se). É que depois de dar voltas e mais voltas quer às suas fotografias publicadas do tempo na Guiné (talvez por causa dos disfarces com os roncos fulas ou mandingas) quer às da actualidade (talvez pela marca do tempo passado), não consigo reconstituir a sua esbelta e marcial figura nos tempos em que convivemos (esporadicamente) no casarão de pedra onde aprendemos a marcar passo. Talvez numa qualquer oportunidade de abraço ao vivo, a minha memória se recomponha.

Mas o Jorge Cabral, falando de nós e do nosso camarada Resende, acaba por trazer a lume um aspecto que julgo ainda não abordado e que falta na história da guerra para ela ficar composta. Ou seja, da luta anticolonial desenvolvida no interior das Forças Armadas por militares antifascistas (sobretudo, entre milicianos) e que acabariam por contaminar os oficiais do quadro de média e baixa patente que, depois, deu no que se sabe.

Como se sabe, muitos cadetes milicianos iam para Mafra depois de terem enfrentado o regime nas lutas estudantis e alguns deles estavam ali precocemente, sem os deixarem concluir os seus cursos, por terem sido punidos com a expulsão da Universidade. Daí que, quando fui enfiado em Mafra, em 1968, a maioria esmagadora dos cadetes tinha já convicções mais ou menos consolidadas contra o regime e contra a guerra colonial. Claro que havia os apolíticos e um ou outro que até aderia ao militarismo. Mas patriotas convictos e convencidos da justeza da guerra, contavam-se pelos dedos e acabavam por fazer figuras algo excêntricas nos sentimentos dominantes e nas conversas. Eram os que chamávamos de chicos e fachos que, por regra, acabavam por ficar isolados. E alguns mudaram posteriormente de posição quando da experiência concreta na guerra, o que pude também constatar em diversos casos.

A chegada do João Resende (referido pelo Jorge Cabral) a Mafra mudou muito as coisas. Ele foi com o curso concluído de engenharia química e tinha sido o líder estudantil no Porto (onde o conhecera e onde com ele acamaradara nas brigas contra os fachos). Era, pois, um veterano e organizado militante contra o regime, com grande capacidade de organização e bom conhecedor das regras conspirativas, mais um grande poder carismático aliado a uma profunda modéstia. Com ele, muito mudou em Mafra. A oposição à guerra evoluiu, entre os cadetes, dos desabafos soltos para uma organização estruturada de denúncia e combate à guerra colonial.

Se, desse grupo, não lembro o Jorge Cabral, lembro-me de outros antigos dirigentes e activistas estudantis, nomeadamente o engenheiro António Redol (filho do escritor Alves Redol) que havia sido Presidente da Associação de Estudantes do Técnico e o Miranda Ferreira, economista e activista nas lutas de Económicas. Éramos um grupo restrito, como se impunha, mas lá fomos mexendo. Nos fins-de-semana, tínhamos as nossas reuniões conspirativas em Lisboa, em casa da mãe do Redol, durante a semana fazia-se o que se podia - contactos com quem revelasse consciência anticolonial, umas tarjetas contra a guerra espalhadas à noite pelas casernas, pinchagens nos corredores ("Abaixo a Guerra Colonial!"), apelo a que se ouvissem as emissões da Rádio Voz da Liberdade (em Argel), etc.

Entretanto, eu saí de Mafra (quando o Resende lá chegou eu já tinha feito a recruta e estava a tirar a especialidade) e o Resende por lá continuou por mais tempo. E com bons resultados, pois num dos posteriores juramentos de bandeira deu-se o célebre protesto dos cadetes milicianos através de, no momento do juramento, perante a generalada e as famílias dos cadetes, ter havido um colectivo, alargado e simultâneo descuido de se carregar na patilha e deixar cair os carregadores da G3 no chão, coisa que foi uma realíssima bronca.

[O João Resende foi, mais tarde, parar ao quartel de Chaves e depois mobilizado para Moçambique. Então, desertou mas não saiu do país, passou à luta como militante clandestino. No meu regresso da Guiné, ele bateu-me à porta diversas vezes, irreconhecível no seu disfarce de clandestino (ele actuava na região de Lisboa), ficávamos noite fora a conversar e conspirar, depois dormia em minha casa e abalava cedo na manhã seguinte até uma próxima visita, deixando-me boas molhadas de material clandestino para ler e distribuir. E foi, graças a ele, que li bem cedo o Rumo à Vitória de Álvaro Cunhal, numa edição integral e clandestina. Assim como uma versão a stencil do Luuanda do Luandino Vieira, então preso no Tarrafal e com os livros proibidos. Poucos meses antes do 25 de Abril, foi apanhado pela PIDE e selvaticamente torturado (imagine-se o que era a PIDE caçar um desertor e militante clandestino!), não tendo passado muito tempo de prisão nem sido julgado porque, entretanto, deu-se o golpe. Por isso, desde a sua prisão até ao 25 de Abril, claro que eu, quando me deitava, sabia da alta probabilidade de ser acordado a meio da noite com visitas inesperadas e desagradáveis.]

Julgo, caro Luís, que esta parte, a luta contra a guerra pelos militares antifascistas e anticolonialistas, é uma parte não pouco importante na nossa história e na história da guerra. Pouco ou nada conhecida, para mais. Outros camaradas de muito mais saberão e talvez se disponham a ajudar a abrir o livro.

Quanto ao camarada Jorge Cabral, o reconhecimento fica para quando da oportunidade do estudo visual e ao vivo. Vamos lá ver como funciona a minha fraquíssima memória. Um grande abraço, entretanto.

Outro abraço para ti, camarada e amigo Luís, outros tantos para todos os estimados tertulianos. Com os pedidos de desculpa por tanto me aturarem (calma, eu prometo já uma pausa mais ou menos prolongada!).


João Tunes

Guiné 63/74 - P848: XXI Convívio da CART 3494 (1972/74), no Quartel Serra do Pilar, V.N. Gaia, em 10 de Junho

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Crachá dda CART 3494 (Os Fantasmas do Xime, 1972/74), pertence ao BART 3873 (Bambadinca, 1972/74).

