domingo, 14 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4521: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/ Mai 71) (1): No RAP 2, V.N. Gaia, onde fez mais de 60 funerais

, A Zona Histórica do Porto e a Ponte de D. Luís, vistas pela objectiva e pelos olhos do Portojo, um dos melhores poetas-fotógrafos do Porto (o nosso camarada Jorge Teixeira, mais conhecido por Portojo) > "Depois da Invernia, subi ao adro do Mosteiro da Serra do Pilar, para ver as cores da minha cidade" (Portojo)... Foi aqui, no antigo mosteiro da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia, no mítico RAP 2, que começou a aventura africana do Alferes Mil Capelão Arsénio Puim, em Novembro de 1969... (LG)


Foto: © Portojo (2009). Direitos reservados


1. Mensagens de Arsénio Puim, ex-Alf Mil Capelão, CCS/ BART 2917, e que esteve em Bambadinca entre Maio de 1970 e Maio de 1971 (A sua comissão terminou mais cedo, um ano depois de ter chegado a Bambadinca, por decisão do Com-Chefe, ao que se sabe). Vive actualmente em Vila Franca do Campo, Ilha de São Miguel, Região Autónoma dos Açores (RAA). Está reformado como enfermeiro do Serviço Regional de Saúde da RAA (*).


12 de Junho de 2009

Luís Graça

Como te havia dito no email anterior, começo a minha participação no Blogue, em forma de pequenos registos com alguma ordem cronológica e temática, se achares que tem interesse.

Um abraço amigo - Arsénio Puim



1 de Junho de 2009

Luis Graça

Chegado já há alguns dias a Vila Franca do Campo, devo dizer que o prazer que tive de encontrar velhos companheiros da Guiné em Viana e em Lisboa compensou, só por si, a minha deslocação a terras do continente português. E quero agradecer-te todas as atenções e referências que me dedicaste durante a minha estadia em Lisboa.

Como havia dito, tenho em mente participar no documental blogue de Luis Graça, talvez com o registo de alguns factos, à maneira de pequenas crónicas, que eu possa relembrar e que constituam mais uma achega para a nossa história comum na Guiné. Fá-lo-ei, porém, lentamente - sou mesmo muito lento naquilo que faço - e numa fase um pouco mais tardia, em que espero ter maior disponibilidade de tempo.
Recomenda-me com a tua esposa. Um abraço amigo - Arsénio Puim


2. RECORDANDO... I - NO RAP 2, EM VILA NOVA DE GAIA

por Arsénio Puim

Este é o primeiro duma série de pequenos relatos, para este histórico blogue de Luís Graça, respeitantes à minha vivência como alferes capelão do Batalhão 2917, que acompanhei desde a Serra do Pilar até Bambadinca, no centro da Guiné, entre Dezembro de 1969 e Maio de 1970.

É meu propósito essencial rememorar e partilhar com os antigos companheiros do Batalhão, por quem tenho muito apreço, alguns factos e acontecimentos que nos são comuns, sem nunca pretender atacar quem quer que seja.

Depois duma curta preparação na Academia Militar, em Lisboa, - tema a que gostaria de voltar mais tarde – vim parar, em finais de Novembro de 1969, ao RAP 2, na Serra do Pilar, em Gaia, para me juntar ao Batalhão [de Artilharia] 2917, que ali estava a ser mobilizado, com destino à Guiné, e me tinha sido atribuído por sorteio, realizado no final do referido curso de capelães militares.

À distância de 40 anos, e recolhido aqui em terras dos Açores, guardo ainda hoje algumas recordações desta estadia, durante três meses, naquele Regimento de Artilharia Pesada.


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971 > Um das famosas imagens da guerra da Guiné, a saída do obus 14, de noite, tirada com a máquina rente ao chão, pelo então Alf Mil Médico Amaral Bernardo (hoje médico do Hospital de Santo António, Porto, e membro da nossa Tabanca Grande)... A padroeira dos arilheiros era(é) a Santa Bárbara... O dia da Arma de Artilharia festeja-se a 4 de Dezembro (LG)

Foto: © Amaral Bernardo (2007). Direitos reservados.


A minha primeira participação em eventos mais assinaláveis desta comunidade militar do Norte foi a Festa de Santa Bárbara, padroeira das Unidades Militares de Artilharia, realizada no dia 4 de Dezembro com considerável aparato. Uma coisa que me intrigou na altura, e que ainda hoje não sei decifrar, foi esta relação de Santa Bárbara com a Artilharia: será por esta santa, algo mítica, ser invocada como protectora nas trovoadas, e o ribombar dos trovões ter alguma semelhança com o estrondo causado pelas armas pesadas?

Depois veio o Natal. Todo o mundo partira, nessa noite, para as suas terras, e o Quartel, ali sobranceiro ao Douro adormecido e olhando para o Porto entregue aos seus convívios familiares, ficara quase deserto. O pequeno grupo que restava – oficial e sargento do dia, capelão e uns poucos soldados – celebrou também a sua consoada, no bar dos oficiais, onde não faltava apetitosa comida, bom vinho e muita saudade.

