terça-feira, 6 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2815: Tabanca Grande (67): Abílio Delgado, Zé Carioca e Sérgio Sousa (Os Gringos de Guileje) (CCAÇ 3477, Nov 1971/ Dez 1972)

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008) > 2 de Março > Intervenção, emocionado, do português Abílio Delgado, que foi comandante da penúltima unidade de quadrícula de Guileje, a CCAÇ 3477 (Nov 1971/Dez 1972), que foi substituída pela CCAV 8350, os Piratas de Guileje (Dez 1972/Mai 1973). Foi, aos 21 anos, o mais jovem capitão, miliciano, do Exército Português. Vive na Ericeira. Passa a integrar a nossa Tabanca Grande.

Vídeo (1' 49''): ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojado em: You Tube >Nhabijoes


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > 2 de Março de 2008 > Três homens com um ar de felicidade... Ei-los aqui fotografados com um tesouro, a estatueta, em metal, da santa protectora dos Gringos de Guileje, encontrada nas escavações arqueológicas do antigo aquartelamento de Guileje... Da esquerda para a direita os valorosos representantes da penúltima unidade quadrícula de Guileje, a CCAÇ 3477 (Nov 1971 / Dez 1972): José Carioca, Abílio Delgado e Sérgio Sousa... O Zé Carioca é actor de teatro (amador ?) e sei que vive em Cascais.


Guiné-Bissau > Bissalanca > Aeroporto Osvaldo Vieira > 29 de Fevereiro de 2008 > O Pepito ficou visivelmente feliz, ao receber de braços abertos, os três Gringos de Guileje, que vieram propositadamente para participar no Simpósio Internacional de Guileje. Em primeiro plano, de costas, o Sérgio Sousa.

Guiné-Bissau >Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008) > Sessão inaugural, 3 de Março de 2008 > Em primeiro plano, o José Rocha e os três Gringos.

Fotos e legendas: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Acampamento Osvaldo Vieira > 2 de Março de 2008 > O editor Luís Graça, de joelhos, fotografando um antigo guerrilheiro do PAIGC, dando explicações sobre a organização militar do PAIGC. Foto enviada pelo Zé Carioca.

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Acampamento Osvaldo Vieira > 2 de Março de 2008 > No primeiro plano, ao centro, o Zé Carioca, ladeado à sua direita pela esposa do Pepito, Cristina, e à sua esquerda pela Sra. Ministra dos Combatentes da Liberdade da Pátria... Na foto, vê-se ainda a Maria Alice Carneira, esposa do editor Luís Graçpa, bem como o Prof Luís Moita, de óculos escuros.

Fotos: ©
José António Carioca (2008). Direitos reservados.


1. Mensagem de José António Carioca, com data de 2 de Maio:

Caro Camarada Luís

Nós, os Gringos de Guileje, vamos fazer o nosso almoço no dia 31 de Maio. Eu gostaria que o meu amigo estivesse presente (com a sua esposa, se assim o desejar obviamente). Entretanto, como também tirou imensas fotos, gostaria de saber se tem algumas onde possam estar os representantes dos Gringos e me possas enviar. Eu gostaria de fazer uma apresentação aos meus camaradas no dia do almoço.

Pela foto que lhe envio, já é mais fácil de me identificar porque na foto onde aparece a sua esposa, eu estou ao lado da Sra. Ministra e da esposa do Pepito.

Eu gostaria de poder colaborar também no seu blogue, Luís Graça e Camaradas da Guiné, mas não sei como o fazer por não dominar muito bem a informática.

Tenho algumas notícias que talvez possam interessar, que é mais propriamente um projecto de intercâmbio cultural com a Guiné Bissau. Numa reunião que já houve aqui em Cascais, com o Pepito e o meu grupo [de teatro], estamos neste momento numa fase avançada desse projecto, penssamos que vai ser possível irmos a Bissau em Setembro deste ano.

Fico então à espera duma resposta sua, tanto para a sua comparência no almoço como a possível troca de fotos.

Um abraço,

José Carioca,
ex-Fur Mil Trms e Cripto,
CCAÇ 3477,
Gringos de Guileje
Guileje (1971/72)

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Zé Carioca, amigo e camarada:

(i) Fico feliz por me teres contactado e enviado 2 fotos destes dias maravilhosos que passámos juntos no sul da Guiné-Bissau e em Bissau, entre 29 de Fevereiro e 7 de Março de 008;

(ii) Fico encantado por pedires guarida na nossa Tabanca Grande: como te disse na altura, era minha intenção propor e apadrinhar a tua candidatura a membro (activo) do nosso blogue... A ti, ao Abílio Delgado e ao Sérgio Sousa... Podes confirmar que te fiz ou vos fiz a proposta e a promessa. E que tive a anuência dos três.

(iii) Sobre o teu amável convite para participar na festa de convívio dos Gringos, tenho a dizer o seguinte: fico-te grato pela ideia e pela intenção; mas acontece que tenho convite parecido, anterior ao teu, de uma outra unidade; por razões de calendário e compromissos familiares, não posso dizer, desde já, o que vou fazer no dia 31 de Maio; infelizmente, não tenho o dom da ubiquidade; se não for este ano, poderá ser numa próxima; de resto, temos, nós próprios, a malta do nosso blogue, o nosso III Encontro Nacional, em Monte Real, já no dia 17 de Março para o qual tu, o Abílio e o Sérgio, ficam automaticamente convidados.

(iv) Por uma razão ou outra, só hoje, ao ler o teu mail, é que dei conta de que estou em falta contigo e com os teus camaradas Gringos, o Abílio e o Sérgio... O que é prometido é devido... A partir de hoje, podes, com todo o mérito, considerar-te membro da nossa tertúlia. Tu e os teus dois camaradas. Ir a Guileje é como ir a Meca. E ter vivido em Guileje um ano, já é obra. Se fosses general, dava-te logo mais uam estrela...

(v) Infelizmente, não tive tanto tempo quanto desejaria para falarmos, com profundidade, calma e cumplicidade, do teu tempo passado, presente e futuro. Sei que estás ligado ao teatro. É uma expressão de arte de que gosto muito. Fico contente por saber que já tens ideias e projectos concretos no domínio do intercâmbio cultural entre o teu grupo de Cascais e a malta de Bissau (presumo que se trate do Grupo de Teatro Os Fidalgos, que eu também gostaria de poder ajudar).

(vi) Para já, vamos manter-nos em contacto, pelo mail do blogue. Algumas fotos tuas e dos teus camaradas têm vindo a ser publicadas no nosso blogue. Preciso agora de fotas vossas, de Guileje, de 1972. Sejam bem-vindos à nossa Tabanca Grande, tu, o Abílio e o Sérgio. Vamos pôr-vos na lista do nosso correio electrónico.

Um Alfa Bravo. Luís Graça

___________

Nota de L.G.:

(1) Sobre os Gringos de Guileje:

14 de Dezembro de 2005 >
Guiné 63/74 - CCCLXVII: Guileje, terra de fé e de coragem (Luís Graça)

11 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P864: Unidades aquarteladas em Guileje até 1973 (Nuno Rubim / Pepito)

28 de Junho de 2007 >
Guiné 63/74 - P1894: Louvores e punições (2): CCAÇ 3477, Os Gringos de Guileje (Amaro Samúdio)

10 de Outubro de 2006 >
Guiné 63/74 - P1162: Guileje: CCAÇ 3477, os Gringos Açorianos (Amaro Munhoz Samúdio)

18 de Novembro de 2006 >
Guiné 63/74 - P1293: Guileje: do chimpanzé-bébé aos abrigos à prova do 122 mm (Amaro Munhoz Samúdio, CCAÇ 3477)

22 de Junho de 2007 >
Guiné 63/74 - P1869: Convívios (19): Os Gringos de Guileje, a açoriana CCAÇ 3477, encontram-se ao fim de 33 anos! (Amaro Samúdio).

23 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2674: Recortes de imprensa (3): José Carlos Marques, do Correio da Manhã, em Gandembel e Guileje, embeded nas NT


(...) " O regresso a Guiledje é um momento sentido por outros três ex-combatentes. Abílio Delgado, Sérgio Sousa e José Carioca cumpriram ali serviço militar entre Setembro de 1971 e Julho de 1973. Com 21 anos, Abílio Delgado, o mais jovem capitão do Exército português, comandava a companhia dos Gringos de Guiledje. 150 homens habituaram-se a viver sob ameaça permanente:

"-O período mais longo que estivemos sem ser bombardeados não passou de 15 dias. Havia sempre morteiros a cair e passávamos a vida escondidos nos abrigos - lembra.

"A companhia teve duas baixas em combate, mas conseguiu aguentar o quartel até ao fim da comissão. Foram a última companhia a consegui-lo. Os militares que os substituíram, os Piratas de Guiledje, comandados por Coutinho e Lima, abandonaram" (...).


Guiné 63/74 - P2814: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (4):Carta ao Idálio Reis, ao Hugo Guerra e aos seus camaradas de Gandembel


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Gandembel > 1 de Março de 2008 > Gandembel, terra maldita que os próprios guineenses não quiseram ocupar, depois da guerra...



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Ponte Balana > 1 de Março de 2008

Fotos: © José Teixeira (2008). Direitos reservados.


1. Texto enviado pelo Zé Teixeira, em 11 de Abril último. Recorde-se queo nosso Zé Teixeira foi 1.º Cabo Enfermeiro, na CCAÇ 2381( Buba, Quebo, Mampatá e Empada ,1968/70). E deixou-nos um notável documento, escrito, com as notas do seu diário, já publicadas na 1ª Série do nosso blogue: vd. poste de 14 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVI: O meu diário (Zé Teixeira) (fim): Confesso que vi e vivi.


Uma Carta para o Idálio Reis, Hugo Guerra e seus camaradas de Gandembel

Bons amigos e camaradas.

Após este meu regresso à Guiné (1), aquela, que vós conhecestes tão bem, desde Aldeia Formosa a Guileje, tenho passado um tempo em reflexão e a saborear os belos e excelentes momentos que lá vivi, revivendo outros que em tempos idos foram bem dolorosos.