Além do Sousa de Castro, pertenceram a esta unidade (que esteve no Xime e em Mansambo) os nossos tertulianos António J. Serradas Pereira, Carvalhido da Ponte e Manuel G. Ferreira.


Foto: © Sousa de Castro (2005).


Reprodução de folheto que nos chegou por e-mail do Sousa de Castro (ex-1º Cabo de Trms):

Caríssimo Amigo:

Uma vez mais nos iremos reunir em almoço de confraternização, o vigésimo primeiro desde 1974. Será no dia 10 de Junho, na Serra do Pilar em Vila Nova de Gaia, para nós, RAP 2.

Para a maioria de nós será como que um regresso às origens pois foi lá que nos vimos pela primeira vez, que com emoções indiscritíveis nos começamos a conhecer enquanto formávamos Batalhão nos idos de 1971.

Desejamos que, também por este atractivo, este encontro motive um maior número de participantes.

Do programa consta uma missa pelos nossos saudosos camaradas de armas falecidos, uma patrulha de reconhecimento ao quartel, o descerramento de uma lápide que perpetue esta nossa vivência e o almoço convívio.

Não temos os contactos de todos, por isso te pedimos que te certifiques junto daqueles de quem tens forma de contactar da sua vinda.

PROGRAMA

10.00 – Início da concentração no Quartel da Serra do Pilar

10H30 - Visita guiada ao Quartel

11H00 – Missa de Acção de Graças

12H00- Homenagem aos nossos já falecidos

12H15 – Descerramento de lápide alusiva ao encontro

12H30- Início do rancho


NOTA: Estacionamento automóvel autorizado no Quartel mediante exibição deste folheto

INSCRIÇÃO

Agradecemos que preenchas o formulário destacável e que o envies impreterivelmente até ao dia 26 de Maio para o remetente da carta ou que contactes, por telemóvel ou telefone, qualquer membro da comissão, a comunicar a tua presença.

Nome _____________________________

Morada ___________________________
__________________________________

N.º de presenças_____

Custo por pessoa incluindo despesas 10€

Pagamento no local do evento ? Sim ____ Não, junto o cheque____

n.º _____________, Banco___________________________

de € ________,00


Contactos >
Luís Domingues - 220 137 618 e 961 070 184
José Vilela Peixoto - 967 098 181

E-Mail: cart3494@sapo.pt

Comentário de L.G.:

Apesar da divulgação tardia desta convocatória, no nosso blogue, faço votos para que a festa do pessoal da CART 3494 seja muito concorrida, no próximo dia 10 de Junho, e decorra, se possível, ainda melhor do que nas edições anteriores, em ambiente de grande amizade e camaradagem. É de louvar o esforço de organização e a persistência destes camaradas que, desde o regresso, em 1974, têm-se encontrado todos os anos.

Julgo que a maioria do pessoal da CART 3494 era oriunda do Norte. Pela nossa parte, confiamos ao Sousa de Castro a tarefa, que ele tem desempenhado com grande carinho, voluntarismo e dedicação, de divulgação do nosso blogue e dos propósitos da nossa tertúlia... LG

Guiné 63/74 - P847: Do Porto a Bissau (25): Ruínas e lembranças de Mansambo (A.Marques Lopes)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Mansambo > Abril de 2004 > O Saagum e o António de Almeida (1) , ambos pertencentes à CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69), junto ao único monumento que resta de pé (erigido pela CART 2714, 1970/72 - "Bravos e Leais" - , pertencente ao BART 2917 (1970/1972). Já em 1996, quando o Humberto Reis lá esteve, era o único que restava das unidades de quadrícula ali sediadas... (LG)




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Mansambo > Abril de 2004 > O pouco que resta do antigo aquartelamento, feito com sangue, suor e lágriams por homens como o Carlos Marques dos santos, o Torcato Mendonça, o Saagum, o António Almeida ou o Ernesto Ribeiro membros da nossa tertúla, que pertenceram, todos eles, à CART 2339 (1968/69), a unidade que construiu aquele aquartelamento.




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Mansambo > Abril de 2004 > O José Clímaco Saagum, de regresso, à famigerada fonte de Mansambo, quase 40 anos depois (2): aqui foi gravemente ferido, em emboscada montada pelos guerrilheiros do PAIGC, em 19 de Setembro de 1968. O Saagum era soldado do 1º pelotão da CART 2339 (Mansambo, 1968/69). Nas duas fotos acimas, uma granada de morteiro, abandonada, e um aspecto da fonte, que continua a ser utilizada pela população local (LG).


1. Texto do A. Marques Lopes:

Caros camaradas e amigos:

O António Almeida e, sobretudo, o Saagum tinham de ir a Mansambo, [fazer] a catarse necessária. Como sabem, o Saagum sofreu na fonte de Mansambo (a cincoenta metros do quartel!) uma emboscada terrível que o feriu para toda a vida (2). Mais lembranças.

A. Marques Lopes

2. Comentário de L.G.:

Mansambo é dos sítios da Guiné, por onde passámos, que tem mais referências no nosso blogue (3): hoje, fazendo uma pesquisa em Blogue-fora-nada > Serach this blog, encontrei 79 referências a Mansambo!... As fotos que hoje se publiquem não precisamd e gardnes legendas: falam por si ... NO entanto, é preciso contextualizá-las... Obrigado ao A. Marques Lopes por estas "lembranças de Mansambo".

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Notas de L.G.


(1) Vd. post de 12 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCXCIX: Boa viagem para o Almeida e o Saagum (CART 2339)


(2) Vd. post de 12 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXV: Do Porto a Bissau (12): A fonte de Mansambo (Albano Costa)

(3) Vd. entre outros posts mais os seguintes:

14 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCVIII: A emboscada na fonte de Mansambo (19 de Setembro de 1968) (Carlos Marques dos Santos)

9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DIX: As baixas da CART 2339 (Mansambo, 1968/69)

30 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CDI: Mansambo, um sítio que não vinha no mapa (3): Memórias da CART 2339

Guiné 63/74 - P846: Do Porto a Bissau (24): As ruínas de Fulacunda (A. Marques Lopes)


Guiné-Bissau > Região de Quínara > Abril de 2006 > Restos do antigo aquartelamento de Fulacunda.