Botei a palavra. Neste contexto natalício e de ausência familiar, para mais com a perspectiva da partida próxima para a Guiné e já alguns eflúvios vínicos a actuar (os quais são sempre propícios a gerar inocentes climas de comoção), vivemos alguns momentos de grande sentimentalidade, com algumas lágrimazinhas mesmo a aparecerem ao canto do olho. Lembro com simpatia esta noite, embora não recorde já os convivas.

Foi no final de Fevereiro de 1970 que teve lugar a Comunhão Pascal da Guarnição, presidida pelo «bispo brigadeiro» de Portugal, responsável pelo Vicariato Castrense e a assistência religiosa aos militares do País.

Os Comandantes do Regimento e eu esperámo-lo junto do Mosteiro do Pilar. Saindo dum carro grande do Estado, conduzido por um soldado, D. António percorreu, admirou, reclamou mais dinheiro para aquelas velharias do Mosteiro. Um pouco atrás seguia eu, quando se chegou junto do meu ouvido o capitão-capelão-chefe do Porto, que me segredou:
- Arranje uma batina (sotaina) e apareça com ela amanhã. O D. António ficou danado(Eu tinha estado, no dia anterior, na Comunhão Pascal da Reclusão do Porto, vestido, apenas, com o fato e o cabeção eclesiásticos).

Certamente uma questão bem fútil no contexto da problemática, já então acesa, dos capelães militares e da guerra colonial.

Era o RAP 2, em Gaia, que recebia os soldados de toda a região norte mortos no Ultramar. Várias dezenas de caixões empilhavam-se uns sobre os outros numa grande sacristia, mal iluminada, da igreja do Pilar, que eu atravessava – um pouco de corrida, confesso – quando ia celebrar missa. Não raro, alguns caixões abriam espontaneamente um pequeno orifício por onde vertia um líquido fétido de cor esverdeada, até que os soldadores fossem chamados para obturar a brecha.

Cabia ao capelão do Regimento fazer os funerais, de acordo com uma escala elaborada pelos serviços competentes, acompanhando a urna até à terra natal de cada soldado, que o pároco e a população em peso aguardavam, com grande consternação e incontido choro geral, num sítio próximo da igreja.

Foram mais de 60 funerais que fiz nestes três meses - 2 ou 3 deles apenas as caixas dos ossos - nas mais diversas e recônditas aldeias do norte de Portugal. Um sacrifício dramático da nossa juventude, merecedor de muito respeito e dignidade, mas que não podia deixar de fazer pensar qualquer pessoa.

Arsénio Puim

_________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores, rekacionados com o Arsénio Puim:

3 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 – P4455: Estórias cabralianas (50): Alfero, de Lisboa p'ra mim um Fato de Abade (Jorge Cabral)

26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4416: Memória dos lugares (26): Bambadinca, CCS/BART 2917, 1970/72 (Arsénio Puim, ex-capelão)

25 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4412: Dando a mão à palmatória (20): O Arsénio Puim, capelão do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), só foi expulso em Maio de 1971

25 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4410: Cancioneiro de Bambadinca (4): Romance do Padre Puim (Carlos Rebelo † )

23 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4404: CCS do BART 2917: a emoção do reencontro, 38 anos depois (Arsénio Puim)

19 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4378: Arsénio Puim, o regresso do 'Nosso Capelão' (Benjamim Durães, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72)

18 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4372: Convívios (131): CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), com o Arsénio Puim e os filhos do Carlos Rebelo (Benjamim Durães)

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1763: Quando a PIDE/DGS levou o Padre Puim, por causa da homília da paz (Bambadinca, 1 de Janeiro de 1971) (Abílio Machado)

Guiné 63/74 - P4519: Destas não reza a História (Manuel Maia) (3): Desertei depois de ter vindo da Guiné

1. Mensagem de Manuel Maia (*), ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74, com data de 11 de Junho de 2009:

Caro Vinhal,
Junto envio este texto para enquadrares onde entenderes.


MAU GRADO OS 39 MESES DE TROPA, FUI CONSIDERADO DESERTOR...

Encarei o serviço militar como uma inevitabilidade a que não me devia eximir já que não tendo própriamente apetência para herói, também não me via na miseranda pele de refractário, ou, pior ainda, na asquerosa figura de desertor como alguns figurões deste Portugal, a quem alguém chamou amordaçado, mas que eu rotulo de enxovalhado, a carecer duma expurgação de todos esses vampiros, chacais e abutres que lhe sugaram o sangue e esventraram entranhas...

Seria na perspectiva de quem não gosta de fardas, que interiorizei a passagem pelo serviço militar como um acidente de percurso.

Quando assentei praça no RI5 da bela cidade de Bordalo, sabia por amigos que por lá tinham passado, que ou virava chico devorando toda aquela prosápia do conhecimento livresco da arte bélica com as mais estapafúrdicas tácticas, para debitar depois a informação balística e mostrar conhecimento armamentista - de cor e salteado - tendo por objectivo conseguir uma nota de curso muito alta que me pusesse a salvo de uma mobilização individual, ou então, a mais óbvia, e que se enquadrava mais comigo, aceitando, sem violentar em demasia a minha sólida aversão a fardas, que continuaria a ser um civil com aquela obrigatoriedade, por isso, quanto mais cedo, melhor...