Claro que durante a minha estadia, por aquelas paragens, todos vós, meus companheiros de algumas jornadas, quer a caminho de Gandembel, quer em Buba na construção da nova estrada para Aldeia Formosa, estiveram bem presentes na minha memória. Recordei também a Companhia dos lenços azuis que connosco partilhou momentos bem difíceis na aventura que nos foi comum.

De Aldeia Formosa em diante até Gandembel, parece que nada mudou. Até algumas árvores ainda lá estavam, apesar da picada ter sido deslocada em alguns sítios, sobretudo a partir do cruzamento de Mampatá, agora um pouco mais atrás, em Bacar Dado e na Chamarra.

A seguir a Chamarra, a recta que nos leva a Changue Laia, lugar de tão tristes recordações, lá estava, agora cheia de moranças com gentes e terrenos de cultivo. Depois vem uma pequena subida e uma ligeira curva. A curva fatídica onde estavam os buracos dos fornilhos e o campo de minas. Agora gente e mais gente sorridente a dizer-nos adeus. As crianças a correrem atrás da viatura sem medo das minas que lá foram outrora semeadas.

Ponte Balana lá no fundo, a dar-nos passagem, sobre o rio de água límpida. Seguiu-se Gamdembel. Lá estava o pequeno desvio da picada e a porta de armas.

Em cima dos restos dessa caserna, eu recordei, com carinho, todos os que ali viveram, por ali passaram, ali sofreram e sobretudo os que deixaram o seu sangue regar aquelas terras. Das poucas terras, onde ainda ninguém da Guiné ousou voltar e transformar num espaço de vida humana.

Ali deixei uma pequena planta que me acompanhou desde o Porto (2) e por lá ficará, espero eu, por tempos sem fim a relembrar aos vindouros que ali se travaram duras lutas de sobrevivência. Ali, muita gente viu a morte à sua frente, muitos de vós pensaram, quantas vezes ,que não sairiam de lá vivos.

Acto simples, extremamente simbólico. Tal como prometera um dia Tabanca Grande ao escrever sobre a vossa aventura.

Devo dizer-vos que este meu desejo foi acarinhado por todos os que de algum modo estavam envolvidos na dinâmica do Simpósio, a quem devo um profundo agradecimento.

Como compreenderão, não consigo passar ao papel o que senti. A emoção tomou posse de mim. As pernas tremiam-me, a boca recusava a emitir as palavras que saíam do coração.

Pude, pela primeira vez, pisar sem medo, aquele espaço, andar por cima das pedras que vocês arrastaram e levantaram umas em cima de outras para construírem os abrigos da vossa salvação.

Seguiu-se a picada para Guiledje. Com muita alegria vi, umas centenas de metros adiante a primeira tabanca de gente que acabada a guerra se instalou naquelas terras. Dali até Guileje, tal como da Chamarra a Ponte Balana, um e outro lado da picada – O carreiro da morte ou o Caminho da liberdade – está cheia de tabancas, de vida (3). Caminho que em tempos ainda vivos na nossa memória, cheirava a pólvora e a morte e só ao pensar que por imperativos de ordem superior se tinha de pisar, era suficiente para se encomendar a alma a Deus e pedir a sua protecção.

A picada levou-nos até Guileje, terra que também foi vosso abrigo e daí a Imberém, até às margens do rio Cacine, mais propriamente Canamine. Antes pudemos visitar no interior da mata do Cantanhez o local onde esteve sediado uma base inimiga, comandada pelo Oswaldo Vieira (4). Através de pequenos jogos cénicos foi-nos dada a possibilidade de apreender algumas das técnicas e estratégias dos guerrilheiros na sua luta pela independência.






Guiné-Bissau > Região de Tombali > Gandembel > 1 de Março de 2008 > Restos do nosso aquartelamento...

Fotos: ©
José Teixeira (2008). Direitos reservados.


Por fim, com alguns companheiros de jornada fui visitar Cabedú [vd. próximas notas soltas] e participar na inauguração de um fontenário de água límpida, tirada de um poço através de um motor alimentado a energia solar, numa tabanca que desde há trinta e cinco anos, ou seja desde que a tropa branca os abandonou, não tinham água corrente própria para beber. Uma população, como se lembram com certeza do tempo das vossas andanças pela Guiné, comunicativa e expansiva, dava largas à sua alegria, cantando, e dançando por todas as terras por onde passamos.

Antigos combatentes, que ao nosso lado expuseram a sua vida tal como nós, numa guerra que hoje põe muita gente a interrogar-se: Para quê!?

Esses, como o Sóri Bari, o Mamadu Djaló e outro camarada, actualmente a viverem em Catió, donde partiram no dia anterior para participar na festa e localizar antigos companheiros brancos que a seu lado lutaram e também os filhos dos que perderam a vida, casos do Alfa Baldé, filho do Aliu Baldé de Mampatá e a Cadidjatu Candé, filha do Davo Candé de Quebo (este, assassinado no pós-guerra, por se ter batido pelo lado errado) (4).

O Sóri Bari, foi meu conterrâneo em Mampatá e o Mamadu Djaló mais o seu outro companheiro (Este andou trinta e dois anos fugido no Senegal) cruzaram-se comigo e convosco em Buba nos trabalhos da estrada.

Será que conseguis imaginar a alegria que estes homens deixaram transparecer no seu rosto, quando descobriram gente que palmilhou aquelas terras com eles! Eles que vieram de tão longe a pé à procura de dgenti amiga! E eu como me senti! Foi mais um grande momento de alegria e emoção indiscritível.

Mas havia também outro tipo de combatentes, muitos mesmo, que do outro lado da barricada se bateram contra nós, atacaram Guiledge, Gandembel e Balana, como o Maunde Baldê que em Agosto de 1968 me atacou em Mampatá em plena hora do almoço, com vontade de nos apanhar à mão, conforme escrevi no meu diário.

Novembro, 1968 / Mampatá /3

O dia 3 de Novembro não será esquecido pelos "Amarelos de Mampatá" pois tivemos de travar uma luta de vida ou de morte com o IN que aproveitou a hora do almoço em que os militares se afastaram do seu posto de defesa para buscar na cozinha alimentação, para tentar entrar em Mampatá.

De algum modo eu fui o responsável pela situação criada, pois incentivei um sentinela durante a noite a mandar um tiro na direcção de uma vaca que estava entre as duas faixas de arame farpado e tocava neste, provocando o tilintar das garrafas que lá tínhamos colocado para não sermos surpreendidos pelo IN a tentar entrar pela calada da noite cortando o arame. Esta minha atitude passou-se durante a minha hora de ronda e o sentinela assim fez pouco depois, aparecendo de manhã uma vaca com um buraco numa coxa. Claro que o proprietário o Régulo Alfero Aliu (Alferes da Milícia) vendeu a vaca à tropa.

Há mais de um mês que não comemos carne, porque os Africanos se recusam a vender qualquer animal. Assim foi fácil convencer o proprietário a vender a vaca ferida, mas ficou-nos caro.

Praticamente todos os postos de sentinela ficaram abandonados à hora do almoço o que não é habitual, mas o estranho foi o turra saber exactamente o que se estava a passar e atacou.

Quase todos os soldados tiveram de correr para as suas posições debaixo de fogo e durante quinze minutos a luta foi terrível com eles junto ao arame com fogo cerrado. Chegamos a ter a sensação que estavam cá dentro o que não se verificou graças à nossa capacidade de resistência e por sorte também. Ao tentarem entrar pelo lado de Buba, o Silva Algarvio que não tinha vindo buscar a comida ao refeitório por estar doente, aguentou-os até chegarem reforços e obrigou-os a retirar. Aliás foi ele que deu o sinal. Ao ver um grupo de africanos com armas que não eram a velha mauser a tentarem forçarem a porta em rede de arame farpado, estranhou e abriu fogo, depois... foi, cantinas de comida pelo ar e umas loucas correrias para os abrigos de protecção. Segui-se o chocolate do costume. Os assaltantes recuaram para selva e o fogo continuou

Onze tabancas ficaram destruídas pelo fogo, pois utilizaram balas incendiárias e também destruiram o paiol. Fiquei assustado e desorientado porque dada a intensidade do fogo e a estratégia adoptada pelo IN contava ter muito que fazer com os feridos talvez mortos, atendendo a que ninguém contava com tal surpresa e os postos estavam desguarnecidos e sobretudo porque tinha pouco material de socorro (apenas 2 sacos de soro). Ainda debaixo de fogo saí do abrigo onde me protegera e corri pela Tabanca à procura de feridos, junto dos abrigos subterrâneos onde se abrigara a população. Felizmente nada aconteceu, foi só fogo de vista susto e prejuízos materiais. Graças a Deus.

Pergunto-me como que a população não foi atingida e as suas casas foram queimadas? Ataque combinado?

Notamos que o catequista muçulmano saiu de manhã cedo para bolhanha, o que é estranho pois costuma estar sempre na tabanca a ensinar os putos e só voltou muito depois do ataque. Temos de o trazer debaixo de olho, como disse o Alferes Belo depois de saber a sua ausência.

O Maiunde Baldê, ao aperceber-se que eu estivera em Mampatá, perguntou-me se em Novembro de 1968 estaria lá. Ao confirmar que sim, ele retorquiu: -Eu estive lá e fui dos que entrei para dentro do arame farpado, mas tive de fugir para não morrer. Vocês estavam cercados, mas não nos deixaram entrar...

Seguiu-se um abraço apertado de agradecimento a Deus por termos escapado e estarmos os dois vivos.

Muito interessante, no mínimo, foi o diálogo que mantive com um grupo de fulas, que fizeram a sua luta pela independência, na mata do Cantanhez e se encontraram comigo em Bissau durante as Conferências do Simpósio. Cruzaram-se convosco em muitos ataques a Gandembel e nas emboscadas que fizeram a vocês e a nós na estrada de Quebo/Gandembel.