Fotos: © A. Marques Lopes (2006)


O A. Marques Lopes e o Xico Allen passaram por lá, de jipe... Fulacunda é hoje um... lago (para não dizer um mar, por que seria uma hipérbole) de ruínas, como Có (1) ou outros sítios que o grupo de tugas visitou, em Abril de 2006.

Não temos muitos camaradas, na nossa terútulia, que tenham passado por (ou estado em) Fulacunda. Nos meus registos consta apenas a CCAV 2862, que pertenceu ao BCAV 2867 (Março de 1969/Dezembro de 1970), e que esteve aquartelada em Fulacunda (2). A este Batalhão, mais exactamente à sua CCS, pertencia o Horácio Martinho Ramos, já aqui evoacado pelo seu filho Fernando Martinho (2). A CCS do BCAV 2876 esteve em Tite, segundo pesquisas feitas pelo nosso incansável José Martins.

Se quiserem saber mais coisas sobre Fulacunda, leiam o romance Rumo a Fulacunda, do Rui Alexandrino Ferreira, editado em 2000 e de que já aqui foi feita uma breve recensão bibliográfica pelo nosso camarada Jorge Santos (2). (LG)

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Notas de L.G.

(1) Vd. post de 30 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXV: Do Porto a Bissau (22): As ruínas de Có (A. Marques Lopes)


(2) Vd posts de

25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXIV: BCAV 2876, o batalhão do Horácio Ramos ? (José Martins)

3 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCII: Horácio Ramos, presente!! (BCAV 2867, Tite, 1979/70)

24 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXI: À procura de camaradas do meu pai, Horácio Martinho Ramos (conhecido por Papel)

(3) Vd. post de 12 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CVII: Bibliografia de uma guerra (3)

(...) "O autor nasceu em Angola (1943). Fez o curso de oficiais milicianos em Mafra (1964). Foi mobilizado para a Guiné, tendo rendido um desaparecido em combate e pertencido à CCAÇ 1420, sedeada em Fulacunda (1965/67). Depois de frequentar o curso de capitães, em Mafra (1970), volta à Guiné, para comandar a CCAÇ 18. Em 1973 faz uma comissão em Angola. Regressa a Portugal em 1975. Vive actualmente em Viseu. É Coronel de Infantaria na situação de reforma. Rumo a Fulacunda é a sua obra literária de estreia" (...).

domingo, 4 de junho de 2006

Guiné 63/74 - P845: As 95 longas milhas do Rio Cacheu (Manuel Lema Santos)

Texto de Lema Santos:


Caro Afonso Sousa (1),

Para já, fico grato pela leitura atenta que dedicaste ao texto que a Direcção da Caserna entendeu como interessante publicar.

Falar do Cacheu representa, para mim, quase metade do meu tempo de comissão. Parece-me pouco justo dedicar-lhe apenas meia dúzia de linhas a Ele, rio Cacheu, e a Todos os que naquelas 95 longas milhas estacionaram ou navegaram, sofreram, combateram ou até tombaram definitivamente.

De um ou do outro lado e foram muitos. Certamente demasiados.

Poderemos sempre recordá-los-los apelando pessoal ou colectivamente à homenagem, invocando o exemplo e a coragem de alguns pela segurança de todos.

Colectivamente, o mais válido e mais sério esforço, será evitar repetições mas ainda que legislação sobre guerra fosse publicada, como se fiscalizaria, multaria ou penalizaria quem não cumprisse ou pisasse o risco?

Para mim, num eventual regresso à Guiné, uma das prioridades de viagem seria revisitar aquele curso de água com características únicas, de Cacheu até Farim, num irresistível e saracoteante misticismo.

Também nas recordações em que me envolvo sempre que o revejo, ainda que apenas em fotografia.

O curso de água com um leito de perfil em U na quase totalidade da extensão e para montante de S. Vicente, embora com açoreamentos pontuais, permitia aquilo que não conheço em nenhures ou seja, navegação com calado de 2,20 m quase a roçar as pernadas do alto tarrafo, como se de um canal se tratasse.

Em algumas zonas diria mesmo a escafear as antenas de comunicações e, com algumas tangentes mal calculadas, até a deixar lá algumas de recordação.

Nestas condições de navegação, forçoso será reconhecer que em alguns locais, para nós representadas pelas abertas na frondosa vegetação dos mangais, lalas, matas, resumidamente tudo o que não fosse o habitual e muito amigável tarrafo, funcionando como um muro de protecção, representava uma excessiva e perigosa exposição a ataques dos nossos amigos de pêto à época.

Admitamos que não era muito fácil esconder 42 metros de patrulha e, como todos os que se sentem acossados, não podendo evitar as passagens sistemáticas por aquelas zonas menos hospitaleiras, procurávamos nas duas Boffors anti-aéreas de 40 mm e mais umas entradas de que dispunhamos antes do prato principal, a sempre excelente companhia nesses momentos, quer como profilaxia quer como terapêutica.

Como rotinas, a simples ficalização ou a escolta a LDG, LDM, LDP ou batelões comerciais, transportando pessoal, material ou víveres.

Como alternativas, o embarque de DFE em Bissau com uma ordem de operações na mochila, rumar até ao Cacheu e, navegando para montante, executar as instruções previstas na ordem de operações, utilizando as LDM - as grandes heroínas da navegação nos baixos, no tarrafo e do encalhe - para efectuar o transbordo do pessoal para terra, normalmente durante a noite.

O controlo da operação a partir da LFG para o CDMG e, na manhã seguinte, o regresso a Bissau aos camarões e às ostras com as respectivas bazookas.

Voltarei à vaca fria no Cacheu e, mais tarde, também para Sul.

Quanto à costureirinha que referes, julgo tratar-se da Pistola-Metralhadora PPSH, de origem soviética, calibre 7.62 (russo), de tambor redondo e que nos anos 60 também fez parte do armamento dos movimentos africanos de independência que se opuzeram a Portugal. Também se ouviam no Cantanhês. Tinha um matraquear próprio com ruído especialmente irritante (haverá algum que o não seja?).