O expectável, na altura era ainda de 18 meses (para passar depois a 21, tendo este vosso camarada permanecido exactamente um quarteirão deles...)

Vingou portanto a segunda tese. Assim, como primeira medida para nunca ter a tentação de consultar uma que fosse das obras de cariz bélico que me forneceram logo à chegada, amarrei-as bem com corda e coloquei (aquele, para mim, indesejável conhecimento armamentistista, táctico, balístico...) bem fechadinho dentro do armário, não fosse perder-se alguma...

Devo dizer-vos, sem pejo nenhum, que já passava muito mais de mês da minha presença em terras de Malhoa, quando pressionado por camaradas temerosos por qualquer porrada que pudesse apanhar, acabei por fim defazer a primeira continência.
Até aí conseguira sempre esquivar-me a esse acto de que não gostava.

Veio Tavira - C.I.S.M.I. - num quartel (antigo convento) em obras, implicando que uma boa parte dos instruendos pudesse ter autorização de pernoitar fora.

Alugámos um quarto (mais propriamente a sala de jantar de uma casa modesta onde os proprietários plantaram quatro camas, encavalitadas duas a duas,(oriundas, da tropa, mas com uma operação de maquillage numa repintura branco hospitalar...) tendo ainda direito a tratamento da roupa (estávamos impossibilitados de ir a casa de fim de semana, que ali acontecia só ao sábado de manhã.

Paralelamente, e como éramos quatro, as hipóteses de casamento para a neta perdida iam ganhando algum alento, sendo que a moça quando pressentia algum de nós no quarto, arranjava sempre uma justificação qualquer para ter alguma coisa que fazer ali, trazendo roupa engomada... desculpe que vinha fazer a cama... fazendo alarde de uns decotes generosos...

Nenhum de nós casou na parada, mas era comum acontecer e o Comandante da Unidade no discurso de boas-vindas alertava para o facto...

O Algarve dessa altura já tinha muito turismo, com os reduzidos biquinis das inglesas e holandesas, a fazerem arregalar a vista ao militar...

De lá rumei a terras de Viriato largando a diagonal vermelha dos ombros por troca com as também vermelhas de Cabo Miliciano (mais uma invenção portuguesa como o nónio do Pedro Nunes ou a quilha das caravelas p´ra vencer o Atlântico em substituição da chata do mais calmo Mediterrâneo até aí conhecida) NENHUM EXÉRCITO DO MUNDO tinha ou teve Cabos Milicianos...

No RI 14 tive um episódio digno de figurar no anedotário nacional ou como sketch de um filme cómico...

Era usual o Sargento da Guarda (profissional) desenfiar-se para ir dormir a casa com a família (nada de mais justo, afinal a guerra daqui era de brincar...). No seu lugar ficava depois da formatura de recolher um dos Cabos Milicianos de serviço com Sargento de Dia à Unidade.

Um dia estava este vosso camarada a dormir ferrado, já de madrugada num catre igual aos da cadeia, ali ao lado, quando disparou o alarme numa barulheira infernal...

Foi um espectáculo verdadeiramente circense com tudo quanto era gente a correr para os locais de defesa, como se porventura o inimigo estivesse ali, para tomar as terras de Viriato...

Sem saber exactamente o que fazer, deambulei por ali a ver no que davam as modas, até que após um bom pedaço de tempo, de telefonemas para a Casa da Guarda a que eu ou um dos Cabos RD que ali estavam, íamos pondo água na fervura sobre a invasão...

Não se via inimigo nenhum, há muito que os espanhóis haviam perdido a ideia expansionista, os ciganos de então não se atreviam (já não diria o mesmo agora, quer sejam ciganos ou outros quaisquer... não, não é xenofobia...) portanto a guerra não era concerteza nem mesmo que a do Solnado se tratasse...)

Entretanto clareou, e os ânimos serenaram...

Ensaio não fôra, portanto o Comandante, um homem carregado de dragonas nos braços do casacão preto cheio de bordados que víamos às vezes quando requeria um grupo de recrutas para lhe varejarem e colherem a azeitona da sua propriedade na zona, usando naturalmente a mão de obra gratuita os carros e combustível da tropa (isto não é para aqui chamado...) o Comandante chamou aqui esta vosso camarada ao seu gabinete e disparou:

- Que estás aqui a fazer? Chamei o Sargento da Guarda!

Enchendo-me de brios do alto das minhas vermelhas divisas, numa posição de sentido que faria invejar qualquer profissional, especialmente os que faziam gala na cagança (era este nome que davam àquela sequência toda de bater com os calcanhares um no outro para gerar uma sonora pancada, fechar os punhos lateralmente, atirar com o peito para fora, qual galo de Barcelos no acto da cantoria...) e numa voz tronituante respondi:

- Saiba Vossa Excelência, meu Comandante que quem se encontra de serviço como Sargento da Guarda desde o toque de recolher até à alvorada sou eu próprio, Cabo Miliciano 08865271, hoje também Sargento de Dia à Unidade da 2.ª Companhia de Instrução.

- Mas... para quem não gostava de fardas, desenrascaste-te bem - dirão os mais afoitos...

