terça-feira, 2 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4452: Controvérsias (19): O 'massacre do Pidjiguiti', em 3 de Agosto de 1959: o testemunho de Mário Dias

Guiné-Bissau > Bissau > c. 1975 > Novo mapa, pós-colonial, da capital da nova república, já com as novas designações das ruas, avenidas e praças, que vieram substituir o roteiro português: Av 3 de Agosto, Av Pansau Na Isna, etc. Veja-se a localização do porto do Pidjiguiti (para os barcos de pesca e de cabotagem), à esquerda do porto de Bissau (para os navios da marinha mercante).

Foto: © A. Marques Lopes (2006). Direitos reservados



1. No dia do enterro de Luís Cabral (1931-2009), achámos oportuno e pertinente recuperar o testemunho do nosso camarada e amigo Mário Dias sobre os trágicos acontecimentos do 3 de Agosto de 1959, que estiveram na sua origem um conflito laboral, opondo os trabalhadores portuários e os marinheiros da Casa Gouveia à respectiva gerência local que se recusava a proceder à actualização (anual) dos salários.

Desde o seu regresso à Guiné, em 1953, Luís Cabral era contabilista (ou guarda-livros, como se dizia na época) na Casa Gouveia, um emprego que lhe tinha sido arranjado pelo próprio irmão, o Engº Agrónomo Amílcar Cabral. Trabalhador-estudante, terá completado em 1958 o 5º ano. Em 1956, era um dos co-fundadores do clandestino PAIGC. E em 3 de Agosto de 1959 foi testemunha do 'massacre do Pidjiguiti' (*)

(…) "Da varanda do meu apartamento que estava situado frente ao porto, pude presenciar a parte final do monstruoso crime da caça ao homem no rio Geba. O sol desaparecera nessa tarde dos céus de Bissau; a atmosfera pesada e escura parecia gritar com o povo.

"A tarde sangrenta de 3 de Agosto fizera mais de cinquenta mortos e muitas dezenas de feridos entre os marinheiros pacíficos que mais não queriam que viver um pouco melhor.

"Na noite de 3 de Agosto, reuni-me com o Aristides e o Fortes. Este, na sua qualidade de chefe da Estação Postal, tinha podido meter no correio, que devia partir na manhã seguinte, cópias de um comunicado elaborado rapidamente sobre os acontecimentos, endereçadas às principais emissoras escutadas em Bissau.

"Lembro-me bem que a Rádio Brazzaville, a BBC, a Rádio Conakry e a Rádio Dakar, estavam entre aquelas que receberam e difundiram a notícia que os colonialistas não queriam que saísse da Guiné. Simultaneamente, foi também enviado um primeiro relatório ao Amílcar que se encontrava nesse momento em Angola." (...)


Há 3 anos atrás, na I Série do nosso blogue, publiquei a versão do Mário Dias (**), que também foi testemunha dos acontecimentos, tal como Luís Cabral. E comentei o seu texto, mais ou menos nestes termos:

O massacre do Pidjiguiti é um dos mitos fundadores do PAIGC. Aliás, para os seus ideólogos, marca o início da luta de libertação nacional. O depoimento do Mário Dias é uma peça importante para se fazer a história recente da Guiné-Bissau: reivindicações laborais dos marinheiros do serviço da cabotagem das casas comerciais de Bissau (e, em particular, da Casa Gouveia, ligada ao grupo CUF - Companhia União Fabril) estiveram na origem de graves tumultos que foram prontamente reprimidos pelas autoridades portuguesas.

Trata-se de um depoimento que terá que ser tido em conta pelos nossos historiadores (tanto de um lado como do outro). E sobretudo por nós, portugueses e guineenses, que temos direito à verdade. Eu, pessoalmente, só conhecia (e mal) a versão do PAIGC (e de Luís Cabral), que fala em massacre, em 50 mortos e mais de um centena de feridos.

Na época - é bom lembrá-lo - a imprensa portuguesa não era livre, pelo que nunca nos poderia dar a, nós, metropolitanos (nem muito menos aos poucos guineenses que liam jornais ou ouviam rádio), uma versão isenta dos acontecimentos. Havia a censura, a polícia política, o partido único, o governo de Salazar... É bom não esquecê-lo (um recado que serve sobretudo para os mais novos mas também para os mais velhos, que eram umas crianças, nessa época: eu, por exemplo. tinha 11 anos...).

Infelizmente, eu não conhecia, em 2006, investigação de arquivo sobre este assunto. O historiador Leopoldo Amado tentou já fazer luz sobre este e outros acontecimentos que antecederam o início da guerrilha do PAIGC, na sua tese de doutoramento em história contemporânea, sobre a guerra colonial versus guerra de libertação, defendida em provas públicas, na Universidade de Lisboa (2007). Mas a sua perspectiva é sobre o Pidjiguiti é macro, não micro (***): ele não me parece trazer elementos novos, historiográficos, sobre os acontecimentos do 3 de Agosto, se bem que eu continue a aguardar a publicação, em livro, da sua tese de doutoramento, de há muito prometida...

Como é timbre do nosso blogue, temos procurado pautar-nos pela procura da verdade dos factos, tendo publicado, logo no primeiro ano (2005/06), alguns notáveis (e inéditos) documentos sobre a experiência da guerra na Guiné (1963/74).

Como então escrevíamos, "nenhum de nós é detentor da verdade. E a verdade não se resume aos factos: mais complexa é a sua análise e interpretação"... Mas também a sua recolha..

O depoimento do Mário Dias honrou (e continua a honrar) o nosso blogue. O Mário, que anda agora mais fugidio das lides blogísticas, é um homem que, sem negar os seus valores, a sua identidade e o seu passado, sempre revelou uma grande sensibilidade, sabedoria, humildade e honestidade intelectual...

Agradeço-lhe mais uma vez o ter confiado em nós para publicar a sua versão dos acontecimentos do 3 de Agosto de 1959. Ele não se arvora em dono da verdade. Simplesmente, ele foi uma testemunha (privilegiada) dos acontecimentos: ele estava lá em Bissau, no Pidjiguiti, nesse dia 3 de Agosto de 1959 (que é hoje dia de feriado nacional na República da Guiné-Bissau), na qualidade, algo insólita, de soldado recruta, cuja companhia, acabada de chegar de Bissalanca e a caminho do quartel em Santa Luzia, foi chamada à pressa para ajudar a repôr a ordem pública...

Essa circunstância valoriza muito a sua versão (presencial) do que ocorreu naquele dia e que, à distância de 47 anos, não podemos deixar de condenar e lamentar, como um dos episódios que ensombraram a presença portuguesa naquelas paragens... A mim, pessoalmente, como português, é um episódio da nossa história em África que me envergonha... Tal como me envergonham, enquanto homem e amigo da Guiné, os fuzilamentos do pós-independência, efectuados pelo PAIGC em nome da justiça revolucionária...

Já na altura tinha escrito que não ia entrar em polémica com ninguém (e muito menos com o nosso querido Mário) sobre a contabilidade dos mortos e o conceito (técnico-jurídico) de massacre. Nem sobre outros alegados massacres que terão occorrido na longa Guerra do Ultramar / Guerra Colonial, tanto na Guiné como nas outras duas frentes, Angola e Moçambique, a começar pelo terrível massacre de população civil cometido pela UPA no norte de Angola, em 1961.

No início de 2006, este assunto ainda era doloroso para todos nós. E fracturante. Mas também já não era tabu, com a criação de uma janela aberta, por e para os antigos combatentes de um lado e do outro, uma janela aberta para o debate (tanto quanto possível possível, sereno) sobre estes e outros fantasmas da guerra colonial que precisavam de ser exorcizados... (L.G.).

Guiné > Bissau > Ponte-Cais > 1969 > Postal Ilustrado, edição Foto Serra.

Foto: ©
Tino Neves (2006). Direitos reservados


1. Texto do Mário Dias (ex-sargento comando, Brá, 1963/66) (**)

Caro Luis:

Tinha guardado o propósito de falar sobre os acontecimentos de Agosto de 1959 no Pidjiguiti proximamente. Atendendo, porém, que eles têm sido referidos recentemente no blogue, antecipei a decisão. Espero que se consiga lançar um pouco de luz sobre esta tragédia de forma a que se evitem especulações futuras.


Um abraço
Mário Dias



Os acontecimentos do Pidjiguiti em 3 de Agosto de 1959 (depoimento de Mário Dias)

[Subtítulos, a bold, de L.G.]

Muito se tem escrito e comentado sobre os acontecimentos que tiveram lugar no cais do Pidjiguiti em 3 de Agosto de 1959. Eu estive lá. À época dos factos, cumpria o serviço militar obrigatório, ainda como recruta (o Juramento de Bandeira teve lugar uma semana depois, precisamente a 10 de Agosto) (***).

Para melhor entendermos a greve e consequente revolta dos marinheiros, há que recuar um pouco no tempo e no contexto em que se movimentava a actividade dos marinheiros.

As principais casas comerciais da Guiné (vou designá-las pelo nome abreviado como eram conhecidas, Casa Gouveia (CUF), NOSOCO, Eduardo Guedes, Ultramarina e Barbosas & Comandita, tinham ao seu serviço frotas de lanchas - umas à vela e outras a motor - que utilizavam no serviço de cabotagem transportando mercadorias para os seus estabelecimentos comerciais e, no regresso, traziam para Bissau os produtos da terra, principalmente mancarra e arroz. A maioria deste tráfego era pelo rio Geba, até Bafatá e, para o Sul, até Catió e Cacine.


(i) Tudo começou com um conflito laboral

Anualmente, essas empresas se reuniam para acordarem os salários a pagar aos diversos elementos da tripulação das embarcações. Esse acordo tinha a finalidade de ajustar o salário nas várias frotas, de forma a evitar concorrência no engajamento do pessoal. É claro que, embora efectivamente todos os anos fossem aumentados, os marinheiros não eram tidos nem achados nestas reuniões. Era comer e calar à boa maneira da época. O mesmo se passava, aliás, em relação ao preço a praticar anualmente na compra do amendoim (mancarra) e que era fixado por tabela governamental, ouvidos os comerciantes. Os agricultores não era ouvidos nem tinham voto na matéria.

