terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)


1. Carta ao Director do Público, enviada pelo João Seabra, advogado com escritório em Lisboa, ex-Alf Mil da CCAV 8350 (Guileje, 1972/73) (*);

Senhor Director,

Tendo lido as peças de Eduardo Dâmaso “A nave dos feridos, mortos, desaparecidos e enlouquecidos” e “Ninguém entregou a condecoração ao coronel”, publicadas no “Público de 26/6/2005”, achei conveniente pôr à sua disposição as tardias considerações que se seguem, às quais dará o destino que bem entender.

Fui alferes miliciano na Ccav 8350, retirada de Guileje, em 22/5/73, por sensata decisão do comandante do então COP5, sr. major (coronel) Coutinho e Lima.

Nunca estive a bordo da “fragata Orion” (não seria uma LFG – lancha de fiscalização grande?), pela simples razão de que nunca me ausentei de Gadamael na sequência dos ataques dos dias 1/6/73 (uma quinta-feira) e seguintes.

Escreve-se numa das peças em causa: “os três ou quatro soldados que sobraram da tropa comandada pelo recém-chegado capitão Ferreira da Silva, ficaram sem artilharia, sem apoio aéreo, sem oficiais, sem posto de rádio ...”.

Não foi assim.

Para além de mim próprio, permaneceram no interior do destacamento, o alferes Luís Pinto dos Santos, comandante do pelotão de artilharia do Guileje e o alferes Rocha, comandante de um pelotão de canhões sem recuo 57 mm (e já vão três oficiais), e ainda, pelo menos, um furriel, e algumas (poucas) praças desta mesma unidade e da CCaç 4743 (a companhia originariamente de guarnição a Gadamael).

Além disso, encontravam-se em patrulha próxima do aquartedamento um pelotão da CCaç 4743 (com o seu alferes) e outro da CCav 8350 (alferes Reis).

Sou portanto uma das raras pessoas, que reúne em si a dupla qualidade de “cobarde” que, sob as ordens do major (coronel) Coutinho e Lima, retirou do Guileje e de pretenso “herói” de Gadamael. Nesta última condição fui louvado por despacho do General Comandante-Chefe de 28/8/73.

E não saímos de Gadamael por razões de decência básica (havia mortos e feridos que não podiam ser abandonados) e de elementar sensatez (uma retirada, devidamente comandada, é uma manobra militar, mas não consigo imaginar nada de tão perigoso como uma debandada).

Acontece que, na situação que se gerou em 1/6/73, só por comodidade de expressão se poderá falar em “tropa comandada pelo recém-chegado capitão Ferreira da Silva”.

Para o perceber, há que retroceder às peripécias que determinaram a retirada de Guileje, e às que se lhe seguiram.

Ao contrário de Guileje, Gadamael era uma posição sustentável, com poços de água potável muito próximos do perímetro exterior do aquartelamento, dotada de um cais acostável, acessível por via fluvial através de LDM, que na praia-mar navegavam sem dificuldades no braço do rio Cacine em cuja margem se situava.

Já Guileje era um destacamento absurdo, necessitando de organização de colunas escoltadas para reabastecimento de água a 3,4 Km,  dependente, para o seu aprovisionamento, de complicadas colunas rodoviárias múltiplas, de e para Gadamael, com uma pontualidade que poderia servir de exemplo à CP, e que ficava completamente isolado na época das chuvas.

O inimigo (termo convencional pelo qual designarei a entidade que nos pretendia matar, estropiar ou capturar, e a quem, se tivéssemos oportunidade, faríamos outro tanto) conseguiu conjugar duas vastas operações, práticamente simultâneas, ao norte sobre Guidage e ao sul sobre Guileje.

A primeira dessas operações, quase esgotou a chamada reserva do comando chefe, em tropas especiais.

Os meios utilizados pelo inimigo, tanto em artilharia como em infantaria, eram quantitativa e qualitativamente muito superiores aos das nossas guarnições de quadrícula.

A este propósito, tem interesse a leitura do artigo, publicado no Público, de 26/7/2004, pelo comandante Osvaldo Lopes da Silva do PAIGC, se bem que a desenvoltura com que este oficial transita da astronomia para a geografia e da geografia para a topografia, me sugira não ter sido ele o autor do plano de fogos na operação sobre Guileje.

Seja como for, dada a prioridade à defesa de Guidaje, Guileje foi isolado mediante a interdição dos seus acessos rodoviários a Gadamael e à água potável, através de emboscadas permanentes, por unidades de infantaria do inimigo, numerosas e dotadas de superior poder de fogo, minagem em profundidade dos itinerários, e sujeito a contínuo bombardeamento por todas as armas pesadas de que o inimigo dispunha.

Retirada a guarnição, e população, de Guileje, através de um itinerário ainda não reconhecido pelo inimigo, foi recebida em Gadamael, pelo então coronel (agora brigadeiro na reserva) Rafael Durão (Comandante do CAOP3, com sede em Cufar) esclarecido oficial, cuja primeira medida consistiu em promover uma formatura da CCav 8350, para ademoestar os respectivos oficiais, sargentos e praças, em bom vernáculo militar. O major Coutinho e Lima foi enviado para Bissau, onde permaneceu detido, pelo menos até ao 25/4/74.

Ainda hoje estou para perceber por que razão, confirmada a sua evacuação, o aquartelamento de Guileje não foi imediata e intensivamente bombardeado pela Força Aérea. Provavelmente havia quem acalentasse a fantasia de uma reocupação imediata. Certo é que o inimigo continuou a flagelar a posição após a nossa retirada, e só nela entrou dois a três dias depois (como diria Alves a C.ª: “ que coisa prudente é a prudência!”).

Dir-se-ia que, naquela conjuntura, se afigurava, pelo menos, bastante provável que o inimigo procurasse balancear, sobre Gadamael, os abundantes e sofisticados meios que tinha reunido para a operação de Guileje.

Nessa eventualidade – e sem prejuízo do indispensável patrulhamento em profundidade – eram necessárias providências urgentes.

Antes de mais – porque em Gadamael não havia obras ou abrigos adequados a uma guarnição entretanto duplicada – impunha-se a necessária actividade de organização do terreno, fortificando o destacamento, reforçando os espaldões de armas pesadas, abrindo trincheiras eficientes, enquadrando as subunidades, dotando-as de postos de combate defensivos bem determinados e interligados entre si e com o comando.

Em vez disso, o pessoal da CCav 8350 foi caóticamente disperso, em alojamentos de ocasião, pelos cerca de 40 000 m2 do aquartelamento, sem contacto com os seus oficiais e com o comando. Não se iniciaram quaisquer obras defensivas.

Por iniciativa de alguém que não consigo identificar, nas semanas anteriores operou-se uma radical alteração do material à disposição dos pelotões de artilharia de Guileje e Gadamael: as peças 114 mm (Guileje) e 105 mm (Gadamael), foram substituídas por obuses de 140 mm.

Ora, tanto as peças de artilharia de campanha como as próprias armas pesadas de infantaria, quando instaladas numa dada posição, necessitam de regulação do tiro, mediante a observação dos respectivos pontos de impacto, geralmente através de observação aérea, que já se sabia ser impraticável a partir do momento em que o inimigo passou a dispor de misseis solo-ar Strella-SA7.

As causas da desregulação são variadas, tendo a ver, designadamente, com choques sofridos pelas armas durante o serviço, com as condições meteorológicas, com insuficiências de cartografia, etc..

Os nossos obuses 140 mm (modelo 1943), tinham portanto a interessante função de fazer barulho e, nos casos em que abriam fogo de noite, de fornecer indicações de ajustamento do tiro do inimigo.

Nesta prometedora situação, o coronel Durão – certamente a benefício do brio e da disciplina – pôs de parte qualquer trabalho de organização defensiva, determinando um patrulhamento que se pretendia agressivo e que envolvia, em permanência, dois a quatro pelotões de entre as duas companhias.

De tal actividade resultaram dois contactos com pequenos grupos de reconhecimento do inimigo (os quais, por definição, evitam empenhar-se em combate), a quem foram capturadas três espingardas automáticas Kalashnikov.

No dia 31 de Maio de 1973 (uma quarta-feira), de manhã, o coronel Rafael Durão, retirou-se para Cufar, tendo chegado à lúcida conclusão que o inimigo, em consequência dos nossos “sucessos”, tinha retraído o seu dispositivo, sendo improvável um esforço sério da sua parte sobre Gadamael. Tratou-se evidentemente de uma bazófia só comparável com a sua idílica ignorância das intenções e do sistema de forças do inimigo.

Em sua substituição deixou o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva. Nesse mesmo dia, à tarde, iniciou o inimigo uma forte flagelação sobre Gadamael, utilizando, sobretudo, morteiros 120 mm, mas também foguetões Katyusha de 122 mm e peças de 130 mm, com uma qualidade de tiro surpreendente.

No dia 1 de Junho, o fogo da artilharia do inimigo intensificou-se qualitativa e quantitativamente e, entre as 10 e as 13 horas, uma área de 20 000 a 30 000 m2 do destacamento de Gadamael encaixou, seguramente, entre 350 e 400 impactos de morteiro 120 mm, provocando consideráveis baixas na guarnição.

Os dois capitães (comandantes, respectivamente, da Ccaç 4743 e da Ccav 8350), foram evacuados entre as 10,30 e as 11,00 horas, e não “ao princípio da tarde”.

Apercebendo-me de que se estava a gerar uma debandada, tentei impedi-la, pelas razões acima expostas, com resultados muito limitados.

O pessoal estava completamente entregue a si próprio e a falta de condições de comando era total: só conseguíamos transmitir ordens a quem nos passasse ao alcance da voz.

Dois dos três espaldões das peças de artilharia receberam granadas de morteiro 120 mm, que feriram, mataram ou dispersaram a totalidade das respectivas guarnições.

O pessoal que ia debandando dizia-me que o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva tinha dado ordens para se “sair do quartel”.

Dirigindo-me a uma das posições da artilharia, encontrei o alferes Luís Pinto dos Santos, que sobreviveu, com ferimentos ligeiros, e resolvemos ambos procurar o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva, para lhe perguntar se tinha ordenado a evacuação do aquartelamento. Respondeu-nos que tal não era a sua intenção, tendo apenas recomendado ao pessoal que se deslocasse temporariamente “para fora do arame”, isto é, para o exterior do perímetro do destacamento, uma vez que o seu interior estava a ser intensamente batido pela artilharia inimiga.

Fizemos-lhe saber que tal “deslocação temporária” tinha degenerado em debanda incontrolável.

O alferes Pinto dos Santos, com a minha ajuda, conseguiu improvisar um mínimo de serventes (entre os quais o furriel de transmissões da CCav 8350) para activar um dos três obuses 140 mm, à cadência de um tiro de quarto de hora em quarto de hora.

Tudo visto, recolheram-se os mortos, evacuaram-se os feridos por via fluvial, e garantiu-se, com fogo esporádico de obus 140 mm, de morteiro de 81 mm e de canhão sem recuo de 57 mm, uma aparência de capacidade de reacção que dissuadisse um eventual reconhecimento em força por parte do inimigo (que aliás não se mostrou muito afoito).