O homem gostou.
Pôs-me à vontade, expliquei-lhe que não havia sido o autor do aviso de guerra e o electricista do quartel haveria de explicar-lhe que se tratara de um curto circuito...

Vai daí, o comandante acabou com todo aquele mise-en-scène, e acabaria por dar uma porrada ao Sargento...

De Viseu haveria de rumar para a cálida planície alentejana (como vêm fiz uma autêntica volta a Portugal nesse meu mourejar interno antes do embarque para a Guiné).

Ao invés de ir de combóio, como acontecera aquando da viagem para Viseu que demorara desde Pedras-Rubras, 14horas (sim leram bem catorze horas, tive de fazer dois transbordos e esperar umas horas em cada um deles, para cobrir cento e poucos quilómetros na linha da Beira Baixa), aproveitei e fui no carro do Barbosa de Ermesinde que acabaria por ir para o Biambe, e com o Maia de Coimbra, que iria para Encheia, onde permaneceria pouco mais de sete meses até à evacuação para Lisboa motivada pelo tiro que apanhou de ricochete na cabeça).
(Envio-vos daqui um abraço pois estou certo que seguis esta nossa tabanca)

Pois essa Yeborah mourisca, de que tanto gosto, recebeu-nos no RI16, outro antigo convento (para quem não professa nenhuma religião parece uma espécie de perseguição...) e dali haveríamos, Batalhão formado, de rumar à nossa Guiné.

Aqui, passadas as passas (não do Algarve pois as de Tavira, como vos disse, até nem foram nada más, antes pelo contrário, mas... as africanas, como todos vós mais ou menos passastes, com períodos em Bissum/Naga, Cafal Balanta (naquele belo edificio que tive oportunidade de vos mostrar no poste 4481), Cafine, ali ao perto, escassos 2 km, mas vivendo em tendas (como se na praia nos encontrássemos, dando assim à comissão uma vivência de férias...), para finalmente me quedar por Fatim, destacamento do Dugal, perto de N´Hacra.

Regressado, ao fim de uns dias (aqui vem finalmente a razão do título do escrito...) dei entrada no Hospital Militar do Porto com problemas estomacais sérios.
Fui visto pelo Dr. Barbosa Leão (já vos explico porque fixei este nome...) que me haveria de internar.

-Tenha paciência doutor, mas internar, nem pensar. Farto de tropa estou eu. Moro aqui perto, Pedras-Rubras, posso deslocar-me facilmente.

-Sendo assim, terá de preencher um formulário de pedido de pernoita fora. Por mim não ponho obstáculos.

Entretanto após diagnóstico haveria de me receitar dois medicamentos que não poderiam ser tomados isoladamente (presumo que um deles, porventura deveria ser uma espécie de protector para o estômago...).
Desloquei-me à farmácia, mas só havia um que trouxe, ficando depois de ir ligando para saber quando chegaria.

Óbviamente, desandei, e de quando em vez lá ligava, mas a resposta era sempre a mesma, terá de aguardar...

A consulta desse médico era às quartas. Ainda fui a uma outra para tentar tomar uma beberragem que permitisse a detecção da extensão do problema via Raio-X (ou outro qualquer...), mas não consegui porque vomitava de imediato.
A solução passava por ir aguentando até à chegada do medicamento.

O tempo rolou, e uma bela quinta-feira, estando a 100 kms de distância em casa de familiares, recebo um telefonema muito preocupado da minha mãe a dizer-me que haviam ligado do hospital considerando-me desertor.

-Apresenta-te hoje ou amanhã, dissera, aflita...

-Não se preocupe! Eles não me prendem!

Segunda-feira, este vosso camarada, por volta das dez da madrugada, deu entrada no HMR 1 do Porto.

Dirigi-me à enfermaria, perguntei ao Sargento de serviço o que se passava comigo para me ameaçarem daquela forma...
Quando se apercebeu que era eu, o sargento disse-me:

- Estás f..... pá!

- F.... porquê meu primeiro?

- Por onde tens andado? Já por várias vezes todo o mundo pergunta por ti e ninguém te conhece. Se calhar vais de cana...

-Isso é que era bom! Não se preocupe Primeiro, porque eles p´ra guerra não me mandam mais, pois faço-lhes um manguito...

-Vê lá se atrranjas um pijama.

-Um quê?

-Um pijama, pá. Estás internado tens de andar de pijama e apresentar-te assim...

-Não me lixe, meu Primeiro, não me lixe... Nem que a vaca tussa, eu não vou falar com o Comandante de pijama.

Arranjei umas calças, por sinal curtas e apertadas, uma camisa, uma boina, e... já ia.
Diz-me o sargento:

- E as divisas? - Eu dava tanta importância àquilo que até me esquecia do seu uso...

Arranjei umas de um Furriel internado, coloquei-as, e de novo o Sargento me chamou a atenção:

- Olha lá, olha lá pá, o Furriel agora tem as divisas ao contrário. São com o bico para cima.

- Ou me aceitam de bico p´ra baixo, ou nada feito.

E assim foi. Bati à porta do gabinete do Comandante e acto contínuo acompanhando um simples dá licença, entrei... boina na mão para não ter de fazer saudação militar, pudera eu sentia-me civil...