Acordo estabelecido, as várias firmas comerciais começaram a pagar aos marinheiros o novo salário. Porém, a Casa Gouveia não procedeu ao aumento e continuou a pagar pela tabela do ano anterior. Passaram-se meses e os marinheiros questionavam o gerente - na altura o ex-funcionário do quadro administrativo Intendente Carreira - sem resultados e até com uma certa sobranceria, tique que lhe deve ter ficado dos tempos de funcionário administrativo. Com o descontentamento a aumentar e ânimos cada vez mais exaltados se chegou à tristemente célebre tarde de 3 de Agosto de 1959.

E agora o relato dos acontecimentos por mim presenciados e conforme informações na altura colhidas.


(ii) O triângulo Santa Luzia, Bissalanca e Pidjiguiti: uma companhia de recrutas ao serviço da lei e da ordem

Nesse dia passou por Bissau, a caminho de Angola, uma alta entidade da Força Aérea. Ocupava no governo, salvo erro, o cargo de Secretário de Estado de Aeronáutica. Fosse qual fosse a sua função, a verdade é que tinha direito a honras militares à sua chegada ao aeroporto. Não havendo outra tropa com capacidades para tal missão, embora ainda recrutas e como tal impedidos regulamentarmente de prestar guardas de honra, acabámos por ser nós a fazê-lo. Bem limpos e engraxados, mauser com baioneta calada, luvas brancas, partiu a Companhia de Recrutas para Bissalanca (****).

A cerimónia decorreu de forma brilhante (nós éramos um espanto!) e iniciámos o regresso ao nosso quartel em Santa Luzia. Ao aproximarmo-nos da praça do Império, comecei a reparar que muita gente se dirigia apressadamente, alguns até corriam, em direcção ao rio. E, um pouco antes de atingida essa praça, fomos interceptados pelo comandante da companhia, capitão Teixeira, que se dirigiu ao oficial que comandava a coluna, tenente Vaz Serra, com quem esteve a conversar por alguns momentos.

Retomada a marcha, ficámos todos surpresos por virarmos à direita em direcção ao rio em vez de à esquerda para Santa Luzia. Conforme descíamos a avenida da República víamos que algo devia estar a acontecer pois cada vez havia mais pessoas aglomeradas e maior era a agitação que demonstravam.


(iii) Polícias africanos armados de espingardas Lee Enfield 7,7 mm

A certeza tive-a quando, já perto da Casa Gouveia, vi, em cima de um camião que seguia para o hospital, vários homens em grande exaltação. Um deles ficou-me na memória: de pé, escorrendo sangue de um ombro, barafustava e agitava os braços, dava punhadas no peito como um possesso. Impressionante! Ainda hoje, passados todos estes anos, quando se fala destes acontecimentos do Pidjiguiti, é esta a imagem que me ocorre.

Chegados ao local, vi uma considerável multidão nas imediações, os portões do Pidjiguiti encerrados e uma força da PSP, constituída por pouco mais de uma dezena de seguranças, como chamávamos aos polícias africanos, armados com espingardas Lee Enfield 7,7 mm, enquadrados por 2 ou 3 graduados europeus.

Na altura já tinham terminado os tiros e encontravam-se apenas a conter a multidão e a evitar que os marinheiros e trabalhadores do cais de lá saíssem em direcção à Casa Gouveia. Fomos mandados apear das viaturas e só então nos deram as indicações da nossa missão que foi, simplesmente, cercar os terrenos anexos ao Pidjiguiti (no local onde mais tarde nasceram as Oficinas Navais e instalações da Marinha e Fuzileiros) que na altura eram terrenos baldios. Não devíamos deixar ninguém sair por esse lado que não tinha vedação. Ainda vimos alguns tentando fugir por aí, atravessando o lodo, mas desistiam ao ver o cordão por nós ali formado.


(iv) O papel dos militares, armados de mausers, mas sem munições...

Nós, militares intervenientes, não demos nenhum tiro. Aliás, nem podíamos pois nem tínhamos munições. Como já referi estávamos a regressar de uma guarda de honra quando fomos desviados para o local. Deve ter sido bem caricata a nossa postura, de luvas brancas, num cenário daqueles.

Ali nos mantivemos, aproximadamente 30 minutos, até os ânimos acalmarem (era o que se pretendia) e regressámos ao quartel.


(v) A reconstituição dos acontecimentos, feita no dia seguinte

Nos dias seguintes não se falava de outra coisa. Como não tinha assistido ao início dos acontecimentos, fui perguntando aos que mais de perto o tinham seguido e a versão generalizada era a seguinte:

Nessa tarde, mais uma vez, aproveitando a presença do gerente da Casa Gouveia no local, os marinheiros e descarregadores pertencentes a essa firma comercial reclamaram pelo aumento de salário que todas as outras empresas já estavam a praticar.
- Casa Gouveia, nada. Então como é, senhor Intendente?

As coisas começaram a azedar e teve que retirar apressadamente a bem da sua integridade física. Chamou-se a polícia. Um subchefe que para lá se dirigiu, não sei se por falta de tacto em situações como aquela ou porque a exaltação dos marinheiros e trabalhadores era já considerável, foi agredido com um remo na cabeça e teve de imediato que ser socorrido e levado para o hospital. Vieram reforços, já armados, e como se organizava no cais um movimento em direcção à Casa Gouveia, armados de remos, ferros e do que havia à mão com a intenção de tudo escavacar, fecharam os portões para impedir a sua saída. Mesmo assim não desistiram e começaram a galgar o portão e a vedação.

Entretanto, o comandante militar, tenente-coronel Filipe Rodrigues, chegado ao local inteirou-se da situação e, ao ver aquele grupo armado de remos, paus, etc. a marchar agressivamente em direcção à Casa Gouveia, deu ordens aos polícias para dispararem por ser a única forma de os deter.

E foi assim que aconteceu. O resultado foram 16 mortos e não 50, ou até mais, como já tenho visto escrito. Por mim, um que fosse já era demais. Mas, atendendo às circunstâncias do momento, hoje questiono-me: que teria acontecido se não tivesse sido travada aquela multidão da única forma que foi possível? Certamente teríamos muita destruição e bastantes mais mortes a lamentar. E ter-se-ia gerado uma espiral de violência de consequências muito mais graves.

Guiné > Bissau > 1959 > Alguns dos 1ºs Cabos Milicianos do 1º Curso de Sargentos Milicianos, realizado na província portuguesa da Guiné, em participaram juntos, pela primeira vez, europeus e guineenses."De cócoras, a partir da esquerda: Domingos Ramos; um outro cujo nome não me lembro mas que também foi para a guerrilha; Laurentino Pedro Gomes.

"De pé: não me recordo o nome mas também foi para a guerrilha; Garcia, filho do administrador Garcia, muito conhecido e estimado em Bissau; mais um de cujo nome não me recordo; eu, [Mário Dias]; e mais outro guerrilheiro. Como se pode concluir, o recrutamento de 1959 do CIC [Centro de Instrução de Civilizados] , foi um autêntico alfobre [de quadros ] para o PAIGC.

Foto e legenda: ©
Mário Dias(2006). Direitos reservados.


(vi) Lições e conclusões:

Da narração destes tristes acontecimentos podemos realçar os seguintes factos:

- O PAIGC não esteve por detrás da ocorrência. Ela foi inteiramente da responsabilidade dos marinheiros e trabalhadores do cais pertencentes à Casa Gouveia, por motivos meramente laborais. Os marinheiros das outras empresas não estiveram envolvidos, pelo menos no início dos acontecimentos. É possível que, por solidariedade, alguns se lhes tenham juntado. O PAIGC aproveitou-se inteligentemente deste movimento, como sempre fez - o que só nos merece admiração - para conquistar mais uns tantos seguidores.

- Não se pode considerar o ocorrido como uma simples greve, conforme é vulgarmente referido. Foi mais do que isso. Tendo começado por greve, rapidamente se transformou numa revolta violenta cujas consequências são difíceis de prever se não tivesse sido travada. Se a referida revolta era ou não justificada, é-me difícil concluir. Sim, atendendo à injustiça de que estavam a ser vítimas. Não, pelas proporções que lhe deram.

Antes de concluir, parece-me que o termo massacre, aplicado aos acontecimentos do Pidjiguiti, é um pouco exagerado, não por o número ser muito inferior aos 50 habitualmente referidos, mas porque o conceito que a palavra implica, se refere à chacina indiscriminada, a uma carnificina injustificada do género descrito nos livros de história como passar tudo a fio de espada.

Com respeito aos massacres de populações balantas e beafadas na região de Bambadinca nos primeiros anos de 60, referidos no blogue-fora-nada (******), embora não os possa negar ou confirmar, tendo eu saído da Guiné em Fevereiro de 1966, nunca deles ouvi falar o que é estranho pois, como se diz na Guiné, noba ka ta paga cambança - aforismo com um sentido semelhante ao as notícias espalham-se depressa. Numa terra como a Guiné onde tudo se sabia e comentava, é estranho que nunca tivesse ouvido falar em tal acontecimento. Deve ter sido muito bem ocultado.

E já que estamos a tratar de massacres, assunto tão melindroso e de que frequentemente acusam as nossas tropas, só tenho a dizer que durante toda a guerra colonial a que assisti e em que participei (depois da Guiné tive uma comissão em Moçambique e duas em Angola) massacres, massacres mesmo, na verdadeira acepção da palavra, só conheci um: foi o perpetrado pela UPA (mais tarde FNLA) no Norte de Angola em Março de 1961 sobre os fazendeiros brancos e suas famílias bem como sobre os negros bailundos fiéis aos seus patrões. Mas esses já estão esquecidos ou, convenientemente, nunca são referidos.
_____________

Notas de L.G.