Um deles, o Braima Camará, mostrou-se muito interessado em saber se eu tinha ida na coluna em que tivemos de levantar muitas minas, entre Chamarra e Ponte Balana, junto a uma bolanha (Changue Laia) em Agosto de 1968.

Felizmente não fui nessa coluna, mas foi muito grave o que se lá passou e o que aconteceu uns dias antes com a Companhia estacionada em Gandembel, que ao cair no campo de minas teve de retirar, levando creio que cinco mortos, retorqui.
- Pois... eu era sapador e recebi ordens para colocar essas minas! - disse-me, com um ar misto de culpado e de alegria por saber que eu não estivera lá.

O regresso de Imberém para Bissau ficou marcado pelas despedidas afectuosas daquelas gentes simples. Abraços e beijos não faltaram, pedidos para voltarmos, corridas atrás da viatura, Enfim. Pelo caminho – carreiro da morte – agora cheio de vida, com tabancas por toda a margem. Crianças e adultos, na berma gritavam portu, portu e acenavam dizendo adeus.

Imaginem, em pleno interior da Mata do Cantanhez, um missão de fransciscanos italianos com uma pequena fábrica de descasque de castanha caju!

Passamos Gandembel em silêncio e deparamos com Balana cheio de vida. Naquele bucólico lugar, o silêncio imperava. Duas jovens mulheres, vestidas estranhamente como era seu costume há quarenta anos atrás, lavavam a roupa de seus filhinhos debaixo da ponte. Desci até lá, fui recebido com sorrisos. Uma deles correu para mim, deu-me um beijo e disse: - Anda ver o poço. Uns metros ao lado estava o poço que suponho foram vocês que o construíram. Postou-se junto ao mesmo e ficou à espera que eu tirasse uma fotografia. Com um grande sorriso deixou-se abraçar, como que a dizer, vai em paz. A vida voltou a esta terra...

Muito mais há para dizer, mas não quero abusar da vossa paciência.

Um fraternal abraço deste camarada e de algum modo partilhou um pouco da vossa aventura na Guiné e teve a graça de lá poder voltar para rever terras e gentes, re(viver) cenas marcantes para a sua vida em plena juventude e viver grandes momentos que me acompanharão até ao fim da vida.

Podeis crer que nada do passado foi esquecido, bem pelo contrário, foi reavivado, mas esta visita permitiu-me afastar os fantasmas que me perseguiam. Agora tenho a visão de uma Guiné diferente, sem medos ou fantasmas, com vida pujante.

Continua pobre como era, talvez mais ainda, mas rica, muito rica nas pessoas com valores humanos, alegres, expansivos, solidários e sobretudo amorosos.

Zé Teixeira
_________

Notas dos editores:

(1) Vd. postes anteriores:

21 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2669: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (1): Desta vez fui voluntário e estou em paz comigo próprio

23 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2676: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (2): Um abraço de ermons e (más) recordações do Comandante Manecas

29 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2698: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (3): O Abdulai Djaló

(2) Vd. poste de 14 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2640: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (5): Um momento de grande emoção em Gandembel

(3) Vd. postes de:

16 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2650: Uma semana involvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (6): No coração do mítico corredor de Guiledje

17 de Março de 2008 >
Guine 63/74 - P2655: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (7): No corredor de Guiledje, com o Dauda Cassamá (I)

17 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2656: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (8): No corredor de Guiledje, com Dauda Cassamá (II)

(4) Vd. poste de 23 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2790: Quem pode ajudar a filha do nosso camarada Aliu Sada Candé? (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P2813: Convívios (55): CCAÇ 4150, em Fátima no passado dia 27 de Abril

CCAÇ 4150, Cumeré, Bigene e Guidaje, 1973/74



Foto de família dos ex-militares da CCAÇ 4150, presentes em Fátima no dia 27 de Abril de 2008.

Foto : © Albano Costa (2008) . Direitos reservados.

Recebemos no dia 3 de Maio de 2008 uma mensagem do camarada Albano Costa a dar conta do Encontro anual da CCAÇ 4150.

Caro Editor e co-editores

Foi no passado domingo, em Fátima, mais um convívio da CCAÇ 4150, só agora estou a dar a notícia um pouco atrasado, mas mais vale tarde do que nunca.
Estiveram reunidos no convívio trinta ex-combatentes e as suas respectivas famílias.

Não sei se é da crise ou não, só sei que somos muitos mais, e que faltaram, desculpando os que infelizmente já partiram e parece praga, agora cada ano que passa lá vem a má notícia de mais um colega que nos deixa.

O resto correu num ambiente de franca camaradagem, e com saúde para continuar, afinal ficou logo ali marcado o local para o próximo almoço, que irá ser na bonita cidade de Felgueiras, no norte de Portugal, terra de bom vinho e o celebre pão de ló.

Passe a publicidade, a organização do nosso convívio: o Ary e o Frade, antes de irmos para o restaurante deram-nos a conhecer uma aldeia recuperada, que fica na zona de S. Mamede (Fátima), que tem o nome de Pia do Urso, que eu irei lá voltar para ver melhor, porque no dia não deu tempo para muito.

Albano Costa
_________________

Nota dos editores:

(1) - Vd. poste de 10 de Abril de 2008> Guiné 63/74 - P2740: Convívios (49): CCAÇ 4150 em Fátima no dia 27 de Abril de 2008 (Albano Costa)

Guiné 63/74 - P2812: Tabanca Grande (66): João Dias da Silva, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 4150 (Guiné 1973/74)




João Dias da Silva
Ex-Alf Mil Op Esp
CCAÇ 4150
Cumeré, Bigene e Guidaje
1973/74


1. Em 21 de Abril de 2008, o nosso novo camarada João Dias da Silva enviava esta mensagem a Luís Graça:

Meu caro e amigo,
desculpe-me a familiaridade, Luís Graça.

Já há algum tempo que tive conhecimento deste blogue através de um amigo comum – o Albano Costa (CCAÇ 4150) –, mas, por esta ou aquela razão, que nem sei apontar, nunca me tinha predisposto a "fazer-lhe uma visita".

Antes de mais, uma apresentação muito sumária: chamo-me João Dias da Silva e fui alferes miliciano da CCAÇ 4150 (Cumeré, Bigene, Guidaje e Combis-Bissau), que nos finais de 1973 rumou a Guidaje e aí se manteve até meados do ano seguinte.

Em segundo lugar, quero manifestar, na sua pessoa, os meus sinceros e sentidos parabéns a todos quantos contribuem(ram) para esta página que é simplesmente fantástica (pelos conteúdos, pela apresentação, pela organização, pelo cuidado, enfim… pelo amor com que se fazem as coisas de que muito se gosta).
Muito obrigado.

Por último, a razão que, ao fim de tanto tempo, me levou a procurar-vos: é óbvio que a mola, que espoletou o impulso para quebrar a inércia, radica na Grande Reportagem sobre as exumações de Guidaje, que a SIC passou ontem no final do Jornal da Noite.

E porquê? Foi pena não ter sabido atempadamente, culpa minha por certo, de todo este movimento encabeçado pela Liga dos Combatentes, pois poderia, talvez, ter dado um pequeno contributo para complementar o croquis da zona das sepulturas.
É que, pouco depois de ter chegado a Guidaje fotografei o "Cemitério Militar de Guidaje", segundo a designação do citado documento, ou seja, pouco mais de meio ano sobre os enterros.

Embora tenha feito vários slydes nas áreas militar e civil, apenas um mostra especificamente o sítio das campas sinalizadas por cruzes de madeira.
Se, apesar de tudo, entender que poderá servir para algo, disponha.

Um abraço
João Dias da Silva


2. Em 24 de Abril de 2008 nova mensagem endereçada ao Blogue

Caros amigos

Com as visitas que tenho feito nos últimos dias ao blogue (o bichinho começa a corroer!) começo a aperceber-me do seu funcionamento e das normas de conduta e, a cada ida, mais visível se torna o trabalho hercúleo que ele representa, pelo que renovo os meus parabéns aos seus responsáveis directos, pois estão a prestar um grande serviço à comunidade em geral (acho que ninguém renega, ou pelo menos não deveria, renegar o seu passado) e, muito particularmente, a todos os que passaram pela Guiné.

Tal como já fiz em anterior contacto, repito a minha identificação João Dias da Silva, ex-Alferes Miliciano (Op. Esp.), n.º mecanográfico 11953971, CCAÇ 4150, Guiné, 1973/1974 e anexo as fotografias da praxe:

(1) Fotografia aposta na minha Carta de Identificação Militar, tirada no início do COM, em Mafra, e
(2) Actualmente.

Devo confessar que não sou um bom contador de factos/ocorrências passadas, não tanto porque não sou escritor, mas porque desenvolvo com muita facilidade mecanismos inconscientes de defesa que fazem com que facilmente se apague da memória tudo aquilo que provoca(ou) sofrimento. Aliás, no caso concreto, de quando em vez, há como que uns cliks sobre certos factos, mas que não sei bem se não terão mais a ver com narrações ouvidas aquando dos almoços da Companhia que vamos fazendo com alguma regularidade (não fora o empenho e o entusiasmo do Albano Costa e certamente que não seria tanto assim!) – o próximo, o XX Encontro-Convívio da CCAÇ 4150, será na zona de Fátima, já no domingo que vem, dia 27Abril –, em que situações vão-se clarificando ao jeito dum puzzle que se vai construindo.

Contudo, tenho algumas notas soltas, algumas fotografias e documentos, que irei retirar do fundo do baú (por certo que muitas delas já terão sido disponibilizadas/referidas pelo Albano Costa, sempre muito interessado em recolher tudo o que à nossa Companhia diga respeito – honra lhe seja feita! –, mas daqui também não vem mal ao mundo), e que porei à disposição de todos, dando mais um contributo, o meu, para a História que se está a escrever, para além de achar, pelo que tenho observado, que este blogue é um magnífico arquivo, na melhor acepção do termo.