- Quem és tu?

Lá me apresentei e disse:

- Andam para aí a chamar-me desertor...

- E és. Já estás desenfiado há mais de quinze dias.

- Isso é que era bom! Eu falei com o Dr. Barbosa Leão e ele disse que podia dormir em casa.

- Não assinei nenhum pedido.

- Na altura quando quis fazer o pedido, não havia ninguém na secretaria e como tinha mais que fazer...

- Onde estiveste?

- Vim da Guiné.

- Pronto, pronto, vai à tua vida e trata lá disso.

Eu que não suporto desertores fui-o considerado um dia!

Um abraço a toda a tabanca
Manuel Maia
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 8 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4481: Os bu...rakos em que vivemos (12): Cafal Balanta contribui para o desenvolvimento nacional (Manuel Maia)

Vd. último poste da série de 25 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4414: Destas não reza a História (Manuel Maia) (2): Quem matou Inesa?

Guiné 63/74 - P4520: História do BCAÇ 4612/72 (6): Missão, Dispositivo e Actividades (Enviado pelo Jorge Canhão)


MISSÃO atribuída ao BCAÇ. 4612/72 pela directiva operacional “ÁGUIA JUDICIOSA”

a) Garante prioritariamente a segurança imediata, próxima e afastada dos trabalhos de construção da estrada JUGUDUL/BAMBADINCA, dentro da sua ZA, e assegura a perfeita integração do desenvolvimento desses trabalhos com as referidas medidas de segurança em ordem a que os mesmos não sofram qualquer quebra de rendimento.

b) Garante as condições de segurança necessárias à execução de movimentos nos itinerários NHACRA-MANSOA-MANSABÁ-FARIM e MANSOA-BISSORÃ, dentro da sua ZA.

c) Acaba com O IN na sua ZA, aniquilando-o, capturando-o ou, no mínimo, expulsando-o da sua ZA.

d) Intercepta os eixos:

.....................................MAMBONCÓ - SUARECUNDA
.................MORÉS <..................................................> SARA
....................................SANTAMBATO - MANDINGARÃ

IONFARIM - BIRONQUE - CÃ - QUEBO - MORÉS

FARADINTO - TENTO - UÁLIA
.......................................> GUSSARÁ - MANTIDA - SARA
............CAMBAJU - GENDO

Dificultando ao IN a sua utilização.

e) Assegura a defesa eficiente dos aglomerados populacionais ocupados pelas NT e o socorro em tempo oportuno dos destacamentos de menor efectivo.

f) Reconhece com frequência a faixa marginal do RGEBA de forma a detectar novos locais de cambança e linhas de infiltração IN, tendo em vista o oportuno desenvolvimento de acções de contra - penetração.

g) Exerce o esforço de Acções Psicológica sobre as populações controladas em especial as das regiões de MANSABÁ, BINDORO, BISSÁ, INFANDRE e BRAIA, com vistas à consolidação da sua adesão à causa nacional, fundamentalmente através de uma participação mais efectiva e esclarecida dos seus elementos na resolução dos problemas da Província, de forma a conseguir:

- a mobilização psicológica, à luz da actual política do Governo, em ordem ao seu enquadramento na manobra socioeconómica em curso integrada no movimento de “Uma Guiné Melhor”;

- a participação voluntária na defesa do seu chão.

h) Actua psicologicamente sobre as populações sob controlo IN, em especial as do regulado de CUBONGE, de forma a colocá-las na situação de duplo controlo, através:

- de um tratamento profundamente humano e de uma anulação de propaganda IN, constatação de factos incontestáveis, junto dos elementos que, por iniciativa própria, estabelecem contactos com as NT.

- de contactos a realizar pelas NT, ou por elementos apresentados e recuperados em operações para o efeito especificamente orientadas.

- Actua psicologicamente sobre o inimigo, de forma a conseguir:

- a dissociação do binário dirigentes/combatentes;

através:

- De uma propaganda e contra-propaganda, pelos factos, utilizando indirectamente as populações com que normalmente contacta;

- Da recuperação psicológica dos combatentes inimigos apresentados ou capturados, de molde a que se tornem testemunhas evidentes da validade da nossa politica.

j) Exerce o esforço de Acção Psicológica sobre as NT de forma a conseguir:

- A sua comparticipação consciente na manobra socioeconómica em curso;

- A dignificação e promoção do nativo, através das relações normais com a população.

l) Garante o funcionamento dos Postos Escolares Militares já existentes na sua Zona de Acção e dos que venham a ser criados face às normas em vigor.

m) Estabelece as necessárias medidas de segurança e de controlo das populações em ordem a evitar acções de terrorismo selectivo OU de sabotagem nos principais centros populacionais, em especial MANSOA e MANSABÁ.

n) Apoia os serviços Civis no quadro da manobra socioeconómica, nomeadamente no que se refere:

- À assistência sanitária às populações;

- À estruturação e accionamento do sistema de controlo da população, nos termos da legislação em vigor.


o) Conforme as instruções especiais e ordens particulares emanadas sobre o assunto:

- Executa e/ou impulsiona e melhora os reordenamentos e benefícios colectivos isolados à responsabilidade das autoridades militares, na sua ZA.