(*) Vd. postes de:

1 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4447: PAIGC - Quem foi quem (7): Luís Cabral (1931/2009) (Virgínio Briote)

18 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLVII: Antologia (36): o massacre do Pidjiguiti (Luís Cabral)

(**) Vd. postes de:

15 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXV: Pidjiguiti, 3 de Agosto de 1959: eu estive lá (Mário Dias)

21 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXIII: Pidjiguiti: comentando a versão do Luís Cabral (Mário Dias)

(***) Vd. postes de:

22 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXV: Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - I Parte

25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXVI: Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - II Parte

26 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXVIII: Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - III (e última) Parte

26 de Fevereiro de 2006 >Guiné 63/74 - DLXXXIX: Pidjiguiti: resposta do Mário Dias ao Leopoldo Amado

(****) Sobre a vida militar do Mário Dias e de alguns dos seus camaradas que depois se alistaram nas fileiras do PAIGC, vd. postes de:

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCI: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCIII: Domingos Ramos e Mário Dias, a bandeira da amizade (Luís Graça / Mário Dias)

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCIV: O segredo do Mário Dias, ex-sargento comando

12 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2343: PAIGC - Quem foi quem (5): Domingos Ramos (Mário Dias / Luís Graça)

30 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3543: O segredo de ... (1): Mário Dias: Xitole, 1965, o encontro de dois amigos inimigos que não constou do relatório de operações

(...) Em 1959 , Mário Dias e Domingos Ramos tinham feito a recruta juntos, com início em 8 de Maio de 1959, numa unidade que então se chamava Centro de Instrução de Civilizados (CIC), destinado a naturais da Guiné considerados civilizados. O comandante era o capitão Teixeira, pai do historiador Severiano Teixeira, actual Ministro da Defesa. (No anos seguinte, passaria a chamar-se Centro de Instrução Militar (CIM), tendo sido transferido para Bolama)

Em 10 de Agosto de 1959, prestam juramento de bandeira, uma semana depois dos sangrentos acontecimentoss do Pidjiguiti, a 3, em que também tiveram uma pequena participação, ajudando a polícia a manter a ordem...

Em 14 de Agosto desse ano, os dois estão no 1º Curso de Sargentos Milicianos e estreitam a sua amizade.

Em 29 de Novembro de 1959, são promovidos a 1ºs cabos. O Mário fica em Bissau a dar recruta, enquanto o Domingos segue para Bolama. (...)


(******) Fui eu que fiz referência, na altura, em e-mail interno que só circulou pela nossa tertúlia, a alegados "massacres de populações balantas e beafadas" que terão ocorrido na região de Bambadinca (Samba Silate, Poindon), no início da guerra, reportando-me apenas a conversas, soltas, que eu fui tendo, durante a minha comissão (Maio de 1969 a Março de 1971) com os meus soldados africanos (leais, valentes, insuspeitos, fulas, entre eles o Abibo Jau, mais tarde fuzilado pelo PAIGC) da CCAÇ 12 mas também com outras fontes como o malogrado Seco Camará, mandinga do Xime, extraordinário guia das NT (morto em 26 de Novembro de 1970, na Op Abencerragem Candente > vd. poste de 25 de Abril de 2005 > Guiné 69/71 - VII: Memórias do inferno do Xime (Novembro de 1970) (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P4451: Poemário do José Manuel (28): Matar ou morrer ? Não...

Guiné > Região de Tombali > Mampatá > CART 6250 , Os Unidos de Mampatá (1972/74) > O repouso do guerreiro... O Zé Manel, ou o Josema (pesudónimo literário), "a reler o que havia escrito, numa pausa durante a protecção a uma coluna de Buba para Aldeia Formoso". Foto editada (LG).


Guiné > Região de Tombali > Mampatá > CART 62590 , Os Unidos de Mampatá (1972/74) > Um foto aérea de Quebo (ou Aldeia Formosa)...

Guiné > Região de Tombali > Mampatá > CART 6250 , Os Unidos de Mampatá (1972/74) > "Eu e o Álvaro, soldado de transmissões e meu companheiro de tabanca, baterista do Pop Five , um dos conjunto Rock mais famosos naquela época, autores da música que abria um dos programas mais ouvidos na Rádio Renascença. Nunca mais o vi, não vai aos encontros. Gostava de lhe dar um abraço, mas não sei por onde anda nem como está" (JML)


Guiné > Região de Tombali > Mampatá > CART 6250 , Os Unidos de Mampatá (1972/74) > "Num campo de futebol construído pela Companhia de Engenharia que fez a estrada [até Nhacobá]. Grande equipa de futebol:o Vieira, madeirense, que jogou nas camadas jovens (Iniciados, Juvenis e Juniores) dos três grandes, Benfica, Porto e Sporting; o Pinheiro, do Desportivo de Aves, o melhor médio que vi jogar até hoje; o Plácido, o guarda redes acrobata; o Alferes Esteves, o Simões, o Camilo (mais tarde deputado pelo PS), o Gomes e eu, o terceiro da Esquerda, na fila de pé, que jogava porque era quem fazia a equipa e também era o dono da bola" (JML).

O Capitão da companhia era um miliciano, Luís Marcelino, "um amigo, antes de ser capitão", um homem por quem o José Manuel ainda hoje nutre um sentimento de respeito e de amizade... Apareceu há dias no Nosso Livro de Visitas, e já recebeu um convite do Carlos Vinhal para se juntar a nós (**)

Fotos, legendas e poemas: © José Manuel Lopes (2009). Direitos reservados.


1. O nosso camarada José Manuel Lopes veio recentemente da Guiné-Bissau, aonde foi em romagem de saudade (**), com mais três ou quatro camaradas (o Nina, o Carvalho, o Leça, o Silvério Lobo, este, de Aldeia Formosa)... Já aqui nos deixou cinco crónicas desse longo e até de certo modo dramático, regresso ao passado (em particular, a Mampatá, na Região de Tombali)... Mandou-nos o ano passado uma colecção de cerca de seis dezenas de poemas, que temos vindo a publicar nesta série, Poemário do José Manuel... (***). Hoje fomos ao rabisco, e descobrimos mais dois poemas, inéditos. Estamos à espera que ele passe pela casa da avó, na Régua, e descubra o paradeiro de mais duas dezenas que se salvaram do auto de fé que ele um dia fez com os seus papéis da Guiné... Recorde-se que ele todos os dias escrevia um poema, enquanto abria a estrada Buba-Quebo-Mampatá-Nhacobá-Salancaur (inconcluída com o 25 de Abril de 1974)...

O último mail dele, de 20 de Maio, trazia-nos excelentes notícias sobre os seus vinhos, que são a menina dos seus olhos, lá na Quinta Senhora da Graça, no Alto Douro, Património Mundial da Humanidade:

Bom dia, Luís:

Claro que vou [ ao nosso IV Encontro, no dia 20 de Junho], eu e a Luisa, que está em Madrid com o Vasco , fomos convidados a apresentar os vinhos. O Pedro Milanos Reserva 2006, depois da Medalha no 'Wine Masters Challenge', teve uma crítica muito boa na Revista 'Wine' de Abril e esta em 10º. lugar no Top 100 dos vinhos de mesa. Não consegui fazer a inscrição pelo blogue, quando o meu filho regressar de Madrid vou pedir para o fazer por mim. Um abraço, jose manuel.


_____________

Sangue derramado

Puseste o pé em sítio errado,
um som violento, o pó levantado
escondeu por algum tempo
teu corpo violentado.

Sem pensar em outras minas,
correram em teu socorro,
o sangue fugia de teu corpo
e o héli não chegava.

Tua cara, ainda de criança,
ficava cada vez mais pálida,
tudo num silêncio angustiado.

Apesar dos teus vinte anos,
a vida fugia-te em golfadas,
porquê tanto sangue derramado?

s/l, s/d

Josema

[Enviado em 27/2/08]

Não matarás!mandamento por cumprir
por quem fala
em nome de Deus,
em nome da lei,
pela humanidade,
a quem sempre
sai a sorte,
neste xadrez
da vida e da morte
só nos resta
não ser peça
nesse jogo diabólico
e ficar na esperança,
não da vingança,
mas na passagem
da mensagem
para que acabem
de vez
os peões da desgraça.

Bissau 1973
Josema

[Enviado em 18 de Março de 2008]

[Fixação / revisão de texto: L.G.]


__________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 29 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4437: O Nosso Livro de Visitas (65): L.J.F. Marcelino, ex-Cap Mil da CART 6250, Mampatá, 1972/74

(**) Vd. postes de:

15 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4033: De regresso a Mampatá (Zé Manel Lopes) (1): Da Tabanca de Matosinhos ao Cabo Bojador

15 de Março de 2009 >Guiné 63/74 - P4034: De regresso a Mampatá (Zé Manel Lopes) (2): Do Trópico de Câncer à Mauritânia

21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4061: De regresso a Mampatá (Zé Manel Lopes) (3): Do Trópico de Câncer à Mauritânia (2.ª Parte)

26 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4081: De regresso a Mampatá (Zé Manel Lopes) (4): Senegal e Guiné-Bissau

31 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4118: De regresso a Mampatá (Zé Manel Lopes) (5): Finalmente chegados a Mampatá

(***) Vd.último poste desta série > 11 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4011: Poemário do José Manuel (27): Um ruído vem do céu / e há cabeças no ar, / hoje é dia de correio...

Guiné 63/74 - P4450: Estórias do Juvenal Amado (16): Borrasca no Pilão

1. Mensagem de Juvenal Amado (*), ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74, com data de 30 de Maio de 2009:

Caro Luis, Carlos, Virgínio, Magalhães e restante tabanca

Dirão alguns que a minha posição nesta estória não é de algum modo de um soldado brioso.
Com 10 meses já estava farto de conflito e não sabia que ainda me faltam 17.

Mas voltando ao assunto, eu fui como tantos outros um homem de paz, que teve que ir para a guerra. A minha visão de valentia, nunca se mediu pelo o número de inimigos mortos, mas sim pelos foram evitados de ambos os lados.

Como o José Brás muito bem disse, muitos de nós preferimos o abraço do que o aço e o homem em vez de inimigo.

Gosto deste espaço em que polémicas à parte todos tem o seu lugar, enquanto uns como eu já se sentem em paz, penso que o blogue ainda cumpre o seu desígnio terapêutico, aos que necessitam de ajuda e sem coragem para escrever, se sentem também retrados nas várias estórias.

Podem pelo o menos dizer: - Vês eu não estava a mentir quando falava do que lá passei.

Um abraço
Juvenal Amado


2. Borrasca no Pilão

Sentado do lado da janela, parecia um pardal de telhado sempre ao saltos.

Muito magro, pequeno pouco maior que uma G3, foi durante toda a viagem de regresso à Guiné motivo de animação.

Quando avião se fez à pista e começou a ver o arame farpado a correr veloz, o seu semblante transformou-se ligeiramente.
- Já estamos de regresso ao arame farpado novamente - disse com algum desânimo.

As férias correram rápidas, os dias escaparam-se por entre os dedos, agora no corredor de rumo à saída do 727 pensava no calvário, que ia passar até chegar a Galomaro.

Ainda sinto o cheiro dos lençóis e a frescura daquele Novembro, que a escassas 3 horas deixei para trás.

Cada passada que dava me aproximava da porta, a hospedeira desejava-nos sorte. Tão apreciada durante toda a viagem, o seu sorriso depressa se diluiu nas ondas de calor, que me atingiu quando cheguei às escadas.

A roupa arde. O corpo ainda está à temperatura do ar condicionado.

Vou para os Adidos. Apresentei-me já sabendo que seria escalado para tudo que era serviço. Tenho que sair de Bissau rapidamente.

A mistura de periquitos e veteranos fazia uma manta de retalhos. Os braços e joelhos branquinhos contrastava com os rostos tisnados da malta mais velha.

A noite foi passada em cima do colchão sem lençóis e todo vestido, pois sabia lá quem já tinha dormido naquela cama.

No dia seguinte foi fatal, estou de piquete.

Quem comandava o piquete era um furriel novinho em folha, tão branco e magro, o suor corria-lhe em bica e dava-lhe um aspecto quase transparente.

Ou muito me engano ou se houver chatice, vai ser complicado convencer o furriel de que não deve fazer ondas.

No Pilão, conviviam entre a população, segundo era voz corrente, clandestinos do PAIGC, comandos africanos, fuzileiros e prostitutas, que eram responsáveis pelas visitas dos soldados às enfermarias com maleitas, que por vezes faziam temer o pior em relação ao futuro reprodutor dos mesmos.

Assim estava eu a rogar a todos as santinhos que não houvesse problemas lá para aqueles lados, quando o piquete foi chamado.

Estava visto que as minhas preces não tinham sido ouvidas.

Tinha estalado um fogachal com rebentamentos à mistura bem no meio do bairro.

Olho à minha volta, três ou quatro soldados mais velhos, o resto são acabados de chegar. Um Unimog com o nosso furriel no comando dirige-se para os cavalos de frisa da entrada do bairro. Os clarões estão cada vez mais perto e ouvem-se tiros.

Nós não conhecíamos o bairro, nem tínhamos qualquer preparação para lá intervirmos.

- Meu furriel o melhor é não entrarmos lá, sem que outros piquetes mais conhecedores lá entrem primeiro. Tentavam os velhinhos demover o furriel.

O bom senso ditava que aguardássemos que os piquetes de Bissau interviessem primeiro.

Passaram os piquetes do QG, dos Comandos, PM e não sei mais quantos. A coisa não dava sinal de abrandar, o cheiro a incêndio era intenso. Por fim lá nos fizemos à vida e entramos também.

As cubatas queimadas, feridos e possivelmente mortos deram-nos razão. Não teríamos salvação se fôssemos apanhados entre fogos, nem saberíamos donde nos chovia.

Regressamos aos Adidos, já madrugada tentei dormir, lembrava-me do sorriso da hospedeira, da fresquidão dos lençóis, dos sabores e perfumes de casa.

Os mosquitos atacavam em esquadrilhas, estou demasiado excitado para dormir.

Pensava: - Tenho que arranjar transporte para o Xime numa LDG ou coisa parecida, rapidamente, pois lá perto está a minha segunda casa.

Juvenal Amado

O Geba ao fundo

Piscina de Bafatá

De regresso a Galomaro há que festejar. O Passos, Ivo, Catroga, Setã, Alfredo, Silva, Ferreira, Romão e Viseu
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de1 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4270: Blogpoesia (42): Reflexão - É mais fácil (Juvenal Amado)

Vd. último poste da série de 2 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3162: Estórias do Juvenal Amado (15): Adeus, até ao meu regresso

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4449: In Memoriam (23): Luís Cabral ou o respeito por um homem que lutou por um ideal (Virgínio Briote)

Guiné-Bissau > Região do Boé > 24 de Setembro de 1973 > Foto da revista PAIGC Actualités, nº 54, Outubro de 1973: "O Camarada Luís Cabral, secretário geral adjunto do nosso Partido, eleito Presidente do Conselho de Estado, seu representante nas relações internacionais, sendo igualmente o comandante supremo das Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP)"...

O primeiro presidente da República da Guiné-Bissau morreu sábado, dia 30 de Maio, em Lisboa, vítima de doença prolongada (*). O seu enterro será amanhã, terça-feira, dia 2, por volta das 10h... Luís Cabral residia em Lisboa desde 1984. Exilou-se em Cuba e depois em Portugal, após um golpe de Estado conduzido, em 14 de Novembro de 1980, pelo falecido 'Nino' Vieira (por quem, de resto, nutria - ao que parece - um 'ódio de estimação').

Uma delegação do PAIGC, de que foi um dos co-fundadores, liderada pelo primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, e que integrou Artur Silva, o ministro da defesa, e Malam Bacai Sanhá, antigo presidente interino do país e candidato do PAIGC às eleições presidenciais do próximo 28 de Junho, veio expressamente a Lisboa apresentar condolências à família de Luís Cabral. SEgundo os jornais de hoje, seria intenção das autoridades guineenses a de, muito oportunamente, trasladar os seus restos mortais, para a sua terra natal, Guiné-Bissau, e fazer-lhe um enterro com honras de Estado. (LG).

1. Mensagem do nosso camarada e amigo, co-editor Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando, Brá, 1965/67 (foto, à esquerda):

Luís:

O corpo do Luís Cabral está na Igreja de São João de Deus, na Pr Londres (frente à Mexicana, como sabes).
Um episódio, até hoje por esclarecer, o abate dos seus antigos inimigos e meus Camaradas, [dos Comandos Africanos,] não me impediu de manifestar o respeito que sinto por um homem que lutou por um ideal.

Enquanto viver, talvez como tantos de nós, não vou esquecer que o Bacar Djassi, o Djamanca, um bom companheiro de tantas caminhadas, o Sisseco, figura muito mais controversa hoje que no meu tempo, o Justo Nascimento, com quem partilhei uma especial afinidade, o Bacar Mané, do meu grupo, um homem simples e afável, e, infelizmente, outros com quem convivi, repito, não posso esquecer que foram executados sem julgamento, sem qualquer hipótese de defesa. Não esqueço, como não posso esquecer as responsabilidades de governantes portugueses, civis e militares, que não foram capazes de prever o que viria a acontecer aos antigos Camaradas Africanos.
Podem dizer que os tempos, pós-Indepenência, foram propícios a ajustes de contas. Mas os Homens é nos tempos conturbados que são precisos.
Luís Cabral era o Chefe máximo nessa altura. Talvez muita coisa lhe escapasse, no meio de tantas prioridades. Mas não tenho informação que lhe diminua a responsabilidade na execução de tantas vidas. Este é um ponto.
O outro, é o homem que pôs a sua vida nas mãos de um ideal, a Independência do seu País. Curvar-me ante o seu corpo foi, para mim, a manifestação do respeito perante alguém contra quem combati, apenas isso. Como o faria e voltarei a fazer perante qualquer outro que se tenha cruzado comigo, de armas na mão, nos mesmos trilhos. Por isso, no livro de condolências escrevi:

Com o respeito de um ex-militar português que cumpriu a comissão na Guiné, entre 1965 e 1967. V Briote.

Um abraço, Luís
VB


2. Comentário de L.G.:


Deixa-me, amigo e camarada Virgíno, despir por momentos a minha pele de editor, e saudar a tua grandeza de alma e a tua nobreza de espírito... É na morte dos nossos inimigos de outrora que somos capazes, muitas vezes, de enxergar mais longe do que o limitado campo de visão que nos proporcionava a mira da G3 ou a seteira do nosso miserável abrigo... É na morte que os inimigos de ontem, de um lado e de outro, se agigantam... É na morte que somos capazes do mais nobre sentimento que distingue os seres humanos de outras espécies (animais): a capacidade de compreender e até de perdoar (não confundir com esquecer), o sentimento de pesar, de piedade, de compaixão... É a morte, e não a vida, que, na maior parte das vezes, aproxima aqueles que, em vida, procuraram destruir-se até à morte...

Admiro alguns cemitérios do sul do nosso país, onde alguém inscreveu, na parte cimeira do portão, a frase tão verdadeira como lapidar (e quiçá irónica): "Campo da Igualdade"... Amigos e inimigos, ricos e pobres, brancos e negros, colonizadores e colonizados, estamos finalmente, na morte, em pé de igualdade, na horizontal, nus, despojados de todos os elementos de status social, sem orgulho nem preconceito, apenas à espera do veredicto final da história e da memória (implacável) dos povos...

Meu caro VB, tu que conheceste pessoalmente (embora em circunstâncias fortuitas) o Luís Cabral, e que ainda tiveste a veleidade de o querer entrevistar para o nosso blogue (**), honras o melhor da nossa Tabanca Grande, dos amigos e camaradas da Guiné, que é também essa nobre (mas difícil) capacidade de respeitar, na morte, os nossos inimigos (ou adversários...) contra quem lutámos, de armas na mão...

Um Alfa Bravo. Luís (***).

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Notas de L.G.:

(*) 7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4301: In Memoriam (22): Carlos Rebelo, a última batalha (Abilio Machado, ex-Alf Mil, CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/72)


(**) Vd. poste de 1 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4447: PAIGC - Quem foi quem (7): Luís Cabral (1931/2009) (Virgínio Briote)

(***) Alguns artigos disponíveis na Internet, aqui listados a título meramente exemplificativo:

(i) Artigos Recomendados pelo portal RTP

Malan Bacai Sanhá recorda o "africanista convicto" que foi Luís Cabral
2009-05-30 22:39:53

Silvino da Luz destaca Luís Cabral como "grande líder" da luta de libertação
2009-05-31 08:44:08

Secretário executivo da CPLP destaca "inquestionável" patriotismo de Luís Cabral
2009-05-31 08:44:20

Governo considera morte de Luís Cabral como perda de um «dos grandes homens guineenses»
2009-05-31 08:45:46

Com morte de Luís Cabral desaparece «parte importante da história do partido» - PAIGC
2009-05-31 08:45:44

Luís Cabral - Biografia/Perfil
2009-05-31 08:44:13


(ii) O Liberal [, Cabo Verde] > Colunistas > Fernando Casimiro (Didinho) > 1 de Junho de 2009 > "O Luís Cabral que conheci era um patriota e um homem bom"

Guiné 63/74 - P4448: Agenda Cultural (15): 2º Ciclo de Conferências “Memórias Literárias da Guerra Colonial”, em 4 de Junho (Alberto Branquinho)

Camaradas Tertulianos, 
Trazemos ao vosso conhecimento a intervenção do nosso camarada e tertuliano do nosso Blogue, Alberto Branquinho no 2.º Ciclo de Conferências "Memórias Literárias da Guerra Colonial, que vai decorrer no próximo dia 4 de Junho, pelas 19 horas, na Biblioteca-Museu República e Resistência/Grandela, em Lisboa, onde falará do seu livro, com o título "Cambança". 

BIBLIOTECA-MUSEU REPÚBLICA E RESISTÊNCIA 
Espaço Grandella
Estrada de Benfica, 419
1500-078 Lisboa
Telefone: 21 771 23 10

Um abraço 

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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P4447: PAIGC - Quem foi quem (7): Luís Cabral (1931/2009) (Virgínio Briote)



Luís Cabral (1931/2009), por Virgínio Briote 

 Quando o pai morreu, Luís Cabral tinha 20 anos e há dois que trabalhava nos Serviços de Estatística, em Cabo Verde. Com várias propriedades no interior da ilha de Santiago, as secas prolongadas tinham deixado a família sem grandes possibilidades para o manter a estudar. 

 Com a morte do pai e irmãos mais novos para criar, a situação tornou-se ainda mais difícil para o Luís. A seguir aos funerais, um próspero comerciante da Praia, grande amigo do pai dos tempos da Guiné, ofereceu-lhe um emprego nos seus escritórios, com um salário superior ao que vinha auferindo nos Serviços de Estatística. 

  Em Bissau, na Casa Gouveia 

 Os contactos com o irmão mais velho, Amílcar, foram produzindo frutos. Na Guiné, removidas as dificuldades levantadas pela Polícia quanto à sua permanência no território, Amílcar prometeu arranjar-lhe um emprego. Seduzido pelas ideias do irmão, que afinal eram as suas, Luís deixou a mãe e os irmãos em Cabo Verde. 

 Chegou a Bissau, numa manhã de Abril de 1953, disposto a começar uma nova vida. A Guiné, de onde tinha saído com cerca de um ano de idade estava sempre presente, nas conversas, em casa com os pais e nas visitas que recebiam. Amílcar e a Maria Helena, sua mulher, levaram-no a viver com eles, em Pessubé, nos arredores de Bissau, onde se situava a Granja Experimental, de que Amílcar era o director. 

Dadas as relações e conhecimentos não foi difícil a Amílcar arranjar-lhe emprego nos serviços de contabilidade da Casa Gouveia. Nos primeiros tempos da estadia na Guiné, Luís Cabral via com impaciência o irmão não o convidar para as reuniões que, sabia, Amílcar fazia regularmente com camaradas da luta que se estava a forjar. Nem tão pouco Amílcar lhe dava conta do que estava a fazer. 

 Luís Cabral, entretanto, não perdia tempo. Enquanto progredia na Casa Gouveia, mandara vir de Cabo Verde a mãe e os irmãos. E continuou a estudar, para completar o 5º ano dos liceus. Visitava regularmente o irmão, mas era através da cunhada que Luís se mantinha a par dos movimentos de Amílcar. Segundo a cunhada, Amílcar queria que, se lhe acontecesse alguma coisa, Luís ficasse como retaguarda da família. 

  As conversas de Amílcar Cabral com o Governador-Geral 

 Amílcar já tinha provado o sabor da denúncia. Alguém que estava a par das suas actividades, deu conta delas à polícia. Um dia, Amílcar foi chamado ao governador, o oficial da Marinha Diogo de Melo e Alvim. Segundo contou mais tarde, o governador ter-lhe-á perguntado: - Ó engenheiro, então o senhor é que é o chefe dos "Mau-Mau" cá da terra? - Desculpe-me, senhor governador, mas parece-me que os "Mau-Mau" só existem na África Oriental! - Olhe, engenheiro! O senhor não me lixe! Mas seja um homem da actualidade! Viva a sua época! 

  Na fundação do PAIGC 

 Luís acabou por se integrar no grupo a que pertenciam Aristides Pereira, Fernando Fortes, Abílio Duarte e outros. É nesta altura que conhece a Dr.ª Sofia Pomba Guerra, uma farmacêutica portuguesa, que tinha sido desterrada para a Guiné, acusada de ser membro do PCP em Moçambique. É a Dr.ª Sofia que, mais tarde, lhe dá aulas de Inglês, quando Luís Cabral se propõe completar o 7º ano do liceu. 

 Os rumores da actividade que Amílcar persistentemente desenvolvia, acabaram por ser de tal forma públicos que o governador se viu na necessidade de o chamar novamente para lhe dar uma alternativa: ou Amílcar cessava tais actividades ou então, ele governador, deixava-o cair. Amílcar não teve outro remédio senão sair da Guiné, mas em condições de poder voltar de tempos a tempos. 

 Um ano depois, Amílcar estava de novo em Bissau. Aproveitando a estadia, reuniram-se em 19 de Setembro, numa casa onde moravam Aristides Pereira e Fernando Fortes, o nº 9-C da Rua Guerra Junqueiro. O grupo era composto por Amílcar, Luís Cabral, Júlio Almeida, Élysée Turpin e, naturalmente, o Fernando Fortes e o Aristides. Foi nesta data que oficialmente nasceu o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde, com a divisa Unidade e Luta. Mais tarde, a designação do Partido viria a simplificar-se, passando a chamar-se PAI (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde. Luís Cabral foi-se envolvendo em várias actividades. 

Nas eleições para o Sindicato dos Empregados de Comércio e Indústria da Guiné fez parte de uma lista que tomou conta da direcção. Filiou-se no Benfica de Bissau e, na modalidade de volei, teve a oportunidade de conhecer, numa das viagens a Dakar, Lucette de Andrade que se veio a tornar a sua primeira mulher. 

 Em Março de 1958, dispondo de uma licença de 6 meses, resolveu deslocar-se a Lisboa, com passagem por Dakar para se casar. Aproveitou para se apresentar a exames do 5º ano no Liceu Pedro Nunes e para conhecer Portugal, na companhia de Lucette e de Amílcar, mulher e filha. 

  Pidjiguiti 

 No seu livro Crónica da Libertação, Luís Cabral conta: 

  "A situação das equipagens das lanchas e outras embarcações das empresas coloniais era, em 1959, bastante deplorável. Os salários variavam entre 150 e 300 escudos, o capitão da embarcação ganhava ainda menos do que o motorista, pois este em geral sabia ler e gozava do estatuto de 'civilizado'. Os restantes membros da tripulação, sendo considerados 'indígenas', tinham de contentar-se com um salário de miséria, sem quaisquer regalias. Para cada viagem, o tripulante recebia, para a alimentação, uma determinada quantidade de arroz e mais 15 escudos por mês. Havia já muitos meses que os marinheiros vinham pedindo uma melhoria da sua situação, sem qualquer resultado. Faziam-lhes promessas, é certo, mas a situação mantinha-se e os trabalhadores não viam, na verdade, nenhumas perspectivas de mudança. Encorajados com o descontentamento crescente dos trabalhadores das docas, cuja situação também era má, os marinheiros fizeram saber às empresas que estavam decididos a parar o trabalho, se as reivindicações não fossem atendidas. As respostas das direcções das empresas, já concertadas, continuaram a ser promessas sem quaisquer garantias. A partir da noite do dia 2 de Agosto, as embarcações que chegavam ao porto de Bissau eram cuidadosamente arrumadas nas cercanias do velho cais de Pidjiguiti. 

(…) Os chefes das empresas, encabeçadas pelo sub-gerente da casa Gouveia, mandaram um ultimato aos grevistas: ou regressavam às suas embarcações e aos seus postos de trabalho em terra, ou pediam a intervenção da polícia. 

(…) A vida em Bissau parecia ter parado para seguir os acontecimentos. Apenas se viam passar nas ruas os carros da polícia, até ao momento em que as forças militares e paramilitares avançaram para o porto. Os trabalhadores em greve fecharam o portão de acesso aos cais de Pidjiguiti, apanharam tudo quanto podiam para se defenderem e aguardaram. 