Um abraço de amizade para todos,

Manuel Lema Santos

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Nota de L.G.

(1) Vd. post anterior, nº 843.

Guiné 63/74 - P844: Ouvir as 'costureirinhas' a bordo de uma LDG (Afonso M.F. Sousa)

Texto do Afonso M. F. Sousa (ex-furriel miliciano de transmissões, CART 2412, Bigene, Binta, Guidage e Barro, 1968/70)

Caro senhor e amigo Lema Santos (1):


A propósito deste seu interessante descritivo: "...os RPG (lança-granadas do IN) no Cacheu, a montante de Barro (Porto Coco, Jagali, Tancroal) e antes de Binta, também eram aperitivos a evitar..."

Deixe-me transmitir-lhe isto:

Quando ainda periquitos (Agosto de 1968), subimos o Cacheu, de LDG (2), rumo a Bigene. Lembro-me que antes de chegarmos a esse ancoradouro que servia Ganturé, com a lancha a navegar quase encostada à margem esquerda (tecnicamente não sei o porquê), fomos saudados por rajadas de armas que alguém apelidava de costureirinhas que vinham (suponho) dos lados da densa mata do Oio.

Foi o nosso primeiro contacto com o som de armas de fogo do IN. Dentro da LDG, o silêncio imperou e quase continhamos a respiração.

Um abraço.

Afonso Sousa

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Notas de L.G.

(1) Meu caro Afonso: Desculpa fazer-te o reparo mas o tratamento por tu é, à boa maneira romana, uma das regras de convívio na nossa caserna...

(2) Vd post de 4 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXXI: A Marinha, as LDG e as LFG (Lema Santos)

Guiné 63/74 - P843: Memórias do Rio Cacheu (Manuel Lema Santos)

Texto do nosso tertuliano Manuel Lema Santos , ex-1º Tenente da Reserva Naval, 1965/72, Guiné 1966/68 - NRP Orion.

Caro Marques Lopes (1):

Nos posts que tenho efectuado tenho sido bastante parco em explicações, mas esse aspecto tem alguns motivos relevantes:

Ao longo dos anos de conflito na Guiné, quando se estabelece um comparativo global de condições de vida nas unidades - humanas, sociais, psicológicas, conforto e até de risco considero, em consciência, haver claro pendor favorável aos ramos da Marinha e da Força Aérea, embora possa haver casos pontuais de sinal contrário. Estou a lembrar-me de algumas LDM, LDP ou FZE.

No Exército teria muito a ver, também, com factores meramente fortuitos como a unidade para que cada militar era nomeado (diria quase saída em sorteio), a sua localização, enquadramento na área, importância estratégica, etc. Mais não me alongo por desconhecimento.

A consideração e conhecimento do que acima digo relativamente a alguns aquartelamentos de topo de gama como por exemplo Madina do Boé, Guileje, Aldeia Formosa (falando apenas no corredor Sul) e tantos outros a nomear, transporta-me a alguma prudente contenção no relato de proezas heróicas, sobretudo porque o respeito devido aos que lá ficaram, de ambos os lados, me condiciona prioritariamente.

Outro aspecto é muito pessoal e tem a ver com a memória de minha mãe que, quando o meu pai faleceu, tinha três dos quatro filhos em teatros de guerra e apenas o mais novo estava presente para lhe proporcionar algum conforto. Não creio que até hoje tenha sido evocado de maneira minimamente digna o contributo de cada mãe portuguesa, tantas vezes com tão pesada retribuição.

Pela minha parte, que fique claro que, à época e nesse contexto histórico, voltaria a efectuar o mesmo percurso ao serviço do país onde nasci, no cumprimento de um dever de cidadania.

Talvez sem tanta expressão, a minha irmã casada com um oficial da FA em Angola mas, pormenor adicional interessante e controverso, é que tanto eu como o meu irmão estávamos na Guiné, simultaneamente. Eu na Marinha, de 1966-1968 e o meu irmão, como alferes médico, no Exército, de 1967 a 1969, no Batalhão 1933, das célebres Companhias 1790, 1791 e 1792.

Deixo as conjecturas para quem as quiser fazer mas estávamos ambos presentes no convívio da cidade universitária, aquando da greve da fome de 17 estudantes em 1962 - fui ter com o meu irmão para ver como estava aquilo e aproveitar a boleia de carro com ele para casa...o que já não consegui, pelo que a seguir digo.

Pela calada do noite, os cerca de 1500 estudantes presentes (entre os quais um ex-presidente incluído!) foram brindados com guarda especial, seguida de visita guiada pela PIDE e PSP, às estâncias turísticas de Caxias e quartel da polícia de choque na Parede (já extinto). Durante um dia e apenas para identificação, justificou-se na época. A esta distância no tempo, ocorre-me que o episódio até teve algo de ridiculamente cómico/trágico.

Não quero deixar de te agradecer os pormenores a que vou acrescentar alguns que podem ser-te interessantes:

- Em 28 de Julho de 1968 estava presente no Cacheu a LFG Orion que permaneceu lá de 25 a 30 desse mês mas eu já tinha zarpado. Concluí a minha comissão, com regresso a 12 de Maio;

- Não era normal efectuarmos qualquer disparo, mesmo de reconhecimento, abaixo da Ponta de S. Vicente. Para montante e quando referes o Ingoré estamos, para nós, a falar das zonas de Maca, Canja e Barro onde já efectuávamos a navegação atentos, vigilantes, em estado de prontidão bordadas (uma peça guarnecida);

- Claro que tínhamos em atenção o facto de haver aquartelamentos próximos e apenas efectuaríamos fogo se fôssemos atacados. Para nós, isso era rígido nessa zona. Ainda mais para montante de Barro passávamos a postos de combate, normalmente até Farim e nas zonas críticas especialmente referenciadas, como Porto Coco, Jagali e Tancroal fazíamos, embora nem sempre, fogo de reconhecimento e protecção;

- Em Tancroal, no Cacheu, em 14 Janeiro de 1968 as LFG tiveram o mais violento ataque. No caso a LFG Lira - sorte minha porque substituiu a LFG Orion que acabou por não sair de Bissau por avaria do motor de estibordo à descolagem - efectuava a escolta à LDG Alfange que transportava para Bissau o Batalhão estacionado em Farim (penso que aí conseguem referenciá-lo com facilidade pela data). Foi atingida na ponte e no rufo da casa das máquinas com granadas de RPG 3 (2) com 2 mortos e 7 feridos, entre os quais o imediato, meu camarada, que ficou surdo de um ouvido. Com um destacamento de fuzileiros a bordo...