- Apoia as autoridades administrativas no melhoramento dos reordenamentos que lhe estejam cometidos.


DISPOSITIVO

O dispositivo iniciado em 280001NOV72, data-hora em que o BCAÇ assumiu a responsabilidade do Sector04, era:

(1) CCS.........................................................................MANSOA
(2) 1ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72 (-)..............................................PORTO GOLE
.... 01 PEL CAÇ (+)............................................................BISSÁ
(3) 2ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72 (-)...............................................JUGUDUL
.... 01 PEL CAÇ (-).............................................................ROSSUM
.... 01 PEL CAÇ (-).............................................................UAQUE
.... 01 PEL CAÇ ( + )...........................................................BINDORO
(4) 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72 (-)...............................................MANSOA
.... 01 PEL CAÇ.................................................................INFANDRE
.... 01 PEL CAÇ.................................................................BRAIA
.... 01 PEL CAÇ.................................................................PISTA E MANCALÃ
(5) CCAÇ 15.....................................................................MANSOA
(6) CART 3567..................................................................MANSABA
(7) PEL CAÇ NAT 57............................................................CUTIA
(8) PEL CAÇ NAT 58 (-).........................................................INFANDRE
.... 01 SEC CAÇ.................................................................BRAIA
(9) PEL CAÇ NAT 61............................................................CUTIA
(10) PEL REC DAIMLER 3088...................................................MANSOA
(11) PEL MORT 3030............................................................MANSOA
.... 01 ESQ MORT...............................................................MANSABA
.... 01 ESQ, MORT..............................................................PORTO GOLE
.... 01 HOMENS..................................................................INFANDRE
.... 02 HOMENS..................................................................BRAIA
.... 02 HOMENS..................................................................ROSSUM
.... 04 HOMENS..................................................................UAQUE
.... 02 HOMENS..................................................................BINDORO
.... 02 HOMENS..................................................................JUGUDUL
.... 02 HOMENS..................................................................BISSÁ
(12) 13º PEL ART (14)...........................................................MANSOA
(13) 01 SEC ART (8,8;/GA7.....................................................MANSABÁ
(14) CMIL/MANSOA..............................................................CUSSANA
.... PMIL 250.....................................................................CUSSANA
.... PMIL 251.....................................................................CUSSANA
.... PMIL 252.....................................................................CUSSANA
(15) PMIL 253....................................................................MANSABA
(16) PMIL 302....................................................................INFANDRE
(17) PMIL 303....................................................................BISSÁ



ACÇÕES ( TOTAL 49)

RESUMO DA ACTIVIDADE OPERACIONAL (NO PERÍODO)

FURÃO I a FURÃO XXVIII........................................Seg trabalhos estrada
FABAGELA........................................................Patr Comb Embc Noct
FABELA...........................................................Escolta
FABIANO..........................................................Patr Comb Embc
FABIFORME.......................................................Patr Comb Embc Noct
FABRICA..........................................................Patr Seg Descontinua
FALANGE.........................................................Patr Comb Embc Noct
FABULA...........................................................Patr Comb Embc Noct
FALCÃO...........................................................Patr Comb Embc Noct
FAÍSCA............................................................Patr Comb
FALCOADA........................................................Patr Comb Embc Noct e Batida
FACADA...........................................................Escoltas
FADIGA............................................................Embc Noct Seg
FAGULHA..........................................................Patr Comb Embc Noct
FACUNDOS.........................................................Escolta
FALANGETA........................................................Patr Comb Embc
FAGOTE............................................................Patr Comb Embc Noct
FAISÃO.............................................................Patr Comb Embc Noct
FAIANÇA............................................................Patr Comb Embc Noct
FAJARDO............................................................Patr Comb Embc Noct
FACETA..............................................................Patr Comb Embc Noct


Outras actividades operacionais:

Emboscadas diurnas.........................................51
Emboscadas nocturnas.....................................103
Emboscadas diurnas/nocturnas............................12
Patrulhas de reconhecimento................................2
Patrulhas de combate......................................139
Patrulhas fluviais..............................................5
Patrulhas auto.................................................3
Seg. trabalhos Pop...........................................31
Seg. trabalhos de capinação................................20
Seg. recolha gravilha........................................19
Escoltas........................................................41
Pic e armadilhamentos......................................30
Colunas auto para reabastecimento.......................24
Patr. Comb. e batidas........................................2
Patr. Comb. c/picagem de estrada.........................2


ACTIVIDADES


Em 280001NOV72 o BCAÇ assumiu a responsabilidade do Sector 04.

Em 282155NOV72, um GR IN não estimado, flagelou simultaneamente durante cerca de 10 minutos com CAN S/R, Mort 82, RPG-7, RPG-2 e AAUTM a tabanca e aquartelamento de JUGUDUL bem, como o aquartelamento de MANSOA, tendo ainda efectuado 04 tiros de CAN S/R sobre a estrada do CUSSANÁ com bases de fogos localizadas na região de CUSSANJA e MANSOA 7A 0.49. s/consequências para as NT. Pop raptada 28 (11h,16m, 01c) casas incendiadas 44. O IN teve várias baixas a avaliar pelo material abandonado.