Enfim: o trivial.

As munições para as armas pesadas eram transportadas do paiol em uma viatura Berliet temerariamente conduzida por um cabo escriturário (Raposo) da CCaç 4743, o qual, na volta, também transportava feridos para locais de embarque.

Nesse mesmo dia 1 de Junho à tarde:

Reentraram no quartel os dois pelotões que estavam em patrulha exterior; desembarcaram, de helicóptero, dois oficiais de confiança do Comando Chefe (capitães Caetano e Manuel Soares Monge) e o coronel Rafael Durão (pessoa dotada de coragem física em proporção inversa à do respectivo discernimento).

No dia 3 de Junho (Sábado), desembarcou a companhia 122 de paraquedistas (capitão Terras Marques), e no dia seguinte a 123 (capitão Cordeiro).

Uns dias mais tarde chegou a companhia de paraquedistas nº 121 (comandatada pelo então tenente, e hoje tenente-general, Hugo Borges), o que significa que foi deslocado para Gadamael um batalhão completo de paraquedistas (BCP 12).

Entre sexta-feira, dia 2/6/73 e o domingo seguinte, a presença do major Pessoa, do BCP 12, pôs termo ao efémero comando do capitão (coronel /dr.) Ferreira da Silva) no, assim chamado, COP5.

Um verdadeiro e próprio comando das forças de Gadamael foi estabelecido no domingo (4/6/73) na pessoa do tenente-coronel Araújo e Sá (comandante do BCP 12).

Nesse mesmo dia – por razões que, para mim, permanecem obscuras – o major Pessoa (era o 2º comandante do BCP12) retirou-se de Gadamael.

Apesar de não figurarem habitualmente como “heróis de batalha de Gadamael”, as operações das diversas companhias paraquedistas, em cerca de duas semanas, desarticularam o dispositivo inimigo, sofrendo baixas moderadas (uns 25 a 40 feridos, na maior parte ligeiros, com estilhaços de RPG 7).

Nunca será demais sublinhar a qualidade destas tropas de elite. Recordando os contactos que mantive com os seus oficiais (designadamente os capitães Terras Marques e Cordeiro), anoto, como curiosidade, que se mostravam extremamente críticos (no limiar do humor negro) em relação aos fundamentos e à condução da guerra, sendo a sua considerável eficiência, fruto exclusivo de um extraordinário brio profissional.

O corpo de tropas pára- quedistas – das melhores que se poderiam encontrar, inclusivé a nível da NATO – foi destroçado, como unidade combatente, em 1975. Ao que me consta o brigadeiro Rafael Durão e o major Pessoa tiveram, nessa meritória obra, a sua função, cada um do seu lado, respectivamente, no “11 de Março” e no “25 de Novembro”.

Não sei se o tenente coronel Fabião tinha condecorações para atribuir. Recordo que o alferes Pinto dos Santos e eu próprio fomos ouvidos como testemunhas num processo de averiguações para atribuição de condecoração militar ao capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva, pelo major (brigadeiro) Manuel Soares Monge, no quartel general do Comando Chefe, em Bissau.

A nenhum de nós dois pareceu que fosse caso de condecorações a propósito do que se passou em Gadamael no dia 1 de Junho de 1973 (excepção feita ao cabo Raposo, atentos o seu posto e especialidade).

Recordo-me que, na altura, o então capitão Caetano me disse que tinha chegado a “fase dos baldes de plástico” (brinde comercial muito apreciado à época). Temíamos o aproveitamento de tal “fase” para transformar o capitão Ferreira da Silva numa espécie de contra-exemplo, em relação ao major Coutinho e Lima.

A serem atribuídas condecorações, deveriam elas ser, obviamente, atribuídas a oficiais, sargentos ou praças das tropas paraquedistas.

A partir da chegada do BCP 12, a CCav  8350 e a CCaç 4743 não tiveram qualquer actividade operacional de relevo.

Aliás nem poderiam ter, uma vez que não tinham treino, nem armamento, para se defrontar com a infantaria inimiga em reconhecimento avançado, do que foi feita a (desnecessária) demonstração no dia 4 de Junho, quando um pelotão da CCav 8350, reduzida a uma dúzia de elementos, caiu numa emboscada a menos de 1 km do aquartelamento, sofrendo quatro mortos (entre eles o respectivo alferes) e cinco feridos graves.

Será a este episódio que o dr. Ferreira da Silva, por equívoco, se quererá referir quando alude a “seis paraquedistas mortos no mesmo dia” (os cadáveres foram efectivamente recuperados por um pelotão de paraquedistas).

O objectivo desta pretensa patrulha era o de “descongestionar” o aquartelamento da sua, por assim dizer, densidade humana, face à eficiência do tiro da artilharia inimiga. Em suma: a CCav 8350 e a CCaç 4743 tinham passado a desempenhar a proverbial função de carne para canhão.

Note-se que a nossa tropa de quadrícula (companhias tipo caçadores), nem sequer estava dotada de uma metralhadora ligeira decente (a nossa inacreditável HK-21 encravava ao fim de cinco ou seis tiros).

As tropas especiais usavam as metralhadoras ligeiras MG 42 e, em considerável quantidade, equipamento capturado ao inimigo: metralhadoras ligeiras Degtyarev, lança granadas RPG 2 e RPG 7, espingardas automáticas Kalashnikov. Excelente material que, ainda hoje, está ao serviço, do Iraque ao Afeganistão, do Sudão à Libéria.

Tive a inspiração de selecionar, de entre os meus pertences, que carreguei de Guileje, um grande livro: Bouvard et Pécuchet, de Gustave Flaubert.

Quando saí de Gadamael, faz agora trinta e dois anos, tinha chegado a uma passagem célebre: “alors une faculté gênante se développa dans leur esprit, celle de percevoir la bêtise e de ne plus pouvoir la tol
érer.” [ “então uma faculdade embaraçosa se desenvolveu em suas mentes, a de perceber a estupidez e não mais ser capaz de tolerá-la.” [tr. do editor LG ]

Dê a este enfadonho relato, Sr. Director, o destino que bem entender.

João Seabra

Antigo Alferes Miliciano da CCaV 8350 (1972/74)

P.S. - Porque, em certos aspectos factuais, confirma algo do acima relatado, junto segue extracto da minha folha de matrícula. 

____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3790: Dossiê Guileje / Gadamael (3): "Um precedente grave" (Diário, Mansoa, 28 de Maio de 1973) ... (António Graça de Abreu)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3800: Recado para o senhor José (José Manuel Dinis)

1. Mensagem de José Manuel M. Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, com data de 24 de Janeiro de 2009:

Caro José
Permita-me que o trate assim, pois apesar de muito recentemente ter aparecido um comentário subscrito por José Oliveira e Rocha, Bart 2857, Piche, não posso deduzir tratar-se da mesma pessoa. Também vou tratá-lo por senhor, na medida em que ainda não fez a apresentação à Tabanca.

Como já deve ter reparado, a Tabanca Grande é um espaço de tertulia, onde os intervenientes se apresentam, partilham e discutem ideias, conhecimentos, opiniões, na maior liberdadade, e com o devido respeito pelas divergências de cada um. Como já li do Luís Graça, a Tabanca não tem portas nem janelas. Cada um pode entrar, identificando-se, e participando, descomplexadamente, do elo que a todos nos une, a passagem na condição militar pelo território da Guiné.
Mas, ainda assim, foram estabelecidas regras aos tertulianos, constantes, depois da fiche técnica, do lado esquerdo do ecran. Nada do outro mundo, coisas de bom senso, regras de sã convivência, de que destaco, a obediência à verdade e o respeito recíproco.

O senhor, espero, vai compreender-me: dei-me conta de um comentário a um texto meu sobre a criação e emissão de um posto de rádio em Piche, onde duvidava do conteúdo. Nada que me melindrasse, e respondi sinteticamente. Depois, dei conta de novos comentários, de tom jocoso, em relação a textos subscritos por outros tertulianos. Não relevei por aí. Mas surgiu um comentário ao Nuno Robim, desprimorando-o insidiosamente, referindo que ele conheceria a Guiné da secretaria, como fundamento para um atestado. Leia se faz favor a biografia do visado, que comandou uma Companhia em Guilege e foi comando noutra ocasião, para além de oficial de artilharia. Não conheço o Nuno Robim, mas não gostei da desfaçatez. Por último, com o estilo acutilante, a identificação mais completa, o mesmo Bart, coincidências para a mesma pessoa, em apoio a uma tese de um tertuliano, enaltece-o por, com o texto, arrasar com os Fala Barato. Engana-se, se foi o autor, porque no blogue, ninguém arrasa ninguém, nem se manifesta tal intenção, apesar de poder acontecer alguma teimosia na defesa dos pontos de vista. Isto é natural, e, delicadamente, cultiva o respeito e a amizade. Que vai continuar a ter expressão nos encontros do pessoal de que Matosinhos é farol.

Meu caro, não encare esta mensagem como reprimenda. Se chegou aqui, é porque tem elos fortes com o pessoal e interessa-se pelas matérias tratadas. Não se acanhe, apresente-se e participe. Os editores, seguramente, prontificam-se a ajudar, desde a revisão de textos e tratamento de fotografias, à procura de camaradas. A Tabanca, também é um lugar de solidariedade.

Com os melhores cumprimentos
José Dinis

2. Aos que se nos dirigem a coberto do anonimato ou de nomes mais ou menos fictícios.

É apanágio dos editores, sempre que publicam algum trabalho enviado pelos tertulianos, fazê-lo, afixando a fotografia do autor e/ou no mínimo identificando-o com o nome, antigo posto militar, local e anos de cumprimento de comissão. Isto porquê? Porque quem envia os seus trabalhos para publicação no Blogue responsabiliza-se pelo que escreve. Em bom português, dá a cara. Os editores como não têm dúvidas disso, publicam sem reservas.

Quem emite comentários sem identificação, fazendo-o premeditadamente, mais não é que alguém que tem medo que as suas afirmações não sejam levadas a sério. Mas, mesmo os momentos de boa disposição no nosso Blogue são autenticados com o nome dos autores e não acreditamos que haja por aí algum anónimo com a categoria de, por exemplo, Jorge Cabral, mestre do no sense.

Com os comentários ofensivos o melhor é nem perder tempo e retirá-los imediatamente para não poluirem. Não é qualquer ou Tone que ofende quem se expõe com a sua cara e o seu nome completo.

Carlos Vinhal

Guiné 63/74 - P3799: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (3): O hino da CCAÇ 2405 (1968/70) (Victor David)

1. O Victor David (foto do lado esquerdo) respondeu, em 24 do corrente, a um pedido meu, dirigido ao pessoal que passou por Dulombi, para nos mandarem letras do Cancioneiro de Dulombi / Galomaro ("Amigos e camaradas de Dulombi, avós, pais e netos: Para vosso conhecimento. Infelizmente não tenho o mail (actualizado) do Jorge Rijo. O dos seguros foi desactivado: julgo que ele passou à reforma. Reforço o pedido: Kadé o Cancioneiro de Dulombi ?")...

Na véspera, já tinha recebido um mail do Rui Felício. Do Jorge Rijo, não há notícias. O Paulo Raposo, por sua vez, vai aparecendo, de tempos a tempos.


2. Mensagem do Rui Felício (ex-Alf Mil, CCAÇ 2405, Dulombi, 1968/70), de 23 do corrente:


Meu caro Luís Graça:

A minha ausência das lides bloguistas não significa menos atenção ao teu blog, que visito com a regularidade possível. Respondendo ao teu e-mail referente ao designado Cancioneiro do Dulombi :

(i) Como disse na altura que escrevi o post que tu referes, fui eu de facto o autor da letra da cantoria dedicada aos periquitos que nos substituiram, e que a malta da CCAÇ 2405 costuma cantar nos almoços anuais que realiza. A música foi arranjada pelo Jorge Rijo, essa sim plagiada de uma cantiga que na altura andava em voga (essa cópia da musica está assumida também no mesmo post);

(ii) Por isso fiquei um tanto confuso com a reivindicação de autoria feita pelo tal Luis Dias. Ou então não entendi bem o que ele quiz dizer com isso;

(iii) Não me faz diferença nenhuma que a autoria me seja atribuida ou não, até porque aquilo foi uma versalhada sem qualquer valor poético ou literário. Mas as coisas são o que são e não tenho a menor dúvida que fui eu que a escrevi e nem sequer me inspirei nalguma outra de que me tivesse servido como molde ou como ideia;

(iv) O que não quero é que se pense que me intitulei autor de versos que o tal Luis Dias diz que já tinham sido feitos por ele. E não quero porque não é verdade...

(v) Como também disse na mesma altura do tal post que referes, não sou já capaz de a reproduzir integralmente e quem a tem transcrita para papel é de facto o Jorge Rijo, cujo contacto de e-mail não tenho. Aliás, da última vez que falei com ele disse-me que ia arranjar um endereço electrónico mas desde então nada mais me disse.

Reencaminho este e-mail para ao Vitor David e para o Raposo. Pode ser que eles possam encontrar os tais versos.

Um abraço do teu amigo
Rui Felício

3. Comentário de L.G.:

Rui, não quero que o avô se zangue com o neto... O que o Luís Dias reclamou, muito modestamente, foi apenas a paternidade... da letra do Adeus Guiné:

É o fim do castigo ,
Terminou a comissão,
É necessário gritar
Piras! Não venham,
Deixem isto acabar,
Morrer de tédio,
Sem remédio.
Isto é vida de cão,
A velhice vai embora
Enquanto a bajuda chora
E a nau está a naufragar.
(...)

Entretanto, tenho notícias frescas do Victor David. Um abraço para os baixinhos de Dulombi, Jorge Rijo, Paulo Rsposo, Rui Felício e Victor David. LG


4. Mensagem do Victor David (ex-Alf Mil, CCAÇ 2405, Dulombi, 1968/70):

Caríssimo Luís Graça:

A minha veia de escritor passou toda para o Felício aquando da nossa passagem pela Guiné, pelo que não tenho colaborado no blogue activamente, mas não tenho deixado de ser um leitor atento e interessado na grande qualidade dos seus escritos e orientação. Para mim continua a ser dos mais completos, interessantes e valiosos documentos para a memória dos tempos inesqueciveis que passámos na Guiné, sobretudo porque são depoimentos de quem viveu os factos e não de quem os trata jornalisticamente, impingindo-nos a sua versão não vivida!...

Bem, mas respondendo ao pedido que foi lançado no blogue àcerca da letra do Hino da CCaç 2405, na altura da recepção à companhia que nos foi render em Dulombi e, depois de devidamente analisada a papelada em arquivo próprio, aqui vai ela (de autoria do Felício - ou do Rijo - já não sei) e música, também me não lembro de quem - mas de uma canção na moda naquela altura:

SÊ BENVINDO, PIRIQUITO,
PIRIQUITO,
JÁ CANSAVA DE ESPERAR,
DE ESPERAR.

COMO VÊS ISTO É BONITO,
COM MUITA COBRA E MOSQUITO
E GUERRILHA A CHATEAR,
A CHATEAR.

ANDA CÁ, ESTÁ SOSSEGADO,
DESCONTRAI, POUSA A CANHOTA
QUE O IN ESTÁ NOUTRO LADO,
ANDA PRAÍ EMBOSCADO,
EM ALGUM PONTO DE COTA.

ATAQUES, FLAGELAÇÕES,
MUITAS MINAS, EMBOSCADAS,
VERY LIGHTS AOS MONTÕES
E MANGA DE ROQUETADAS,
AS SABOROSAS RAÇÕES
E A CARNE AFIAMBRADA.

HÁ ABELHAS E MOSQUITOS,
OLÉ LÉ LÉ LÉ,
MOSCA CHATA E FORMIGA,
OLÉ LÉ LÉLÉ,
SAPOS, RÃS E UNS LAGARTITOS,
OLÉ LÉ LÉ LÉ
MAS É TUDO MALTA AMIGA!
OLÉ LÉ LÉ LÉ.

Um abraço
Victor David
BAIXINHO DO DULOMBI ( com muita honra!)

P.S. Quem souber de que canção era a música, que dê uma ajuda!

___________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes desta série:

20 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3763: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (1): Adeus, Guiné / É o fim do castigo, / Terminou a comissão... (Luís Dias)

21 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3772: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (2): Tecnil, Tecnil / Eu passei lá muitas noites / Certamente mais de mil (Luís Dias)

Guiné 63/74 - P3798: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (3): Jungo, neuréjungo, ondo... / Braço, mão, dedo, ...



Continuação da publicação do Dicionário Fula/Português, organizado pelo nosso camarada Luís Borrega, ex-Fur Mil Cav MA da CCAV 2749/BCAV 2922 (Piche, 1970/72).

III parte da lista de vocábulos em dialecto fula (e respectiva tradução em português) (*), recolhidos em resultado de conversas com o seu amigo Cherno Al Hadj Mamangari, que vivia em Cambor, a nordeste de Piche. Como já foi dito, o título Al Hadj é dado ao crente muçulmano, depois de regressar da sua peregrinação a Meca.

2. Comentário do nosso camarada José Colaço (ex-Sold de Trms da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65), publicado no poste P3786:

"Nafinda. Só tive uma lição de Fula/Português da qual enviei cópia do original P3598 (**). Estive a compará-la, pensava que estava pior. O meu prisioneiro professor portou-se como um homem grande. Passe a minha modéstia eu tenha requisitado todas as minhas capacidades para merecer a sua confiança. Nafinda, Nháluda ou Naquirda, conforme a hora o local em que o comentário seja lido. Um alfa bravo, Colaço" .

3. Sitografia:

Há uma tese de dissertação de mestrado sobre o idioma fula (também conhecido por peul, fulani, pulaar, fulbe, fulfulde...), que está disponível na Net, e cuja leitura se recomenda a quem quiser aprofundar os seus conhecimentos sobre este idioma que é falado na Guiné-Bissau, e noutras partes da África Ocidental, por um universo de falantes estimado entre 10 a 16 milhões de pessoas.

É um ficheiro em formato pdf, de 79 páginas. É um trabalho académico apresentado no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Linguística, Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas, Instituto de Letras, Universidade de Brasília, Brasília, 2007:

Título> Fonologia segmental preliminar da língua fula da Guiné-Bissau
Autor > Ricardo Washington de Sousa Moura
URL > http://bdtd.bce.unb.br/tedesimplificado/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=2446

Resumo > "Esta dissertação tem por meta uma descrição inicial da fonologia da língua Fula da Guiné-Bissau. Primeiramente, descreve-se seu espaço geográfico, seu povo e sua família lingüística. Em seguida, aborda-se o foco central deste trabalho, que é a análise segmental fonológica desse idioma. Faz-se uma análise de seus sons vocálicos, consonantais e identificam-se os padrões silábicos existentes. A metodologia adotada para esta pesquisa foi por meio de um trabalho de campo com uma falante nativa do idioma, a qual pronunciou as palavras solicitadas para que fossem gravadas para posterior análise. Com isso, partiu-se para uma análise bibliográfica baseada, sobretudo, em COUTO (1994, 1995), SILVA (1999) e WEISS (1988), a fim de que os fatores fonológicos da língua fossem identificados e teorizados. A língua estudada apresenta um conjunto de sete vogais orais /a,e,",i,o,¿,u/ e cinco nasais /ã,~e,i,õ,u/. As consoantes somam 19 /p,b,t,d,k,g,?,?,f,s,z,?,½,h,ä,m,n,µ,l/ e há um par de semivogais /w/ e /j/. Os padrões silábicos são cinco, CV, CVC, VV, V e VC, ordenados conforme o grau de ocorrência".

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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores desta série:

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3785: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (1): Nafinda, nháluda, naquirda... Bom dia, boa tarde, boa noite...

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3786: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (2): Gô, Didi, Tati, Nai, Joi.../ Um, Dois, Três, Quatro, Cinco...

(**) Vd. poste de 11 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3598: O segredo de... (4): José Colaço: Carcereiro por uma noite

Guiné 63/74 - P3797: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (2): Unidades de intervenção no subsector de Bajocunda

Continuação da publicação do trabalho de pesquisa do nosso camarada José Martins (*):


Copá, na fronteira com o Senegal (1965-1974) - Parte II: Unidades de intervenção no subsector de Bajocunda

Copá [vd. carta de Canquelifá]: Situado, sensivelmente, nas coordenadas 13º 55” Oeste e 12º 38” Norte, por lá passaram centenas de homens que, na impossibilidade de se obterem relações nominais, nos levaram a pesquisar as unidades que por lá estiveram, não só actuando directamente no terreno, quer em quadrícula quer em patrulhamentos, mas também nos escalões de comando e coordenação, embora mais afastados do local de acção. Tentou dar-se uma informação sucinta de cada unidade, dando destaque à sua passagem por Copá ou na área em que este destacamento se inseria (**).

Além das subunidades (companhia e pelotões) que tiveram intervenção directa e em quadrícula na zona em que se encontrava Copá [subsector: Bajocunda], outras houve que coordenaram e comandaram as operações nesta área, agrupando sob o seu comando alguns sectores, para assim melhorarem a acção das Nossas Tropas desenvolvida no terreno. Entre elas contam-se:

(i) Unidades de intervenção:


3ª COMPANHIA DE CAÇADORES INDÍGENAS
(3ª CCAÇ I, 1961/67)


Foi criada em 1 de Fevereiro de 1961, como unidade da guarnição normal do Comando Territorial Independente da Guiné, de acordo com o dispositivo aprovado, para aquele território. Constituída por quadros metropolitanos e praças do recrutamento local, iniciou a sua formação adstrita à 1ª Companhia de Caçadores Indígenas, com a formação de um pelotão que, em 13 de Maio de 1961 foi deslocado para S. Domingos.
Depois da formação de dois pelotões foi oficialmente concretizada a sua organização, em 1 de Agosto de 1961, sendo colocada em Nova Lamego por troca com a 1ª Companhia de Caçadores Indígenas.

Constituindo os pelotões em falta para completar a companhia, instalou efectivos em Buruntuna, BAJOCUNDA [ foi a primeira unidade a deslocar efectivos para aquela zona em 1 de Agosto de 1961], Cabuca, Canquelifá e Geba, e a partir de 6 de Maio de 1963 instalou pelotões em Béli e Madina do Boé.

Em 1 de Abril de 1967, quando passou a designar-se por Companhia de Caçadotres nº 5, tinha a sua sede em Nova Lamego com destacamentos em Cabuca, Canjadude e Che-che.

COMPANHIA DE ARTILHARIA Nº 676 (CART 676, 1964/66)

Mobilizada no Regimento de Artilharia Pesada nº 2 em Vila Nova de Gaia, desembarcou em Bissau em 13 de Maio de 1964, tendo sida integrada no dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores nº 600 e atribuída pontualmente, como reforço, ao Batalhão de Caçadores nº 619, de 3 a 5 de Agosto de 1964; Batalhão de Caçadores nº 599 de 17 a 19 de Agosto de 1964 (região de Jabadá e Gampará); e CDMG – Comando de Defesa Marítima da Guiné entre 19 e 21 de Setembro de 1964 (região de Cantanhez).

Em 12 de Outubro de 1964, destacou dois pelotões para Pirada e Paunca, em reforço do dispositivo do Batalhão de Caçadores nº 506, tendo sido rendida em Bissau pela Companhia de Caçadores nº 726.

Em 29 de Outubro de 1964, foi instalado o comando da companhia em Pirada.

A 30 de Outubro de 1964 deslocou para Bajocunda um pelotão que substituiu igual efectivo da 3ª Companhia de Caçadores Indígenas. Foi rendida em Bajocunda em 11 de Março de 1965, data da criação do subsector, pela Companhia de Cavalaria nº 704.

Esteve integrada no dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores nº 506, Batalhão de Caçadores nº 512, Batalhão de Cavalaria nº 705 e Batalhão de Cavalaria nº 757, de acordo com as alterações e rendições verificadas na zona.

A companhia foi rendida no sector de Pirada em 11 de Abril de 1966 pela Companhia de Caçadores nº 1496, regressando à metrópole em 27 de Abril de 1966

COMPANHIA DE CAVALARIA Nº 704 (CCAV 704, 1964/66)

Mobilizada no Regimento de Cavalaria nº 7 em Lisboa, desembarcou em Bissau em 24 de Julho de 1964.

Foi atribuída em reforço do Batalhão de Artilharia nº 645, entre 2 e 5 de Dezembro de 1964, para actuação na região de Mansoa – Porto Gole; Também foi atribuída em reforço ao Batalhão de Caçadores nº 513, entre 15 e 17 de Dezembro de 1974, actuando na região de Injassane, deslocando-se para Bolama em 8 de Janeiro de 1965.

A partir de 18 de Janeiro de 1965 cedeu dois pelotões ao Batalhão de Caçadores nº 512, para reforço de Nova Lamego e Pirada, até que em 5 de Fevereiro de 1965 foi atribuída a subunidade àquele batalhão, tendo destacados, por períodos curtos, forças para diversos destacamentos da área como Bajocunda, Madina do Boé, ponte do Rio Caium e Béli.

A 11 de Março de 1965 substituiu a Companhia de Artilharia nº 676, assumindo a responsabilidade do subsector então criado, e, em 16 de Março de 1965, destaca um pelotão para Copá, para guarnecer o destacamento então criado.

Em 15 de Junho passou para a dependência do Batalhão de Cavalaria nº 705, do qual fazia parte. Foi rendida pela Companhia de Caçadores nº 1417, regressando a Bissau e embarcando de regresso em 14 de Maio de 1966.


COMPANHIA DE CAÇADORES Nº 1417 (CCAÇ 1417, 1965/67)

Mobilizada no Regimento de Infantaria nº 1 na Amadora, desembarcou em Bissau em 6 de Agosto de 1965, ficando nessa cidade como unidade de intervenção e reserva do Comando - Chefe. Foi atribuída em reforço do Batalhão de Cavalaria nº 790, actuando na região de Insumeté (Bissum) entre 5 e 24 de Setembro de 1965.

A 23 de Setembro de 1965 foi aquartelada em Fá Mandinga, como força de intervenção do Batalhão de Caçadores nº 697, tendo operado nas regiões de Galo Corubal, Ponta do Inglês, Poidom, entre outras.

Em 4 de Maio de 1966 foi colocada no sector do Batalhão de Caçadores nº 1856, ao qual pertencia, assumindo em 9 de Maio de 1966 a responsabilidade do subsector de Bajocunda, com um pelotão destacado em Copá, rendendo a Companhia de Cavalaria nº 704.

Entre 25 de Janeiro e 26 de Março de 1967, destacou um pelotão para reforço da guarnição de Belí. A 7 de Abril de 1967 foi rendida pela Companhia de Caçadores nº 1586 recolhendo a Bissau, tendo regressado à metrópole em 15 de Abril de 1967.

COMPANHIA DE CAÇADORES Nº 1586 (CCAÇ 1586, 1966/68)

Mobilizada no Regimento de Infantaria nº 2 em Abrantes, desembarcou em Bissau a 4 de Agosto de 1966, sendo destacado para o sector do Batalhão de Caçadores nº 1856, assumindo a 8 do mesmo mês a responsabilidade do subsector de Piche, substituindo dois pelotões da Companhia de Caçadores nº 1567, e guarnecendo o destacamento da ponte do Rio Caium com um pelotão, até 21 de Setembro de 1966.

A partir desta data assumiu, também, funções de unidade de intervenção na zona de Nova Lamego, reforçando diversas localidades, entre elas Nova Lamego de 10 de Outubro de 1966 até princípios de Dezembro desse ano; Madina do Boé entre 10 de Fevereiro e 1 de Maio de 1967; e Béli de 25 de Janeiro de 1967 até 15 de Abril de 1967.

A 6 de Abril de 1967 foi rendida no subsector de Piche, assumindo o subsector de Bajocunda no dia seguinte, rendendo a Companhia de Caçadores nº 1417 e guarnecendo Copá com um pelotão, mantendo-se integrada no dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores nº 1933 e posteriormente do Batalhão de Caçadores nº 2835.

Entre 28 de Outubro e 4 de Dezembro de 1967, integrou, com um pelotão, o sector temporário de Canjadude.

Foi rendida no subsector de Bajocunda em 27 de Abril de 1968 pela Companhia de Caçadores nº 1683, embarcando de regresso à metrópole em 9 de Maio de 1968.

COMPANHIA DE CAÇADORES Nº 1683 (CCAÇ 1683, 1967/69)

Mobilizada no Regimento de Infantaria nº 15 em Tomar, desembarcou em Bissau em 2 de Maio de 1967 tendo efectuado a adaptação operacional na região de Safim. Substituiu entre 21 de Maio e 23 de Junho de 1967 a Companhia de Artilharia nº 1746 no dispositivo do Batalhão de Artilharia nº 1904.

Na situação de intervenção e reserva do Comando - Chefe, realizou operações, em reforço do Batalhão de Caçadores nº 1912 na região de Sarauol entre 23 de Junho e 7 de Julho de 1967; e em reforço do Batalhão de Artilharia nº 1914, entre 12 e 23 de Julho de 1967, na região de Uanandim e Guebambol.

Em 17 de Agosto de 1967 substitui a Companhia de Caçadores nº 1651, assumindo a responsabilidade do subsector de Julmete, ficando integrada no dispositivo do Batalhão de Caçadores nº 1911, a que pertencia, orientada para a protecção e segurança dos trabalhos na estrada Pelundo–Jolmete e realização de operações nas regiões de Gel-Calaque, Jol e Pecê-Bugula.

Em 1 de Novembro de 1967, por troca com a Companhia de Cavalaria nº 1649, é colocada em Teixeira Pinto com um pelotão em Caio. Volta a assumir o subsector de Jolmete em 1 de Março de 1968, por troca com a Companhia de Cavalaria nº 1648, até 17 de Abril de 1968, sendo rendida pela Companhia de Caçadores nº 1622.

A 27 de Abril de 1968 assume a responsabilidade do subsector de Bajocunda, com um pelotão em Copá, no sector à responsabilidade do Batalhão de Caçadores nº 2835, em substituição da Companhia de Caçadores nº 1586.

Foi rendida pela Companhia de Artilharia nº 2438 no subsector de Bajocunda, em 25 de Novembro de 1968, sendo deslocada para Teixeira Pinto, onde ficou em intervenção e reserva às ordens do Batalhão de Artilharia nº 2438, com um pelotão destacado na ilha de Jete, entre 30 de Novembro de 1968 e 12 de Março de 1969, e outro pelotão em Pelundo, entre 7 de Dezembro de 1968 e 12 de Março de 1969.

Em 20 de Março de 1969 foi para Bissau, por troca com a Companhia de Artilharia nº 1802, regressando à metrópole em 16 de Maio de 1969.

COMPANHIA DE ARTILHARIA Nº 2438 (CART 2438, 1968/70)

Mobilizada no Regimento de Artilharia Ligeira nº 5, em Penafiel, desembarcou em Bissau em 15 de Novembro de 1968.

Seguiu de imediato para Bajocunda a fim de render a Companhia de Caçadores nº 1683, tendo assumido a responsabilidade do subsector em 25 de Novembro de 1968, com um pelotão destacado em Copá e integrado no dispositivo do Batalhão de Artilharia nº 2857, a que pertence.

Em 15 de Agosto de 1970 foi rendida, por troca, pela Companhia de Caçadores nº 2679, mantendo-se em Bajocunda em reforço do Comando Operacional Temporário nº 1, até 21 de Setembro de 1970, data em que recolheu a Bissau, para embarcar para a metrópole em 5 de Outubro de 1970.


1ª COMPANHIA DE COMANDOS AFRICANA
(1ª CCmds Afr, 1970)


Criada em 9 de Julho de 1969 foi formada exclusivamente com pessoal natural da Guiné. Efectuou a sua instrução em Fá Mandinga a partir de 6 de Fevereiro de 1970 que terminou com o Juramento de Bandeira em 26 de Abril de 1970.

Como força de intervenção e reserva às ordens do Comando Chefe e mantendo a sua sede em Fá Mandinga, foi destacada para a região de Bajocunda em 21 de Junho de 1970 onde se manteve em treino operacional até 15 de Julho de 1970, ficando nessa zona em reforça do Comando Operacional Temporário nº 1, até finais de Setembro de 1970, recolhendo a Fá Mandinga.

COMPANHIA DE CAÇADORES Nº 2679 (CCAÇ 2679, 1970/71)

Mobilizada no Batalhão Independente de Infantaria nº 19, no Funchal, desembarcou em Bissau em 6 de Fevereiro de 1970. Em 20 do mesmo mês segue para Piche afim de efectuar o treino operacional, sob a orientação do Batalhão de Artilharia nº 2857, ficando como força de intervenção e reserva daquele batalhão.

Em 29 de Julho de 1970 é deslocada para Bajocunda, destacando um pelotão para Copá, por ter sido atribuída como reforço do Comando Operacional Temporário nº 1. A 17 de Agosto de 1970, por troca com a Companhia de Artilharia nº 2438, assumindo a responsabilidade do subsector de Bajocunda e mantendo um pelotão destacado em Copá.

Rendida em 25 de Novembro de 1971 pela Companhia de Cavalaria nº 3462, deixa dois pelotões em Bajocunda e transferindo o restante pessoal para Bafatá, em reforço do Batalhão de Artilharia nº 2920.

Em 17 de Dezembro de 1971, toda a unidade é reunida em Bafatá e segue para Bissau, tendo embarcado em 27 de Dezembro de 1971.

PELOTÃO DE CAÇADORES NATIVOS Nº 65 (Pel Caç Nat 65, 1970)

Unidade constituída no âmbito do Comando Territorial Independente da Guiné, foi criado em Maio de 1968. Teve a sua primeira base em Nova Lamego e foi, sucessivamente colocada em Camjabari (Abril de 1969), Piche (Agosto de 1969), Buruntuma (Março de 1970), Bajocunda (Julho de 1970), Copá (Setembro de 1970), Bajocunda (Janeiro de 1971), Copá (Dezembro de 1971), Bajocunda (Fevereiro de 1972), Paúnca (Março de 1973), Guidage (Junho de 1973) e Bajocunda (Dezembro de 1973).

Dando cumprimento ao Acordo de Argel, de 26 de Agosto de 41974, os seus elementos foram disponibilizados e o pelotão extinto.

COMPANHIA DE CAÇADORES Nº 5 (CCAÇ 5, 1967/74)

Unidade da guarnição normal do Comando Territorial Independente da Guiné, foi constituída em 1 de Abril de 1967, por alteração da designação da 3ª Companhia de Caçadores Indígenas. Integrou o dispositivo de Manobra do Batalhão de Caçadores nº 2835 e dos batalhões que se lhe seguiram, tendo a sua sede em Nova Lamego e destacamentos em Canjadude, Cabuca e Che-che.

Em 14 de Julho de 1968 foi deslocada para Canjadude, assumindo a responsabilidade do subsector, reforçada com três pelotões da Companhia de Artilharia nº 2338, que substituiu no Che-che, com um efectivo de pelotão, igual guarnição da Companhia de Caçadores nº 5.

Manteve, no entanto, um pelotão em Cabuca, até 20de Abril de 1968, e outro em Nova Lamego, até 9 de Agosto de 1968, situação esta vindo do antecedente.

Destacou, ainda, um pelotão para reforço do Batalhão de Cavalaria nº 2922 em Nova Lamego entre Abril e 21 de Novembro de 1970 e Buruntuma de 21 de Novembro de 1970 a 18 de Junho de 1970.

Para reforço do Comando Operacional Temporário nº l e do destacamento de Copá, deslocou um pelotão entre 31 de Janeiro de 1971 e Março do mesmo ano.
Dando cumprimento ao Acordo de Argel, de 26 de Agosto de 41974, os seus elementos foram disponibilizados e o aquartelamento entregue ao PAIGC em 20 de Agosto de 1974.

COMPANHIA DE CAVALARIA Nº 3462 (CCAV 3462, 1971/73)

Mobilizada no Regimento de Cavalaria nº 3, em Estremoz, desembarcou em Bissau em 30 de Setembro de 1971, realizando a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional no Centro Militar de Instrução, no Cumeré, entre 04 de Outubro e 31 de Outubro de 1971

Em 1 de Novembro de 1971 seguiu para Bajocunda para sobreposição dom a Companhia de Caçadores nº 2679 e treino operacional. Assume a responsabilidade do subsector de Bajocunda, com pelotões destacados em Copá e Tabassi, em 25 de Novembro de 1975.

Em 25 de Novembro de 1973, rendida pela 1ª Companhia do Batalhão de Cavalaria nº 2823/73, regressa a Bissau, embarcando para a metrópole em 15 de Dezembro de 1973.

1ª COMPANHIA DO BATALHÃO DE CAVALARIA Nª 8323/73 (1973/74)

Mobilizada no Regimento de Cavalaria nº 3, em Estremoz, desembarcou em Bissau em 29 de Setembro de 1973 e realizou a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional no Centro de Instrução Militar, em Bolama, de 5 de Outubro a 31 de Outubro de 1973.

Seguiu em 4 de Novembro de 1973 para o subsector de Bajocunda, para sobreposição, treino operacional e substituição da Companhia de Cavalaria nº 3462.

Assumiu a responsabilidade do subsector de Bajocunda em 25 de Novembro de 1973, com um destacamento guarnecido por um pelotão em Copá. O destacamento de Copá foi extinto em 14 de Fevereiro de 1974, após violentas e continuadas flagelações.

O pelotão destacado em Copá regressou a Bajocunda, onde se manteve até 22 de Agosto de 1974, data em que entregou o aquartelamento ao PAIGC, de acordo com o dispositivo de retracção da Nossas Tropas, recolhendo a Piche e depois a Bissau, onde embarcou de regresso à metrópole em 10 de Setembro de 1974.

(Continua - III Parte: Unidades de comando)

José da Silva Marcelino Martins
josesmmartins@sapo.pt
Furriel Miliciano de Transmissões de Infantaria
Companhia de Caçadores nº 5 – CTIGuiné
Nova Lamego e Canjadude - Jun1968 a Jun1970
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Notas de L.G.:

(**) Um outro destacamento, Mareué, a oeste de Copá, também terá sido abandonado pelas NT, presumivelmente na mesma época (Fevereiro de 1974), segundo informação do nosso camarada António Santos:

Guiné 63/74 - P3796: Blogues da Nossa Blogosfera (14): "CART 2732" criado e gerido por Inácio Silva (Carlos Vinhal)


Nasceu mais um Blogue, desta feita dedicado à madeirense CART 2732 (*) e aos seus ex-combatentes, que ao longo de 22 longos meses permaneceram e defenderam a povoação e aquartelamento de Mansabá.

Além das suas funções de tropa de quadrícula, intervieram nas inúmeras Operações que se desenvolveram pela Região do Óio muito para além da sua Zona de Acção limitada a Norte pelo Bironque, a Oeste por Mansodé, a Sul por Mamboncó e a Leste por Manhau, quer enquanto sob o Comando do BCAÇ 2885, quer já sob o comando do COP 6, durante e após a construção do troço da estrada Bironque/K3, que fazia parte do itinerário que ligava Bissau/Mansoa/Mansabá/Farim numa extensão de quase 100 quilómetros, totalmente alcatroada. Ficou a ser porventura uma das vias de comunicações rodoviárias mais importantes da Guiné, por atravessar zonas sensíveis como o corredor do Morés, por exemplo.

No Blogue da CART 2732, pode-se ler já um trabalho publicado, com as Actividades mais importantes desta Unidade.

Estando ainda este Blogue nos seus primeiros passos, o seu criador, o nosso camarada e tertuliano Inácio Silva (**), com as qualidades que lhe reconhecemos de homem interventivo e actuante, não deixará de o manter vivo e interessante.

Convido toda a tertúlia para ver esta nova página em cart2732.blogspot.com
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 18 Abril 2006 > Guiné 63/74 - DCCXI: Breve historial da CART 2732 (Mansabá, 1970/72) (Carlos Vinhal)

(**) Vd. poste de 27 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1889: Tabanca Grande (20): Inácio Silva, 1.º Cabo Apontador de Metralhadora, CART 2732 (Mansabá, 1970/72)

Vd. último poste da série de7 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3709: Blogues da Nossa Blogosfera (13): Entre Fogo Cruzado e Rumo a Fulacunda de Henrique Cabral

Guiné 63/74 - P3795: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (1): O princípio do fim, a história do Soldado António Rodrigues

Capa do livro de Benigno Fernando, O Princípio do Fim. Porto: Campo das Letras. 2001. 78 pp (Campo da Memória, 6).

"Benigno Femando nasceu em Massarelos, Porto, em 1960. Começou a trabalhar aos dez anos de idade. Em 1975, iniciou a prática de futebol no Sport Comércio e Salgueiros, prolongando esta actividade durante treze anos em diversos clubes amadores.Durante a década de 90, colaborou na secção desportiva dos jornais O Primeiro de Janeiro e O Portuense. Trabalha nos Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento do Porto desde 1979. Reiniciou os estudos no final dos anos 80 e em 2001 estudava na Escola Secundária Alexandre Herculano. O Princípio do Fim é o testemunho de um militar (o soldado condutor auto Rodrigues, da 1ª Companhia do Batalhão nº 8323) que esteve na zona leste da Guiné durante a Guerra Colonial"...

Sabemos que o António Rodrigues é de Braga, e vive no Porto (*)


1. Mensagem do José Martins, de 25 de Janeiro último:

"Boa tarde. Apesar de já ter comprado e lido o livro há dois anos, feitos no dia 9 do corrente, quase de imediato iniciei as minhas habituais pesquisas mas, não sei qual a razão de ter ficado em arquivo.
"Segue o texto, com os parabéns ao Benigno Fernando pela forma como conseguiu passar ao papel, e à posteridade, as memórias do nosso camarada de armas António Rodrigues.
 

Um abraço. 
José Martins"


2. Copá , na fronteira com o Senegal (1965-1974) - Parte I: a história do Sold Condutor Auto António Rodrigues, contada por Benigno Fernando

“Chegava a noite; os que tinham começado a enjoar deitaram-se mais cedo, a maioria só foi para as camaratas perto da meia-noite e a essa hora ainda se conseguia ver luzes na costa portuguesa. Essa vista começou a provocar-lhe uma nostalgia, e foi nesse momento que o Rodrigues começou a pensar: 'É o princípio do fim.' *

(...) Há terras maravilhosas,
De certeza que não minto;
Se duvidam, vão visitar
Copá e Teixeira Pinto. (...)

In Turismo na Guiné,

de Florêncio Oliveira da Silva
Furr Mil, QG, Bissau, 1972



(i) Uma história igual a tantas outras

A frase saída da memória do António Rodrigues e da pena de Benigno Fernando, numa edição da Editora Campo das Letras, recorda-me outra frase, muito semelhante, O fim do principio atribuída como título a um dos textos que compõem a colectânea Refrega, de minha autoria e não editada, e que pretendem recuperar a minha memória dos tempos que passei na Guiné, assim como a fase que os antecedeu e alguns comentários posteriores.

Poder-se-á dizer, durante ou mesmo no final da leitura de O princípio do fim que se tratar de uma história igual a tantas outras.

Todo o percurso daqueles, a grande maioria, que vieram a cumprir o serviço militar obrigatório nas fileiras do Exército, começa com o dia das sortes, sortes essas que já são previsíveis: o apuramento para todo o serviço.

Depois, como o António Rodrigues, a espera pela incorporação, a entrada no quartel com toda amalgama de emoções, muitas das vezes não reprimidas, a aversão à farda, a recruta, a especialidade… tendo de permeio todos os obstáculos que são desde a disciplina militar, nova e despropositada para todos, os pequenos poderes, os fins de semana “à Benfica” (castigo com perda do direito ao passaporte e, algumas vezes a acumular serviços) ou mesmo o contar dos tostões que não chegam para a camioneta para ir à terra ver a família e os amigos.

Depois vem o “formar batalhão” e, quando completo, a ordem de embarque.

No teatro de operações de destino há que cumprir, ainda, o IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional) e a sobreposição com a unidade a render.

Depois há que [re] iniciar tudo aquilo que os que nos procederam fizeram, fazendo cada um de nós, e todos em conjunto, a história de cada unidade e a história deste país cuja Bandeira juramos defender.

Ao António Rodrigues coube-lhe a sorte de cair num destacamento, semelhante a muitos que existiram na Guiné, numa tabanca em que se misturava a tropa e as populações, duma povoação atravessada por uma estrada/caminho de terra batida, mas, na realidade é a história de alguém, a história que revela uma vivência única, porque única é a história de cada um e na história dum povo.

O autor adverte de que a “narrativa é baseada em acontecimentos verídicos”. Assim é. Há nomes, locais, datas ou factos que, validados com a versão oficial, não podem ser mais coerentes.


(ii) Copá: de 11 de Março de 1965 a 14 de Fevereiro de 1974

Copá [ou Kopá, como escrevem hoje os guineenses] foi o local que, a partir de 11 de Março de 1965, passa a ser guarnecido, em permanência, por uma força do exército constituída ao nível de pelotão reforçado e, portanto, uma unidade em quadricula, de pequeno efectivo, mas que se tem de desdobrar para fazer face à vida que se vivia em qualquer destacamento, fosse de que escalão fosse.

O livro é um texto que se lê de uma vez só. Só se consegue parar na última página, mas que obriga, quase de imediato, a regressar ao início, para uma leitura mais pausada. Mais pausada e com outros olhos, colocando, sobretudo, no que foi aquele pedaço de chão e no que se tornou.

A zona, desde o início das hostilidades, era uma zona relativamente calma, dado que era lá para o sul que a guerra se desenrolava, bastando ter na zona apenas um pelotão da unidade que pontificava no distrito de Nova Lamego – a 3ª Companhia de Caçadores Indígenas.

Porém, quando a guerra se estendeu ao Leste, foi necessário ir reforçando a presença militar que, acabando por serem criadas outras estruturas de comando, incluindo o destacamento em análise, que acabaria por ser abandonado em 14 de Fevereiro de 1974. Este abandono foi justificado não só pela ausência dos civis na povoação, mas porque com o evoluir da situação, desfavorável para o lado português, deixou de ter interesse estratégico. Não era o primeiro destacamento/ aquartelamento a ser abandonado. Muitos mais, e em breve a totalidade, seriam alvo do chamado movimento de retracção das NT que, após o Acordo de Argel, teria início.

Situado, sensivelmente, nas coordenadas 13º 55” Oeste e 12º 38” Norte, por lá passaram centenas de homens que, na impossibilidade de se obterem relações nominais, nos levaram a pesquisar as unidades que por lá estiveram, não só actuando directamente no terreno, quer em quadrícula quer em patrulhamentos, mas também nos escalões de comando e coordenação, embora mais afastados do local de acção. Tentou dar-se uma informação sucinta de cada unidade, dando destaque à sua passagem por Copá ou na área em que este destacamento se inseria.

(Continua: Parte II - Unidades que passaram por Copá) (**)
_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

8 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1409: Bibliografia de uma guerra (16): Pirada, Bajocunda, Canquelifá, Copá: o princípio do fim (Beja Santos)


8 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1410: Antologia (57): O Natal de 1973 em Copá (Benigno Fernando)

Vd. também poste de 10 de Novembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3430: Bibliografia de uma guerra (36): No ocaso da Guerra do Ultramar, de Fernando Sousa Henriques (Helder Sousa)

(**) Sobre Copá (aquartelamento abandonado pelas NT em 14 de Fevereiro de 1974), vd. ainda o postes de:

27 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1216: A batalha (esquecida) de Canquelifá, em Março de 1974 (A. Santos)

30 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P3004: PAIGC: Op Amílcar Cabral: A batalha de Guileje, 18-25 de Maio de 1973 (Osvaldo Lopes da Silva / Nelson Herbert)

13 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2937: A guerra estava militarmente perdida? (16): António Santos,Torcato Mendonça,Mexia Alves,Paulo Santiago.

Vd. ainda o poste de 16 de Julho de 2007 >Guiné 63/74 - P1958: Vídeos da guerra (1): PAIGC: Viva Portugal, abaixo o colonialismo (Luís Graça / Virgínio Briote)

(... ) Referência ao vídeo da televisão francesa, a antiga ORTF, disponível em INA - Institut National de l' Audiovisuel

GUINEE : LA GUERILLA AU GRAND JOUR MAGAZINE 52 ORTF - 04/07/1974 -

Video 12m 32s / DVD 3 €

Sinopse (em francês)

On est plus de 2 mois après la 'révolution des oeillets' au Portugal, le gouvernement Caetano est tombé après un coup d'Etat d'officiers portugais engagés dans la guerre coloniale en Afrique, le mouvement des "forces armées", le pouvoir a été rendu aux civils et le général Spinola, membre de la junte militaire qui a pris le pouvoir le 25 avril à Lisbonne est désigné pour mener à bien la décolonisation en Afrique après avoir été gouverneur militaire de Guinée Bissau et des îles du Cap Vert et avoir combattu les militants du PAIGC.

Abouchar est parti dans les maquis du mouvement en Guinée Bissau sorti de la clandestinité. - meeting du parti dans le maquis acclamant les peuples de Guinée et du Cap Vert et celui du Portugal passé aux mains de l'opposition de gauche - discours d'Antonio Borges en créole et portugais, trad off par Abouchar "la négociation est dans l'impasse avec le Portugal" - discours d'un commissaire politique du PAIGC en portugais - itw Manuel Santos alias Manecas, commissaire politique du Front nord, en français, parlant du combat contre le tribalisme et la lutte anti colonialiste - entraînement des guerilleros équipés par l'Union soviétique.

Camp portugais de Copa détruit et incendié, Manecas fait visiter les lieux à un journaliste portugais Manuel Batoreo, le premier admis dans une zone contrôlée par le PAIGC - itw Manuel Batoreo en français, sur le point de vue du PAIGC - suite itw Manecas sur l'indépendance du Cap Vert qui interviendra seulement le 5 juillet 1975 "le PAIGC est une organisation qui lutte pour l'indépendance de la Guinée et du Cap Vert, ce sont 2 pays différents, dans notre programme c'est très clair, ce sont 2 pays différents mais le PAIGC estime qu'il y a toutes les raisons pour unifier ces 2 pays parce que nous avons des origines ethniques, oui je suis capverdien, le PAIGC n'a pas d'action directe au Cap Vert mais nous avons une organisation clandestine au Cap Vert qui travaille, il y a des manifestations au Cap Vert en faveur du PAIGC, de l'indépendance...le Cap Vert a un intérêt stratégique pour leurs lignes de communication" - dans les marais guinéens, militants débarquant dans une zone très peu accessible, jambes nues et chaussures à la main.

Suite itw Manecas "nous estimons que ce n'est pas une mauvaise chose que d'avoir des contacts avec les militaires portugais mais nous ne pouvons pas arriver à un accord sur place sur un cessez le feu qui n'a pas été encore déterminé entre le gouvernement portugais et les autorités de notre parti" - suite itw Manuel Batoreo "selon moi, le gouvernement est intéressé à accorder l'autodétermination comme premier pas vers l'indépendance mais au bout ce sera effectivement l'indépendance pour toutes les colonies, c'est pour bientôt oui l'indépendance" - arrivée ravitaillement dans zone libérée, la une du journal indépendantiste "PAIGC Actualités" avec la photo d'Aristides Pereira leader du parti, vente de vivres par des magasins ambulants aux villageois.

Itw Batoreo "ce qui m'a le plus marqué ? la conscience collective de la lutte que les gens ont dans les différents rangs de l'armée, des civils, l'organisation, conscience de faire un pays vraiment nouveau, adapté aux besoins des gens exploités toutes ces années par un colonialisme que le monde connaît bien" - itw Manecas "les Portugais ont laissé le pays dans un état on ne peut plus arrièré, il n'y a rien, avant le déclenchement de la lutte armée il y avait au moins 90 % d'analphabètes, la seule école secondaire ouverte en Guinée date de 1956" sur des images d'alphabétisation dans le maquis - la popote et l'ouverture des boîtes de conserves pour les maquis - suite et fin Manecas "le PAIGC se sent prêt pour l'indépendance, nous avons sur place une administration et je crois qu'il faut sur place l'agrandir un peu, ça va fonctionner, nous aurons un régime nationaliste, de parti unique, démocratique, y a t il un pays indépendant africain pour servir de modèle ? nous, on ne croit pas beaucoup aux modèles"
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Resumo em português (tradução e adaptação de LG)

Passaram-se mais de dois meses após a "Revolução dos Cravos" em Portugal, o governo Caetano caiu após um golpe de Estado levado a cabo por oficiais portugueses envolvidos na guerra colonial em África, o movimento das "Forças Armadas". O poder foi entregue a civis e o General Spínola, membro da Junta Militar que tomou o poder em 25 de Abril em Lisboa, é encarregado de levar a bom termo processo de descolonização em África após de ter sido governador militar da Guiné-Bissau e das ilhas de Cabo Verde e de ter ter combatido os militantes do PAIGC .

Abucar partiu para a Guiné-Bissau, para as regiões controladas pelo PAIGC, saído da da clandestinidade. - Reunião do partido no mato, dão-se vivas aos povos da Guiné e Cabo Verde e de Portugal, país que agora passou para as mãos da oposição de esquerda - Antonio Borges fala em crioulo e Português, tradução de Abucar em voz off, "as negociações com Portugal estão num impasse" - discurso dum comissário político do PAIGC, em Português – entrevista em francês com Manuel Santos, ‘Manecas’, comissário político da frente frente, em que fala do combate contra o tribalismo e da luta anticolonialista – treino dos guerrilheiros equipados pela União Soviética.

Copá, aquartelamento português, destruído e queimado e queimadas, Manecas faz uma visita guiada, acompanhando jornalista português, Manuel Batoreo, o primeiro admitido numa zona controlada pelo PAIGC – entrevista com Manuel Batoréo, em francês, em que se aborda o ponto de vista do PAIGC – continuação da entrevista com Manecas sobre a independência de Cabo Verde, que terá lugar somente em 5 de Julho de 1975, "o PAIGC é uma organização que luta pela a Independência da Guiné e Cabo Verde, são 2 países diferentes, no nosso programa é muito claro, são 2 países diferentes, mas o PAIGC acredita que há todas as razões para unificar estes 2 países, porque temos origens étnicas comuns, sim eu sou caboverdiano, o PAIGC não nenhuma ação directa em Cabo Verde mas temos uma organização clandestina em Cabo Verde que trabalha, há manifestações em Cabo Verde a favor do PAIGC, a independência ... Cabo Verde tem um interesse estratégico para as suas linhas de comunicação " - nos pântanos da Guiné, militantes desembarcam numa área muito pouco acessível, descalços, as botas na mão.