- Provavelmente ter-te-ás cruzado, vagamente ou não, com o meu irmão pois entre Junho de 1968 e Maio de 1969 esteve, como médico, na companhia estacionada no Ingoré. Mais ainda julgo que terá uma vez ido a Barro ao correio ... Tenho bastantes fotos cedidas por ele que publicarei caso ele não veja inconveniente e que vão desde o Ramadão até fotos da Messe, Parada, arredores do Ingoré, etc.;

- Tenho bastantes documentos e fotos que terei prazer em ir expondo mas gosto de efectuar a articulação lógica com factos directamente relacionados que permitam correctas interpretações das situações que relato e são mesmo muitas.

Quando começo a puxar os fios do novelo alastro até me puxarem as orelhas! Puxem e com força.

Um abraço de amizade,
Manuel Lema Santos

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Nota de L.G.

(1) Vd. post anterior, nº 841.

Guiné 63/74 - P842: Quando os nharros da CCAÇ 3 foram alvejados pela nossa Marinha (A. Marques Lopes)

Caro Lema Santos:

Tenho lido os teus posts sobre as lanchas (1) e tenho-me lembrado de um episódio. Tenho grande apreço por todo o pessoal marinheiro e pelo seu papel relevante na Guiné.

Este é um episódio que encarei, na altura, com normalidade e que, se calhar, não era assim tão fora do normal. Conto-o agora: a meio do dia 28 de Julho de 1968, andava eu com o meu grupo de combate da CCAÇ 3 pela margem esquerda do Cacheu, por entre o tarrafe e outra vegetação, entre Barro e Ingoré, fazendo correr os craques em todas as direções, com o objectivo de descobrir (mais) uma passagem dos abastecimentos do PAIGC.

Eis senão quando surgiu uma lancha, viram os meus nharros e começaram a disparar para a margem, de G3 e metralhadora pesada. Felizmente não acertaram à primeira. Alguns dos meus ainda levantaram os braços para alertar que era gente amiga. Mas eu vi a determinação dos homens da lancha e dei ordem de cavanço e internámo-nos na mata.

Contei o facto, é claro, e mais tarde vim a saber que o pessoal da lancha tinha pensado que eram turras... Mas, felizmente, não morreu ninguém com o fogo amigo.

Abraços
A. Marques Lopes

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Nota de L.G.

(1) Vd. poste de 25 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXC: Os marinheiros e os seus navios (Lema Santos)

Guiné 63/74 - P841: Curriculum Vitae do nosso doutorando Leopoldo Amado


Leopoldo Amado - Curriculum Vitae resumido

Foto: Lamparam (2005)

Doutorando em História Contemporânea pela Universidade Clássica de Lisboa (Faculdade Letras de Lisboa), sob a temática “Guerra Colonial da Guiné versus Luta de libertação Nacional (1961 – 1974); membro da nossa tertúlia; edito do blogue Lamparam II.


1. DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

Nome: Leopoldo Victor Teixeira Amado
Filiação: Mateus Teixeira da Silva Amado e Cipriana Araújo de Almeida Vaz Martins Amado
Naturalidade: Guiné-Bissau
Nacionalidade: guineense e portuguesa
Data e lugar de Nascimento: Guiné-Bissau, 19 de Junho de 1960


2. HABILITAÇÕES ACADÉMICAS


1967– 1971/concluiu o ensino primário na Escola Central de Bolama;

1971/73> Concluiu o ensino complementar básico do ciclo preparatório em Bissau;

1973/80> Concluiu o Curso complementar dos liceus;

1980/81> Concluiu o Curso dirigido de formação de professores liceais;

1882/86> Concluiu licenciatura em História pela Universidade Clássica de Lisboa (Faculdade Letras de Lisboa);

1986 > Frequentou o Mestrado de Estudos Africanos no Instituto de Ciências Políticas e Sociais de Lisboa;

1989 > Conclui o Curso de pós-graduação em Relações Internacionais (Curso de Estudos Islâmicos, pela Universidade Internacional de Lisboa);

2001/05 > Concluiu o doutoramento em História contemporânea na Universidade Clássica de Lisboa e aguarda para breve a arguição respectiva [provavelmente em Outubro de 2006].


3. ACÇÕES DE FORMAÇÃO

1989/00 > Participou na cidade do Porto num Seminário promovido pela Embaixada de Angola sobre “O desenvolvimento da Literatura e das Ciências Sociais nos PALOP";

1990 > Participou em Vila Real, Trás – os – Montes, Portugal, num seminário sobre a metodologia de investigação em Ciências Sociais, promovido pela Universidade de Trás–os–Montes;

1990 > Promovido pelo INEP, participou no Congresso Internacional “Bolama Caminho Longe”;

1990 > Promovido pelo INEP, participou num seminário sobre “Negociações e Estratégia”;

1990 > Promovido pelo INEP e Universidade Cheik Anta Diop, em Dakar, participa num seminário sobre "A investigação Histórica em África";

1991 > Participou no Instituto Científico Tropical de Lisboa num seminário sobre a problemática da investigação social em África;

1991 > Participou na Universidade Cheik Anta Diop, Dakar num seminário promovido pela CODESRIA, sobre a metodologia de investigação histórica em África;

1992 > Participou numa acção de formação promovida pela SOLIDAMI, Bissau, sobre a elaboração, gestão e seguimento de Projectos;

1993> Participou num seminário promovido pela Radda Barnen em Dakar sobre a Aplicação da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito das Crianças;