(…) Poucos minutos depois ouviam-se os primeiros tiros: os soldados e a polícia tinham acabado de romper a frágil barragem do portão e penetravam no recinto do cais, atirando contra os grevistas, que, a princípio, ainda tentaram defender-se. Cedo, porém, depois de verem cair muitos companheiros, compreenderam que, diante da cruel realidade, a única solução era procurar fugir do cais, para escapar à morte. Uns caíam mortos ou feridos, outros procuravam por todos os meios alcançar a saída mais livre e a única que parecia segura, tentando, enquanto ainda era tempo, atravessar a estreita passagem que conduzia ao rio Geba, portanto às embarcações que ali estavam ancoradas. À medida que os homens conseguiam alcançar a ponta do cais iam-se atirando às águas do rio e nadavam desesperadamente para alcançar as embarcações. A horda colonialista com os sucessos alcançados, também avançou para a ponta do cais de Pidjiguiti. Fazendo dali calmamente a pontaria, conseguiram ainda matar ou ferir vários homens entre os que se tinham atirado desesperadamente ao Geba. E não eram só militares e polícias, os que atiravam. Também se juntaram a eles elementos civis com as suas armas pessoais, que depois se vangloriavam da sua participação na caça selvagem aos homens do 3 de Agosto. Saímos cedo do trabalho. Os escritórios da Casa Gouveia ficavam perto do cais do Pidjiguiti e não era possível trabalhar com o barulho terrível do tiroteio, tendo às portas tão criminoso espectáculo, sem precedentes nos nossos dias. Ficámos de pé no passeio, mesmo em frente do grande edifício onde trabalhávamos. (…) 

 (…) Da varanda do meu apartamento que estava situado frente ao porto, pude presenciar a parte final do monstruoso crime da caça ao homem no rio Geba. O sol desaparecera nessa tarde dos céus de Bissau; a atmosfera pesada e escura parecia gritar com o povo. A tarde sangrenta de 3 de Agosto fizera mais de cinquenta mortos e muitas dezenas de feridos entre os marinheiros pacíficos que mais não queriam que viver um pouco melhor. Na noite de 3 de Agosto, reuni-me com o Aristides e o Fortes. Este, na sua qualidade de chefe da Estação Postal, tinha podido meter no correio, que devia partir na manhã seguinte, cópias de um comunicado elaborado rapidamente sobre os acontecimentos, endereçadas às principais emissoras escutadas em Bissau. Lembro-me bem que a Rádio Brazzaville, a BBC, a Rádio Conakry e a Rádio Dakar, estavam entre aquelas que receberam e difundiram a notícia que os colonialistas não queriam que saísse da Guiné. Simultaneamente, foi também enviado um primeiro relatório ao Amílcar que se encontrava nesse momento em Angola." 

A saída da Guiné 

 No seguimento dos acontecimentos do Pidjiguiti, como era de esperar, foram efectuadas numerosas detenções. Luís Cabral era o guarda-livros da Casa Gouveia e, por altura da inauguração do novo edifício da Associação Comercial, Agrícola e Industrial de Bissau, teve conhecimento que o Administrador da Casa Gouveia pedira a Lisboa que fosse recrutado um novo guarda-livros, uma vez que o actual ia ser preso. Decide, então, sair da Guiné. Ajudado pelo madeireiro português Fausto Teixeira, Luís saiu de Bissau, por Mansoa, em direcção à fronteira com o Senegal. Perto de Fajonquito transpôs a fronteira a pé, tomou um autocarro para Koldá e rumou a Dakar. 

 Algum tempo depois recebeu a companhia da mulher e do filho. Conseguiram trabalho sem grandes dificuldades, Luís na Shell e Lucette, sua mulher, numa companhia de seguros. Viviam sem grandes problemas materiais e os seus dinheiros ainda chegavam para ajudar as actividades do Partido em Dakar, enquanto em Conakry, Amílcar como conselheiro do Ministério da Economia, e Helena, mulher de Amílcar, como professora do Liceu de Conakry, se serviam dos seus recursos para subsidiar o Lar do Combatente. Deste Lar partiram para a República Popular da China os primeiros militantes do PAIGC para receberem treino militar. 

  As primeiras acções armadas 

 Um ano depois de terem chegado a Dakar, Luís e a mulher deixaram os empregos, rumaram a Conakry e decidiram dedicar todo o tempo à luta. As primeiras acções armadas em que alguns elementos do PAIGC se viram envolvidos correram mal. Em plena fase de explicação das razões da luta às populações, nem sempre estas guardaram segredo. Em mais que uma ocasião foram cercados e atacados a tiro pelas tropas portuguesas. Vitorino Costa, armado apenas com uma pistola, foi morto numa destas situações. As armas que o PAIGC tinha num armazém em Conakry demoravam a ser libertadas pelas autoridades. Os jovens guerrilheiros, sem armas, depois dos fracassos iniciais, refugiaram-se nas fronteiras com o Senegal e com a Guiné-Conakry, reclamando armas. Amílcar conseguiu colocar a questão ao governo marroquino, que acedeu prontamente fornecer armamento. 

 As primeiras armas foram levadas para Conakry por via aérea em malas, sacos e caixotes, levadas pelo próprio Amílcar Cabral, pelo Vasco Cabral e outros, como se de bagagem pessoal se tratasse. Aquino de Bragança, que vivia no mesmo prédio de Amílcar, foi um dos que ajudou a descarregar caixotes do Volkswagen. Depois, o transporte do material de guerra de Casablanca para Conakry passou a ser feito por via marítima. As embalagens eram dissimuladas. Os volumes com granadas vinham em embalagens de medicamentos, em que na parte superior, quando abertas, mostravam fileiras muito arrumadas com pequenas embalagens de medicamentos. 

  A grande ajuda de Marrocos 

 As primeiras pistolas-metralhadoras, levadas de Marrocos, em sacos e malas, foram transportadas por Manuel Saturnino e José da Silva, dois guerrilheiros escolhidos para esta missão. O material era depois novamente embalado no secretariado do PAIGC em Conakry e a seguir levado nos transportes colectivos para Colaboi, onde era descarregado, para evitar o controle policial em Boké, a pouco mais de 80 kms da linha de fronteira. A partir daqui, os volumes eram levados à cabeça por homens que os introduziam nas zonas da guerrilha. O primeiro grande volume de material de guerra foi obtido por Luís Cabral junto do governo marroquino. Dezenas de carabinas, de PPSH e milhares de balas foram carregadas num camião civil, no pátio do Ministério da Defesa marroquino e foram entregues ali, ao portão, sem qualquer formalidade. 

  Preso por Sekou Turé 

 Este material veio a ser descoberto no porto de Conakry e Luís Cabral, Aristides Pereira, Vasco Cabral, Pedro Ramos, Armando Ramos e Fidelis Cabral, foram acusados de contrabando de armas e detidos pelas autoridades guineenses. Amílcar só não foi preso porque se encontrava na altura em Rabat. Sekou Turé libertou-os quase um mês depois, e a partir desta altura, depois de uma reunião entre Turé e Amílcar Cabral, o transporte de material de guerra pela Guiné-Conakry passou a ser feita com a autorização das entidades governamentais. “De Morés, a luta no Norte tinha-se alargado à área de Biambi e dali até Canchungo (T. Pinto), a oeste do país. No centro do Chão dos Manjacos, nome que o povo dava à circunscrição de Canchungo, ficava a floresta de Jol. Era ali que se encontrava o lugar sagrado onde o Irã de Cobiana, consultado pela população e pelos combatentes, proclamava que a luta do PAIGC era irreversível e que conduziria à libertação total do país. 

 Citações do livro "Crónica da Libertação", de Luís Cabral. 

  Luís Cabral nasceu em Bissau em 1931. Fez os estudos em Cabo Verde e na Guiné, para onde foi trabalhar na Casa Gouveia. Desde muito jovem interessado nas actividades políticas contra o governo português, colaborou com Amílcar Cabral e com outros militantes na fundação do PAIGC. Após os acontecimentos de Pidjiguiti saíu da Guiné, primeiro para Dakar e, depois para Conakry, onde participou na preparação e no desenvolvimento da luta armada que se prolongou por mais de uma dezena de anos. Fez parte do Bureau Político e foi membro do Conselho de Guerra do PAIGC. Em 1973, no decorrer do 2º Congresso do PAIGC que proclamou unilateralmente a Independência da Guiné-Bissau, foi eleito secretário-geral adjunto do partido e Presidente do Conselho de Estado da República, cargo para que foi reeleito, já depois do reconhecimento por Portugal, em 1974. 

 Luís Cabral foi presidente da Guiné-Bissau entre 1974 e 1980, ano em que foi destituído pelo golpe militar protagonizado por Nino Vieira. Esteve preso cerca de 13 meses na fortaleza de Amura, seguindo depois para Cuba e Cabo Verde, vindo a fixar-se mais tarde nos arredores de Lisboa, onde residiu até morrer em 30 de Maio de 2009, com 78 anos.

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 Notas de vb: Subtítulos da responsabilidade do editor 










domingo, 31 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4446: Convívios (142): Castro Daire, agora chão de Bambadinca, 1968/71 (2): A música, a festa, a dança no planalto beirão

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida > Restaurante P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas (*) > O Adélio Monteiro, organizador do encontro, dá as boas vindas aos camaradas de Bambadinca 1968/71... No chão, sacos da Câmara Municipal de Castro Daire e das Termas do Carvalhal com um pequena lembrança, distribuídos no fim a todos os participantes... Encostado à parede, outro elemento ex-CCAÇ 12, o ex-Sold Radioteleg João Gonçalves Ramos, que veio da Quinta do Conde / Barreiro (**).


Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida >Restaurnate P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > O bolo comemoartivo do 15º aniversário dos convívios...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida >Restaurnate P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > Mas também havia dois camaradas que faziam anos nesse dia, o António Quadrado e o Fernando Sousa, ambos da CCaç 12... O Quadrado vive na Moita e o Fernando na Trofa...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida >Restaurnate P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > "GUINÉ 24-5-69": foto de uma tatuagem no braço esquerdo do António Quadrado, comemorativo na partida dos quadros metropolitanos da então CCAÇ 2590 - mais tarde CCAÇ 12 - para a Guiné, no T/T Niassa... Chegada a Bissau, a 30...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida > Restaurante P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > A festa, a música, a dança... Ou não estivessemos nós no norte... Embora Castro Daire pertença ao distrito de Viseu, Beira Alta, aqui já se respira a alegria, sempre contagiante, das gentes do Minho e de Entre-Douro e Minho...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida > Restaurante P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > Cinco concertinas animaram a tarde, e onde não faltaram os cantares à desgarrada ou cantigas ao desafio...

Na foto, no lado direito, o Américo Silva, genro do Adélio Monteiro, presidente da junta de freguesia de Monteiras (com cerca de 600 habitantes), comerciante e um dos mais famosos cantadores ao desafio da região, Presidente da Associação de Cantadores ao Desafio e Tocadores de Concertina da Beira Alta, já com uma dezena de CD publicados... Na foto, o outro cantador é o Amadeu, se não me engano (na ponta, do lado esquerdo)... Os tocadores de concertina são o Flávio Monteiro, ao lado do Antunes, ( e que é irmã do nosso Adélio Monteiro, também nosso camarada, veterano de Angola). O outro tocador é o Manuel Martinho, ao lado do Américo Silva...

Sobre a freguesia das Monteiras, do município de Castro Daire: (i) Dista cerca de onze quilómetros de Castro Daire; (ii) ocupa uma área de 2 167 hectares; (iii) é composta por cinco povoações: Carvalhas, Colo de Pito, Eido, Monteiras e Relva; (iv) tem 586 habitantes; (v) fica, aproximadamente, situada a 920 metros de altitude, entre a serra de Montemuro e Leomil...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida > Restaurante P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > O Adélio Monteiro (à direita) apresenta, ao estimável público, mais um artista de ocasião, o nosso camarada Soares, do Pel Rec Inf (1968/70), que era comandado pelo Alf Mil Oliveira... O Soares veio do Luxemburgo e disse-nos que esperou 39 anos "por este momento"... Emocionado, tocou-nos várias músicas com uma harmómnica que lhe foi dada na Guiné por um oficial superior cujo nome não retive...


Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida >Restaurante P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas > Mas que maravilha, estas veteranas de guerra em acção!


Vídeo (1' 01''): © Luís Graça (2009). Direitos reservados

(Continua)

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste anterior, desta série: 31 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4444: Convívios (138): Em Castro Daire, agora chão de Bambadinca, 1968/71 (1): O reencontro na capela de N. Sra. da Ouvida

(**) Vd. postes com lista nominal de pessoal:

Guiné 63/74 - P4445: Recortes de imprensa (20): Jornal "O Mirante" - As lágrimas de um ex-combatente (Sousa de Castro)

1. Mensagem de Sousa de Castro (*), ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, 1971/74, com data de 29 de Maia de 2009:

Assunto: As lágrimas de um ex-combatente no momento de enfrentar a memória

http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=393&id=54202&idSeccao=5930&Action=noticia
Com os cumprimentos do
Sousa de Castro


2. Fazendo uso da informação que o nosso camarada Sousa de Castro nos fez chegar, e com a devida vénia ao semanário regional "O Mirante" (**), reproduzimos uma notícia inserida na sua edição online do dia 28 de Maio de 2009.



O Mário Beja Santos da defesa dos consumidores volta a vestir o camuflado(***)

As lágrimas de um ex-combatente no momento de enfrentar a memória

Não há nada que sacie a vontade que os ex-militares têm de contar o que se passou e o que passaram na guerra colonial. Mas depois de anos de um silêncio muitas vezes auto-imposto queixam-se que a sociedade continua sem querer saber.


Mário Beja Santos lê devagar. Pausadamente. Suspeita que se vai emocionar. “Ergui a tua cabeça e tu disseste-me baixinho: “Alferes, dá-me um tiro para acabar tudo”. Afastei-te a espingarda, o Jolá rasgou-te o dólman, tirou-te os restos das botas. Tu estavas muito mal, o braço esquerdo todo rasgado, buracos no peito, estilhaços nas pernas, pensei que tinhas perdido os dois olhos, tal o mar de sangue.”.

Silêncio total no pequeno auditório da biblioteca. O ex-oficial miliciano do exército português, mais conhecido como um dos primeiros portugueses na frente de luta em defesa dos consumidores do que como combatente na frente Leste da Guiné-Bissau entre 1968 e 1970, é traído pela emoção. Chora. Pede desculpa e retoma a leitura de um dos textos do seu livro “Diário da Guiné (1º volume) - Na terra dos Soncó ”. A voz sai marcada pela emoção. O episódio tem por título “O presépio de Chicri”. Tudo aconteceu há mais de 40 anos. Tudo acontece naquela tarde de sábado, 23 de Maio de 2009.

“Retirámos aos tombos, eu levava entre os dentes o teu braço esfacelado, e vamos percorrer os quilómetros mais dolorosos da minha vida até chegarmos ao anfiteatro de Chicri. Não sei quanto tempo durou esta viagem alucinante. Finalmente, depositei-te, cheio de ternura, no chão. O Teixeira tentou uma ligação, a ver se conseguia que um helicóptero te viesse buscar. Não se conseguiu a ligação. O Sol estava no zénite”. Perante o olhar tenso de antigos militares que passaram pelos vários teatros da Guerra Colonial em África, Beja Santos limpa as lágrimas com um lenço enquanto tenta recompor-se.

No início da conferência, em Alverca, numa sala onde não estava mais de uma dezena de pessoas, o ex-combatente conta como o pudor o impediu de falar da sua comissão na Guiné durante dezenas de anos. “Quando estava na guerra e apesar de não ser permitido eu contava o que acontecia. Aos meus pais, aos meus amigos. Mas não encontrava ressonância. Era como se não dissesse nada. Cá recebemos o teu aerograma eu ficava furioso”.

Não foi só Beja Santos que calou a Guerra dentro do peito. No início da conversa, integrada no ciclo “Guerra Colonial realidade ou ficção”, organizada pelo serviço de bibliotecas da Câmara de Vila Franca de Xira, o orador convidado lembrara que ainda hoje não há muitas obras de artistas plásticos sobre aquele período da guerra colonial, antes de dizer os primeiros versos do poema Nabuangongo, de Manuel Alegre. “Em Nambuangongo tu não viste nada/não viste nada nesse dia longo longo/a cabeça cortada/e a flor bombardeada/não tu não viste nada em Nambuangongo”.

“Quando regressei da Guiné suspendi as minhas recordações. Baixei os painéis. Queria acabar o meu curso. Iniciar a minha vida de casado. Criei uma carapaça para fugir à tormenta das minhas memórias dolorosas”. O ex-combatente sentiu que mesmo após o 25 de Abril ninguém queria tocar no assunto. “O que estava na agenda era a descolonização. As pessoas andam todas à procura da prosperidade. Nós fazíamos parte do passado. Do período colonial. Ninguém queria ouvir as nossas histórias e nós não sabíamos onde colocar aquilo em que tínhamos participado”.

Trinta anos depois Beja Santos juntou os mais de 500 aerogramas (cartas sem franquia para troca de correspondência entre militares e família) enviados à sua mulher, libertou-se do peso que o sufocava e começou a escrever sobre a sua comissão. “Era uma vez um menino alferes que chegou à Guiné e foi lançado no regulado do Cuor, no Leste, em 1968. A sua missão principal era proteger o rio Geba, garantindo a sua navegação, indispensável para a continuação da guerra. O alferes comandava dois aquartelamentos e alguns dos soldados mais valentes do mundo: caçadores nativos e milícias, gente que vivia no Cuor, em Missirá e em Finete”


Depois de “Na terra dos Soncó” em 2008, saiu já este ano “Tigre Vadio” o segundo volume do seu Diário da Guiné. “Agora falo do que se passou com grande naturalidade” diz a certa altura da sua exposição, algum tempo antes de se emocionar e deixar correr as lágrimas ao lembrar o episódio do soldado ferido.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 29 de Maio de 2009 >
Guiné 63/74 - P4438: Convívios (136): Pessoal da CART 3494/BART 3873, no dia 13 de Junho de 2009, em Santa Catarina de Vagos (Sousa de Castro)

(**) Sobre "O MIRANTE online"

Em Novembro de 2002 O MIRANTE passa a disponibilizar a quase totalidade dos conteúdos da edição semanal através de um site colocado no endereço
http://www.blogger.com/www.omirante.pt. A novidade foi o facto de tal edição ficar acessível às quartas-feiras a partir das 13h00 permitindo aos assinantes e a outros leitores da edição em papel um primeiro contacto com os conteúdos do jornal – O MIRANTE é colocado à venda à Quarta-feira de manhã e é também às Quartas-feiras que é entregue pelos correios em casa dos assinantes.

A 13 de Outubro de 2004 é disponibilizada no mesmo endereço uma edição com actualizações permanentes dando resposta a uma crescente necessidade de informação regional diária.

(***) Vd. poste de 30 de Abril de 2009 >
Guiné 63/74 - P4269: Agenda Cultural (11): Ciclo de Encontros Guerra Colonial: Realidade e Ficção - Alverca do Ribatejo (Beja Santos)
7ª Sessão - 23 de Maio, às 15.30h, com o Dr. Mário Beja Santos, na Biblioteca Municipal de Alverca.
“Era uma vez um menino alferes que chegou à Guiné e foi lançado no regulado do Cuor, no Leste, em 1968. A sua missão principal era proteger o rio Geba, garantindo a sua navegação, indispensável para a continuação da guerra. O alferes comandava dois aquartelamentos e alguns dos soldados mais valentes do mundo: caçadores nativos e milícias, gente que vivia no Cuor, em Missirá e em Finete. Mas havia outras missões, para além de proteger o rio: emboscar, patrulhar, minar, atacar e defender, garantir um professor para as crianças, reconstruir os quartéis flagelados, levar os doentes ao médico, praticar com o régulo, um destemido Soncó, neto de Infali Soncó que derrotara Teixeira Pinto no dealbar do século XX. Era uma vez um alferes que aprendeu a trabalhar com um morteiro 81, a emboscar na calada da noite, a enterrar os mortos e a levar os moribundos às costas. Era uma vez um alferes que se deslumbrou com as terras dos Soncó e que resolveu escrever um diário para se manter vivo e lembrar aos entes queridos que se estava a fazer um homem. A partir daquela guerra, Cuor e os Soncó viveram para sempre no coração do alferes. Era uma vez…”
Documentos de Divulgação em anexo.


Vd. último episódio da série de 5 de Maio de 2009 >
Guiné 63/74 - P4283: Recortes de imprensa (19): O pesadelo das minas (Nelson Herbert)

Guiné 63/74 - P4444: Convívios (141): Em Castro Daire, agora chão de Bambadinca, 1968/71 (1): O reencontro na capela de N. Sra. da Ouvida

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Capela de Nossa Senhora da Ouvida > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal da CCS do BCAÇ 2852, da CCAÇ 12 e outras subuniddaes adidas (Bambadinca, 1968/71)

Castro Daire > Lugar de Nossa Senhora de Ouvida > 30 de Maio de 2009 > O nosso camarada Abílio Machado, ex-Alf Mil da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/2)... Em frente as fraldas da Serra de Montemuro, num dia magnífico de sol...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Capela de Nossa Senhora da Ouvida >30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas >O inesperado encontro entre dois velhos camaradas e amigos que não se viam desde, pelo menos, 1972: o Humberto Reis (da CCAÇ 12) e o Abílio Machado (CCS/ BART 2917)... Um veio de Lisba, outro da Maia...

Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Capela de Nossa Senhora da Ouvida >30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas... > Foto de família

Fotos: © Luís Graça (2009). Direitos reservados


Estavam convocodas as seguintes subunidades adidas à CCS o BCAÇ 2852, para da CCAÇ 12: Pel Caç Nat 52 (1968/70), Pel Caç Nat 54 (1969/70), Pel Caç Nat 63 (1969/71), Pel Mort 2106 (1969/70), Pel Mort 2268 (1970/72), Pel Rec 2046 (1968/70), Pel Rec 2206 (1970/71)...

Também seriam bem vindos camaradas da CCS / BART 2917 (1970/72), como foi o caso do ex-Alf Abílio Machado, mas que não é normal comparecerem (têm o seu convívio própio, este ano, em 3ª edição, e que teve lugar em Viana do Castelo, a 16 de Maio último).

O desafio e o convite tinha sido feitos pelo Adélio Gonçalves Monteiro, ex-Sold Cont Auto, da CCAÇ 12 (Bambadinca, Junho de 1969/Março de 1971), e hoje um conceituado comerciante de Castro Daire, com duas lojas de moda, e chefe de um clã de gente fantástica e hospitaleira...

Eis a carta que nos veio do Código Postal 3600-132 Castro Daire:

(...) "Cá estou eu, Adélio Gonçalves Monteiro, para vos convidar ao nosso já habitual convívio que todos os anos se realiza por esta altura (...).

Castro Daire é uma vila muito bonita bem no Coração de Portugal, mais propriamente no Planalto Beirão, banhado ao sul pelo Rio Paiva, um dos rios menos poluídos da Europa, onde abundam as famosas trutas (...) que fazem parte da gastronomia local.

Castro Daire conta também com as famosas Termas do Carvalhal consideradas as melhores do País em tratamentos de doenças de pele, aparelho digestivo e respiratório. Esta vila pequena, mas muito acolhedora, rodeada de vales e montes, sobranceira à serra de Montemuro, com paisagens deslumbrantes que só a natureza nos pode oferecer" (...) (*).


Em boa verdade, o convívio da malta de Bambadinca 1968/71, agora na sua 15ª edição, começou em 1994, 26 de Novembro de 1994, em Fão, Esposende, organizado pelo ex-Alf Mil António Manuel Carlão. Foi o primeiro e único a que eu pude ir. Recorde-me que nessa ocasião estiveram presentes o ex-Cap Inf QP Carlos Alberto Machado Brito, agora Cor Ref, e que vive em Braga. Também compareceram, entre outros, o major Ribeiro (hoje Coronel, de seu nome completo Ângelo Augusto da Cunha Ribeiro), que foi segundo comandante do BCAÇ 2852, da CCS do BCAÇ 2852, o ex-Alf Mil Cav, do Pel Rec Daimler 2206, José Luís Vacas de Carvalho, o Beja Santos, do Pel Caç Nat 52 e vários camaradas meus da CCAÇ 12 (cito de cor: o Humberto Reis, o Tony Levezinho, o António Fernando R. Marques, o Joaquim Fernandes, o Arlindo Teixeira Roda, o João Carreiro Martins, o José Luís Vieira de Sousa, o Francisco Magalhães Moreira, o Fernando Andrade de Sousa, o José Martins Rosado Piça, o Alberto Martins Vieira, etc...). Não eramos muitos, talvez três ou quatro dezenas... A partir de 1994, os convívios realizaram-se todos os anos.

Este ano procurei conciliar a agenda, e lá apareci, por volto meio dia, acompanhado do Abílio Machado, ex-Alf Mil da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72)... Tinha combinado com o Abílio (que teve a gentileza de, vindo da sua casa, na Maia, passar pelo Marco de Canavezes e apanhar-me em Paredes de Viadores, Candoz, e dar-me uma boleia até Castro Daire, ali mesmo do outro lado da Serra de Montemuro), tinha combinado, dizia, fazer uma surpresa ao Humberto Reis que, juntamente com o Tony Levezinho, o Sousa, o Gabriel Gonçalves, o 2º sargento Piça, o 1º sargento Brito e outros, fazia parte da nossa tertúlia nocturna de Bambadinca, de copos e cantorias)...

O Levezinho, exilado em Sagres, sabíamos que não viria... O Jorge Cabral, do Pel Caç Nat 63, também não... Totalistas da CCAÇ 12 só eram o ex-1º Cabo Aux Enf Fernando Sousa, da Trofa, e os Fur Mil António Marques e Joaquim Fernandes... O Humberto Reis falhara o convívio, em Lisboa, na Casa do Alentejo, em 26 de Maio de 2007 (**).

Eu e o Abílio fomos os primeiros a chegar à linda capelinha de Nossa Senhora da Ouvida, já na estrada Castro Daire-Lamego, perto da zona industrial de Ouvida, freguesia de Monteiras... Com algum atraso em relação ao previsto no programa, lá chegou o pessoal... Muitos beijinhos e abraços, até à altura de eu apresentar o Abílio ao Humberto Reis, que de todo não o reconheceu...
- Humberto, apresento-te o meu primo... Abílio Machado, mais conhecido em Bambadinca por Bilocas da Cuprativa, natural de Riba d'Ave...

Claro, caíram logo nos braços um do outro... Outros camaradas da CCAÇ 12 foram, de imediato, reconhecidos por mim (nalguns casos com uma ajudinha de outros): os ex-Fur Mil Marques, Almeida e Fernandes, os ex-1ºs Cabos Fernando Sousa (Enfermeiro), António Rodrigues ( Transmissões), José António Damas Murta (Cripto), António Quadrado (Apontador de Armas Pesadas), os ex-Sold João Gonçalves Ramos (Radiotelegrafista), Francisco Patronilho (Condutor Auto) e, claro, o Adélio Monteiro (também ele Condutor Auto)...

Depois da missa celebrada em homenagem aos nossos mortos, seguímos para o restaurante, ali perto, onde passámos um belíssima tarde, com gente emocionada e fantástica, a começar pela família - um verdaderio clã - do homem da organização, o nosso Adélio Monteiro...

(Continua)

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Notas de L.G.:

(*) 1 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4120: Convívios (104): Pessoal de Bambadinca 1969/71: BCAÇ 2852, CCAÇ 12, Pel Caç Nat 52, 54 e 63... Castro Daire, 30/5/2009

(**) Vd. referência a anteriores convívios:

20 de Abril de 2005 > Guiné 69/71 - V: Convívio de antigos camaradas de armas de Bambadinca (Luís Graça)

29 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXIV: Ao Fernando Sousa: Sei que estás em festa, pá (Luís Graça)

9 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1742: Convívios (2): Lisboa, Casa do Alentejo, 26 de Maio de 2007: Bambadinca 68/71, BCAÇ 2852, CCAÇ 12, etc. (Fernando Calado)

27 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1788: Convívios (10): Pessoal de Bambadinca 1968/71: CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12, Pel Caç Nat 52 e 63 (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P4443: Bandos... A frase, no mínimo infeliz, de um general (23): Menino, para a guerra trazido (Manuel Maia)

1. Mensagem de Manuel Maia (*), ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74, com data de 25 de Maio de 2009:

Assunto: Lutarei contra o esquecimento... até que a voz me doa...

Caro Vinhal,
Eis-me de novo depois de ter, esta madrugada feito uma alteração à prosa do "Xico da Róla" (**) que espero tenhas recebido.

Aqui vai a minha contribuição, desta feita aumentada, que faz referência ao comentário do António Matos e com o qual concordo, se resultar...


Um corpo jaz deitado, moribundo,
por balas trespassado, deixa o mundo
de interesses e de intrigas compactado...
Menino para a guerra foi trazido
deixando lá na terra, tão sofrido,
um coração de mãe dilacerado...

Que ireis dizer à mãe, vós generais,
que as balas não ouvis, lá onde estais,
tão longe destes p´rigos, escondidos?
Dos "bandos" foi no mato um residente
que na aramada cova lá na frente,
vos defendia os coiros protegidos?

Não peçam que me cale ante este insulto
que certo general, soez, estulto,
bramiu, contra milhares, impunemente...
De António Matos chega uma proposta
que entendo merecer uma resposta
de quem lida com leis, diáriamente...

Ouçamos pois a voz da dita lei
tão arredia hoje nesta "grei",
que assinatura aponho, dito e feito...
Dificilmente o dito se retrata
pois falta-lhe honradez, que é coisa inata,
e humildade dentro do seu peito...

Que passe a sugestão a firme facto,
que assumo desde já assinar pacto,
do meu mutismo e forte contenção...
Enquanto não houver nada em concreto
afirmo ser fiel ao meu projecto
de não calar cá dentro a indignação...


Com um abraço extensivo a toda a tabanca
Manuel Maia
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Notas de CV:

(*)Vd. poste de 30de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4440: Controvérsias (14): Direito de defesa (Manuel Maia)

(**) Vd. poste de 25 de Maio de 2009 > > Guiné 63/74 - P4414: Humor de caserna (12): Quem matou Inesa? (Manuel Maia)

Vd. último poste da série de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4408: Bandos... A frase, no mínimo infeliz, de um general (22): O desvendar do segredo (Manuel Maia)