Continuação da entrevista de Manecas, "Nós achamos que isto não é mau, manter contactos com os militares portugueses, mas não podemos chegar, no terreno, a um acordo sobre um cessar-fogo que ainda não foi estabelecido entre o Governo Português e direcção do nosso partido "- prossegue a entrevista com Manuel Batoréo, "Acredito que o governo está interessado em conceder a auto-determinação como um primeiro passo para a independência, mas o final do processo é a independência para todas as colónias, em breve sem dúvida é a independência "- chegada de reabastecimento a uma zona libertada, a primeira página do jornal nacionalista “PAIGC Actualités”, com a foto do líder Aristides Pereira, vende de alimentos aos camponeses pelas lojas ambulantes do PAIGG.

Entrevista de Batoréo, "O que me surpreendeu mais? a consciência colectiva da luta das pessoas nos diferentes escalões das forças armadas do PAIGC, nos civis, a organização, a consciência de se estar a um país verdadeiramente novo, adaptado às necessidades das pessoas exploradas durante todos estes anos por um colonialismo que o mundo conhece bem” – entrevista de Manecas, "os Portugueses deixaram o país num estado que não podia ser de menor atraso, não há nada, antes do início da luta havia pelo menos 90% de analfabetos, a única escola secundária aberta na Guiné data de 1956 ", imagens de alfabetização no mato – o rancho e a abertura de caixas de conserva para os guerrilheiros – continuação e final da entrevista com Manecas, "o PAIGC sente-se pronto para a independência, temos uma administração montada no terreno, creio que é só preciso aumentá-la um pouco, isto vai funcionar, teremos um regime nacionalista , de partido único, democrático, há algum país africano independente Africano para servir de modelo ? nós, não acreditamos muito nos modelos”.

Guiné 63/74 - P3794: Álbum das Glórias (50): Jobo Baldé, o dedicado padeiro de Missirá depois de Julho de 1969 (Beja Santos)


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Missirá > Julho de 1969 > Pel Caç Nat 52 > Um padeiro competente e empenhado, o Jobo Baldé.

Foto: © Beja Santos (2007). Direitos reservados.


1. Mensagem de Beja Santos, ex-Alf Mil, Pel Caç Nat 52 (Missirá e Bambadinca, 1968/70):

Depois do grande incêndio de Missirá, em 19 de Março de 1969, durante a reconstrução, deu-se azo à imaginação, alguns progressos foram possíveis no nosso ameaçado bem-estar. Para substituir Sadjo Baldé, um dos falecidos durante a flagelação, veio o Jobo, natural de Galomaro.

Não tínhamos padaria, e em conversa informal perguntei tanto no Pel Caç Nat 52 e do Pel Mil 101 se havia voluntários para as tarefas da padaria. Jobo ofereceu-se logo, e, moderno e polivalente, fez-me a seguinte proposta: Faria pão para a tropa dentro do seu horário, independentemente dos reforços, idas a Mato de Cão, colunas de abastecimento, emboscadas e operações; fora do serviço queria dedicar-se ao que hoje se chama o empreendedorismo.

E assim foi, ele era bem jovem e deu conta do recado tanto na actividade independente como nas tarefas marciais. Era um regalo o cheirinho a pão, a partir de Julho de 1969. A Missirá civil deu-lhe farta clientela, todo o pão alvo era escoado sem reclamações.

O Jobo ainda resistiu quando fomos para Bambadinca, em Novembro, queria ficar, mas ninguém no Pel Caç Nat 54 quis trocar com ele. Resignado, abandonou as lides da panificação. Todos os anos me escreve a pedir para vir para Lisboa, quer trabalhar e de preferência numa padaria. Confesso que a vida foi bem madrasta com o Jobo, a viver na miséria e sem esperança em dias melhores.

Esta é a primeira fotografia do Jobo na sua padaria: ele amassa cheio de vontade o nosso primeiro pão; veio um mestre do Cossé ensinar a fazer o forno; ele amassa num cunhete de granadas de bazuca mas do que gosto mais é a determinação do seu olhar, há ali um mundo de sonhos que ninguém, parecia, iria parar. Honra ao trabalho, amassarás o teu pão com o suor do teu rosto.

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3632: Álbum das Glórias (49): O meu ex-Cap Mil Abel Quintas, da CCAV 8350, os Piratas de Guileje (J. Casimiro Carvalho)

domingo, 25 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3793: Fauna & flora (16): Relações amistosas com o Macaco-cão na zona de Cufar (Mário Fitas)

Mensagem de Mário Fitas, de 12 de Janeiro de 2009


Fauna na região de Cufar em 1965/66

Quando a CCaç 763 tomou conta do sector de Cufar, existia uma enorme lagoa entre o Aquartelamento - antiga quinta do madeirense Sr. Camacho - e a tabanca de Iusse.
Era pois um ponto onde, para além do gado dos moradores daquela tabanca pastoreava e se sedentava, havia outros clientes que passo a referir: gazelas, cabras do mato, javalis, porcos-espinhos e alguns predadores, como uma espécie de gato bravo, mais parecido com o nosso furão.

Quanto a répteis desde as serpentes às mais variadas espécies de cobras, tudo por ali aparecia, até uma espécie de lagarto grande parecido com as iguanas e de que o meu amigo Alfa Nan Cabo se banqueteava.

Mas o verdadeiro espectáculo era dado pelas aves: eu, que depois da guerra fui ornitólogo, fartei-me de identificar variadíssimas espécies que frequentavam a lagoa: desde o grou coroado lá conhecido pela Ganga; pato da Berbéria cá conhecido como pato mudo. Havia diversas qualidades de patos e de todos os tamanhos, assim como rolas, onde conheci pela primeira vez a rola diamante (pequenina com os seus pontinhos nas asas) até às rolas gigantes incluindo pombos verdes.

Os massorongos (conhecidos por papagaios do Senegal) e periquitos verdes. O marabu, os jagudis (almeidas daquela terra) e protegidos por lei. Vinha depois a passarada miúda: desde os barulhentos tecelões que faziam das árvores colmeias de ninhos, até aos pequeninos bicos de lacre, degolados e sumptuosas viúvas do paraíso no seu lindo e ondulante esvoaçar.

Com tudo isto, a guerra foi acabando. Não foi só desastre humano, foi também ecológico.

Quanto aos nossos amigos Babuínos (macaco-cão), nunca houve conhecimento de matança, para comer ou por simples desporto.

Tirando os problemas das suas relações provocatórias com os nossos cães (por esse motivo tivemos de prescindir deles em determinadas operações). As relações eram amistosas e até por vezes nossos batedores, pois quando progredíamos por estrada, eles faziam a mesma coisa que nós, progredindo à nossa frente “em fila de pirilau” e houve pelo menos duas ocasiões se bem me lembro que nos foram úteis. Mas nessas alturas pareceu que fizeram mais barulho que o matraquear das armas.

Em termos que possam servir para estudo, e relativo ao tempo em que estivemos em Cufar, havia dois grupos bem definidos e localizados, e que seguramente se a memória não me falha, andariam pelos trinta e cinquenta exemplares entre todos, fêmeas, machos e é claro o manda chuva dominante, sempre no comando.

Um dos grupos, e o mais numeroso, costumava-nos acompanhar pela estrada (antiga) para Catió. Desde o começo da mata ao cimo da lala a seguir ao cruzamento de Camaiupa (Cabaceira) chegando até às proximidades de Priame.

O outro grupo aparecia na estrada Catió Cobumba, após Camaiupa já próximo da mata de Afiá.

Parece ser tudo, ficarei satisfeito, se este escrito servir para qualquer estudo.

Da esquerda para a direita: Soldado que não recordo o nome, de camuflado o Fur Mil Enf Juvenal, o Fernando que nos acompanhou desde Bissau, Mário Fitas Fur Mil Oper. Espec. e Olindo apontador de bazuca da minha secção. Foto de Mário Fitas.

Foto que me foi concedida pelo Manuel Brita condutor das Fox e que esteve em Cufar no tempo do António Graça de Abreu.
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Notas de vb:


Guiné 63/74 - P3792: O Nosso Livro de Visitas (56): Paulo Botelho procura fotos da CCAÇ 2789, Guiné, 1970/72

1. Mensagem de Paulo Botelho, com data de 26 de Outubro de 2008

Assunto: Fotos da CCAÇ 2789

Caro Sr. Luís Graça,
Antes de mais ficam os meus sinceros parabéns pelo seu trabalho no Blogger.

Estou a enviar-lhe este mail, porque gostaria se possível de perguntar ao sr. Luis
se tem em sua posse fotografias do CCAÇ 2789, ano 1970/72, que pudesse enviar-me via mail.

Agradecia-lhe imenso, visto que tenho um familiar que esteve lá, a quem gostaria de mostrar as fotos.

Obrigado. Sem outro assunto de momento
Com os Meus Melhores Cumprimentos.

Aguardo resposta.

pxemrei@gmail.com

2. No dia 18 de Dezembro de 2008 foi enviada uma mensagem ao nosso camarada Luís Moreira, pedindo ajuda.

Caro Luís Moreira:

Votos de boa saúde na linda cidade de Viana do Castelo. Podes dar uma dica a este amigo que nos contactou?

Votos de Santo Natal e bom Ano 2009.
Um abraço
Carlos Vinhal


3. No dia 19 foi enviada resposta a Paulo Botelho

Caro amigo:

As nossas desculpas por só agora estarmos a dar resposta à sua mensagem.

Contactei hoje mesmo um camarada do nosso Blogue que se chama Luís Moreira, de Viana do Castelo, e que foi Furriel de Transmissõesé na CCAÇ 2789, para ver se ele o poderá ajudar.

Vamos esperar pelas suas notícias.

Um abraço de
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


4. No mesmo dia recebíamos esta mensagem de Paulo Botelho:

Caro sr. Carlos Vinhal:

Antes de mais, fica desde já os meus Parabéns pelo Blog.

Agradeço a sua atenção e paciência dispensada. No entanto o nome do familiar que referi é João Antão e a Net mais computador são coisas que nunca lhe passaram pelos planos. Eu é que lhe tenho mostrado algumas coisas do vosso Blog.

Deixo o contacto telefónico dele caso lhe seja útil.
O numero é o 296 442 759.

Pertenceu ao CCAÇ 2789 / Vigilantes, ano 1970/72.

Abraços amigo.
Obrigado.
Ficarei a aguardar feedback

PS - Segue em anexo duas fotos mostrando o monumento em honra aos ex-combatentes de cá da ilha de São Miguel.





5. Comentário de CV

Apesar do pedido de ajuda feito ao camarada Luís Moreira, se alguém tiver em seu poder as fotos solicitadas pelo nosso amigo Paulo Botelho, faça o favor de as fazer chegar até ele para dar alegria ao nosso camarada João Antão.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3781: O Nosso Livro de Visitas (55): Carlos Figueira, ex-Fur Mil da CCAÇ 4946, Jemberem, Cacine e Bolama (1974)

Guiné 63/74 - P3791: Estórias do Zé Teixeira (36): O El Gonzalez (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)

1. Publicamos hoje a 34.ª estória de Zé Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, enviada em 2 de Janeiro de 2009.


O EL GONZALEZ

El Gonzalez, abafador de tacos de profissão (1). Estado natural, alcoolizado. Conheci-o na quinzena em que, perdidos nas Serras da Beira Baixa, nos preparavamos para partir para a guerra na Guiné. Como tudo servia para carne para canhão, El Gonzalez já marcado pelo vício do álcool, logo deu sinal de si. Num ambiente tão propício, como o de viver sobre calor escaldante, longe da família e num ambiente de guerra, a situação agudizou-se.

Como telegrafista o Pré era baixo, mas certo e sabido que no dia em que El Gonzalez andasse sóbrio era para se deitar um foguete, na certeza que poucos se gastariam nos cerca de dois terços de comissão que teve de cumprir. Como arranjava o patacão, não sei. É certo que havia sempre alguém a pagar uma cervejita, só para o ver feliz, mas não era o suficiente para o seu grau de alcoolização permanente.

Durante a visita que Marcelo Caetano fez à Guiné, coube-me a sorte de ir passar a noite na outra margem do rio de Buba, exactamente no local de que servia o PAIGC para nos vir cumprimentar à canhoada, enquanto a sua Infantaria atacava do lado oposto, junto ao cemitério ou junto à pista de aviação. Local onde o comandante Manecas - o futuro comandante do PAIGC responsável pelos Mísseis Strela, não foi apanhado à mão pelos Fuzas, porque a sua estrelinha o acompanhava, no célebre ataque a Buba em Outubro de 1969, estudado no terreno pelo Capitão Peralta (cubano) e pelo próprio Manecas. Operação que se lhes tivesse corrido de feição, Buba teria caído nas suas mãos. Era esse pelo menos o seu projecto, segundo me contou o Comandante em Março passado. Ataque que eu não vivi por ter ido uns dias antes para Empada.

Após uma penosa marcha, por Sinchã Cherno, para iludir os possíveis espiões existentes na Tabanca, como se confirmou posteriormente na sequência do referido ataque de Outubro, existirem em Buba e para ultrapassar as barreiras naturais do rio – braço de mar, que se espraiava até Buba, inundando e alagando as terras limítrofes, para recolher novamente ao sei leito na maré vasa.

Pois bem, o El Gonzalez, foi o telegrafista, que nos acompanhou nesta árdua missão.

Na nossa marcha, pudemos apreciar um belíssimo espectáculo, nunca mais visto. Caranguejos multicolores, aos milhares espalhados no tarrafo, formando um colorido tapete que mudava de forma e cor em função da nossa evolução no terreno. Ao sentirem o ruído que provocávamos na marcha, ao pôr os pés no chão, fugiam à nossa frente, procurando um buraco na lama para se esconderem, formando uma espécie de semi-circulo. Nessa deslocação precipitada mudavam de posição no terreno, modificando permanentemente as cores do tapete que formavam com os seus corpos. Espectáculo fantástico que devo ao senhor Primeiro Ministro, dado que se ele não tivesse ido à Guiné, eu possivelmente não teria ido passar a noite a tão perigoso lugar e assim perderia a esta imagem que ainda retenho no baú das minhas recordações.

O El Gonzalez, chegado ao local, pousou o rádio, encostou-se a ele e adormeceu, roncando toda a noite. Acordou no dia seguinte, à pressão, já o sol ia alto e a primeira pergunta que fez foi:
- Onde estamos ?

Certo e sabido que com o seu roncar, não havia inimigo que tivesse a coragem de se aproximar e impossibilitou que algum camarada mais despreocupado adormecesse.

Na sequência desta aventura, enviei-o para o Hospital em Bissau como alcoólico crónico, na esperança de conseguir recambiá-lo para Lisboa. Oito dias depois, apareceu em Buba como curado. Passados uns dias, face ao seu contínuo estado, foi de novo dar um passeio até Bissau, mas só à terceira tentativa, logrou ganhar o passaporte para a Capital.

Isto passado mais de ano e meio de comissão.

(1) Depois da colocação de tacos no soalho das casas. Com uma lixadeira faz o polimento dos tacos e a enceramento

Zé Teixeira
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3767: Estórias do Zé Teixeira (35): O Lisboa (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)

Guiné 63/74 - P3790: Dossiê Guileje / Gadamael (3): "Um precedente grave" (Diário, Mansoa, 28 de Maio de 1973) ... (António Graça de Abreu)

Capa do livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e ÁguiA Pura (Lisboa: Guerra e Paz. 2007. 220 pp)... O autor, António Graça de Abreu , foi Alf Mil, CAOP 1,Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar (1972/74). Dele se publica a seguinte mensagem:


Lá vai o português, lá anda. Dobrado ao peso da História, carregando-a, de facto, e que remédio - índias, naufrágios, cruzes de padrão (as mais pesadas). Labuta a côdea do sol e já nem sabe se sonha ou se recorda. Mal nasce, deixa de ser criança, fica logo com oito séculos.

José Cardoso Pires (1925-1998) em E agora, José? publicado em 1977.


Meus caros camaradas e amigos

O Luís Graça, por bem, infatigável no labor de nos unir neste seu, nosso blogue, mesmo quando desentender é também uma forma de nos entendermos, (somos gente plural), o Luís Graça pediu-me autorização para publicar o meu texto sobre Guileje escrito em Mansoa, uma semana após a retirada de Guileje.

Aí está o balanço do dia, tal como surge no meu Diário da Guiné, Lisboa, Guerra e Paz Editora, 2007, pag. 106.


Mansoa, 28 de Maio de 1973

O outro “Gui”, Guileje. O que se passou no aquartelamento do sul? Dizem-me que Guileje tem os melhores abrigos de toda a Guiné, em cimento armado, mas foi sendo sucessivamente flagelada, dias a fio, com o mais variado tipo de armas e, tanto quanto sei pela primeira vez na história recente desta guerra, as NT abandonaram um aquartelamento e retiraram-se para Gadamael, outro destacamento também junto à fronteira mas mais próximo de Cacine e do mar. Isto sem o conhecimento do Comandante-Chefe, general Spínola e dos estrategas de Bissau. Pelo menos é o que consta, estou a vender a notícia como a comprei, mas parece produto afiançado.[1]

Guileje fica a cinco quilómetros da fronteira com a Guiné-Conacry e sempre foi um dos lugares mais atingidos pela guerra. Os aquartelamentos junto à fronteira têm estes problemas, são fáceis de flagelar. Os guerrilheiros dispõem de muitos quartéis no país ao lado, Senegal ou Guiné-Conacry, caminham uns quilómetros, entram na nossa (deles!) Guiné e despejam toda a artilharia pesada e ligeira que têm à disposição sobre os aquartelamentos onde se encontra a tropa portuguesa. Depois regressam aos quartéis do outro lado da fronteira. Missão cumprida.

Guileje é um precedente grave. Diz-se por aqui que depois de Guileje outros aquartelamentos se seguirão, irão sendo abandonados, tipo bola de neve e já se fala em começarmos todos a preparar a trouxa para marcharmos para Bissau, a caminho de casa. Não acredito. É verdade que alguma coisa se alterou, as nossas tropas quase não podem contar com a força aérea, o que é muito negativo, mas ontem já ouvi dizer que Guileje ia ser reocupada pelos pára-quedistas das minhas conhecidas companhias 122 e 123.

De Lisboa, chegam bocas, deformações, notícias fantásticas: um quartel a vinte quilómetros de Bissau tomado pelo PAIGC, centenas de mortos. Valha-nos Deus! Guileje fica talvez a uns cento e cinquenta quilómetros de Bissau e dentro do aquartelamento houve quatro ou cinco mortos. Mas é verdade que naquela região continua a morrer gente, demasiada gente. As NT retiraram de Guileje porque eram constantemente flageladas, viviam dentro dos abrigos, não podiam sequer vir cá fora para se abastecerem de água, não tinham apoio aéreo, a situação era insustentável.



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[1] “Deixando as instalações (de Guileje) e o material pesado, incluindo a artilharia, nas mãos do PAIGC, o major Coutinho e Lima fez seguir a tropa para Gadamael, transportando o que podia. Em 22 de Maio chega a Bissau para ficar sob prisão no quartel da Polícia Militar, na Amura. É substituído pelo coronel pára-quedista Rafael Durão, em fim de comissão e pelo capitão Manuel Monge. E foi sobre os seus ombros jovens mas firmes que, após o regresso de Durão a Bissau, caiu a pesada responsabilidade de aguentar a tragédia de Gadamael.” Em Otelo Saraiva de Carvalho, Alvorada em Abril, Lisboa, Livraria Bertrand, 1977, pag. 122.


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Permitam-me agora apenas um comentário (*).

Este texto foi escrito há quase trinta e cinco anos, em Mansoa, uma semana após o abandono de Guileje, com as informações de que dispunha na altura, via meu CAOP 1, através dos meus majores, etc. O último parágrafo contém algumas incorrecções factuais.

Em Guileje não “houve quatro ou cinco mortos”, como escrevi , apenas faleceu um furriel. As tropas em Guileje naqueles dias críticos, apesar dos Strella, tiveram apoio aéreo como demonstrou recentemente no nosso blogue o tenente-general António Martins de Matos, na altura um dos pilotos dos Fiats. Por último, se na altura, com 26 anos, eu afirmei que “a situação era insustentável”, hoje, com 61 anos, conhecendo melhor a distribuição das forças no terreno e todo o enquadramento militar que rodeou a retirada de Guileje, estou convencido de que a situação era sustentável. Basta recordar Guidage e Gadamael, sofreram mais do que Guileje e não houve retirada militar.

Curioso também recordar que o hoje general Manuel Monge, meu amigo, actual Governador Civil de Beja, é singularmente elogiado por Otelo Saraiva de Carvalho na nota de rodapé que acrescentei em 2007, por ter aguentado Gadamael, com os pára-quedistas e a restante tropa. Curioso recordar que o então major Manuel Monge, com o major Casanova Ferreira, encabeçou a coluna militar que, a 16 de Março de 1974, saiu das Caldas da Rainha em direcção a Lisboa, antecipando o 25 de Abril.
O problema era de natureza política.

Um abraço,

António Graça de Abreu,
(alf mil, CAOP 1, Guiné, 1972-1974)
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Nota de L.G.:

(*) vd. postes anteriores desta série (Dossiê Guileje / Gadamael 1973):

24 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3788: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (1): Depoimento de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3789: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (2): Esclarecimento adicional de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)