1993> Participou em Dakar num seminário promovido pelo ENDA TIERS MONDE sobre a Gestão de Projectos sociais e Abordagem Participativa;

199 > 00/Participou em Abidjan, Costa do Marfim, numa acção de formação sobre a elaboração, gestão e seguimentos de Projectos;

1996> Participou em Portugal em vários seminários sobre a problemática da criança;

1996 > Promovida pela UNICEF – BISSAU, participou numa acção de formação dos formadores em matéria de Planificação Estratégica por objectivos e Avaliação de Projectos;

1997 > Participou em Bissau numa acção de formação promovido pela AMIC sobre "A situação das crianças em situação particularmente difícil: crianças de rua, crianças trabalhadoras e crianças desprovidas de meio familiar adequado";

1997 > Promovido pela L.G.D.H. e Acção Penal Internacional, participou num seminário sobre "Os fundamentos jurídico – internacional dos Direitos Humanos";

Participação em Maputo na conferência sobre a produção do saber histórico na África Lusófona, organizada pela Universidade Eduardo Mondlane.

1997 > Participou em Lisboa num Congresso Internacional de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa, promovido pelo Comissão para a comemoração dos descobrimentos portugueses;

1998 > Participou em Lisboa num seminário sobre" A indivisibilidade dos Direitos Humanos, promovido pela CIVITAS";

1998> 0Participação em Maputo, na qualidade de consultor da Amnistia Internacional, na colecta de informações e elaboração do Relatório sobre a situação dos Direitos Humanos em Moçambique;

1998 > Participação em Luanda, na qualidade de consultor da Amnistia Internacional, na colecta de informações e elaboração do Relatório sobre a situação dos Direitos Humanos em Moçambique;

1999 > Promovido pelo Centro de Estudos Africanos do ISCTE, participou numa Conferência de Reflexão sobre o conflito político – militar, subordinada ao tema “A Guiné – Bissau na encruzilhada";

2000 > Promovido pela Câmara Municipal de Belo Horizonte – Brasil, participou numa Congresso internacional sobre as literaturas de Língua Portuguesa;

2000 > A convite da Embaixada de Portugal na Guiné – Bissau e da Fundação "Mário Soares", deu uma conferência subordinada ao tema: "A Actualidade do pensamento político de Amílcar Cabral".

2003 > Participação em Durban, África do Sul, na III Convenção Mundial dos activistas dos Direitos Humanos, organizado pela WMD (World Movement for Democracy);

2005 > Participação em Lagos, Nigéria, no Seminário de planificação estratégica do African Democracy Fórum;

Participou em Lagos, Nigéria, em Agosto 2005, na II Reunião da Africain Democracy Forum;

2006 > Participou em Istambul, Turquia, na IVª Assembleia da World Movement for Democracy, ocorrida em Março de 2006.



4. EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL

1976/79 > Trabalhou como professor primário em Canchungo e Bissau;

1979 > Trabalhou como professor na Escola "Justado Vieira", do Ensino Básico Complementar e redactor da Revista do Ministério da Educação;

1980/81 > Trabalhou como professor do Liceu Regional de Bafatá, onde desempenhou a função do Presidente do Conselho Técnico;

1986/88 > Trabalhou como investigador do extinto Instituto de Cultura e Língua Portuguesa (actual Instituto Camões);

1988/89 > Trabalhou na Embaixada de Angola em Portugal como assessor do Departamento Cultural;

1989/91 > Trabalhou como investigador permanente do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa da Guiné-Bissau), onde actualmente é investigador associado;

1991 > Trabalhou como consultor nas pesquisas tendentes ao zoneamento da Guiné–Bissau, pela da UICN – União Internacional para a conservação da natureza;

1991 > Trabalhou como Consultor da USAID no estudo "Mercado de Castanha de Cajú” na Guiné – Bissau;

1991/94 > Trabalhou como Director Comercial do "Geta–Bissau", empresa privada;

Desde 1995 que vem desempenhando as funções de comentador político junto à imprensa guineense e internacional: Rádio Nacional da Guiné–Bissau, Rádio “Pindjiguiti”, Rádio “Bombolom”, Diário de Bissau,“RDP África”, Rádio Renascença Internacional, RTP África, Voz de América e BBC.

1994/96 > Desempenhou as funções de Director do mensário "Baguera", órgão de informação geral;

1994~/96 > Trabalhou como Coordenador de Projectos da AMIC – Associação dos amigos da Criança;

1994/96 > Dirigiu várias acções de formação de formadores em Bissau e no interior do país, em matéria de gestão participativa, organização comunitária e Convenção das Nações Unidas sobre o Direito das Crianças;

1994/95 > Trabalhou como consultor da Radda Barnen na elaboração do estudo sobre "A situação das crianças Fulas, Mandingas, balantas e papel";
. 1995– 97/Desempenhou as funções de Director da "Tcholoná", na altura a única Revista cultural da Guiné – Bissau;

1996 > Trabalhou como consultor da PLAN INTERNATIONAL – Planificação Estratégica e Programação do novo ciclo de acções e Projectos;

1996 > Trabalhou em Bordeaux e Paris como consultor da editora Nathan e Escola Internacional de Bordeaux na elaboração como co-autor do livro "Anthologie Littéraire de L' Afrique de l'Ouest";

1996 > Trabalhou como consultor da UNICEF – Planificação Estratégica por objectivos e Programação do um novo ciclo de acções e Projectos;

1996 > Trabalhou como consultor na Planificação Estratégica por objectivos para o FNUAP, onde teve responsabilidades pelo sector "Advocacy (Plaidoyer)";

1995/97 > Trabalhou como Coordenador de Projectos da Liga Guineense dos Direitos Humanos;

2004/06 > Director da Revista “Tcholoná”, única Revista Cultural existente na Guiné-Bissau;

1997/00 > Desempenhou as funções de Vice – presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos;

1997/00 > Autor de inúmeros programas radiofónicos de interesse público e pesquisa histórica: Rádio Difusão Nacional da Guiné – Bissau e Rádio Pindjiguiti;