Um forte abraço
João Dias da Silva


3. Em 29 de Abril de 2008, nova mensagem

Caros amigos
Em 23 de Abril de 2008, no "Guiné 63/74 – P2790: Quem pode ajudar a filha do nosso camarada Aliu Sada Candé?", o José Teixeira pedia informações sobre este comando africano.

Embora não tenha tido qualquer contacto ou relacionamento com qualquer destas pessoas, o facto é que estou a ler um livro que recentemente me ofereceram – referência bibliográfica: Bernardo, Manuel Amaro (2007) – Guerra, Paz e… Fuzilamentos dos Guerreiros. Guiné 1970-1980. Col. História Militar, Série Estudos e Documentos. Prefácio-Edição de Livros e Revistas, L.da. Lisboa. 402 pp. –, onde encontrei duas referências:

1.ª – pág. 80 - No Cap. V GRANDE ESFORÇO DE GUERRA EM 1973, ANEXO III Militares "Comandos" condecorados em combate na Guiné (Lista Provisória), ponto 3. Medalha de Cruz de Guerra (80+14/anter. refe.s aos das Torre Esp.), surge no 14.º lugar: "- Soldado Aliu Sada Candé – 1966.4"
A nota de rodapé 4 diz: "Fora graduado em Alferes e colocado na C.Caç. 21. Fuzilado em Bambadinca depois da independência."

2.ª – pág. 144 No Cap. VIII FUZILAMENTOS CLANDESTINOS NAS MATAS DA GUINÉ…, ANEXO III Lista dos Comandos Africanos Fuzilados na Guiné (Provisória), aparece na 22.ª posição: Nome, Posto / Colocação, Data/local fuzilamento Aliu Sada Candé 1, 4, 6 Inc. 6-5-1966 Alferes "Cmd" CCaç 21 (2.ª CCmds Af/74) n. 8-5-1944/Aldeia Formosa, Bambadinca.

As notas de rodapé indicam as fontes:
1 – Queda Sambú (quadro superior/dissidente do PAIGC, em 1987). "Ordem para Matar (…)". Lisboa, Ed. Referendo, 1989.
4 – Informação da Ass. Cmds.
6 – Em Junho/73 fora nomeado para a CCaç 21, extinta em AGO74, tendo regressado à CCmds onde pertencia (relação de documentos de matrícula em arquivo/ex-RCmds).

Que estas migalhitas possam ajudar o Zé Teixeira, lembrando-lhe que a esperança é a última a morrer (o povo é quem mais sabe!...).

Um grande abraço
João Dias da Silva


4. Em 3 de Maio o nosso Editor Luís Graça rtespondia ao João nos seguintes termos:

Meu caro João:
O Albano já me tinha falado em ti (tratamo-nos todos por tu aqui na nosa Tabanca Grande), como velhos camaradas que fomos e continuamos a ser... O teu texto e as tuas duas fotos chegaram em boas condições.
O Carlos Vinhal, meu co-editor, fará a gentileza de te apresentar, no blogue, ao resto do pessoal.

Obrigado pelo teu interesse, as tuas palavras amigas e amáveis, e o teu desejo de te juntares ao grupo, já extenso, de amigos e camaradas da Guiné.

Vamos fazer um III Encontro Nacional no dia 17´de Maio, em Monte Real, Leiria. Se quiseres e puderes, aparece. (Já agora, onde moras?).

Um Alfa Bravo
Luís Graça


5. Em 4 de Maio vinha a resposta

Luís e restantes co-editores
Obrigado pelo mail.
Folgo em saber que consegui atravessar com êxito esta "bolanha", já que os meus textos chegaram finalmente.
A apresentação na Tabanca Grande acontecerá quando tiver que acontecer, pois, imagino eu, terão muito material para ver e publicar.
Conforme as minhas disponibilidades e disposição irei mandando alguns contributos mais.

E, porque me perguntavas, moro em Coimbra.

E já agora, para vosso governo, acrescento que me aposentei em 31 de Julho de 2006, após 30 e tal anos de trabalho na Polícia Judiciária – em Lisboa, Coimbra, Açores/Ponta Delgada (Responsável pelo Departamento local) e Porto (Subdirector Nacional Adjunto) – e sou Licenciado em Geografia–Ordenamento do Território e Desenvolvimento.

Um forte abraço
João Dias da Silva


6. Comentário de C.V.

Caro Dias da Silva, chamo a isto uma entrada em grande.
Vamos aos elogios.
Tudo o que dizes sobre o nosso Blogue dá-nos uma certa vaidade pois a nossa ideia é que ele seja um arquivo histórico com narrativas e testemunhos na primeira pessoa e não o vulgar diz que disse que viu.

Pessoalmente não me revejo nos teus elogios, pois a minha colaboração passa despercebida. Grande homenagem temos que prestar ao Comandante Luís Graça que tomou em ombros tamanha tarefa.

Todos os membros da tertúlia estão igualmente de parabéns, porque cada um à sua maneira, contribui com as sua narrativas, avivando a memória colectiva e não deixando que se apaguem as páginas de um passado que não pode ser ignorado.

Portugal, como tantos países à época, era uma potência colonial e, o seu erro foi não programar a retirada dessas colónias, a tempo de evitar uma esperada guerra de libertação que iria custar milhares de vidas em ambos os lados das barricadas.

Obrigado pela tua colaboração em relação ao nosso ex-camarada Aliu Sada Candé. Faremos chegar estas informações ao Zé Teixeira.

Em nome da Tertúlia envio-te um abraço de amizade e boas vindas.
Não esqueças que assumiste implicitamente a obrigação de aumentares espólio do nosso Blogue.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2811: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (3): De 1966 a 1967 (A. Marques Lopes)

Quadro 5 - Guiné 1963/74: Militares portugueses metropolitanos, mortos por ferimentos em combate, doença, acidente ou outros motivos, e cujos corpos ficaram em cemitérios locais. Parte III: 1963/65 e 1966/67, por trimestre. No final de 1967, somavam 187. Mas nesta lista não se incluem os guineenses, ao serviço do Exército Português.

Quadro 6 – Guiné 1963/74: Distribuição, por cemitério, dos corpos dos militares portugueses metropolitanos, mortos por ferimentos em combate, doença, acidente ou outros motivos, e cujos corpos foram enterrados em cemitérios locais. Parte III: 1963/1967 (n=187).

O cemitério de Bissau (n=103) representava 55% do total (n=187), seguido à distância pelo cemitérios de Nova Lamego (n=17), Bafatá (n=15), Bolama (n=11), Farim (n=4), Bambadinca (n=3), Fulacunda (n=2) e Catió (n=2).

Cerca de 13,4% dos corpos (n=25) não tinham sido recuperados. Outros locais de enterramento (n=5), com um sepultura cada: Aldeia Formosa, Bedanda, Binta, Buba e Cacine.


Imagens e legendas: ©
Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados.



Guiné-Bissau > Bissau > Cemitério Militar de Bissau > Março de 2008 > O Cor Art na situação de reforma Nuno Rubim, participante do Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008), junto à campa nº 383, do António Gonçalves Santos, Soldado, da CCaç 1424, morto em 04.03.66, segundo o livro da CECA, em "Guilege, junto da fronteira", em resultado de "ferimentos em combate". Era natural de Erada, Covilhã. Segundo o nosso querido amigo Nuno Rubim, que comandou a CCAÇ 1424, o Santos morreu "muito perto do cruzamento do corredor de Guileje".

Foto : ©
Nuno Rubim (2008) . Direitos reservados.

Aqueles que nem no caixão regressaram - Parte III

(Organização por ordem cronológica da data de morte: A. Marques Lopes, Cor DFA, Ref) (*)(Continuação) (1)
NOME e POSTO / UNIDADE / DATA da MORTE / LOCAL da MORTE / CAUSA da MORTE NATURALIDADE / LOCAL DA SEPULTURA


1966


Nome: António da Purificação Marques,
Posto: 1.º Cabo
Unidade: CCaç 1423
Data da morte: 03.01.66
Local da morte: Darsalame
Causa da morte: Ferimentos em combate
Naturalidade: Povolide, Viseu
Local de sepultura: Cemitério de Bissau, Campa 33, Guiné.


Avelino do Patrocínio Lage, Soldado / CCaç 1427 / 03.01.66 / Cafal / Ferimentos em combate / Paranhos, Porto / Corpo não recuperado.

Abel Pereira da Silva, Soldado / CCaç 1419 / 05.01.66 / Itin. Ponte do rio Blassar-Matar / Ferimentos em combate / Cristelo, Barcelos / Cemitério de Bissau, Campa 35, Guiné.

António Novais Esteves, 1.º Cabo / CCaç 1419 / 05.01.66 / Itin. Ponte do rio Blassar-Matar / Ferimentos em combate / Vale de Anta, Chaves / Cemitério de Bissau, Campa 35, Guiné .

Aires Jesus Moreira, Soldado / CCS BCav 757 / 11.01.66 / Sare Dicó, na estrada Fajonquito-Canjambari / Ferimentos em combate / Calendário, Vila Nova de Famalicão / Cemitério de Bafatá, Campa 24, Guiné.

Artur Mário Ferreira Duque, Soldado / CCS BCav 757 / 11.01.66 / Sare Dicó, na estrada Fajonquito-Canjambari / Ferimentos em combate / Carnaxide, Oeiras / Cemitério de Bafatá, Campa 29, Guiné.

José Mota Brás, Soldado / CCS BCav 757 / 11.01.66 / Sare Dicó, na estrada Fajonquito-Canjambari / Ferimentos em combate / Casével, Santarém / Cemitério de Bafatá, Campa 31, Guiné.

José Salvado Dias Raposo, Soldado / CCS BCav 757 / 11.01.66 / Sare Dicó, na estrada Fajonquito-Canjambari / Ferimentos em combate / Fundão (**) / Cemitério de Bafatá, Campa 23, Guiné.

Américo Mateus Jorge, Soldado / CCav 1482 / 16.01.66 / Estrada Amedalai-Taibata / Ferimentos em combate / Sobral da Lagoa, Óbidos / Cemitério de Bambadinca, Campa 8, Guiné.

António Ramos Leal, Soldado / Pel Rec 963 / 18.01.66 / Guilege, junto à fronteira / Ferimentos em combate / Capinha, Fundão / Cemitério de Bissau, Campa 89, Guiné.

Augusto Figueira Caria, 1.º Cabo / Pel Rec 963 / 18.01.66 / Guilege, junto à fronteira / Ferimentos em combate / Penamacor / Cemitério de Bissau, Campa 90, Guiné.

José Luís Duarte, Soldado / Pel Rec 963 / 18.01.66 / Guilege, junto à fronteira / Ferimentos em combate / Ferreira do Zêzere / Cemitério de Bissau, Campa 88, Guiné.

José Rodrigues Vicente, Soldado / CCS BCav 757 / 01.02.66 / Bafatá / Acidente de viação / São Bartolomeu de Messines, Silves / Cemitério de Bafatá, Guiné.

Manuel Fonseca Afonso, 2.º Sargento Pel Rec 1077 / 07.02.66 / Cacine / Acidente de viação / Castelo Branco / Cemitério de Bissau, Campa 222, Guiné.

Alberto Simões Crespo, 1.º Cabo / CCav 1483 / 13.02.66 / Cassum / Ferimentos em combate / Benavente / Corpo não recuperado.

Júlio Manuel de Jesus Joaquim, Soldado / CCav 1485 / 13.02.66 / Cassum / Ferimentos em combate / Alcanede, Santarém/ Cemitério de Bissau, Campa 148, Guiné.

Juvenal Gonçalves, Soldado / CCaç 1439 / 28.02.66 / Bambadinca / Afogamento / São Vicente, Madeira / Cemitério de Bambadinca, Fila 1, Campa, 9, Guiné.

António Gonçalves Santos, Soldado / CCaç 1424 / 04.03.66 / Guilege, junto da fronteira / Ferimentos em combate / Erada, Covilhã / Cemitério de Bissau, Campa 383, Guiné.

António Alves Maria da Silva, Soldado / CCaç 674 / 06.03.66 / Jabadá / Ferimentos em combate / Erada, Covilhã / Cemitério de Bissau, Campa 247, Guiné.

Manuel Silveira Reis, 1.º Cabo / CCaç 1438 / 10.03.66 / Salancaur / Ferimentos em combate / Feteira, Horta, Açores / Cemitério de Bissau, Campa 277, Guiné.

Manuel Vieira Ferreira, Soldado / CCaç 1438 / 11.03.66 / Salancaur / Ferimentos em combate / Praia da Vitória, Açores Cemitério de Bissau, Campa 276, Guiné.

Alberto Tibúrcio da Silva, Soldado / CCaç 797 / 18.03.66 / Tite / Ferimentos em combate /Edrosa, Vinhais / Cemitério de Bissau, Guiné.

Adolfo do Nascimento Piçarra, Soldado / CCaç 1427 / 20.03.66 / Catesse / Ferimentos em combate / Ferradosa, Alfândega da Fé / Cemitério de Catió, Guiné.

Albino Teixeira Martins, Soldado / CCaç 1427 / 20.03.66 / Catesse / Ferimentos em combate / Cachopo, Tavira / Corpo não recuperado.

Domingos Ramos Rodrigues, Soldado / Pel Morteiros 1041 / 24.03.66 / Banjor / Ferimentos em combate / Penamacor / Cemitério de Bafatá, Campa 35, Guiné.

Libânio Pires, Soldado / CCaç 1422 / 20.04.66 / Farim / Acidente de viação / Troviscal, Sertã / Cemitério de Farim, Campa 12, Guiné.

António da Silva Monteiro, Soldado / CArt 1526 / 21.04.66 / Estrada Binar-Taura / Ferimentos em combate / Livração, Marco de Canavezes / Cemitério de Bissau, Campa 286, Guiné.

Carlos José da Costa, Soldado / CArt 731 / 23.04.66 / Binta / Afogamento / Ferreira do Alentejo / Corpo não recuperado.

Dionísio Rocha Lourenço, 1.º Cabo / CCav 1485 / 26.04.66 / Biambe / Ferimentos em combate / Santa Iria de Azóia, Loures / Cemitério de Bissau, Campa 284, Guiné.

José Gomes Rodrigues, Soldado / CCaç 1423 / 27.04.66 / Ingué / Ferimentos em combate / Castelo, Sertã Corpo não recuperado.

José António Leonor, 1.º Cabo / CCaç 1501/ 30.04.66 / HM241, Bissau / Ferimentos em combate / Estrada-Mansoa-Cutia a 29.04.66 / Coelhoso, Bragança / Cemitério de Bissau, Campa 285, Guiné.

Joaquim dos Santos, Soldado / CCav 787 / 23.05.66 / Teixeira Pinto / Ferimentos em combate / Carvalhal Benfeito, Caldas da Rainha / Cemitério de Bissau, Campa 516, Guiné.

Aurélio da Silva Barbosa, Soldado / CCav 789 / 24.06.66 / Itinerário Binar-Bula / Ferimentos em combate / Buarcos, Figueira da Foz / Cemitério de Bissau, Campa 466, Guiné.

Francisco António Fernandes Lopes, Soldado / CCaç 1566 / 25.08.66 / Estrada S. João-Nova Sintra / Ferimentos em combate / Estômbar, Lagoa / Cemitério de Bolama, Campa 24, Guiné.

José Maria Fernandes Carvalho, Soldado / CCaç 1566 / 25.08.66 / S. João Doença Aião, Felgueiras / Cemitério de Bolama, Campa 25, Guiné.

Manuel Pacheco Pereira Junior, Soldado / CCaç 1439 / 06.10.66 / Mato Cão / Ferimentos em combate / São Miguel, Açores / Cemitério de Bambadinca, Talhão Militar, Fileira 2, Campa 1 .

Alberto Teixeira Santos, Soldado / Pel Rec 1077 / 28.10.66 / Cacine-Cameconde / Ferimentos em combate / Vidago, Chaves / Cemitério de Bissau, Guiné.

Almiro Celeste, Soldado / CCaç 1588 / 08.11.66 / HM241, Bissau / Ferimentos em combate / Estrada Cutia-Mansoa / Travancas, Cinfães / Cemitério de Bissau, Talhão Militar, Talhão 10, Fileira 7, Campa 1, Guiné.

Manuel Augusto Carteira, 1.º Cabo / CCaç 1588 / 08.11.66 / HM241, Bissau / Ferimentos em combate / Estrada Cutia-Mansoa / Lagoaça, Freixo de Espada à Cinta / Cemitério de Bissau, Talhão Militar, Talhão 9, Fileira 8, Campa 7, Guiné.

José Pedro Correia, Soldado / CCS BCaç 1858 / 25.11.66 / Estrada Cufar-Cantone / Ferimentos em combate / Bagueixe, Macedo de Cavaleiros / Cemitério de Bissau, Guiné.

Martinho da Costa Moreira, Soldado / CCav 1485 / 16.12.66 / Encheia / Afogamento / Santa Maria do Avioso, Maia / Cemitério de Bissau, Guiné.

1967

Joaquim Cordeiro da Silva Monteiro, Soldado / CArt 1648 / 18.03.67 / Tel / Ferimentos em combate / Macieira, Leiria / Corpo não recuperado.

Miguel Ferreira da Costa, Soldado / CArt 1648 / 18.03.67 / Tel / Ferimentos em combate / Torrados, Felgueiras / Corpo não recuperado.

António Reis Vieira, Soldado / CCaç 1588 / 15.06.67 / Itinerário Caium-Piche / Ferimentos em combate / Santo António da Serra, Machico, Madeira / Cemitério de Bissau, Guiné.

João David Oliveira, Soldado / CCaç 1588 / 15.06.67 / Itinerário Caium-Piche / Ferimentos em combate / Fornelos, Fafe / Cemitério de Bissau, Guiné.

Artur Furtados Medeiros, Soldado / Pel Morteiros 1065 / 19.06.67 / Farim / Ferimentos em combate / Nordeste, S. Miguel, Açores / Cemitério de Bissau, Guiné.

António da Silva Domingos, 1.º Cabo / CCav 1693 / 21.06.67 / Estrada CheChe –Nova Lamego / Ferimentos em combate / Vaqueiros-Alcoutim / Cemitério de Bissau, Guiné.

Armando Bernardo Barbosa, 1.º Cabo / CArt 1647 / 09.08.67 / Bula / Ferimentos em combate / Massarelos, Porto / Corpo não recuperado.

Manuel da Costa Sacramento, Soldado / CCav 1649 / 16.08.67 / HM241, Bissau / Ferimentos em combate / Estrada Cacheu-Ponte Alferes Nunes / Montalvão, Nisa / Cemitério de Bissau, Guiné.

António Manuel Cabeçana, Soldado / CCaç 1686 / 07.10.67 / Tenha-Locher / Ferimentos em combate / Sé, Évora / Corpo não recuperado.

Manuel Joaquim Várzea do Sado, Soldado / CCaç 1686 / 07.10.67 / Tenha-Locher / Ferimentos em combate / Vendas Novas / Corpo não recuperado.

José Ferreira de Oliveira, Soldado / CCaç 1551 / 15.10.67 / Saltinho / Afogamento / Antas, Vila Nova de Famalicão / Corpo não recuperado.

António Pires Correia, Soldado / CArt 1691 / 11.12.67 / Cumbamori (Senegal) / Ferimentos em combate / Favaios, Alijó / Corpo não recuperado.

José Miranda, Soldado / CCS BCaç 1887 / 11.12.67 / Cumbamori (Senegal ) / Ferimentos em combate / São Martinho de Moura, Resende / Corpo não recuperado.

Joaquim Pinto de Sousa, 1.º Cabo / CArt 1742 / 19.12.67 / Canhagina / Ferimentos em combate / Verride, Montemor-o-Velho Corpo não recuperado (2).

_____________

Notas de AML:


(*) Fonte: Tomo II, Guiné - Livro 2, do 8º Volume, Mortos em Campanha, da autoria de CECA - Comissão para o Estudo das Campanhas de África. Editado em 2001 pelo Estado Maior do Exército. Desta lista estão excluídos os naturais da Guiné.

(**) Na Ficha da Unidade não consta nada desta situação. Houve mais 6 mortos, 4 deles guineenses e 2 sepultados na metrópole.

(***) Houve mais 3 mortos, um deles guineense (não recuperado). Nenhuma das companhias fala disto.

(****) Companhia formada nos Açores.

(*****) Caminho para Sinchã Jobel, subsector de Geba, Zona Leste

________

Nota dos editores:


(1) Vd. postes anteriores desta série:

28 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2799: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (1): De 1963 a 1964 (A. Marques Lopes)

30 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2802: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (2): 1965 (A. Marques Lopes)

(2) Esta lista enferma de algumas falhas: por exemplo, não consta a presumível morte, em 10 de Setembro de 1966, por afogamento, do soldado da CCAV 1484, José Henriques Mateus, natural da Areia Branca, Lourinhã, no decurso da Op Pirilampo, numa das matas do Cantanhez, na região de Tombali, sector de Bedanda.

Vd. poste de 19 de Abril de 2007 >
Guiné 63/74 - P1676: Vivo ou morto, procura-se o Soldado Mateus, da CCAV 1484, natural da Lourinhã (Benito Neves)



(...) "Quando as NT atravessavam o rio TOMPAR [, afluente do Rio Cumbijã, a sudoeste de Bedanda], afogou-se o soldado nº 711/65, José Henriques Mateus, da CCAV 1484, não tendo sido possível recuperar o seu corpo, apesar de todas as buscas efectuadas" (...)

Guiné 63/74 - P2810: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (30): O Xime, sem ferro mas com fogo...

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xime > c. 1969 > O cais do Xime, no Rio Geba, por onde passavam milhares de homens e toneladas de material para os aquartelamentos do chão fula, Bafatá e Gabu.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > c. 1969 > Rio Geba nas proximidades do Xime

Fotos: © Torcato Mendonça (2006). Direitos reservados.


Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1), enviado em 11 de Fevereiro de 2008:



Luís, sugiro como ilustração essa fotografia que aí tens com uma peça de artilharia do Xime. Junto várias propostas de ilustração, que seguem em correio separado. Para a semana tu e eu iremos reviver a [Op] Tigre Vadio. Queta, a minha segunda memória, mais uma vez surpreendeu-me, conservou os detalhes da nossa entrada no acampamento de Belel, verdadeiramente sangrenta, a que se vai seguir o regresso por Madina e vocês todos cheios de sede e um piloto de helicóptero que me queria largar em nenhures, como se eu fosse o Rambo... Recebe um abraço do Mário.

Operação Macaréu à vista > Episódio XXX

OPERAÇÕES JAQUETA LISA E COLETE ENCARNADO: A REGIÃO DO XIME SEM FERRO MAS COM FOGO (1)

por Beja Santos


(i) Notícias surpreendentes de Xerazade

Há obras na ponte de Udunduma, voltámos às emboscadas nocturnas e aos recenseamentos de armas nas tabancas em autodefesa, ainda não estou recomposto da [Op] Rinoceronte Temível e já sei que estou a caminho de outra, só que agora o meu coração está totalmente devotado à operação do casamento.
Canalizo epístolas umas atrás das outras para Bissau, dou informação aos padrinhos da noiva e do noivo, combino as horas do casório, as escolhas da música de Bach para órgão, informo que as certidões de casamento e de nascimento estão a atravessar o oceano, sugiro à Cristina que venha a 14 já que a minha última operação militar findará a 10, falo-lhe das compras em conjunto, peço fato, camisa, gravata e botões de punho. Sempre que estou em Bambadinca, graças à cumplicidade estabelecida com D. Leontina dos correios, tento ligar para Lisboa e às vezes tenho sorte. Dou tantos e tais pormenores ao telefone, falo de tantas localidades que gostaria de visitar com a noiva que D. Leontina já me perguntou se andaremos por toda a África durante a lua-de-mel.
Não me canso de introduzir informação secundária que a Cristina obviamente não pode filtrar, os soldados que vão assistir ao casamento, que o Cascalheira promete não voltar aos desacatos, pelo menos enquanto me estiver a substituir; que hoje estou de oficial de dia e que já tive que ir à tabanca por causa de uma rixa entre um marinheiro e um furriel dos comandos, houve socos, luta com garrafas, o marinheiro ficou com o nariz rebentado, aguardo a chegada de uma LDM para o entregar; que recebi cartas do Alcino e do Jolá e que o Ruy Cinatti, estranhamente, está a escrever-me duas vezes por semana; em tom de brincadeira, digo que a D. Leontina gostava muito que eu fosse fardado... aí a visada resmoneia, põe o dedo no ar, está indignada, no final da chamada pede esclarecimentos e depois ri às bandeiras despregadas.

É um tempo de euforia. O que disse sobre Ruy Cinatti é a pura das verdades: nunca escreveu tanto, dá opinião sobre as operações, cola-se ao meu entusiasmo, opina sobre os mandingas que querem vir para a metrópole, dedica-me poemas, fala desenvolvidamente dos seus projectos científicos.

Um dia, venho a subir a rampa dos correios para o quartel e cruzo-me com D. Violete que me avisa em tom bombástico:
-Sr. alferes, tenho informações surpreendentes para lhe dar. Nem sabe o que descobri, emprestaram-me livros raros e estou a conversar com pessoas que me dão resposta à sua curiosidade. Quando é que me quer visitar?.
A escassos dias de nova operação, não resisti a propor-lhe um encontro ao fim da tarde desse mesmo dia, estou a arder de curiosidade. Aceitou logo, anoitecia em Bambadinca quando lhe bati à porta com o meu caderninho viajante na mão. E as revelações vieram em catadupa:
- Olhe Sr. alferes, conheci no Gabu, na semana passada, uma neta de Mamadu Sissé, aquele tenente de 2ª linha que fez a campanha do Oio, em 1907, contra Bonco Sanhá e Infali Soncó. Chama-se Fatumana, é uma mulher grande, muito culta, viveu no Oio, depois veio para Badora, agora está reformada e vive entre o Gabu e Bafatá. Confirmou-me que antes das intrigas de Infali contra as autoridades portuguesas, tinha havido uma guerra entre as gentes do Cuor e os balantas da vizinhança que lhes roubavam gado e mulheres. A intriga tinha a ver com uma inventona da cedência de Badora a Abdulai, régulo do Xime e envolveu Dembajai, régulo do Corubal, e Délaje, régulo do Cossé. Infali Soncó maltratou um tenente que residia no Geba, tudo se passou em Sambel Nhanta, a insubordinação precisava de um reparo firme, as autoridades portuguesas estavam furiosas, tinham sido elas a impor Infali aos beafadas, ele respondeu com desrespeito e maldade. Infali umas vezes era leal às autoridades portuguesas, outras vezes bandeava-se para o inimigo, caso dos oincas. A marinha de guerra portuguesa foi atacada no Geba, na região do Cuor, os soldados de Infali tenham longas e os marinheiros responderam com metralhadoras e uma peça de artilharia ligeira. Pois bem, Fatumana emprestou-me um livro onde tudo isto vem descrito. Está aqui à sua disposição, lamento mas só o posso emprestar. Olhe, tenho também uma boa notícia para si. Quando ler este relato da guerra do Cuor vai finalmente saber que Sambel Nhanta se situava onde hoje é Sansão. Além disso, foi ali perto, em Caranquecunda, que as tropas portuguesas bivacaram e fizeram fortim, foi daqui que partiram para Madina onde incendiaram a tabanca. Infali fugiu e os régulos pediram perdão. A partir de então que os habitantes passaram a pagar o imposto de palhota, em 1908 entraram nos cofres da Província quarenta seis contos de réis só referentes aos residentes de Geba.
Agradeci toda esta informação a D. Violete, meti o precioso livrinho dentro de um saco de plástico prometendo devolvê-lo dentro de uma semana. Não sabia porquê, mas D. Violete lembrava-me Xerazade e todas as histórias de encanto e fascínio que faziam com que procurasse sempre com o maior entusiasmo a sua companhia. Sim, D. Violete era a contadora das minhas mil e uma noites.

(ii) Uma conversa desnorteada com Jovelino Corte Real e outros operacionais

Chegou a hora dos últimos preparativos antes de partirmos para o Xime. O comando de Bambadinca afinou o diapasão com Bafatá, o Xime é a prioridade das prioridades no sector, é preciso repelir esses grupos que atacam barcos mesmos nas barbas do Xime, torna-se indispensável impedir as culturas na bolanha do Poindom, alimento crucial para quem vive no Buruntoni ou no Fiofioli, ao longo do rio Corubal o PAIGC não dispõe de terras tão férteis como as do Poindom.
É intenção do comando que se faça uma batida com dois destacamentos: um que vai do Xime até à Ponta do Inglês, será constituído por grupos de combate da CCaç 12, é a Colete Encarnado; um outro vai do Xime até à foz do Corubal, passando a pente fino toda a bolanha do Poindom, será constituído pelas tropas do Xime e pelo Pel Caç Nat 52, é a Jaqueta Lisa. Sairão à mesma hora do Xime, em 22. Estes dois patrulhamentos ofensivos procurarão apoiar-se um ao outro, com apoio aéreo, no segundo dia retirarão conjuntamente, estando o comando de acordo que se use a mesma táctica quanto aos apoios de artilharia nos casos de detecção pelo inimigo ou emboscadas.

Apresentado o plano, inscrevi-me e pedi para que as minhas objecções fossem apreciadas por todos aqueles que iriam intervir na operação. Do que me fora dado ver, da experiência que colhera das idas infrutíferas ao Buruntoni, estávamos perante um mato fechado na margem esquerda da estrada Xime-Ponta do Inglês e da amplidão da bolanha entre Ponta Varela e a foz do Corubal.
O PAIGC, estava provado e comprovado, referenciava muito facilmente a presença das nossas tropas, emboscava regularmente junto a Madina Colhido, ao deslocarmos dois destacamentos em cooperação, iríamos comprometer a missão de um deles graças à detecção do outro. Propunha, por consequência, alvos diferentes para que o PAIGC não pudesse infernizar a vida de trezentos homens ao mesmo tempo. Em concreto, sugeria que um dos destacamentos saísse por Ponta Varela, atravessasse a estrada até à Ponta do Inglês e confirmasse que as populações tinham abandonado a mata do Poindom; o outro destacamento emboscaria em Gundaguê Beafada, seguiria na manhã seguinte até ao rio do Buruntoni, manteriam os dois destacamentos contacto via rádio para evitar aproximações, pois só assim é que teria cabimento fazer-se fogo de artilharia.
Esta sugestão não foi aceite, inclusivamente houve quem sugerisse que fôssemos juntos até ao Poindom, utilizando o trilho de Ponta Varela ao Poindom, frequentado pelo inimigo, e que só então se desse a separação dos dois destacamentos. Vendo o pandemónio da discussão, o comando voltou à referência inicial dos dois patrulhamentos em convergência. Com diferentes guias, com diferentes estados de alma e estado físico, os dois destacamentos iriam viver o desencontro total, deixei claro para quem me queria ouvir. Jovelino Corte Real irritou-se, invocou os galões, exigiu estrita obediência ao espírito da missão: os dois destacamentos iriam partir sincronizados e regressar sincronizados. Ditada a sentença, saímos da reunião e em escassas duas horas a coluna pôs-se em movimento para o Xime, no princípio da tarde do dia 22.

(iii) A história infeliz de duas operações desirmanadas

O contigente da CCaç 12 teve a vida atribulada pelo esgotamento físico, logo à partida. Levavam três horas de marcha desde que tinham saído do Xime quando tiveram que regressar devido a uma situação de doença grave. Só quem não fez a guerra é que não sabe como saídas, regressos e retomas no aceso da época seca se traduz em descompensação e acentua o cansaço e a desconcentração. Entrando tarde na operação, não podendo contactar pelo rádio o destacamento em que íamos, a força da CCaç12 não atinou com as razões do fogo de reconhecimento feito pelo inimigo, que ocorreu durante a noite. Ao amanhecer, foram confrontados com queimadas e a continuação de fogos de reconhecimento.
Sem conseguir contactar com o PCV, o contigente da CCaç 12 ouvia rebentamentos e rajadas lá para os lados de Ponta Varela e Poindom, continuou a progressão mas sem receber instruções quanto ao modo como apoiar o outro destacamento, previsivelmente em apuros. Do que fizemos, dei resumidamente conta à Cristina em carta datada de 25 de Março:
“Venho muito cansado do Poidom. Aproveitámos o luar para, depois de termos emboscado em Ponta Varela, avançarmos nos terrenos lamacentos que levam à foz do Corubal. Para surpresa de todos, as lavras continuavam a ser feitas, ou seja, as populações civis não ficaram atemorizadas com a nossa ida ao Poidom. Tal como tinha sido previsto, na ausência de contacto ou de descoberta de novos acampamentos, emboscámos de madrugada na Ponta do Inglês. Para nossa surpresa, ouvimos o fogo a troar a partir do Buruntoni e Baio, não ligámos nenhuma, já nos tinham avisado que estes reconhecimentos eram habituais. Com a primeira luz da manhã, percorremos a pente fino a mata do Poidom, nada encontrámos a não ser muitas alfaias agrícolas e pegadas recentes. Mas, pelas 7 horas, o fogo intensificou-se, sentimos as morteiradas muito perto, não foi difícil perceber que estávamos referenciados. Recorrendo ao esquema usado na Rinoceronte Temível, pedi fogo sobre o Baio e o Buruntoni, bem como para pontos onde tínhamos detectado os acampamentos em 9 de Março. O fogo inimigo acalmou e pedimos instruções ao PCV que nos mandou regressar a Ponta Varela. Como vês, não tem sentido nenhum imaginar-se uma operação conjugada entre diferentes destacamentos com fogo inimigo pelo meio. Além disso, sinto que o moral das tropas do Xime não está bom, a primeira meia hora logo à saída foi passada a acalmar a berraria de um soldado que em estado de convulsão gritava para que todos ouvissem: “Ai, mãezinha, que não volto vivo!”. Não é determinante, mas abala o ânimo colectivo. Chegámos exaustos a Bambadinca, não sentia as pernas, ando com arrepios, não sei mesmo se não apanhei paludismo”.

Capa da Sonata para violino e piano «Kreutzer», de Beethoven. A famosa empresa discográfica Deutsche Grammophon incluíu este disco na Colecção do Centenário da empresa como o grande registo de 1952, pela limpidez das interpretações, o esplendor do registo de acordo com as técnicas de acústica da época,tempos do mono. Schneiderahan e Kempff foram dois colossos que tive oportunidade de escutar em Bambadinca.


Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.



(iv) A soberania da música, a grandiosidade da literatura

Procuro travar o cansaço ou orientar os momentos de euforia ouvindo música, música sublime ou arrebatadora, música que me galvaniza pelas suas mensagens de alegria, fé ou coragem. Oiço a sonata para violino e piano Kreutzer, de Beethoven, numa interpretação que ficará lendária de Wolfgang Schneiderhan e Wilhelm Kempff. Oiço e volto a ouvir, o articulado daqueles dois instrumentos dá-me imensa coragem. Noutro registo, deixo-me elevar pelos sons majestosos do concerto n.º 4 para piano e orquestra de Camille Saint-Saëns, na bela interpretação de Philippe Entremont e Eugene Ormandy à frente da orquestra de Filadélfia. Revelação completa é o fraseado sublime de Isaac Stern no concerto n.º 2 para violino e orquestra de Mendelssohn, com a mesma orquestra e o mesmo maestro.


Capa original da edição de O Amante de Lady Chatterlay. A Penguin viu-se envolvida num pleito judicial histórico: pretendeu-se retirar do mercado, por ofensas à moral pública, este livro de Lawrence. A liberdade de expressão ganhou. O puritanismo centrou-se nas relações sexuais de Constance e Mellors, deixando nos bastidores a crítica social e política, como se esta fosse inexistente. Publicado em 1928, cedo os críticos reconheceram que o livro era uma pedra preciosa da literatura universal.


Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.





Edição em português de O Amante de Lady Chatterley, por D.H. Lawrenc. Tradução de António R. Salvador, capa de Luis Filipe de Abreu, Circulo de Leitores,1994.


Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.



Desta vez li integralmente O amante de Lady Chatterley de D. H. Lawrence. É uma obra maior da literatura mundial, pode perceber-se há distância de algumas décadas o escândalo que acarretou falar-se cruamente de uma relação sexual numa Inglaterra ainda envolta em puritanismo. Clifford Chatterley, com mansão em Wragby, nas Midlands agrícolas e mineiras, vem da Primeira Guerra estropiado, paralítico. Casara pouco tempo antes com Constance, não tem ilusões quanto à falta de descendência, agarra-se a Constance com todas as suas forças, como igualmente à literatura e aos negócios. É uma relação que caminha rapidamente para o vazio, que não é mitigado pelas inconsequentes aventuras sexuais de Constance. O guarda de caça Olivier Mellors, culto e solitário, um distinto ex-oficial das Índias, vai despertar a paixão de Constance, que irá abandonar a vida de alta sociedade para cumprir o seu sonho de amor. Lawrence dispõe de uma técnica magistral para nos envolver do princípio ao fim, nada é enfadonho nesta relação triangular, é uma descrição poderosa do nascimento de duas sensualidades, mas Lawrence não se fica por aqui: desvela-se o fim da influência da aristocracia rural que dá lugar à industrialização; Constance Chatterley é a afirmação da emancipação feminina, um termo da infidelidade cega e resignada. A espantosa carta de Mellors no final do romance assinala a liberdade de um amor que sobreviveu aos preconceitos sociais do seu tempo. Lawrence dá seguimento à autenticidade do amor no mundo esfarelado do pós-guerra que fez emergir uma nova constelação de valores afectivos.



O mistério da Arca de Noé, de Ellery Queen, nº 80 da Colecção Vampiro, tradução de Elisa Lopes Ribeiro, capa de Cândido da Costa Pinto, s/ data. Não é uma das obras primas de Ellery Queen mas está poderosamente organizado quanto à trama misteriosa, ao enigma que se desvenda a conta-gotas que permite um fantástico desfecho final. O enigma, infelizmente, anestesia a densidade dos protagonistas, fazendo deles objectos mecânicos do autor.


Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.


Saboreei à medida a decifração de um quebra-cabeças aparentemente insolúvel: O mistério da arca de Noé, por Ellery Queen. Este detective vive sempre em altos voos homicídios bizarros, para não dizer grotescos. Desta vez, foi para Hollywood para escrever um romance policial, um joalheiro recebe um cão morto com uma mensagem e morre aterrorizado. O seu sócio que vive numa cadeira de rodas, nada quer revelar sobre o passado de ambos, algo que permite investigar a natureza terrífica do conteúdo daquele bilhete. Seguem-se outros sinais de aviso, como uma tentativa de envenenamento ou um quarto juncado de rãs mortas. Como Ellery Queen é um intelectual eficiente, descobre qual é a chave destes avisos, como por detrás deles está um plano diabólico de vingança que se cruza com outro plano de vingança, um cérebro doente que é manipulado por outro cérebro vingativo. Ellery Queen é um grande senhor do romance policial problema, pelo desenvolvimento de uma charada pontuada por crimes tortuosos e por uma descodificação que se vai desenrolando até ao final da obra.

Estamos a caminhar para o fim do mês [de Março de 1970], estou a chocar um paludismo, parto dentro de dias para a mais sangrenta de todas as minhas operações [, a Op Tigre Vadio]. E quando regressar, totalmente exausto, seremos atirados para a ponte de Udunduma e depois para a operação Pavão Real. Segue-se um período de acalmia, haverá instruções do comandante-chefe para anular quaisquer operações ou patrulhamentos ofensivos. É quando alguns supõem que a guerra vai acabar que eu parto para Bissau à espera da minha noiva.
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Nota do editor:

domingo, 4 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2809: Blogoterapia (50): Racismo é palavra que nunca existiu no meu dicionário (Fernando Chapouto)

Foto 1 > "Eu, com a Cruz de Guerra, por ter transportado um soldado preto, ou seja nativo, morto, às costas, de baixo de fogo".

Foto 2 > "Mascote da companhia em Bissau, nos primeiros dias de permanência na Guiné"


Foto 3 > "Uma mulher com miúdos de Camamudo"

Foto 4 > "Eu, No meio da juventude de Camamudo"


Foto 5 > "Foto após um batuque em que fiz questão ficar nela com mais militares"


Foto 6 > "Com dois simpáticos miúdos que muitas vezes me acompanhavam pela tabanca de Camamudo"


Foto 7 > "Mais uns companheiros que pediam para lhes emprestar a bola e lá ia eu com eles, eu também gostava"


Foto 8 > "Eu, com uma família de Balantas em Geba"

Foto 9 > "Eu, com o Régulo de Cantacunda"

Foto 10 > "Pessoal à espera de comer e tratamentos na enfermaria"


Foto 11 > "Eu, com o Regulo de Cantacunda e pessoal de todas as idades"

Fotos e legendas: © Fernando Chapouto (2008). Direitos reservados.


1. Mensagem do Fernando Chapouto, com data de 8 de Janeiro último. O Fernando foi Fur Mil, Op Esp, CCAÇ 1426 (Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda, 1965/67). O Chapouto chegou, no Niassa, à Guiné em Agosto de 1965; em Outubro de 1965 foi para Camamudo; em Dezembro de 1965 foi destacado para Banjara; em meados de 1966 foi destacado para Geba; em Março de 1967 foi colocado em Cantacunda; e, por fim, em Maio de 1967 regressou à metrópole no Uíge. Recebeu uma cruz de guerra... É dos nossos mais antigos tertulianos. Há tempos ficou zangado comigo, por que ficou com a ideia (errada) de que eu terei insinuado que ele era racista... Bem pelo contrário, eu quis apenas defendê-lo contra aqueles que, não o conhecendo, poderiam pensar mal do Fernando. Não foi assim que entendeu as boas minhas boas, pias, cristalinas, palavras, comos e pode deduzir do texto que ele na altura me mandou... Felizmente que está tudo ultrapassado, uma vez desfeito o mal entendido... Enfim, os habituais problemas da comunicação humana... (LG).


Racismo é palavra que não existe no meu dicionário
por Fernando Chapouto

O meu racismo está espelhado nas fotografias acima mencionadas. Podia pôr mais, mas são suficientemente esclarecedoras do meu racismo, palavra que não existe no meu dicionário. Sou e semopre fui um não-racista.

Isto é uma demonstração do meu respeito por todos, fossem idosos, novos ou quem quer que seja.

Quando me deslocava a Bafatá ou a Geba, eu dava-lhes boleia, levava-os e trazia-os, não os deixava ficar no caminho. Era a nossa missão, é por isso que hoje tenho saudades daquela gente, sejam pretos, brancos, mestiços, amarelos ou de outra cor. Porque era por eles que eu ali estava, defendendo-os de ataques do IN.

Espero que toda a minha discordância seja publicada e dado conhecimento, a todos os ex-combatentes, do meu descontentamento.

Se não concordam com os meus depoimentos e se assim o desejarem podem-me excluir-me da lista do blogue.

Só lamento certas histórias não terem o mesmo tratamento. Concordo que cada um se exprima e relate as suas histórias, pois vivemos em democracia, pela qual sempre lutei.

Espero continuar, na sombra, a ser um leitor assíduo do vosso blogue, pelo qual tenho vivido horas felizes em relembrar aqueles tristes dias da Guiné.

Um abraço para todos
Fernando Chapouto


2. Comentário do editor na altura enviado, por mail, ao nosso camarada Fernando Chapouto, e que ficou sem resposta na altura:

Fernando: Obrigado pela tua mensagem e pelas fotos que mandaste. E que eu vou publicar. Mas quero que fique claro uma coisa: ninguém disse, no nosso blogue, que tu eras racista, muito menos eu ou qualquer um dos nossos co-editores... Aliás, nenhum de nós, que passou pela Guiné, pode ser racista: temos uma grande amizade aqueles povos... Tu convivestes com os pretos, andastes com eles às costas, defendeste-os... Eu estive numa compnhia de pretos, retintos, fulas, fulas pretos... Portanto, tu não precisas de te justificares nem de defenderes de acusações que não existem...

Vejo, com tristeza, que ainda estás zangado connosco, ou só comigo...Ora não é caso para isso... Há um mal-entendido que eu tenho que esclarecer contigo... Não vou perder um amigo e uma camarado só por causa de um mal-entendido... Deixa-me falar contigo: manda-me o teu número de telefone ou telefona tu mesmo, agora mesmo, para o número que te dou. Espero poder esclarecer todos os equívocos. Luís Graça

3. O Fernando entendeu ficar em silência estes meses todos. Há dias rompeu esse silêncio e mandou-me imagens de velhos postais ilustrados... Espero poder vê-lo, e dar-lhe um abraço no dia 17 de Maio, no nosso III Encontro Nacional, em Monte Real.

A mensagem vem endereçada ao Companheiro Luís e camaradas da Guiné... E acaba assim:

"Continuem o trabalho exemplar para beneficio de todos os ex-combatentes da Guiné. O meu muito obrigado

Um abraço
Fernando Chapouto
Ex Fur Mil CCaç 1426
Guiné 65/67"


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Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 5 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2409: Estórias avulsas (12): Uma atribulada viagem de barco pelo Rio Cacheu até Farim (Fernando Chapouto)

(...) "O regresso foi mais rápido e sem problemas até à entrada da barra. Ai apanhámos uma grande tempestade, pois estávamos na época das chuvas, uma grande trovoada, ondas com muita altura... O preto desamarrou os batelões que ficaram à deriva e o barquito onde fiquei com mais dois ou três soldados e a tripulação que era preta. Pensei:- Não morro com um tiro, mas morro afogado...

"Apesar de saber nadar, pensei que era o fim, os pretos (2) rezavam, pareceu-me uma eternidade, com o clarão dos relâmpagos via o lamaçal na margem...Como é que nos safamos se o barco se volta ? Lá ficaremos atolados" (...)
___________

Nota de L.G.:

(...)

(2) Pelo que conheço do Fernando (já nos encontrámos três ou quatro vezes), o termo preto aqui utilizado não tem qualquer conotação racista, é apenas linguagem de caserna...

Guiné 63/74 - P2808: Em busca de... (26): Todos os comandantes do Pel Caç Nat 52, de 1966 a 1974 (J. Mexia Alves / Beja Santos)

Lisboa > Sociede de Geografia > 6 de Março de 2008 > Três históricos do Pel Caç Nat 52 > Joaquim Mexia Alves, à esquerda da foto, no lançamento do livro Diário da Guiné, 1968-1969, de Mário Beja Santos, que está ao centro. À direita, está o Henrique Matos que foi o 1.º Comandante do Pel Caç Nat 52.

Foto: © Henrique Matos (2008). Direitos reservados.


1. Mensagem do Joaquim Mexia Alves, com com data de 20 de Abril:

Caros Henrique e Mário:

Mais um que passou pelo Pel Caç Nat 52! (1) Qualquer dia podemos fazer um blogue do 52...eheheheh

Abraço amigo do

Joaquim Mexia Alves


2. Mensagem do Beja Santos, de 21 de Abril, enviada ao Joaquim Mexia Alves, com conhecimento aos editores:

Querido penúltimo comandante,

A história do Pel Caç Nat 52 começou em 1966, em Bolama, o seu primeiro comandante foi o Henrique Matos Francisco, até 1967.

Seguiu-se o Azevedo, que conheci numa das minhas deambulações por Bissau.

Seguiu-se o furriel Saiegh, que comandou o pelotão interinamente aí uns quatro meses.

Depois apareci eu, de 1968 a 1970.

Seguiu-se o Nelson Wahnon Reis, que lá esteve uns meses, creio que em Fá.

Seguiu-se quem? Ou logo tu ou mais alguém.

E depois o recém aparecido Sá Fernandes.

Há motivos suficientes para um encontro. Talvez o lançamento do meu segundo livro, pela surda estou a preparar um evento de arromba que mete cantares da Guiné-Bissau, a apresentação dos medicamentos que tomávamos produzidos pelo Laboratório Militar, o equipamento de emergência usado pelas enfermeiras pára-quedistas e os estojos de socorros dos Alouette II. Tudo no Museu da Farmácia, e temos depois o lançamento do livro.

O Pel Caç Nat 52 merece reunir-se numa ocasião excepcional...

Um abraço para todos do tigre de Missirá

3. Mensagem anterior do Sousa de Castro, o nosso tertuliano nº 2:

Camarada Fernandes, sou o Sousa de Castro de Viana do Castelo, ex-1º cabo
radiotelegrafista da CART 3494 do BART 3873.

Tanto quanto sei a tua companhia (CART 3521) viajou no N/M Niassa juntamente com o Batalhão 3873, para a Guiné. Entra no endereço anexado e apresenta-te com uma foto da época e outra actual, contando uma pequena estória da tua passagem pela Guiné e serás bem aceite na nossa tabanca.

Melhores cumprimentos.
Sousa de Castro

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Nota dos editores:

(1) Vd. postes de:




18 de Abril de 2008> Guiné 63/74 - P2774: O Nosso Livro de Visitas (13): António de Sá Fernandes, ex-Alf Mil da CART 3521 (Guiné 1969/73)



20 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2780: Tabanca Grande (63): Que seja bem vindo o Sá Fernandes, que me substituiu no comando do Pel Caç Nat 52 (Joaquim Mexia Alves)



22 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2788: Tabanca Grande (64): Apresenta-se Sá Fernandes, ex-Alf Mil da CART 3521 e Pel Caç Nat 52 (Guiné 1971/73)