terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9425: O Nosso Livro de Visitas (125): Amílcar, ex-Fur Mil Inf Op da CCS/BCAÇ 4512 (Farim, 1972/74)

1. Mensagem de 13 de Janeiro de 2012 de um nosso camarada que se assina apenas como Amílcar:
Assunto: ex combatente - fur. milº Inf Op - Farim 1972/74 (Bcaç 4512/72-CCS)

Bom dia.
Por estes dias tive o primeiro contacto com o teu blogue e no que se refere ao sector de Farim e Guidage (pelos funestos acontecimentos) estou parcialmente de acordo com as narrativas feitas. Não estive na frente de combate ou em Guidage, só posso referir o que os camaradas diziam sobre a situação explosiva que se vivia ali e o clima vivido na sede de sector. Do que tive oportunidade de ler a narrativa do ex-Fur Mil Ranger Fernando Araújo* (2ª Compª do Bcaç 4512) está correcta.

Existem ex-combatentes vivos que estiveram na frente de combate, nos diversos dias que a acção decorreu, que poderão dar o seu depoimento. Todos os depoimentos que li e sempre que narravam situações que o combatente não foi protagonista entram em contradição com os referidos por quem os viveu.

Aqueles dias marcaram-nos inclusive a quem ficou a dar apoio às linhas da frente.

Num dos depoimentos é referido que o camarada Bento (Ccaç 14) foi morto pela explosão de mina quando todos os relatos, que tenho conhecimento, referem que foi morto por uma rajada de metralhadora que o cortou na região do baixo ventre. É um pormenor que ilustra bem as diferenças nas várias narrativas. Se queremos a verdade ela só será revelada por quem assistiu a tão trágicos acontecimentos.

A emboscada à 1ª coluna de ajuda a Guidage aconteceu no 1º dia, ao fim da tarde, só terminou ao raiar do dia seguinte, com o IN a derrotar as NT, e fazendo o correspondente assalto final. As munições de ajuda a Guidaje foram destruídas pelo bombardeamento das FAP (cerca das 9 horas) tal como as viaturas e alguns elementos IN que no momento estariam a roubar o conteúdo das Berliets. Os corpos dos nossos mortos foram recuperados semanas depois (quantas?), só após um grupo especial de Sapadores, de Tancos, ter chegado para o efeito.

A chegada angustiante ao quartel de Farim, naquela tarde de domingo de Maio, para verificarmos quem não tinha sido ferido, já que mortos eram 4 (o Bento, o Cabo Miliciano açoriano da 1ª Compª e 2 militares da Ccaç 14). Os feridos deitados no chão das Berliets e Unimogs, desnudados, enfaixados, recebendo soro, e a seu lado as enfermeiras e enfermeiros… O barulho dos motores dos helis, na pista, prontos para os evacuar.

Aquela tarde quente com o gosto amargo pela perda de camaradas, pelos camaradas feridos e mesmo pelos que voltaram sem ferimentos mas cansados e esgotados física/psicologicamente. E a dúvida acabou nesse fim de tarde; o furriel louro morto era o Bento e não o outro (não me recordo do seu nome) que também estava no teatro das operações e cuja esposa estava a viver em Farim. A imagem do encontro do casal nunca se me apagou da memória.

As fotografias documentam o primeiro ataque de foguetões que tivemos (o Batalhão dos velhinhos ainda se encontrava no sector) e a jangada que fazia a travessia do rio Farim (Cacheu), e, nos ligava a K3 (Saliquenhedim).

Quanto aos acontecimentos referidos no depoimento do ex-Fur Mil Ranger Fernando Araújo (2ª Compª do Bcaç 4512) sobre a morte trágica do Alf Mil que comandava o Pel Caç Nat 51 envio-te um ficheiro que consta das minhas memórias de guerra.

Constata-se que o inicio do diferendo não terá sido o reforço mas da não autorização para o militar africano visitar a mulher. Esta situação foi muito comentada pelos soldados africanos de Farim, pois diziam que não era razão para ele matar o alferes.

Para um primeiro contacto já vai longo.

Um abraço, até sempre
Amílcar





2. RETALHOS DE UMA GUERRA
JUMBEMBEM 
(Pel Caç Nat 51)

Naquele fim de tarde, cerca das 17,30 horas, chegou a coluna militar de Jumbembem.

A notícia tinha-nos chegado horas antes e dizia o seguinte: o comandante do Pelotão Nativo 51, Alf. Milº, tinha sido abatido por um tiro, à queima roupa, dado por um soldado africano.

Convém aqui dizer que estes pelotões eram compostos por soldados negros comandados por oficiais e sargentos brancos.

Mais tarde, via rádio, fomos informados de que a coluna militar fúnebre se encontrava junto ao arame farpado do aquartelamento, para depositar o cadáver na missão do sono, donde, posteriormente, seria enviado para a Metrópole.

Estávamos no Comando do Batalhão. O Comandante, Coronel Vaz Antunes, saiu a recebê-los. À frente das viaturas vinham os soldados formados em 2 filas e com as armas em posição funeral-armas, desfile tão triste. Armas que até ali, e dali em diante, só apontavam para ceifar vidas, neste momento com os canos virados para o chão.

Feito o desfile o cadáver foi depositado.

No fim da coluna fúnebre vinha uma viatura “Berliet”, escoltada por 6 homens armados, e no estrado jazia o assassino. O homem tinha sido neutralizado e ataram-lhe as mãos atrás das costas com arame de espessura de 0,5 mm. A cara, de tantos muros e pontapés que tinha levado, estava tão inchada que parecia tudo menos o rosto de um homem. Os pulsos, devido, ao arame, estavam a sangrar. Quem o olhasse diria que estava morto. Só a respiração, ofegante, desmentia tal facto.

Foi chamado o médico do Batalhão, para certificar o estado de saúde do detido, para poder ir para a prisão, uma vez que o oficial de dia se tinha recusado a aceitar o preso naquele estado. O médico observou-o e recusou-se a aceitar o preso devido ao seu estado físico. Mas como a coluna tinha que regressar a Jumbembem, foi o Comandante de Batalhão a responsabilizar-se pelo estado físico do preso.

Apesar de o comportamento assassino do soldado ser reprovado por todos os militares (brancos e pretos), nesta morte ficou estampado todo o racismo recíproco existente. A morte motivada pela não autorização, por parte do alferes, para o soldado ir visitar a mulher, foi um crime, mas a fúria com que todos os brancos batiam no desgraçado, não era menos criminosa. Interrogados porque batiam no homem, respondiam; ele é preto.

Depois de tão martirizado, o soldado, recolheu à prisão onde permaneceu deitado, no chão, até ao dia seguinte.

Durante uns dias o médico assistiu-o, periodicamente, tendo este recuperado.

NOTA: Neste dia estava de sargento de dia ao batalhão


3. Comentário de CV

Caro camarada Amílcar muito obrigado pelo teu contacto.
O assunto que referes e a que acrescentas mais uns pormenores, foi já largamente tratado no Blogue.
Toda e qualquer declaração que aumente o nosso conhecimento é bem vindo, pelo que esta tua mensagem fica a fazer parte do dossiê Guidaje 1973. Antes de ti vários camaradas fizeram chegar até nós testemunhos dramáticos daqueles dias, pelo que nem me atrevo a salientar nenhum. Cada participação tem um valor incalculável porque são quase todos vividos na primeira pessoa.