1997/98 > Trabalhou como investigador do Projecto de Pesquisa da UNESCO, com sede em Cabo – Verde, e intitulado "Projecto de Salvaguarda do Património Histórico da África Contemporânea – os casos da luta de libertação da Guiné–Bissau e Cabo–Verde";

1998/00 > Trabalhou como consultor da Amnistia Internacional em Moçambique e Joanesburgo, África do Sul, tendo participado na elaboração do relatório de 1998 sobre os direitos Humanos em Moçambique;

Após o conflito armado de 1998, trabalhou na área de Projectos como consultor contratado da AMIC (Associação dos amigos da Criança) e L.G.D.H (Liga Guineense dos Direitos Humanos;

1999/01 > Passou a assumir as funções de Coordenador do Projecto SPHAC (Salvaguarda do Património Histórico da África Contemporânea) com sede em Cabo–Verde, de que resultou a elaboração do livro do Presidente Aristides Pereira intitulado“, Uma Luta, Um Partido, Dois países;

Prelector de várias conferências, seminários e colóquios na Guiné – Bissau, Portugal, Brasil, Moçambique e no estrangeiro sobre assuntos africanos em geral e guineense em particular (Dakar, Conakry, Abidjan, Praia);

1998/00 > É actualmente é doutorando em História Contemporânea pela Universidade Clássica de Lisboa (Faculdade Letras de Lisboa), sob a temática “Guerra Colonial da Guiné versus Luta de libertação Nacional (1961 – 1974) ;

É actualmente Secretário Executivo da Guineáspora – Fórum Mundial de Guineenses na Diáspora;

2003 – .05/Membro do “Management Committee” do ADF (Africain Democracy Forum)


5. TRABALHOS PUBLICADOS

1976/81 > Autor de inúmeros artigos na extinta revista do Ministério da Educação Nacional;

1976/81 > Autor de vários artigos e textos de análise e crítica literária publicados no trissemanário "Nô Pintcha”;

1981/89 > Autor de vários estudos sobre a comunidade africana em Portugal dispersos em jornais, revistas de especialidade (extinto jornal “África” e Angolê Artes & Letras”);

1986 > Monografia de final delicenciatura "A Literatura Colonial Portuguesa – 1850 aos nossos dias", apresentada à Faculdade de Letras de Lisboa, Universidade Clássica;

1986/89 > Autor de inúmeros estudos literários publicados na Revista "Ler", Lisboa.

1989/ 91 > Autor de vários estudos publicados sobre a literatura colonial guineense, publicados na Revista “Soronda”, do INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, da Guiné-Bissau;

1989/91 > Autor de vários monografias de índole histórica-sociológica sobre a Guiné–Bissau, publicadas na Revista “Soronda” do INEP.

1990 > Autor do livro "Bolama–Caminho Longe"; INEP, 1990;

1995/00 > Autor de vários Relatórios da L.G.D.G. sobre a situação dos Direitos Humanos nos PALOP

1996/98 > Autor de vários Relatórios da L.G.D.G. (Liga Guineense dos Direitos Humanos) sobre a situação dos Direitos Humanos nos PALOP;

1996 > Co–autor da «Anthologie Littéraire de L’AFRIQUE de l' Oest», Nathan, Paris, 1996;

1997 > Co-autor do livro, “Bolama, Caminho Longe – Entre a cobiça dos homens e a Esperança”, INEP,1994.

1989/91 > Assíduo articulista do jornal "Correio de Bissau";

1991/94 > Assíduo articulista do jornal "Baguera";

1996/01 > Assíduo articulista do jornal Diário de Bissau;

1989/01 > Autor de inúmeros prefácios de obras alusivas à Guiné – Bissau: “Eco do Pranto”, colectânea de poemas dedicados a criança em1992; “Contos de N`Nori”, de Carlos Edmilson M. Vieira, 2000; e “Stera di Thur” de Rui Jorge, 200;

Colaborador de revistas e jornais publicados em Portugal: “Lusófono” e “África Lusófona”;

Assíduo articulista do jornal “Público” em Portugal;

Autor de vários textos de recensão crítica em revistas de especialidade histórica e literária.


6. LÍNGUAS

Crioulo da Guiné – Bissau e Cabo-Verde – Fala e escreve Muito Bem;

Português – Fala e escreve Muito Bem;

Francês – Fala e escreve Bem;

Inglês – fala, lê e escreve razoavelmente.



Novembro de 2005

Leopoldo Amado

Guiné 63/74 - P840: O valente Sargento Enfermeiro Cipriano, da CCAÇ 5, morto em Nova Lamego (José Martins)

Guiné > Zona Leste > Gabu > Canjadude > 1969 > CCAÇ 5 - Os Gatos Pretos (1968/70) > O Fur Mil Transmissões Martins com o seu amigo Sargento Cipriano.

Texto e foto do © José Martins (2006)

Caro Luís

Como já te tinha referido, tive o privilégio de receber originais para entregar aos arquivos históricos.

Entretanto, aquele material que não sabemos quando estará disponivel para os olhos dos estudiosos, foi visto e revisto, e dele respiguei alguns elementos, que muito irão servir nas minhas investigações.

Hoje vou mandar um texto, que não sendo da minha autoria solicitei a competente autorização aos autores para o fazer, apesar de ter sido escrito em 1970, portanto há mais de 35 anos (1).

É uma homenagem a que me associo, porque conforme foto anexa [a inserir mais tarde, por dificuldades técnicas,imputáveis ao servidor, o Blogger.com], era amigo e camarada do homenageado.

Se por acaso o filho do sargento Cipriano ler estas linhas ou o texto, acho que, como nosso camarada de armas, que ele é de facto já que é militar, entre em contacto com a tertúlia.

Um forte abraço
José Martins
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O SARGENTO CIPRIANO (por Pacífico dos Reis e Martins Gago)


Lembro... Como poderia deixar de evocar aquele espírito endiabrado que, a cada frase, nas horas de convívio, nos fazia rir a todos! A sua boa disposição constante e o elevado sentido de camaradagem que em cada acção brotava do seu ser, tornaram-no querido, indispensável para cada hora menos amarga no clima de guerra.