Em 3009001NOV12, levantadas pelo Pel. Sap. 03 MAPES PMD-6 região CUSSANJA (MANSOA 7E3-59).

Em 01 DEZ inicia-se a acção FABAGELA em que é patrulhada a região MANSABÁ - CODUCO - DUTATO - BIRONQUE - MANSABÁ.

No mesmo dia realiza-se a acção FAVELA para escoltar a coluna de reabastecimento do OLOSSATO.

Ainda em 01DEZ são patrulhadas as regiões CRUZAMENTO INFANDRE, NHAE NAMEDÃO, UANQUELIM e INQUIDA durante a acção FABIANO.

Em 03DEZ realizou-se a acção FABIFORME em que 02 GRCOMB/CCAÇ 15 patrulham com embc noct a região de SANSANTO, QUESSAQUE, SABA, SANSANTO e CAUR.

Notícia de 04DEZ72 refere que através elementos da população de INFANDRE e BRAIA que se deslocaram ao CUBONGE, o IN tem procurado saber qual o número de efectivos que ficaram em INFANDRE, depois da rendição do BCAÇ 3832 e se os dispositivos de segurança se mantém, bem como o número de armas pesadas.

Em 06 DEZ a acção FÁBRICA destinou-se a proteger a coluna JUGUDUL BINDORO JUGUDUL.

Em 07 DEZ durante a acção FALANGE é patrulhada a região de MANTEFA.

Em 09 DEZ realizou-se a acção FÁBULA com patrulhamento de regiões entre BRAIA e INFANDRE.

Em 102245DEZ72, um GR IN não estimado, flagelou simultaneamente o destacamento de BRAIA e reordenamento, durante cerca de 17 minutos com Mort 82, RPG-7, RPG-2 e AATUM, tendo bases de fogos localizadas em MANSOA 5H6.38 e ainda do lado esquerdo da estrada paralelamente ao reordenamento. As NT sofreram 03 feridos graves e 03 feridos ligeiros. POP sofreu 03 mortos (02H;01C) IN teve várias baixas a avaliar pelos rastos de sangue deixados no local. Ao mesmo tempo MANSOA foi flagelada com CAN S/R da região de MANTEFA s/consequências.

As forças que acorreram em auxilio do destacamento sofreram uma emboscada região de MANSOA 8A3.28, com fogo proveniente da região de MANTEFA tendo as NT sofrido 02 feridos ligeiros.

No mesmo dia às 2240, um GR IN não estimado flagelou c/03 GR Mort 82 o destacamento de INFANDRE sem consequências. Base de fogos na região de MANSOA 5D2.44».

Em 11DEZ o Capelão deslocou-se a BAFATA a fim de assistir a uma reunião de todos os capelões da Província.

Em 12DEZ visita MANSOA S. Ex.ª BISPO DE MADRESUMA.

Em 13DEZ realizou-se a acção FAÍSCA na qual é patrulhada a região de MANSANSUNTO e MAMBONCO.

Em 131830 GR IN não estimado flagelou CUSSANÁ com 09 GR CAN S/R s/ consequências. Base de fogos em região ANHA FUTA-FULA.

Em 181045, accionada 01 MAPES PMD-6 estrada JUGUDUL BAMBADINCA (MANSOA 7C9.40) s/consequências.

Em 182225 GR IN não estimado flagelou cerca de 05 minutos com RPG e AAUT. destacamento de ROSSUM s/consequências para NT. Rou¬bou 0 3 vacas à Pop. Base fogos em MANSOA 4A3.25 e MANSOA 4B0.18.

Em 182225 GR IN não estimado flagelou com 07 GR Mort. 82 Destaca¬mento de BINDORO s/consequências. Base fogos reg. DATE.

- Em 201320 GRCOMB/lNFANDRE embc em MANSOA 5C5 abriu fogo sobre GR IN não estimado que retirou direcção QUERE. Resultados desconhecidos.


Em 21 DEZ 03 GRCOMB realizaram a acção FAGUNDES que consiste na es¬colta a coluna de reabastecimento a BISSORÃ.


Neste mesmo dia realizou-se a acção FAGOTE com emboscada nocturna na região de SINCHÃ BESSUNHA. Terminou s/contacto.

Em 22DEZ SUA Ex.ª GENERAL Comandante-chefe visitou o destacamento de BISSÁ.

Em 231920 GR IN não estimado flagelou cerca de 05 minutos com Mort 82 CUSSANÁ s/consequências. Base de fogos reg. LOCHER.


Em 23DEZ realizou-se uma patrulha de combate durante a acção FAISÃO em que 02 GRCOMB da 1ª CCAÇ emboscaram de noite em CACUMA. Terminou s/contacto.

Neste mesmo dia apresentaram-se 22 homens do BINDORO para trabalhar na desmatação da estrada JUGUDUL/BAMBADINCA.


- Em 242200 GR IN não estimado flagelou com 02 GR Mort 82 destacamento de BRAIA s/consequências. Base de fogos reg. BENIFO.