Se assunto da tua mensagem se refere ao teu posto e Especialidade, então foste Fur Mil com a Especialidade Inf Op e pertenceste à CCS/BCAÇ 4512/72. Do teu Batalhão fazem parte da tertúlia, assim de repente, os camaradas Manuel Marinho, Manuel Sousa e o Fernando Araújo. Espero não ter esquecido ninguém.

Já agora, aproveito para te convidar formalmente a fazeres parte da Tabanca Grande. Para oficializares a tua candidatura, antecipadamente aceite, manda por favor uma foto militar e outra civil (actual) tipo passe e confirma o teu posto, Especialidade, Unidade, local de permanência na Guiné, e tudo o que achares seja útil conhecermos de ti. Se tiveres mais algum apontamento das tuas memórias que queiras partilhar connosco, assim como fotos, junta ao processo. Digamos que é a jóia para ser admitido.
Futuramente poderás continuar a contar-nos as tuas vivências em Farim, suponho, assim como a enviar fotos, com a respectiva legenda, por favor, para serem publicadas na nossa página. Deste modo contribuirás para a nossa memória futura.

Até ao teu próximo contacto, deixo-te um abraço

Pelos editores
Carlos Vinhal
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Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

25 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 – P6249: Estórias avulsas (85): Como foi assassinado o Alf Mil Op Esp Nuno Gonçalves da Costa, do Pel Caç Nat 51 (Fernando C. G. Araújo)
e
8 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 – P6131: Estórias avulsas (82): A participação do 2º Pel 2ª CCAÇ/BCAÇ 4512, na Coluna a Guidage (Fernando C. G. Araújo)

Vd. último poste da série de 30 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9421: O Nosso Livro de Visitas (124): Recordando as forças expedicionárias do RI 15 (Tomar) no Mindelo, São Vicente, Cabo Verde (1941-1943) (Adriano Miranda Lima, Cor Inf Ref)

Guiné 63/74 - P9424: Documentos (16): Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição, adaptação e digitalização de Luís Gonçalves Vaz (Parte IV): pp. 1/9

1. Publicamos hoje as 9 primeiras páginas do relatório da 2ª Rep/CTIG, documento que nos está a ser gentilmente digitalizado pelo Luís Gonçalves Vaz [, foto à esquerda], a partir de um exemplar pertencente ao arquivo pessoal de seu pai, Cor Cav CEM Henrique Gonçalves Vaz, último Chefe do Estado-Maior do CTIG (1973/74), entretanto falecido em 2001.

O Luís Vaz (que tinha 13 anos, andava no liceu e estava em Bissau com a família em 25 de Abril de 1974) também teve a gentileza de fazer, da sua lavra, um compilação das partes mais interessantes do documento, do ponto de vista do conteúdo informativo. Iremos dar também continuidade à publicação desse seu texto (que está dividido por partes). Mas, para já vamos, ao encontro da sugestão de camaradas e leitores nossos, como o José Manuel Dinis, de quem se publica o seguinte comentário, de 21 de Janeiro, ao poste P3972:

“Caros Editores, o eventual interesse do relatório em epígrafe carece de uma publicação integral, para avaliação sistémica e conjuntural, na medida das possibilidades de cada um. A não ser assim, apenas ficamos a saber da existência de um relatório, mas aos costumes nada se acrescenta. A manter-se nas trevas, será uma oportunidade perdida. Abraços fraternos. JD”.

Nestas primeiras 9 páginas do relatório (que tem no total 74 páginas), aborda-se a situação política à data do 25 de Abril de 1974.

A. Período até 25Abr74
1. Situação em 25Abr74
a. Generalidades (p.1/2)
b. Situação política externa:
(1) PAIGC e organizações internacionais (p. 2/5)
(2) Países limítrofes (p. 5/8)
(3) O reconhecimento internacional do “Estado da G/B em 25Abr74 (p.8/9).

Entretanto, ainda há dias, o Luís Gonçalves Vaz esclareceu o significado das siglas CC/FAG, a nosso pedido:

(...) "Quanto às iniciais CC/FAG é: Comando-Chefe/Forças Armadas da Guiné. O Relatório,  a que estou dar visibilidade, assinado pelo então sr. Major Tito Capela [e hoje maj gen reformado], foi elaborado, já depois da unificação entre o Comando-Chefe e o QG/CTIG. Ler, a este propósito,  a nota do meu falecido pai, a saber:

Bissau, 20 de Agosto de 1974

(...) Despediram-se o Major Barreto Fernandes e o Tenente Abrantes, respectivamente, chefe da Secção de M.M. e Adjunto do Brig  Comandante. Desde 17 que oficialmente se constitui o Q. G. unificado para o C. C. (Comando Chefe) e CTIG . Publicado em Ordem de Serviço do Comando Chefe.

Soube-se hoje após o almoço que irá vigorar o esquema: Totalidade de pessoal (-6000) evacuado até 20 de Setembro de 1974 (...);  Restantes até Dezembro (?); Entretanto vai-se 'evacuando' o material ...". [Coronel Henrique Gonçalves Vaz, Chefe do Estado-Maior do CTIG].

 

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Nota de CV:

Vd. último poste da série > 25 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9398: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição,  adaptação e digitalização de Luís Gonçalves Vaz (Parte III)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9423: (In)citações (37): Mutilação Genital Feminina e Eurocentrismo (Cherno Baldé)

1. Comentário, ao poste P9410, aposto pelo Cherno Baldé [, foto à direita, com os seus quatros filhos, rapazes]:

 Amigo José Saúde,

O tema que hoje trazes à estampa, [a Mutilação Genital Feminina,]  é muito importante e oxalá tivesse eco junto dos demais, em especial da nossa população e assim contribuir para ajudar a neutralizar esta prática em África.

A necessidade de acabar com a pratica da Mutilacao Genital Feminina, devido às consequências negativas na saúde da mulher, é hoje tão consensual que deveria ser automaticamente aceite e aplicada por todos, de forma generalizada.

Mas, se isto nao se verifica é porque existem razões internas, profundas, enraizadas na cultura ancestral (social e religiosamente falando), é verdade, mas também, existem outros motivos e um deles é o facto de esta campanha mundial ser de iniciativa europeia, mais uma e logo suspeita!!! E porquê?

Há um proverbio africano que diz: "Quem já teve um encontro com um 'kancuran' de certeza que terá medo do bagabaga", que o é mesmo que dizer: "Gato escaldado, de água fria tem medo".

Depois de tudo o que (de bom e de mau) aconteceu no encontro entre europeus e africanos,  o que garante que as ideias vindas da Europa são completamente isentas, humanistas e desprovidas de "arrière pensée"?

Sem necessidade de voltar muito atrás na histária, lembro simplesmente que na Nigéria, e provavelmente em toda a África, já se viram campanhas de vacina (para a saúde das crianças!?) transformar-se em campanha para servir-se de cobaias humanas.

A África deve acreditar?!...

A África deve acreditar na Europa e na ciência!?.. Então não é essa mesma Europa e a sua Ciência que, em tempos, considerava o africano ligeiramente superior ao macaco das florestas tropicais e digno de ser obrigado a trabalhar!?..

A África deve mudar?!...

Para que sentido!? Norte, sul, leste...ao capricho e gosto dos europeus?!

Apesar de tudo, ainda há pessoas que ficam admiradas pelo facto de os africanos resistirem e não aceitarem factos cientificamente comprovados. Mais que uma simples teimosia de caráter cultural das nossas populações, na minha opinião, é a confusão e o desnorteamento que criam a resistência à mudanca e não ajudam os voluntários das boas intenções (atencao, de boas intenções...)

Um grande abraço,

Cherno Baldé

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Nota do editor:

Último poste da série > 30 de novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9117: (In)citações (36): Para melhor compreendermos a África... (Artur Augusto Silva, 1963)

Guiné 63/74 - P9421: O Nosso Livro de Visitas (124): Recordando as forças expedicionárias do RI 15 (Tomar) no Mindelo, São Vicente, Cabo Verde (1941-1943) (Adriano Miranda Lima, Cor Inf Ref)


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Hospital de São Vicente, fundado em 1899, no reinado do Rei Dom Carlos I (1889-1908). Foto do álbum do expedicionário, 1º Cabo Luís Henriques, nº 188/41 (1º Pelotão, 3º Companhia, 1º Batalhão, RI 5, Caldas da Raínha). Natural da Lourinhã, onde nasceu em 19 de Agosto de 1920,  Luís Henriques tem hoje 91 anos e memórias muito vivas dos difíceis tempos que passou no Mindelo (26 meses, entre julho de 1941 e setembro de 1943; nos últimos 4 meses esteve hospitalizado, por problemas pulmonares, entre maio e agosto de 1943).

Foto: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010). Todos os direitos reservados


 
1. Comentário, de um camarada de armas e leitor do nosso blogue, com data de 21 do corrente, ao poste P5109:

Luís Graça:


Sou Adriano Miranda Lima, coronel reformado, residente em Tomar, e nascido em Cabo Verde, S. Vicente. Não estive na Guiné, apenas em Angola e Moçambique.

Tive acesso ao seu blogue e só tenho razões para o felicitar efusivamente por esta belíssima e interessante iniciativa.

Revisitar estas saudosas memórias é recolocar a história no seu devido lugar e com ela reencontrar-se num abraço fraterno em que o coração se dá inteiro.

Como servi longos anos no RI 15 [, Tomar], aliás, a minha unidade de colocação, após o termo das comissões no ex-Ultramar, acompanhei sempre o convívio dos antigos expedicionários mobilizados pelo Regimento.

Algumas vezes coube aos expedicionários do RI 15 a organização do convívio, com participação dos camaradas de outros regimentos e unidades mobilizadoras. Cada "regimento" organizava o convívio de todos os que serviram em S. Vicente, [Cabo Verde].

Com o meu apoio pessoal, sendo eu então major, por duas vezes o convívio realizou-se no meu Regimento, em Tomar, e numa das vezes ele foi integrado nas comemorações do Dia da Unidade. Noutra ocasião, foi num restaurante em Tomar, e também estive presente, por simpático convite do elemento organizador, Sr. Francisco Lopes (Chico Concertina), infelizmente falecido há cerca de 4 anos. Dava-me muito bem com ele, e era sogro de um amigo meu, advogado.

Se estiver interessado em saber alguma coisa sobre o Batalhão que saiu de Tomar, terei o maior gosto em prestar informações ao blogue. Por acaso, publiquei um artigo num jornal online, sobre a memória desse batalhão. (**)

Há um blogue chamado Praia de Bote (nome de um local de S. Vicente), em que tenciono publicar uns spots sobre as forças expedicionárias a Cabo Verde. Como tenho poucas fotos, queria pedir a sua autorização para me servir das que constam do seu blogue respeitantes ao BI 5, que eram do seu pai. Apenas como ilustração. Naturalmente que me refiro a fotos de carácter genérico, não pessoais.

Apraz-me também registar o afecto e a admiração com que cultiva a memória do seu pai neste Blogue. (***)

Um abraço
Adriano Lima

[, criador e editor do blogue Ademos, cujo objetivo é a defesa do património ambiental e construído da cidade do Mindelo, São Vicente, Cabo Verde]



Blogue de Joaquim Saial, Almada, Portugal:

"A Praia de Bote é o genuíno coração do Mindelo. Sítio de catraeiros, lojas de aprestos marítimos (em desaparição), vendedeiras de fruta e legumes, botequins com cheiro a grogue, mancarra e tabaco americano, pescadores e seus botes, plurim d'pêxe (mercado de peixe), contrabandos vários, patifes de navalha afiada e também gente boa... Começa na velha Alfândega (hoje Centro Cultural do Mindelo) e termina na Torre de Belém (ou ao contrário...). É dela, da cidade e também da ilha onda se encontra que o blogue PRAIA DE BOTE trata".

Joaquim Saial é Professor e investigador de Arte e História. O blogue tem mais de 20 mil visitantes, desde o seu início (7 de fevereiro de 2011).

2. Comentário de LG:

Adriano, muito obrigado pelo seu comentário, pelo seu elogio ao nosso blogue,  mas também pelo seu pedido. Começando por este, disponha das fotos do meu pai, para os efeitos que julgar convenientes, citando sempre, naturalmente, o nosso blogue. (Temos, aliás, mais fotos de mais outros dois expedicionários, na série Meu pai, meu velho, meu camarada, nomeadamente do Ângelo Ferreira de Sousa e do Armando Lopes).

Todos temos o dever de memória, deixando às gerações seguintes notícias sobre a nossa passagem por este planeta que é único, o berço da humanidade, é a nossa casa, ou é a aldeia onde todos somos vizinhos... Cabo Verde e Portugal têm uma longa história em comum, além de uma língua. Eu tenho um especial afeto por São Vicente e, em particular, pelo Mindelo que um dia destes espero poder  finalmente conhecer ao vivo. (Não conheço Cabo Verde, de todo: estive apenas uma escassa hora ou duas no Sal, em paragem técnica do avião da TAP que me trouxe de férias, de Bissau a Lisboa, em 1970).

Transmiti, este fim de semana,  ao meu pai, Luís Henriques, (a caminho dos 92 anos) o seu interesse e o seu pedido. Até aos 80 anos, costumava ir ao convívios anuais da malta de Cabo Verde. Disse-me que nunca foi ao RI 15 (Tomar), a nenhum dos convívios dos antigos expedicionários, já que ele pertencia ao RI 5 (Caldas da Rainha). Em todo o caso, lembra-se bem das jogatanas de futebol, no Lazareto, entre uns e outros. Como também se lembra da epidemia de fome que assolou as ilhas, no tempo em que lá esteve (1941/43). O seu "impedido", o Joãozinho, que ele alimentava com as suas próprias sobras do rancho, também ele morreu, de fome e de doença, em meados de 1943. Comove-se ao dizer-me que deu à família do miúdo todo o dinheiro que tinha em seu poder (c. de 16$00) - na altura, estava hospitalizado -,  para ajudá-la nas despesas do enterro.

Desejo-lhe, por fim, meu caro Adriano, a si e aos seus amigos,  todo o sucesso na defesa do património daquela terra mágica, o Mindelo, berço de grandes poetas, músicos e cantores.
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 15 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5109: Meu pai, meu velho, meu camarada (18): Do Mindelo a... Bambadinca, com futebol pelo meio (Nelson Herbert / Luís Graça)

(**) Vd. excerto do artigo de Adriano Miranda Lima no jornal Liberal, "on line",

edição de 31 de Março de 2009:

Adriano Miranda Lima > Tropas expedicionárias a Cabo Verde durante o período da Segunda Guerra Mundial - Memória que perdura

(...) Como é sabido, Portugal não teve qualquer envolvimento na Segunda Guerra Mundial, tendo optado por uma posição de neutralidade que se manteve ao longo de todo o conflito. No entanto, sabedor da importância estratégica das suas ilhas atlânticas, nomeadamente os arquipélagos dos Açores e de Cabo Verde, alvos apetecidos por qualquer dos contendores, Portugal entendeu que seria curial guarnecer aqueles territórios com forças militares suficientes para dissuadir qualquer veleidade por parte dos beligerantes. O conflito assumira uma dimensão considerável no Atlântico e aqueles arquipélagos eram, com efeito, detentores de elevado potencial estratégico, sobretudo do ponto de vista aero-naval. Uma fraca presença militar de forças nacionais poderia indiciar um sintoma de desleixo, susceptível de encorajar uma ocupação estrangeira à revelia do direito internacional, em manifesto atropelo da soberania portuguesa.
 
O Regimento de Infantaria nº 15, de Tomar, foi das unidades do exército que enviaram forças expedicionárias a Cabo Verde. Conheço muito bem o historial deste Regimento por nele ter servido durante longos anos. E é assim que me capacito a divulgar a curiosa memória afectiva que os expedicionários deste Regimento de Infantaria desde sempre vêm cultivando e perpetuando. A par de outros Regimentos do Exército, competiu ao Regimento de Infantaria nº 15 organizar e mobilizar para Cabo Verde um Batalhão de Infantaria (cerca de 800 homens). As quatro companhias do Batalhão ficaram instaladas em S. Vicente e S. Antão, tendo partido de Portugal agrupadas em três contingentes. O primeiro embarcou em Portugal em 19 de Outubro de 1941, o segundo em 17 de Novembro do mesmo ano, e o terceiro em 8 de Janeiro de 1942.
 
Mas este acontecimento teria sido mais um episódio normal da história militar portuguesa não tivesse marcado indelevelmente o espírito dos antigos militares, sobretudo a classe de praças (soldados e cabos) e os oficiais e sargentos milicianos (serviço obrigatório). Os capitães já eram na altura homens maduros (quarentões) e habituados às andanças e contingências da vida militar, pelo que é natural que o impacto emocional das grandes “aventuras” tocasse mais a faixa etária dos vinte anos. O facto é que, desde a sua desactivação, os ex-militares que serviram no citado Batalhão vêm promovendo reuniões anuais em almoços-convívio para recordar a sua passagem por Cabo Verde, nomeadamente pelas ilhas de S. Vicente e de S. Antão, por onde se distribuíram as suas companhias.
 
Estive presente num desses convívios, pela primeira vez em 1986, pela circunstância de o mesmo ter sido realizado nas instalações do Regimento de Infantaria nº 15, por convite do seu Comandante. Competiu-me, na altura com o posto de major, ser o oficial a apoiar a organização desse evento, que se inseria nesse ano nas comemorações do aniversário do Regimento, condição que me permitiu assistir do princípio ao fim à confraternização dos ex-militares.

O leitor nem imagine a satisfação daqueles homens quando lhes disse que eu era cabo-verdiano de origem. E isto porquê? Porque, quando se juntam, a intenção é celebrar a memória de uma experiência militar vivida na intensidade anímica dos seus 20 anos, mas também recordar e celebrar a terra cabo-verdiana com eflúvios de uma saudade que eu não imaginava possível.  (...).
 
Um deles, Francisco Lopes, na altura cabo, era um exímio acordeonista (ainda hoje anima as romagens de saudade com o mesmo instrumento), e, como tal, fazia parte de grupos de animação recreativa em S. Vicente, juntamente com outros músicos da terra, frequentando as festas e os bailes das colectividades. Tanto assim foi que aprendeu, e ainda se recorda bem de mornas então em voga que ele recupera e interpreta nestes convívios, acompanhado por outros intervenientes.

Mas achei digno de registo o facto de muitos deles fazerem questão de introduzir nas suas conversas expressões em crioulo, demonstrando que não foi em vão o seu convívio com as gentes cabo-verdianas. São inúmeras as histórias que se contam nestes convívios, citando-se amizades contraídas com cabo-verdianos, namoricos com raparigas da terra, nomes de ruas, praças, botequins, enfim, um reportório variado de emoções e aventuras que a sua memória regista como as mais indeléveis recordações das suas vidas (...).

(...) Mas há um nome cuja memória estes homens veneram. Trata-se do capitão Fernando de Magalhães Abreu Marques e Oliveira, [1903-1975,] comandante da 3ª Companhia do Batalhão, recordado como oficial de alta competência e dotado de grande espírito humanitário. E então recordam que, naqueles tempos difíceis, em que grassava a fome em Cabo Verde, vitimando muita gente entre a população (como bem sabemos), o capitão Oliveira, condoído com aquela dramática situação, ordenou a montagem de um conveniente serviço de distribuição de sobras de rancho (alimentação das praças) às pessoas que se acercavam da portão do quartel. A certa altura, reparando que o número de necessitados crescia a olhos vistos, disse ao Sargento do Rancho que tinham de maximizar as sobras de alimentação. Perante as dúvidas do subordinado, explicou-lhe que era preciso “inventar” todas as situações administrativas e recursos possíveis. O Sargento mostrou-se então com dúvidas, mas a pertinácia do seu capitão não permitia qualquer hesitação ou tibieza. Sublinho que este facto foi-me contado, emocionado, pelo próprio Sargento interveniente, que era na altura um jovem furriel miliciano, infelizmente hoje já falecido.

O capitão Oliveira era, de facto, de uma natureza humana invulgar, um homem de grande nobreza de carácter e estatura moral, às ordens de quem nunca servi, mas que sempre ouvi citado pelas suas altas qualidades humanas e profissionais. Faleceu de morte súbita em 1975, já general reformado, tendo no seu cortejo fúnebre um número infindável de antigos subordinados. Todos os anos, estes veteranos do ex-Batalhão Expedicionário aproveitam o convívio para cumprir uma romagem ao jazigo do cemitério de Tomar onde estão os restos mortais do seu “capitão”. Ele era filho desta cidade de Tomar. Escusado é dizer que me venho incorporando no séquito de homenagem, em intenção a um oficial de estirpe, mas, sobretudo, em nome de todos os meus conterrâneos a quem o oficial mitigou a fome com a sua atitude de grande compaixão e solidariedade humana.

Registe-se que o gesto humanitário do capitão Oliveira em prol dos necessitados em S. Vicente não tardou a ser seguido por outros comandantes das companhias destacadas na ilha de S. Vicente. Creio que por longos anos ficou gravada na memória dos pobres e desprotegidos do Mindelo a figura humana do valoroso capitão. Um homem que aparentava um ar sóbrio e mesmo severo, mas que tinha um coração de ouro, do tamanho do mundo. Havia uma rua em Mindelo que se chamava rua Infantaria 15, provavelmente uma homenagem da cidade por tudo quanto foi aqui referido. Ainda me recordo dessa rua, mesmo no centro da “morada”, que hoje terá certamente outra designação toponímica. Provavelmente, o nome de algum estrangeiro que nenhuma relação teve com Cabo Verde e a cidade do Mindelo.

Num breve apontamento, resta referir que o Batalhão de Infantaria 15 regressou a Portugal em Julho de 1943. Seria interessante citar outros factos do seu historial, em meu poder, mas não o faço para não saturar este texto. No entanto, não deixo de referir que o comandante do Batalhão, major Nicolau de Luizi, faleceu por doença em S. Vicente, em pleno exercício do seu comando. Realizou-se então um cerimonial militar fúnebre em S. Vicente, mas a sua urna foi transferida para Portugal, estando sepultado num jazigo no cemitério desta cidade de Tomar, de onde era também natural. (...)

O capitão Oliveira era, de facto, de uma natureza humana invulgar, um homem de grande nobreza de carácter e estatura moral, às ordens de quem nunca servi, mas que sempre ouvi citado pelas suas altas qualidades humanas e profissionais. Faleceu de morte súbita em 1975, já general reformado, tendo no seu cortejo fúnebre um número infindável de antigos subordinados. Todos os anos, estes veteranos do ex-Batalhão Expedicionário aproveitam o convívio para cumprir uma romagem ao jazigo do cemitério de Tomar onde estão os restos mortais do seu “capitão”. Ele era filho desta cidade de Tomar. Escusado é dizer que me venho incorporando no séquito de homenagem, em intenção a um oficial de estirpe, mas, sobretudo, em nome de todos os meus conterrâneos a quem o oficial mitigou a fome (...).

(***) Vd. último poste da série >22 de janeiro de 2012 >  Guiné 63/74 - P9386: O Nosso Livro de Visitas (123): Fernando Gomes Pinto da CCAÇ 4945/73 (Guiné, 1973/74)

Guiné 63/74 - P9420: Turismo de saudade (2): Mini-diário e fotos da minha visita à Guiné-Bissau (TCor José Francisco Robalo Borrego)

1. Dizia-nos o nosso camarada José Francisco Robalo Borrego*, Ten Cor (R), que pertenceu ao Grupo de Artilharia n.º 7 de Bissau e ao 9.º Pel Art, Bajocunda (Guiné, 1970/72), na sua mensagem de 19 de Janeiro de 2012:

Há uns anos a esta parte, despertou em mim o desejo de voltar à Guiné, volvidos 40 anos, para matar saudades dos locais por onde andei e conversar com os guineenses de quem guardo boas recordações.

Era uma questão de tempo e de oportunidade para concretizar a minha vontade. Esse dia chegou e lá fui eu até Bissau de 4 a 12 de Janeiro do corrente ano.

Aqui está o seu mini-diário, pretexto para vermos algumas das fotos que testemunham a sua visita de saudade à Guiné-Bissau.


05-01-2012
Chegada à Guiné pelas 14 horas. Deslocação para os aposentos e descanso, após o almoço.

A famosa Pensão Central

06-01-2012
Viagem ao Canchungo (Ex-Teixeira Pinto) com passagem por Safim, Có e Pelundo. De assinalar que o Rio Mansoa tem uma bela ponte, construída por espanhóis, ao que consta, com portagem e tudo! A estátua de Teixeira Pinto foi retirada e guardada num museu, segundo me disseram, restando a pedra que a suportava.

Canchungo (Ex-Teixeira Pinto)

Ponte sobre o Rio Mansoa

07-01-2012
Passeio a pé, ida e volta, recordando outros tempos, desde o Quartel-general, Santa Luzia, até ao cais do Pidjiguiti, aproveitando para tirar algumas fotos na cidade.

Quando regressava para Santa Luzia, pedi uma informação a um guineense, na casa dos 60, sobre uma rua o qual se prontificou a informar-me e depois de eu lhe dizer que tinha lá estado, há quarenta anos, na guerra colonial, ele disse-me que também tinha sido combatente da liberdade da pátria, ou seja, do PAIGC, mas que agora éramos amigos, o que eu concordei plenamente com ele. Fomos andando no mesmo sentido e ele amavelmente ia-me transmitindo as alterações geográficas, entretanto, ocorridas. No fim, abraçámo-nos desejando boa sorte mútua.

(Nota do editor: As fotos deste dia, referentes a Bissau, serão publicadas em próximo poste)

08-01-2012
Passeio a Quinhamel onde almocei e pude saborear a bela ostra com uns amigos.

09-01-2012
Visita à minha antiga unidade (GA7), transformada em escola secundária – a Unificada Escola 23 de Janeiro. Conversei alguns instantes com o director a quem pedi autorização para visitar o estabelecimento;

Antiga Casa da Guarda do ex-Grupo de Artilharia N.º 7

10-01-2012
Visita ao hospital de Comura, antiga leprosaria, assim denominado, quando foi fundado e que sempre foi campo de acção pastoral dos Frades Franciscanos. Aliás, presentemente o Director Clínico é um frade médico português – Frei Vítor Farinha Henriques. Como ficava em caminho, aproveitei e dei uma saltada a Prabis.

Hospital de Comura

11-01-12
Visita relâmpago, com uns amigos, da parte da manhã, ao quartel do Cumeré com passagem por Nhacra, onde fomos muito bem recebidos pelo senhor comandante que nos mostrou a unidade e que me autorizou a tirar algumas fotografias. O Cumeré é um local conhecido de muitos camaradas nossos, porque era ali que geralmente o senhor general Spínola dava as boas vindas às tropas que chegavam à Guiné e fazia as suas habituais exortações patrióticas! Da parte da tarde foram feitas as despedidas, arrumar a mala, descansar um pouco, porque o voo de regresso saiu de Bissau pelas 02h30 da madrugada, aterrando em Lisboa cerca das 06h30 do dia 12 de Janeiro.

Edifício Rec. Cumeré

Ruínas da Igreja do Quartel de Cumeré

Parada do Quartel de Cumeré

Porta D'Armas do Quartel de Cumeré

(Continua)
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9391: Turismo de saudade (1): Gostei de voltar à Guiné e ver pessoalmente algumas melhorias, mas a Guiné precisa de muita estabilidade para atingir o tão benéfico desenvolvimento (José Francisco Borrego)

Guiné 63/74 - P9419: Nós da memória (Torcato Mendonça) (6): África, adeus - Fotos falantes IV

Bissau > Cais da Marinha ou o Repouso da Marinha





1. Em mensagem do dia 26 de Janeiro de 2012, o nosso camarada Torcato Mendonça (ex-Alf Mil da CART 2339 Mansambo, 1968/69), enviou-nos este texto para integrar os seus "Nós da memória", ilustrado com fotos falantes da sua IV série.





NÓS DA MEMÓRIA - 6
(…desatemos, aos poucos, alguns…)


2 – ÁFRICA, ADEUS!

(Parece plágio, creio que não)

Fotos Falantes IV

Sabia que não podíamos contrariar a História. Só não sabia quando.
Despedia-me agora de Lisboa sem com isso me preocupar. Partia como soldado em defesa do nada, de muito ou, isso sim, do desconhecido.

Em gelada manhã de Janeiro, meio escondidos como se de nós tivessem vergonha, juntamo-nos à beira Tejo no Cais da Rocha Conde de Óbidos e dali embarcamos, a custo para muitos e em desgosto para muitos mais que em terra ficavam acenando lenços, limpando uma lágrima mais incómoda, gritando um último chamamento. Triste a despedida, são sempre tristes e muitas vezes dispensáveis. Considerava esta sem interesse e, por isso mesmo, pedi para ninguém familiar ou amigo lá ir.

Lá fomos, no “Ana Mafalda”, quebrando ondas, deixando a terra a perder-se no horizonte e vendo só o oceano à volta. Sentia, com o correr dos dias, o ar a aquecer e o mar a mudar.

Finalmente o esperado grito:
-Terra. Cabo Verde, Ilha do Sal, Pedra Lume.

Para mim uma paisagem quase lunar. Paragem breve só para carga e descarga.

Levantou ferro o “Ana Mafalda” rumando ao continente, à Guiné de incógnita e temor, de destino imposto e não desejado.
Sulcava o barco pelo mar calmo e quente, o calor a aumentar e, em igual proporção, a curiosidade e ansiedade a aparecerem mais fortes, mais expectantes, tornando-nos menos faladores e mais mudos observadores.

Na madrugada seguinte o Continente, meio enevoado, surgia na linha do horizonte, cada vez mais perto e a mostrar-se com mais nitidez. Veio a informação:

- Ponta de Jeta, já estamos em mares da Guiné.

Pouco depois o estuário do Geba a ser fendido pela proa do barco. Os olhares a tudo devorarem e África já ali. Bissau a aparecer pouco depois e o calor tão forte a ensopar os corpos.

Recordo mais fortemente uma palavra talhada na alvenaria decrépita num velho casarão: Nosoco. Veio a informação. Era de um armazém de uma empresa francesa. Há anos que abandonara a Guiné.

Devagar navegava o barco e, a bombordo, aparecia o porto, o cais, a cidade. A estibordo o ilhéu do Rei, como a seguir soube o nome. Do alto, de todo o lado, vinha o calor e aquela humidade pegajosa que se colava á pele.

Paramos e esperamos maré. Depois foi o desembarque sem pressas e atravessamos a cidade só parando junto a enormes barracões.

Esperamos.
Não tardou veio a ordem de ali arrumar tudo e esperar.
Ordens a virem, ordens a saírem e o primeiro aquartelamento estava montado.
A noite quente, húmida, diferente, veio e com ela o cansaço.
E agora? Agora? Vamos ver, vamos esperar…

Porto de Bissau > Local de protesto

Uíge, o engole militares

Texto e fotos ©: Torcato Mendonça (Fotos Falantes IV) 2012. Direitos reservados
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9408: Nós da memória (Torcato Mendonça) (5): Fado no Império - Fotos falantes IV

Guiné 63/74 - P9418: Notas de leitura (328): La Pointe du Couteau, de Gérard Chaliand (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Janeiro de 2012:

Queridos amigos,
Gérard Chaliand publicou recentemente o seu primeiro volume de memórias e dedicou páginas de grande beleza a Amílcar Cabral, refere com minúcia a viagem que fez a Conacri em 1964 e ao interior da Guiné em 1966, que deu matéria para um livro que conheceu notoriedade e várias traduções a partir de 1967.
Mais uma peça a juntar à muita bibliografia que já temos em recensão.
A investigação não pára.
Escreveu-me hoje o Leopoldo Amado, temos ai em breve mais um livro.

Um abraço do
Mário


As memórias de Gérard Chaliand e a luta armada na Guiné

Beja Santos

Editado pela conceituada Robert Laffont, no ano passado foram publicadas as memórias de Gérard Chaliand com o título “La Pointe du Couteau”. Chaliand foi um dos primeiros escritores revolucionários a percorrer a Guiné na companhia de Amílcar Cabral (anteriormente tinha percorrido as zonas libertadas Mario Marret autor do filme “Lala Quema” e dois jornalistas franceses).

Chaliand participou aos vinte e cinco anos nos acontecimentos argelinos e cedo verificou que uma grande parte destes discursos ideológicos ditos vanguardistas nem sempre assentava na realidade dos fatos e na sinceridade dos homens. É nessa ocasião que ele parte, a convite de Cabral, para a Guiné. Como ele escreve nas suas memórias, esta experiência decisiva determina a sua existência.

Toda a sua vida de intelectual está ligada ao estudo dos conflitos, por isso ele vai percorrer o Vietname, a América do Sul, os campos Palestinianos da Jordânia, em Israel, no Iraque e no Líbano. Deu numerosas conferências por todo o mundo e a sua bibliografia é impressionante. Poucos intelectuais franceses assumiram tantas responsabilidades como ele no ensino superior em França, em Harvard e Berkeley, mas também Singapura, a Cidade do Cabo, Salamanca e Tbilissi. Procede-se à recensão deste seu texto, entre as páginas 233 e 268.

Descreve-o [ a Amílcar Cabral,]como um homem de estatura média, magro, rosto largo e um olhar atento por detrás dos óculos. Considera-o o mais inteligente dos revolucionários africanos, com uma cultura política impressionante e bem fundamentada. Recorda como a sua intervenção na Conferência Tricontinental, em Havana, em 1965, introduziu uma leitura completamente diferente sobre os movimentos revolucionários, a sua conceção de vanguarda dirigente estritamente associada à base social de apoio, uma leitura que inquietou a ortodoxia vinda de Leste.

Conheceram-se na Argélia, no princípio de 1963, foi nessa altura que Chaliand pediu a Cabral para ir à Guiné estudar as condições da luta armada no território. Cabral fizera convites a outros visitantes de muitos países, só Chaliand e dois chineses é que apareceram em Conacri. Escreve que a imensa vantagem que Cabral tinha sobre a maioria esmagadora dos dirigentes africanos era o conhecimento do terreno, e explica o seu trabalho no recenseamento agrícola da Guiné nos anos 50.

Em Conacri, Chaliand visita a escola de quadros e regista como os revolucionários procediam à abordagem das populações e como, com toda a franqueza, expunha os seus fiascos. Importa não esquecer que a viagem posterior, em 1966, irá dar um livro com várias traduções depois de publicado, em 1967, pela então incontornável editora Maspero, com o título “Lutte armée en Afrique”, cuja recensão já foi publicada no blogue.

Em 1966, Chaliand vai mesmo percorrer o interior da Guiné, o que não fizera em 1964. Saíram de Dakar e entraram no território guineense a partir do Senegal, irão ser acompanhados por Titina Silá, José Mendes, quadro do MPLA, ao seu encontro vem, Osvaldo Vieira, responsável militar da Região Norte. Viajam em direção ao Morés, é uma descrição sóbria, cortante, o viajante sabe que corre mutos riscos, interessa-lhe apurar a vibração existente nas bases de guerrilha, aperceber-se da moral dos combatentes, da qualificação militar e do apoio efetivo das populações. Não esconde o deslumbramento pela qualidade das intervenções de Cabral, o recurso a imagens apreensíveis, a exaltação dos direitos das mulheres, o repúdio por qualquer tipo de neocolonialismo; vai rebatendo a argumentação das autoridades portuguesas na Guiné, como refrão refere o trabalho forçado, a palmatória, o chicote e o imposto de palhota.

Dá um quadro da criação do PAIGC que provavelmente não coincide com os fatos hoje conhecidos (aliás, no início desta exaltação Chaliand diz que Cabral era originário de Cabo-Verde), a seguir temo-lo a conversar com Chico Mendes e Osvaldo Vieira, procura captar a lógica de uma base onde a guerrilha proteja a população, perceber qual o papel do comissário político e do comandante militar.

No Morés propriamente dito vê o funcionamento de um hospital de campanha e pela primeira vez sente os aviões a largar bombas muito perto. Por onde quer que passe, Cabral reúne com as populações e discursa, apela ao fomento da produção, à camaradagem, à disciplina e à denúncia dos déspotas da guerrilha que procedem como senhores feudais. Chaliand regista as suas conversas com António Bana, outrora mecânico, é ele quem clarifica a natureza do papel mobilizador entre 1961 e 1963, como foram desencadeadas ações de sabotagem a partir dos finais de 1962 e se alcançaram grandes progressos no Sul, de 1963 para 1964 operou-se uma relativa clarificação nos apoios das populações, por essa época já era elevado o número de quadros militares e o armamento melhorara substancialmente.

Ainda de acordo com António Bana, a partir de 1965 fora tomada a decisão de não responder com barbaridade aos atos de repressão dos portugueses (convenhamos que esta argumentação é falaciosa e desfasada de inúmeros atos de barbaridade perpetrados por forças da guerrilha, inclusivamente contra outras populações africanas). Chaliand é inteirado da organização das FARP, vê com os seus olhos o armamento.

É em Djagali que Chaliand regista a peça de oratória mais empolgante de Cabral, ao dirigir-se à população o líder do PAIGC pede ao mundo para estar atento ao que ali se passa, há vida nova que ali se organiza, ao progresso que há de vir, não há maior vitória que a do progresso, fundamentado na escolaridade, nos melhores indicadores de saúde e na criação da riqueza apropriada por todo o povo. Chaliand escreve que impressiona a consciência aguda que Cabral tem dos defeitos e das necessidades da sua sociedade.

E depois é a torna-viagem, Chaliand escreveu o que viu, o seu trabalho iria ser elogiado por grandes especialistas da contrainsurreição. Ao longo dos anos foram-lhe chegando notícias do desaparecimento de guerrilheiros que ele conhecera: António Bana, Chico Mendes, Titina Silá. Chegou-lhe a notícia que ele não confirmou de que Osvaldo Vieira teria estado em contacto com os portugueses. Veio a morte de Cabral e depois no Outono de 1973 o reconhecimento da independência da Guiné-Bissau pelas Nações Unidas. Ele lembra-se da receção que teve em Cabo Verde, em 1975, ali se encontrou com Abílio Duarte, Aristides Pereira, Dulce Almada e Pedro Pires.

Anos mais tarde, Lucete Cabral, então mulher de Luís de Cabral, numa homenagem a Nelson Mandela, quando o abraçou disse-lhe: You are the best ao que este respondeu: No, there is Cabral. Chaliand, de forma lacónica, repertoria as etapas seguintes da vida da Guiné-Bissau, num duro contraponto com a democracia cabo-verdiana.

Ao findar as suas recordações de Cabral, volta a referir que ele foi um dos raros africanos do século XX que possuiu o estatuto de um dos grandes dirigentes do mundo contemporâneo, a despeito da dimensão do país. Foi em nome dessa recordação que Chaliand abriu a exceção, ele que tem recusado todas as condecorações, e recebeu a medalha Amílcar Cabral que lhe foi dada pela República de Cabo Verde, a mais alta distinção do país. E termina assim: “Tu contaste muito para mim, pelo teu exemplo, a tua coragem tranquila, a tua inteligência das situações, o teu saber, o teu gosto repartido entre a poesia e o teu prazer de viver e de agir para mudar, modestamente, a ordem suposta das coisas. Tenho sempre a tua fotografia, em tamanho grande, em farda de combate, colada no interior da porta do meu armário, justamente para mim”.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9407: Notas de leitura (327): Bordo de Ataque - Memórias de Uma Caderneta de Voo e um Contributo para a História, de José Krus Abecasis - II Volume (Mário Beja Santos)

domingo, 29 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9417: Em busca de... (181): Camaradas que tenham pertencido ao BCAV 1915 ou BCAÇ 2861 (Bissorã e Bula, 1968/69)



1. O nosso Camarada Luís Dias, ex-Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872,Dulombi e Galomaro, 1971/74, enviou-nos uma mensagem apelando aos nossos Camaradas que tenham pertencido ao BCAV 1915 (que foi rendido em 18FEV1969) ou ao BCAÇ 2861, unidades a que pode ter pertencido o João Gomes.

Camaradas,

Recebi uma mensagem no facebook de um amigo e irmão de um camarada da minha CCAÇ - o 1º Cabo Atirador Avelino Martins – pedindo para localizar os camaradas do ex-Soldado Cozinheiro, João Maria Gomes, nº mec 057524/67, de 65 anos de idade, que esteve nas localidades de Bissorã, Bula e Có - 1968/69 (?).

Este camarada vive em Matosinhos, é um pescador e já não se recorda do número da sua companhia e batalhão. Teve conhecimento que através da net haveria a possibilidade de localizar antigos camaradas e, eventualmente, apurar se eles se reúnem ainda, para que com eles possa conviver, dar um abraço e lembrar os tempos que passaram juntos naquelas terras.

Vamos dar uma alegria a este homem que ficou sensibilizado ao saber que talvez conseguíssemos localizar os seus antigos camaradas.

O meu amigo (Augusto Martins) de Matosinhos vai também contactar a Tabanca de Matosinhos para o mesmo efeito.

Um grande abraço.
Luís Dias
Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

29 DE JANEIRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P9415: Em busca de... (180): Cherno Candé, o Fernandinho de Paunca (1973), procura o Fur Mil Gonçalves da CCA 11 (Os Lacraus)




Guiné 63/74 – P9416: In Memoriam (107): Está de luto a CCAV 488 do BCAV 490, pelo falecimento de Augusto Pimenta Henriques Simões (Fur Mil)



1.   No passado dia 27 do corrente mês, recebemos do nosso Camarada João Henriques Simões (que prestou a sua comissão militar em Moçambique e supomos ser irmão do falecido), uma mensagem informando do falecimento do nosso Camarada António Augusto Pimenta Henriques Simões, que foi Fur Mil Cav da CCAV 488 / BCAV 490 (1963 e 1965).


“Informo que faleceu em New Hampshire (USA) no dia 6 de Janeiro de 2012, António Augusto Pimenta Henriques Simões, ex-Furriel Miliciano de Cavalaria da CCAV 488 do BCAV 490 que serviu na Guiné entre 1963 e 1965. 



Foi condecorado com a Cruz de Guerra por actos de bravura em S. Nicolau - Como, na Operação Tridente (ver na OE o louvor). 

Saudações cavaleiras 
João Manuel Pimenta Henriques Simões 
Alf Mil Cav – PM (CPM 8240/RMM/1972-1974 "OS MARADOS" - custódia das Cargas Críticas entre a Beira e Cabora Bassa). 

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados. 
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Nota de M.R.: 

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Guiné 63/74 - P9415: Em busca de... (180): Cherno Candé, o Fernandinho de Paunca (1973), procura o Fur Mil Gonçalves da CCA 11 (Os Lacraus)

1. Mensagem de Cherno Candé, o Fernandinho de Paunca (1973), com data de 20 de Janeiro de 2012:

Ola sr. Carlos!
Daqui uma vez mais o Fernandinho. Estou e à procura do furriel Gonçalves que aparentemente é de Viseu e serviu na CCAÇ 11 "Os Lacraus de Paunca" em 19773 e nos princípios de 74. Para isso tenho uma foto de um amigo meu que agora está a viver na Austrália. Entre essas pessoas está o furriel Gonçalves.


2. Contactámos o amigo Cherno nos seguintes termos:

Olá caro amigo Cherno
Queria que me dissesse porque anda à procura do meu camarada Gonçalves da CCAÇ 11. Por acaso o Cherno foi um dos miúdos que frequentava o Quartel? O nome Fernandinho foi-lhe posto pela tropa? Que idade tem hoje? Fala de uma fotografia onde está o Gonçalves. É capaz de me mandar a foto digitalizada?
Temos no Blogue poucos camaradas da CCAÇ 11 de 1973, mas pode ser que alguém se lembre dele.

Gostava de saber mais pormenores seus para publicar uma coisa bonita a seu respeito. Se tiver uma foto sua mande também.
Pelo seu endereço nasceu em 1963, é assim? Vive na Guiné-Bissau, em Portugal ou noutro pais estrangeiro?

Fico à espera das suas notícias.
Abraço
Carlos Vinhal


3. A resposta de Cherno Candé foi rápida, assim:

Boa noite sr. Carlos.
Pois é, eu era uns dos miúdos que andava lá no quartel. Na altura chamavam-me Fernandinho. Estive em Portugal há muitos anos, mas agora estou a viver aqui no Reino Unido, concretamente em Belfast - Irlanda de Norte.

Aqui vai uma fotografia onde estou eu e alguns dos furriéis e cabos. Na fotografia, entre os miúdos de pé, eu sou o segundo. Vai aí uma outra fotografia actual, já sou um homem com 48 anos. Vai uma outra fotografia entre esses grupos de pessoas está o furriel Gonçalves.

Caso soubere dele quero contactá-lo, por favor.

Muito obrigado pela atenção
Vai um abraço de Fernandinho.

Cherno Candé, o Fernandinho de Paunca (1973), hoje com 48 anos, a viver em Belfast - Irlanda do Norte

Paunca 1973(?) > Fernandinho será o segundo de pé a partir da esquerda.


Este conjunto de cinco fotos está identificado como sendo do Meireles. Será o tal militar a viver actualmente na Austrália? Será que o nosso camarada Casimiro Carvalho nos poderá ajudar a identificar o Fur Mil Gonçalves?

Fotos enviadas por Cherno Candé - Legendas de Carlos Vinhal
Emblema da CCAÇ 11 da colecção do camarada Carlos Coutinho


4. Comentário de CV:

É sempre com um misto de alegria e alguma nostalgia que recebemos notícias dos nossos meninos guineenses.

Não houve aquartelamento que não fosse invadido por traquinas crianças das tabancas. Ensinavam-nos os seus usos e costumes, prestavam pequenos serviços, recebendo de nós alguma comida e ajuda na execução dos seus trabalhos escolares. A par das nossas lavadeiras, esses fazem ainda hoje parte do nosso imaginário.

Gostaria que se conseguisse ajudar o Cherno Candé a encontrar o seu amigo Gonçalves, ex-Fur Mil da CCAÇ 11 em 1973 que viverá na zona de Viseu.
Desse tempo estou só a ver o camarada Casimiro Carvalho a quem apelamos, sabendo da sua estima pelos nossos irmãos guineenses, para tudo fazer para encontrar o seu camarada Gonçalves.
Casimiro, se eventualmente conseguires identificar alguém nas fotos de quem tenhas os seus contactos, por favor põe em contacto com o Cherno, cujo endereço é chernocande63@gmail.com

Para todo e qualquer camarada que possa ajudar o nosso pedido é válido.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9397: Em busca de... (179): Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798, procura fotos aéreas de Gadamael Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798, procura fotos aéreas de Gadamael

Guiné 63/74 - P9414: Parabéns a você (374): Luís Graça Henriques, ex-Fur Mil Armas Pesadas da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Guiné, 1969/71) e fundador deste Blogue


1. Mensagem do nosso camarada José Lima da Silva:


Camarada Luís Graça

Hoje é dia do teu aniversário.
Desejo-te que passes um lindo dia, rodeado da tua família e amigos.
Também desejo que tenhas um dia muito feliz e que essa felicidade se prolongue por muitos mais anos.


Um abraço de muita consideração
José Lima da Silva




2. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado:


Meu caro Luís

Tu trouxeste memórias das partidas e das chegadas.
Por tua causa revivemos fragâncias a Tejo, que se misturam com os rios e bolanhas, que se desfazem por força de macaréus.


Voltaram os cheiros de mancarra e caju torrados, vinho de palma, o calor, o pó das picadas, a violência das trovoadas, as chuvas intensas mas regeneradoras da Natureza sequiosa.


Os bons e maus momentos. Os rostos que teriam desaparecido na voragem da nossa vida.
O prazer com que quando estamos juntos recordamos.


- Lembras-te daquele ou daquela vez?


- A minha lavadeira para sempre esquecida nas fotos, que por sua vez durante anos também foram esquecidas, está agora ali bem presente.


Quantos reencontros?
Quantos abraços?


Deste-nos a vontade de partilhar e absorver vivências.


Também todos os dias nos permites usar a Liberdade como ferramenta. Sem ela nunca poderíamos ter chegado onde chegamos e a nossa destruição como colectivo, seria uma consequência lógica.


Em troca do que me deste, só me resta dar-te um grande sentido abraço de amizade e reconhecimento.


Parabéns, que este dia seja feliz, seguido de muitos anos na companhia de teus familiares e porque não, de todos nós que formamos esta grande família.


Um abraço
Juvenal Amado

3. Mensagem do João Graça e da Joana Graça:


Pai, no dia do teu 65º aniversário (29.01.2012):



Foi contigo que aprendemos que o universo é maior que as portas de uma casa.

Foi contigo que aprendemos que através do espírito de procura podemos chegar a todo o lado, permanecendo no mesmo lugar.

E que não se viaja apenas por locais, mas também pelo tempo.

Foi contigo que aprendemos que o Marquês de Marialva gostava de fados e da Severa,

Que el Rei Dom João VI fugiu com medo para o Brasil, que sua mãe ficou louca,

Como nos mostrou Maria do Céu Guerra.


Foi contigo que aprendemos que a Guerra, a outra Guerra, é uma experiência que nenhuma geração mais deve passar,

Como passou a tua, injustamente abandonada e enxotada para África por um governo miserabilista e contabilista.

Foi contigo que aprendemos que a História é o repositório mais fidedigno das tendências humanas.

Foi contigo que aprendemos que ser professor é muito mais do que um estatuto. Ser professor é ser humilde, porque também nos ensinaste que aprendes muito com os teus alunos. Ser professor é dar tempo ao outro para aprender. Ser professor é estar ali ao lado.

Foi contigo que aprendemos que através da Arte a humanidade se transcende e se renova.

Foi contigo que aprendemos a apreciar a beleza das pequenas coisas ou a ouvir colectâneas de compositores enquanto enfiados por baixo da cama.

Foi contigo que aprendemos que a poesia é o rio mais belo que corre pela nossa aldeia, e pelas tuas veias.

Foi contigo que nos divertimos nas caças ao tesouro que organizavas em noites de lua cheia, na quinta de Candoz, quando os verões eram intermináveis e intermináveis eram os nossos medos de criança.

Foi contigo que aprendemos a sonhar e acreditar na Fada Oriana e hoje gostarmos de contar histórias, em modo de legado geracional avô-pai-filhos.

Foi contigo que aprendemos a respeitar o outro, mesmo perante a diferença. A não olhar à cor, à raça, à religião, à formação académica ou estatuto social.

Foi contigo que aprendemos a amar a HUMANIDADE.


Obrigado pai,

Dos teus filhos que te amam e que te admiram por aqui aquilo que és! Eternamente gratos!


Joana e João
 
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Nota de CV:


Vd. último poste da série de 27 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9404: Parabéns a você (373): Mário Serra Oliveira, ex-1.º Cabo Escriturário, Messe de Oficiais da FAP (Guiné, 1967/68)