Preto, com a estrela de manjaco a orientar o dinamismo de uma vida inteiramente dedicada à sua profissão que amava, e aos filhos, dois botões de rosa ornamentando o jardim imenso das suas ambições, o sargento Cipriano Mendes Pereira, foi há dias barbaramente assassinado pelos sanguinários vampiros do PAIGC.

Militar firme na sua ideologia, sempre desfez as variadas tentativas que o IN levou a cabo para o fazer ingressar nas suas hostes, raptando-lhe a mãe para o obrigarem a contrariar os seus próprios desígnios. Mas nem assim... Tudo era em vão para demolir aquele caracter formado na rocha do ódio aos inimigos da paz.

Lembro... Como o poderei esquecer!... Aquela tarde do dia 27 de Junho de 1969 e aquela manhã brumosa do dia seguinte, em que o sargento Cipriano de sacola de medicamentos ao ombro e de Walther em punho, encabeçava os Gatos Pretos na perseguição do IN. Os seus gritos de incitamento ouviam-se à distância e aquela frase imortal que a saudade jamais deixará esquecer Gato Preto agarra à mão brotava da sua boca, qual torrente tumultuosa envolvendo e destruindo o moral inimigo.

Lembro... Tanto tenho ainda a lembrar!... Aquela manhã do dia 12 de Setembro desse fatídico ano de 69. A coluna que seguia para Nova Lamego recomeçou o andamento após a picagem da zona perigosa e terminados os flancos necessários à segurança da estrada. Escassos metros percorridos, a viatura rebenta-minas salta da picada entre nuvens negras de TNT, enquanto um fragor dantesco terminava a obra traiçoeira de um IN cobarde que não mostrava a cara. Um silêncio mortal se seguiu nos momentos de surpresa e pasmo dos componentes da coluna. Uma voz forte, enérgica, decidida, se ouviu algum tempo depois na retaguarda e umas pernas ágeis de homem que conhecia o seu dever, se aproximaram correndo do local do sinistro, dando assistência imediata e eficaz à dezena de feridos que juncavam o solo.

O sargento Cipriano era assim... Ao ouvir o rebentamento pegou no saco dos medicamentos e seu olhar ao perigo, correu estrada acima, os dez quilómetros que separavam o aquartelamento do local onde ele sabia precisar de combater a morte.

O sargento Cipriano morreu e, com ele, jazem no escuro do túmulo o militar de rara grandeza, o enfermeiro conhecedor e humano, o homem simples amante da paz e da justiça, o pai estremoso e o suporte de um lar extremamente feliz da nossa Guiné.

Sucumbiu às mãos daqueles que tantas vezes combateu... O seu corpo é hoje pasto de vermes, mas o seu eu, a sua personalidade, continuará na mente daqueles que o conheceram, desafiando o mundo da traição, do terror, da mentira e conduzindo, com o seu exemplo, os homens para o verdadeiro caminho da honra e do dever.

Capitão Pacífico dos Reis

Alferes Miliciano Martins Gago.


Fonte: © RONCO – Jornal do C.I.M. – Bolama. Nº 52. ANO IV. 1 de Janeiro de 1970

O 2º Sargento Enfermeiro Cipriano com o Furriel Trms Martins
Foto do arquivo de José Martins – Dezembro de 1969
___________

Notas de J.M.:


Elementos recolhidos da História da CCaç 5 – Gatos Pretos – Canjadude. Pesquisa e compilação de José Martins – Fur Mil Tms Inf (1968/1970)

Cipriano Mendes Pereira, 2º Sargento Enfermeiro, número mecanográfico 82034859, já se encontrava ao serviço da Companhia em finais de 1969, tendo assumindo as funções de Comandante da Secção de Saúde.

Além das actividades inerentes à sua função, colaborou na construção do edifício destinado a Posto de Socorros e Enfermaria. Foi também professor das escolas primárias das crianças que residiam na povoação.

Foi abatido ao efectivo da Unidade em 10 de Outubro de 1970 por ter sido transferido para o Hospital Militar 241 / CTIG, em Bissau.

Veio a falecer em combate em 16 de Novembro de 1970, durante a flagelação a Nova Lamego.

O filho do sargento Cipriano é hoje oficial do Exército da Guiné-Bissau, provavelmente já com a patente de Major ou Tenente-Coronel.
O meu capitão Pacífico dos Reis é hoje coronel, na reserva.


Comentário de L.G.:

A expressão "barbaramente assassinado pelos sanguinários vampiros do PAIGC" hoje seria excessiva: no entanto, ela tem de ser entendida no contexto da época (1970), do calor da batalha e da dor pela perda de um camarada, mas também da função político-ideológica, propagandística, que cabia a um jornal de caserna como o Ronco (publicado desde 1969 pelo Centro de Instrução Militar, Bolama – SPM 0058).

Naturalmente que os inimigos, em todas as guerras, não se tratam com mimos. E o papel dos oficiais, com funções de comando ou liderança a nível operacional, era também o de criar e manter o ódio e a raiva que levem um soldado a matar outro soldado, visto como (ou transformado em) seu inimigo, para vingar um camarada morto...

Sem a oportuna nota do José Martins, ficaríamos com a ideia (errada) que o Sargento Cipriano tinha sido feito prisioneiro pelos tipos do PAIGC e depois executado, a sangue frio, quando na realidade ele morreu em combate, na sequência de um ataque ao aquartelamento do Gabu (Nova Lamego), o que não é menos lamentável.
Aqui fica esta observação, feita apenas dentro do espírito das regras da nossa tertúlia, que são basicamente as do bom senso, do bom gosto, da tolerância, da convivialidade, do respeito pela verdade dos factos e pelo rigor historiográfico (que também queremos ajudar a construir)...
A guerra foi dura, muita dura, para todos nós, tugas e turras... Quarenta anos depois já não é a altura, já não temos idade sequer, para ir atrás das fantasias dos que quiseram utilizar-nos, dos que nos utilizaram, mesmo com as melhores intenções do mundo, em nome de coisas e de valores que até podiam ser sagrados para alguns de nós: a Pátria, a Nação, a Independência, a Liberdade... (LG)