Em 25DEZ na acção FAIANÇA 02 GRCOMB da 1ª CCAÇ realizaram uma patrulha de combate com emboscada na região de DEMBEL. Terminou s/contacto.

Em 28DEZ no reordenamento de INFANDRE cerca das 0800 uma mulher, acidentalmente, pegou fogo a sua casa o qual devido ao vento, se propagou instantaneamente tendo originado o incêndio de 34 casas.

Em 30DEZ Sua Ex.ª GENERAL Comandante-chefe visitou MANSABÁ, CUTIA, BRAIA e INFANDRE.


No mesmo dia realiza-se a acção "FACETA" com patrulhamento em região a norte de MAMBONCO, emboscada em FARIM 1I6 terminou s/contacto.

Em 300825 accionada 02 M a/p PMD-6 pela segurança afastada estrada JUGUDUL /BAMBADINCA (MANSOA 7E3) causando 02 feridos graves às NT.


Em 300940 GR IN não estimado flagelou com 02 GR Mort 82 segurança afastada estrada JUGUDUL /BAMBADINCA s/consequências. Base fogos reg. LOCHER.

(Enviado por Jorge Canhão – Ex-Fur. Milº da 3ª Cia do BCAÇ 4612/72)

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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:


Fotos: © Alf. Milº Fraga & Jorge Canhão (2009). Direitos reservados.

Foto 1 - O pessoal da 3ª Cia., em Mansoa, num período de descanso a jogar às cartas
Foto 2 - Saída da 3ª Cia. de Bula para a zona do Choquemone depois de ter caído numa emboscada no mato
Foto 3 – No regresso de mais uma operação
Foto 4 - Uma tabanca do PAIGC assaltada pela 3ª Cia. e depois queimámos (ao fundo podem ver-se mais algumas cabanas)
Foto 5 – Material de guerra capturadas ao PAIGC (granadas de RPG)
Foto 6 - Uma evacuação por helicóptero de feridos (eu não estive neste embate, estava cá de férias, mas estou à espera que me façam a história dessa emboscada. Na história do batalhão fala em 10 minutos de combates, mas os meus camaradas, que lá estiveram, falam que os combates duraram cerca de duas horas)

Guiné 63/74 - P4518: Controvérsias (23): Sob a evacuação das NT de Madina do Boé (Armandino Alves)


1. O Armandino Alves foi 1º Cabo Enfº da CCAÇ. 1589 (1966/68), em Beli, Fá Mandinga e Madina do Boé, enviou-nos mais uma mensagem, em 12 de Junho:


Camaradas,

Estive a ler o testemunho do falecido Coronel Hélio Felgas, sobre os motivos que levaram à evacuação de Madina do Boé.

Uma das coisas que diz é que a sua companhia não estava lá a defender população, pois não havia nenhuma.

Basta ir ao Poste 1292 e logo na primeira foto que se lá vê (uma vista aérea de Madina do Boé), é bem patente a existência de várias tabancas. Ou será que aquelas “coisinhas” em forma de cogumelos, que se vêem terão sido lá “plantadas” pelo fotógrafo?

Não é verdade! Madina do Boé tinha a sua população, embora não fosse uma Nova Lamego ou uma Bafatá. Porque não perguntou ele ao nosso Comandante da Companhia o que foi feito dessa população?

Talvez os Altos Comandos não estivessem interessados em saber a verdade. Não sei se foi por sugestão do Cmdt dessa Cia. que as populações abandonaram Madina do Boé, se foi por verem que nem eles próprios se sabiam defender.

O IN só tinha um sítio de onde podia atacar com eficácia, que era o aquartelamento situado no cimo de uma colina, local este que a minha Companhia tinha sob mira do nosso canhão e dos morteiros 81.

Por esse motivo, se eles atacassem, só tinham tempo de disparar uma vez. Claro está, esta hipótese apenas teria lugar no caso de não serem detectados de imediato.

Essa Companhia, no 1º ataque que teve esbanjou todas as munições que lá lhe deixámos, mais as que tinham transportado e armazenado quando para lá foram, tendo que ser, posteriormente, reabastecidos pela FAP.

Isto soube-se em Bissau, ainda eu lá estava, pois só vim para a Metrópole em Setembro.

Mesmo assim apelidaram-nos, a eles, de Bravos de Madina. E as outras Companhias que lá estiveram o que foram? Turistas a passar férias?

Dá a ideia que nós tínhamos umas sardinhadas com o IN às segundas, quartas e sextas, e às terças, quintas e sábados, éramos convidados deles. Aos Domingos descansávamos todos juntos.

Mesmo os mortos que tiveram no CheChe, por todas as leituras que fiz da “coisa”, foram provocadas por uma ordem errada.

O que acho graça no meio disto tudo, é que numa situação idêntica, que todos bem conhecemos, um Homem foi punido por salvar a sua Companhia e a população civil sob a sua protecção evitando um massacre e, neste caso com mortos à mistura, não se procurou um qualquer responsável.

Até no filme, sob este assunto, conseguiram branquear as culpas dos seus intervenientes.

É este o infeliz país que temos e, creio eu, nada o mudará!

Armandino Alves
Ex 1º Cabo Enfº CCAÇ. 1589
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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em: