terça-feira, 10 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10140: Em busca de... (196): Fur Mil Rânger Peixeiro da CCS/BART 2920 (Bafatá, 1970/72)

1. Mensagem de António Tavares (ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), com data de 5 de Julho de 2012:

Caro Vinhal,
A pedido de um camarada, ex-Furriel Mil. Rádio TRMS, no CTIGuiné, procura o contacto do ex-Fur. Mil. Ranger PEIXEIRO, homem das Operações e Informações da CCS/BArt.2920, de Bafatá, em 1970/72.

Desde já agradeço a colaboração no pedido através da Tabanca Grande.

António Tavares
Foz do Douro, 05.Julho.2012
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10122: Em busca de... (195): Informação sobre o Soldado Escriturário Carlos da CCAÇ 3476, Canjambari, Chugué, 1971/73 (Jaime Vieira)

Guiné 63/774 - P10139: Ser solidário (133): Conversas - Guiné-Bissau, dia 13 de Julho de 2012, das 21 às 23 horas, na Fundação Nortecoope em S. Mamede de Infesta - Matosinhos (José Teixeira / Tiago Teixeira)

1. Recebemos, em mensagem de hoje, do nosso camarada José Teixeira (ex-1.º Cabo Enf.º da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70), o seguinte convite, do qual damos conhecimento à tertúlia e leitores em geral:

C O N V I T E


As inscrições devem ser feitas neste endereço: https://docs.google.com/spreadsheet/viewform?formkey=dHFyTVZkbDJhRFRjYzQyS2x6aFM2ZkE6MQ#gid=0
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Julho de 2012 > Guiné 63/774 - P10112: Ser solidário (132): Fonte de água na Escola EVA de Djufunco (José Teixeira / AD)

Guiné-Bissau - P10138: Fauna & Flora (27): A cobra cuspideira (de seu nome científico Naja nigricollis Reinhardt)

 



A cobra cuspideira, aguarela do pintor português, naturalista, [António] Silva Lino (1911-1984), autor de "Serpentes do Ultramar Português". In: Garcia da Orta - Vol.III, nº 4 (1955), pp. 547-553.


1. Em complemento do poste P10135, da autoria do nosso camarada Augusto S. Santos, 9 de julho de 2012... E para exorcizar a nossa, dos primatas, em geral, e dos hominídeos, em particular, tradicional ofiofobia (medo patológico de serpentes)...

Aqui vão algumas características da cobra cuspideira (nome científico Naja nigricollis Reinhardt, 1843):

(i) Serpente muito robusta, alongada (comprimento: até 220 cm), de cauda comprida;  


(ii) podendo alargar o pescoço, em «capelo», sob a ação das costelas cervicais;

(iii) coloração geral variável: por cima negra, castanha ou olivácea e, por baixo, negra com ou sem faixas transversais amareladas ou róseas;

(iv) dentadura proteroglifodonte: dentes inoculadores sulcados, erécteis, mas não retroversáteis e situando-se na parte anterior do maxilar, sem outros dentes neste osso; 

(v) sinais da mordedura: dois pares de perfurações dilatadas, inoculadoras, ladeando duas filas de picadas, mais finas, dos dentes normais palatino-pterigóides;

(vi) a configuração do sulco dentário e a sua abertura permitem o lançamento do veneno a distância considerável;

(vii) veneno mortal, altamente neurotóxico; quando projetado e atingindo os olhos, produz ulcerações graves;

(viii) habita as regiões de savana,  de preferência às de floresta, manifestando maior atividade noturna;

(ix) é muito perigosa pela sua agressividade, a qual se manifesta, primeiro, pelo erguer da cabeça e parte anterior do corpo, com expansão do «capelo», seguido ou não de lançamento do veneno à distância de alguns metros e, depois, pela perseguição e ataque violento;


(x) reprodução por oviparidade.

(xi) alimentação: principalmente, batráquios.

(xii) distribuição geográfiva: África Intertropical, desde a Mauritânia ao Natal; encontra-se na Guiné-Bissau, em Angola e em Moçambique, donde foi descrita a var. mossambica.


Fonte: Cortesia do sítio Triplov > Serpentes do ultramar português: reprodução de aguarelas do pintor Silva Lino; anotações de Fernando Frade e Sara Manaças. "Garcia da Orta", Lisboa, vol.III, nº 4 (1955), pp. 547-553.  

Triplov é também o sítio da revista (digital) TriploV de Artes, Religiões e Ciências, dirigida por Maria Estela Guedes (n. 1947, Britiande, Lamego), que viveu na Guiné entre 1955 e 1966, poeta, escritora e ensaísta, sendo investigadora no Centro Interdisciplinar de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade de Lisboa.









Capa da separata dos Anais da Junta de Investigações Coloniais [JIC], Vol 1, Lisboa, 1946, contendo o "Relatório da missão zoológica e contribuições para o conhecimento da fauna da Guiné Portuguesa", por Fernando Frade (professor extraordinário da Faculdade de Ciências de Lisboa), com a colaboração de Amélia Bacelar (naturalista do Museu Bocage) e Bernardo Gonçalves (assistente investigador da JIC). Cortesia de Tripov > Fernando Frade > Missão zoológica da Guiné.

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Nota do editor:

Último poste da série > 6 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4786: Fauna & Flora (26): Make Love, Not War, ou as cobras que morreram na guerra a fazer amor (Rui Silva)

Guiné 63/74 - P10137: Blogoterapia (212): Veterano, nostágico ?... Sim, ai quem me dera ter outra vez vinte anos... mas saber o que sei hoje (António J. Pereira da Costa, cor art ref)

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[Imagem acima: dois coronéis ref, o pilav Miguel Pessoa, e o artilheiro António Costa. Infografia de Miguel Pessoa, a quem desejamos um rápido restabelecimento da sua saúde, depois do acidente que o levou ao hospital e à "faca"...]


1. Mensagem do nosso camarada António J. Pereira Costa, com data de 30 de junho passado, e em resposta à nossa última sondagem ("Um blogue de veteranos nostálicos da sua juventude ?"):


Assunto - Os Nostálgicos

Conheço alguns trabalhos de René Pélissier. A Biblioteca do Exército tem diversas obras suas. Identifico-me, sem dificuldade, com as ideias que expressa, especialmente no que toca aos antecedentes das “guerras de libertação” em África. Por isso resolvi responder à “sondagem”.

Creio que a minha primeira intervenção no blog versou o tema: “Quem somos nós?”. Queria “atabancar-me” bem e, por isso, considerei interessante definir o perfil do ex-combatente. Num texto de quatro páginas, procurei fazê-lo e as consequências, para mim, foram devastadoras. Felizmente, eu usava capacete…

O perfil que tracei poderá, até certo ponto, servir de contraditório à afirmação de Pélissier.

Aceito agora o desafio do Luís Graça e regresso ao tema, expondo o meu ponto de vista, depois de ter lido as considerações do historiador francês. O tempo que nos é dado e curto. Contudo, tratando-se de uma sondagem, a resposta terá de ser dada com brevidade.

Comecemos com a formação ou mentalização inicial de que fomos alvo, desde bem cedo, nos bancos das Escolas. Convém não esquecer que somos apenas o produto do meio que fomos criados, como dizia António Aleixo. Vivíamos num país desfasado dos padrões de vida europeus do tempo e cujas autoridades dificultavam o contacto com o “estrangeiro”. As diferenças que encontrávamos quando, por sorte, saíamos do país deixavam-nos admirados e invejosos.

Alimento, cada vez mais a ideia de que se tratava de um fenómeno sociológico previsível e previsto por vários visitantes (Henrique Galvão, entre outros,) e residentes naquelas terras, a quem os responsáveis não deram ouvidos e depois… As tensões entre os diferentes grupos sociais, as diferenças rácicas e as tensões acumuladas, ao longo de séculos (Ver René Pélissier) criaram as condições propícias para o sucedido. Chamo aqui a atenção para os textos antigos, que têm vindo a ser divulgados, descrevendo o Ultramar e nos quais, directa ou indirectamente, é possível descobrir as deficiências do colonialismo.

Fomos.

E sobrevivemos a dois traumas seguidos, por vezes separados por poucos dias ou horas até: o choque da chegada a uma cidade militar (e a um teatro de operações num país que, começámos a logo a perguntar se seria efectivamente nosso), e a vida diária no quartel do mato, numa localidade pequena do interior, cujos habitantes nos eram estranhos, não falavam a nossa língua e tinham hábitos e religiões de que só vagamente tínhamos ouvido falar. De que lado estariam e porquê? Perguntávamo-nos porque seria que alguns recusavam a protecção e as condições de vida que lhes dávamos e preferiam uma ligação ao “inimigo”. Mas, se todos tinham nascido e sempre vivido ali, quais seriam as razões para tal?

Amadurecíamos. Ou melhor: envelhecíamos, sem darmos por isso. O esforço diário, o trabalho de equipa, a entreajuda e as horas de incerteza mostravam-nos o lado mais genuíno da vida.

Cada vez, me restam menos dúvidas de que participámos na História do nosso país de um modo com que todos tínhamos sonhado, ao aprendermos a nossa História, nos bancos da escola, mas também nunca tínhamos pensado que pudesse acontecer.

Já defendi, numa revista militar que desde a primeira hora, a guerra estava perdida. E não saiu ninguém a contradizer-me. Tivemos de descobrir à nossa custa que era essa a realidade. Tenham em conta a grande resistência ao “ocupante” que se traduziu em continuar, ao fim de cinco séculos, a usar as línguas tradicionais e a recusar a aprendizagem do português, numa espécie de resistência passiva, que se estende a outros sectores como hábitos e, principalmente, às religiões e hábitos similares (por mais primitivos que fossem).

Mas à chegada à “Metrópole”, vinha a grande desilusão. Julgávamos ser cidadãos-patriotas ou soldados-heróis, mas não éramos mais do que um corpo estranho que lembrava aos políticos a sua incapacidade, e à sociedade um problema que ela tinha, mas que não sabia como resolver e, por isso, varria para baixo do capacho. Sentimos a frustração de não sermos ouvidos, e o desinteresse de vizinhos e conterrâneos, perante a nossa mensagem e, por fim, num fenómeno que a psicologia clínica talvez explique, tentámos esquecer o sucedido. Isso levou-nos a cumprir um período de resguardo de alguns anos durante os quais evitávamos falar “naquilo”.

Havia outras tarefas. Era necessário organizar a vida e desfrutar da luta diária, no fundo a razão de ser dos homens.

Julgo que a curiosidade de sabermos o que seria feito daqueles com quem partilhámos a nossa existência durante dois anos foi determinante. Primeiro a curiosidade, depois as saudades. Entretanto ficámos velhos. E os velhos têm mais necessidade de recordar para se sentirem gente ao contemplarem a vida. Daí aos convívios foi um passo.

Mas, afinal porque nos irmanamos à volta de uma mesa?

Porque todos temos em comum o facto de termos sido os homens que estavam na esquina errada da História. Fomos apanhados num turbilhão e não pudemos fazer nada para sair dele. Nadámos num troço de águas revoltas do rio do tempo.

Por mim não sinto nada “nostálgico” em relação à guerra ou à Guiné. Já disse num Post que, para mim a guerra, se a houve, terminou com a independência e não me sinto mais ligado àquele país do que a qualquer outro. O passado comum, que por vezes se evoca, envergonha uns e revolta os outros e não me sinto nada responsável pelo que de bom ou mau por lá se passa.

Considero, agora, que é essencial que lutemos contra o esquecimento. Não podemos deixar que nos suceda o que aconteceu a tantos outros que andaram pelas Àfricas, durante a I Guerra e especialmente nas chamadas Campanhas de Pacificação ou da Ocupação (fim do Séc. XIX – inícios do Séc. XX). A pouco e pouco vamos descobrindo “coisas”, como os sacrifícios dos nossos compatriotas e o grau de violência praticado de parte a parte. Temos de deixar a nossa assinatura na marcha do tempo.

Além disso, fizemos uma guerra pobre. Era pobre a nossa logística e os meios operacionais escassos. Os meios operacionais do inimigo evoluíam a olhos vistos e os nossos mantiveram-se perigosamente estacionários, como ultimamente temos vindo a ver. As guerras ou se perdem ou se ganham. E nós perdemos,  o que foi mais outra marca na nossa personalidade.

Como diz o Idálio [Reis]: “para quê e porquê?” Enfim, tudo terminou bem, ou menos mal, e isso foi o mais importante.

Nostalgia? Dos vinte e poucos anos? Sim! “Ai quem me dera ter outra vez vinte anos” diz o fado (*), mas saber o que sei hoje, acrescento eu. Mas da guerra e dos dois anos de sacrifícios impostos a troco de nada, não.

E o António Levezinho pergunta: “se não se deve voltar a um sítio onde se foi muito feliz, porquê voltar a um onde se foi particularmente infeliz”?

Não sou nostálgico e creio que o esquecimento é o pior que nos pode suceder, num mundo onde a ignorância é cada vez maior, embora a disponibilidade do conhecimento seja anormalmente enorme. Quero dar testemunho e evitar que aqueles 13 anos possam ser reduzidos a meia página de um compêndio de História.

Um Ab e desculpa o desenvolvimento e o atraso na resposta

António J. P. Costa (**)
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Notas do editor:

(*) O meu primeiro amor [, fado interpretado por grandes fadistas como Amália Rodrigues iou Cidália Moreira]

Letra de Nelson Barros; música de Frederico Valério (c. 1955)

Ai, quem me dera
Ter outra vez vinte anos,
Ai! como eu era,
Como te amei, Santo Deus,
Meus olhos
Pareciam dois franciscanos
A espera
Do céu que vinha dos meus.

Beijos que eu dava,
Ai! como quem morde rosas,
Ai como te esperava
Na vida que então vivi,
Podiam acabar os horizontes,
Podiam secar as fontes
Mas não vivia sem ti.

Ai! como é triste,
Eu dizer não me envergonho,
Saber que existe
Um ser tão mau e ruim
Que eras um ombro para o meu sonho,
Traíste o melhor que havia em mim.

Ai! como o tempo
Pôs neve nos teus cabelos,
Ai como o tempo
As nossas vidas desfez,
Quem me dera
Ter outra vez desenganos,
Ter outra vez vinte anos.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10136: Cartas do meu avô (12): Décima carta: a casa das Quintãs, Aveiro (J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)



Região de Tombali > Catió > 2009 > Meninos de Catió... Muitos anos depois de lá estado o J. LMendes Gomes,  há uma jovem portugesa, cooperante e membro da nossa Tabanca Grande,  Marta Ceitil, que escreve o seguinte sobre a sua estadia  a Catió, em mail de 3 de setembro de 2009:


(...) "Segunda-feira viemos para Catió. A viagem foi tranquila, tinham-nos dito que ia ser horrível que as estradas estavam más... nada disso foi mesmo 'Shanti Shanti'. Catió fica no Sul da Guiné e é lindo, lindo. Aqui sim, sinto e vejo a Guiné que idealizei: paisagem verde, que contraste com o castanho das tabankas. Aqui as pessoas são bem mais calmas, parecem alentejanos. Estamos muito bem instaladas, na Missão Católica. O Padre Maurício (italiano) é uma personagem, muito bem disposto, tem 60 anos, e tirando o meu pai, é dos homens mais charmosos que alguma vez vi na vida (...). , Para além do seu aspecto físico faz umas massas óptimas. Está na Guine desde 1973 e é um espectáculo ouvir as suas histórias. A missa também é qualquer coisa…, primeiro é dada em crioulo e depois a música é tocada com djambés. Segunda-feira começamos a dar a formação aos professores. Este vai ser o nosso maior desafio, mas acredito que vamos dar conta do recado" (...)


Foto: Marta Ceitil (2009)




A. Continuação da publicação da série Cartas do meu avô, da autoria de J.L. Mendes Gomes,  membro do nosso blogue, jurista, reformado da Caixa Geral de Depósitos, ex-Alf Mil da CART 728, que esteve na região de Tombali (Cachil e Catió) e em Bissau, nos anos de 1964/66. [, Foto à direita, com os netos].

As cartas, num total de 13, foram escritas em Berlim, onde vivem os netos, entre 5 de março e 5 de abril de 2012. (*)



B. DÉCIMA CARTA > A casa das Quintãs


>O apartamento de Azurva, embora razoável, era reduzido para a família. Tínhamos três filhos e queríamos ter outro. Sem perder tempo.


Naquele tempo, o custo das casas subia a olhos vistos. Se pensávamos em mudar de casa deveria ser depressa.Punha-se então, um problema. A casa de Azurva continuava sujeita às condições fixadas pela CGA, no primeiro empréstimo. Por mais dois anos, não poderíamos aliená-la livremente.


Comecei a lutar com a tentação de descobrir a forma como poderia dar-lhe a volta, sem ter problemas. Não tinha muitas pessoas com quem me pudesse abrir. Até que ponto a letra daquele contrato,  forjado nos míopes e opressivos tempos salazarentos, sem qualquer justificação actual, consistente e razoável, ainda era tida em conta pela CGA?


À letra, estaria a violar o contrato, se vendesse secretamente e ficasse com o lucro. Obrigar-me a aplicar o lucro na compra de outra habitação, necessária, ainda se justificaria. Perdê-lo em favor da CGA, isso não. Ora eu, como jurista responsável, não podia recalcitrar. Poderia pôr em jogo o meu posto de trabalho, se o fizesse.


Um dia, enchi-me de coragem e liguei para a única pessoa que conheci na CGA, com olhos arejados e que me pareceu homem de confiança. Era um segundo director, que tinha vindo do Banco de Angola,  como retornado.Estava na direcção já havia uns anos. Sabia bem como as coisas funcionavam.




Expus-lhe a questão claramente. Eu não pretendia fazer negócio com o caso. Queria apenas mudar depressa para uma moradia, a nosso gosto. Que desse para a família toda, actual e vindoura. Ele foi claro.
- Ó Mendes Gomes, esteja à vontade. Ninguém vai sobre si. Garanto. Não será o primeiro.


Mesmo assim, tive dúvidas. Era muito arriscado. Pensei noutra saída. Um novo filho vinha já a caminho. Um rapaz. Nasceria em Dezembro de 1980.

Entretanto, calhou que o irmão da nossa mulher a dias , acabava de regressar, de vez, do Brasil, devido à grande insegurança que lá se sentia. Estava farto de ser assaltado, de dia e às claras. Precisava de arranjar uma casa. A irmã, porque sabia, falou-lhe que talvez nós a vendêssemos. Que havia uns problemas mas tudo se poderia resolver.

Ele veio falar-me. Estava disposto a comprá-la , pagando tudo a pronto, se eu quisesse.
- Mas, podemos escrever um papel, o sr. É advogado- sabe bem como. O que eu quero é seriedade. Que não me falhe…Também lhe digo já: seria capaz de lhe dar um tiro na cabeça se faltasse à sua palavra…disse-mo ele naquele jeito próprio dum brasileiro que vinha lá do Rio de Janeiro, onde era pior que viver na selva.

Fiquei a pensar. Com um contrato promessa de compra e venda, poderia satisfazer as condições básicas, sem ofender o contrato. A venda real só se efectuaria daí a dois anos. Até lá, pagar-me-ia por mês uma importância igual à que eu tinha de pagar à CGA e esta importância abateria ao preço fixado.

Todo eu tremia de pavor quando, um dia, assinamos o contrato. Terei envelhecido uns bons anos naqueles dois que se seguiram, apareceram-me os primeiros e imensos cabelos brancos nas barbas e na cabeça, passei muitas horas da noite, em claro, sempre à espera de ser chamado à responsabilidade. Sempre à espera do pior. Que houvesse uma denúncia. Principalmente, quando a Filial era visitada pela inspecção.

Ainda hoje estou para saber se a CGA na sede, teve conhecimento. Penso que sim. Haveria gente na filial bem capaz de me denunciar…e se ufanar com a minha demissão.

Fosse pelo que fosse, nunca ninguém pediu contas. A situação objectiva justificava-a bem. E, não havia ninguém que fosse capaz de me acusar de corrupção, por um único centavo ou minúsculo favor remunerado. Enquanto toda a gente sabia de muitos que o faziam… às claras.

Dum momento para o outro, apareceram carros de luxo, pagos a pronto, não se como…em quem, notoriamente, não ganhava para tanto.
A casa das Quintãs era uma moradia nova, geminada, com quatro quartos, garagem e um bom quintal.  Ficava no meio rural. Rua do Sol  [,Vd. Google > Maps]  era o nome da rua onde ficava.

Certo, na escolha. Ali, os miúdos puderam conviver com outro mundo. Seguiram, sem dar conta às sucessivas tarefas de quem tem de tirar da terra o pão para comer. Desde o lavrar dos campos com tractor, ao pestilento adubar da terra à moda antiga, ao esverdear das searas de milho e ao seu amadurecimento. As carradas de bois, a esbordar de erva ou feno para o gado, o gado a pastar, o leite quentinho a sair das tetas das vacas da vizinha, ao pequeno almoço e a manteiga que dele se tirava... O corropio nas bicicletas à solta pelas veredas, os papagaios multicores, em plástico a voar ao vento...

Enfim um sem número de novas vivências que nunca mais esqueceram. Nela podia receber a visita dos avós, sempre que o quisessem, com muita felicidade para todos nós e p’ra eles.

Ali abri o meu escritório de advogado. Fui procurado por muitas pessoas.Alarguei assim e pus em prática outras vertentes do meu curso. Com proveito material e
imaterial. Os filhos cresceram. Entraram nas universidades e foram à sua vida. J.L.

J. L. Mendes Gomes
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Ponte de Lima > 8º Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima > Jardins de Comer 7 de junho de 2012 > Algumas fotos... para se repensar os conceitos de cidade, campo, jardim... e um convite para visitar. Até outubro de 2012. "Há quem veja a árvore / e nunca descortine a floresta; há quem veja a flor / e nunca descubra o jardim" (LG)...

Fotos: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados.

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Guiné 63/74 - P10135: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (3): A cobra cuspideira

1. Terceira e última história enviada pelo nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), em mensagem no dia 30 de Junho de 2012.


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL (3)

A COBRA CUSPIDEIRA

Embora o maioria do pessoal da minha Companhia fosse constituída por Soldados do norte do país, nomeadamente de Trás-os-Montes, portanto por pessoas habituadas a trabalhar no campo e a lidar com os mais variados animais, ou seja, sem qualquer medo de bichos, sempre havia um outro que, pelos mais diversos motivos, não podia ouvir falar em cobras.

Foi uma dessas situações que levou a que se inventasse que já se havia visto perto do quartel cobras cuspideiras, bicho terrível que poderia cegar uma pessoa, ao cuspir o seu veneno para os olhos. Era uma realidade, no entanto ainda hoje desconheço se existem ou não cobras cuspideiras na Guiné, não tendo isto na altura passado de uma mera invenção para assustar um dos Soldados, que tinha um terrível pavor que tal lhe viesse a acontecer.

Mal ouvia o rastejar de um rato ou de um lagarto em cima da chapa que cobria o abrigo, aí estava ele em alerta total. Lembro-me que a esses lagartos chamávamos de “paga dez”, por estarem sempre a fazer o que pareciam flexões. Para em definitivo (ou não) se tentar acabar com aquela fobia, alguém um dia se colocou no lado de fora numa das vigias do abrigo imitando o rastejar e o silvo de uma cobra, para atrair o coitado do Soldado, que estava na sua hora de descanso.
Para completar a situação, outro entrou no abrigo a gritar que lá fora estava uma enorme cobra. Tendo aquele espreitado pela vigia para ver se via algo, é-lhe despejado um valente bocheco de água nos olhos.

Escusado será dizer que o infeliz deitou a correr para o meio da parada, com alguns trambolhões pelo meio, pois tentava tapar os olhos com as mãos, gritando:
- Estou cego, estou cego, estou cego.

Destas coisas sim, tenho saudades.

Augusto Silva Santos

Jolmete, Agosto de 1972 > Estrada velha de Bula

Jolmete, Agosto de 1972 > Regresso da segurança à água

Jolmete, Outubro de 1972 > Convívio

Jolmete, Novembro de 1972 > Bolanha de Ponta de S. Vicente
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10127: Estórias dos Fidalgos de Jol (2) (Augusto S. Santos): A noite da hiena

Guiné 63/74 - P10134: Notas de leitura (378): O Meu Diário, Guiné - 1964/1966, CCAÇ 674, de Inácio Maria Góis (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 21 de Maio de 2012:

Queridos amigos,
Foi graças ao confrade Carlos Pedreño Ferreira que tive acesso a este documento singularíssimo a vários títulos.
O soldado Inácio Maria Góis, da CCAÇ 674 ultrapassa, de longe, tudo quanto até agora conhecemos como diários: desvela a intimidade, temos acesso aos seus pensamentos, há momentos em que parece que ele está a escrever para a História, reiteradamente comunica ao leitor que tudo quanto escreve é com base em factos reais e verídicos, regista os seus amigos, fala permanentemente da péssima comida e ficamos com uma ideia de como evoluía a guerra naquela região onde ele passou grande parte da comissão, Fajonquito. É impressionante como desvela a alma e como se determinou a publicar na íntegra tudo o que escreveu.

Um abraço do
Mário


O diário do soldado Inácio Maria Góis (1)

Beja Santos

É um documento impressionante, pela indiscutível sinceridade e singeleza. Arranca assim: “Eu, Inácio Maria Góis, filho de Luís Justo Pereira de Góis e de Bárbara Antónia, natural dos Gasparões, concelho de Ferreira do Alentejo. No dia 2 de Agosto de 1962, fui alistado com toda a prontidão para cumprir o serviço militar obrigatório. Em pleno mês de Setembro de 1963, encontrava-me eu trabalhar na vila da Batalha, onde exercia a profissão de operador de máquinas de terraplanagens”. Tinha que se apresentar no RI 3, em Beja, em 20 de Outubro. Despediu-se dos colegas de trabalho e embarcou para Porto Covo para se despedir do pai e da namorada. Vão seguir-se 400 páginas do relato mais minucioso que até hoje me foi dado ler quer como diário ou relato memorialístico. “O Meu Diário, Guiné – 1964/1966 - CCAÇ 674”, por Inácio Maria Góis (edição de autor, 2006) foi-me amavelmente emprestado pelo nosso confrade Carlos Pedreño Ferreira. O autor agradece o apoio da Junta de Freguesia de Porto Covo, onde três funcionários dedicadamente transcreveram na íntegra os textos escritos.

Inácio Góis entra no quartel de Beja, descreve os pormenores da instrução e da preparação e depois regressa a Porto Covo para visitar quem ama. Revela-se em toda a sua intimidade: “Desci do autocarro, peguei na minha mala e caminhei em direção à casa do meu pai, bati à porta, veio a minha madrasta, que me lançou um olhar de arrepiar, ela não gosta de mim, nunca gostou. Eu nunca lhe faltei ao respeito, apenas lhe disse que venho visitar os meus irmãos e o meu pai, é ela que manda, põe e dispõe à sua maneira, é mais nova que o meu pai 10 anos. Tudo quanto ganhei até entrar para o serviço militar o meu pai se aproveitou da minha inocência e eu acreditei na boa-fé do meu pai, que afinal traiu o próprio filho e praticamente o abandonou, dizem que há Deus e eu tenho que acreditar. Vim também para ver a minha namorada, de quem gosto muito e me dá carinho e algum alento”.

Descreve a faxina à cozinha e deixa-nos o estômago revoltado: “O feijão é retirado de dentro dos sacos, não é lavado nem limpo, leva alguns quilos de sódio para ser cozido mais rápido. As couves são cortadas ao meio e não são lavadas, atiram-nas assim para dentro das panelas, apenas as batatas são lavadas. É por isso que aparecem nos nossos pratos lesmas e lagartas”. Olhando para os seus próximos, comenta em Novembro: “Aqui nos encontramos aproximadamente mil jovens a tirar a recruta. As suas idades variam entre os 21 e os 22 anos. Na sua maioria são do Alentejo e Algarve e os restantes vêm do Ribatejo, Norte e Lisboa”. Conta detalhadamente toda a instrução, incluindo as idas ao campo. Em meados de Dezembro vai visitar em Gasparães a mãe e as irmãs. Segue-se o juramento de bandeira e o fim da recruta. Passa o Natal em Porto Covo. Nesse dia escreve: “Eu e a as minhas duas irmãs e a minha mãe não convivemos junto há já alguns anos, o destino assim o quis. Durante o meu percurso de criança não soube o que foi o verdadeiro carinho e amor de mãe. O Natal para os mais pobres é apenas um dia ao qual se chama Natal”.

E de Beja segue para Évora. É aqui que se está a formar a CCAÇ 674. Conhece o comandante da companhia, “tem 27 anos de idade, é baixo, usa óculos graduados e escuros, é natural da Mexilhoeira Grande”, apresenta todos os aspirantes e cabos milicianos. Segue-se a instrução militar e em 27 de Fevereiro de 1964 veio-lhe à memória um encontro com uma madre superior. Trabalhava ali na companhia do pai, em terraplanagem para o novo colégio das irmãs Doroteias. A madre superior fez questão de colocar uma imagem de Nossa Senhora de Fátima na capota da máquina e veio dizer a pai e filho que deviam ir à missa, Inácio Góis nunca esqueceu este episódio. A CCAÇ 674 segue para Faro, seguem-se exercícios militares de diferente índole, recebem fardamentos novos e no dia 1 de Maio ficam a saber que estão mobilizados para a Guiné. Volta a Porto Covo para se despedir de quem mais gosta, com detalhes inenarráveis, por vezes especiosos e miudinhos, ficamos a saber como vai e volta, com quem conversa, onde toma refeições, etc. E de Faro viajam para o embarque no Uíge, há muita tristeza e lágrimas nas estações por onde passa o comboio, Inácio Góis regista que nem o pai se veio despedir: “O navio apitou por três vezes e eu estremeci e não consegui deter as lágrimas. Os gritos, os lenços que nos acenavam eram aos milhares”. Tiradas as amarras, dois rebocadores levam o Uíge para a foz do Tejo. Viaja intranquilo, interroga-se sobre o que está a fazer ali, ninguém lhe explicou até agora em que guerra é que vai participar. Desembarcam em 13 de Maio.

Não esquece as indelicadezas, estavam a montar um aquartelamento improvisado num armazém junto ao Geba, encontrava-se ali a CCAÇ 675, ele dirigiu-se à cozinha desta companhia e o cozinheiro Vilhena recusou a dar-lhe comida e ele disse: “Eu sou da tua terra, negas-me uma marmita de comida, obrigado". Registou o número mecanográfico e o seu nome completo. Procura amigos em Bissau, visita o destacamento de fuzileiros e depois parte em rumo a Bambadinca e daqui para Fá. Há momentos em que o leitor tem a nítida sensação de que este relato é sonido como uma crónica: “A CCAÇ 674, à qual eu pertenço, tem no ativo 195 militares, o que inclui 2 sargentos, 17 furriéis, 4 alferes milicianos, um alferes miliciano que é médico, um furriel enfermeiro e um capitão que é do quadro”. Passam a noite de 30 de Junho em Bambadinca e no dia seguinte vão para Fá: “Verifiquei que havia apenas 3 casas e um pequeno fontanário com água potável e um gerador elétrico. Junto às habitações há um pequeno vale onde corre alguma água, e se encontra cultivado desde bananeiras, ananases, tomates, pimentos, feijão-verde e outros. Notei que este lugar é silencioso, apenas se ouvem as aves cantar”.

A 4 de Julho põem-se ao caminho, vão para Fajonquito. Descreve a povoação e dá as suas impressões: “As casas que existem nesta povoação são muito poucas, apenas seis e uma escola que se encontra fechada. As casas que se encontram vazias foram ocupadas pelos militares, os seus proprietários saíram devido à guerra”. Começam os patrulhamentos e as idas a Bafatá, ele descreve ao mínimo detalhe o funcionamento do aquartelamento, o seu primeiro ataque de paludismo, a primeira emboscada ocorre em 21 de Julho, tinham ido num patrulhamento até uma serração abandonada. Num queixume que jamais abrandará queixa-se da qualidade da comida e observa que os sargentos e os oficiais têm uma alimentação muito superior, começam as queixas do comandante de companhia pela sua brutalidade, ele escreve que o capitão esbofeteia e humilha sem dó nem piedade. E o diário começa a registar uma expressão que nunca mais se apagará: “Vivo numa terra de ninguém”. Ele faz parte do primeiro pelotão, os patrulhamentos dilatam-se, em Agosto vão até Cambáju, estão nas proximidades de Sitató, emboscam com resultados: “Por volta das 11.30 da manhã, passou pela minha frente um homem numa bicicleta, foi feito prisioneiro e depois mandando embora”. Mais à frente emboscam, também sem resultado. Fala do capelão, das milícias, das abatises que é preciso remover das estradas e depois descreve o primeiro ataque a Fajonquito.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10125: Notas de leitura (377): Massacres em África, de Felícia Cabrita (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P10133: (De) caras (12): Foi com um arrepio que voltei ao Xime e a Mansambo, ao ver o vídeo sobre o quotidiano da Cart 2339 (António Vaz, ex-cap mil, CART 1746, Bissorã e Xime, 1967/69)

1. Mensagem do nosso camarada e amigo António Vaz, ex- cap mil da CART 1746 (Bissorã e Xime, 1967/69), com data de ontem, com um comentário sobre o vídeo, excecional, de 50 minutos (, editado em duas partes), que publicámos sobre a vida e a obra dos Viriatos, o pessoal da CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo), vídeo esse  que terá passado despercebido a muitos dos nossos camaradas que conheceram a região, e/ou que foram contemporâneos dos acontecimentos:


Data: 8 de Julho de 2012 17:59

Assunto: Imagens da Cart 2339

Camaradas da Cart 2339:

Foi com um arrepio que vi as imagens do vosso e nosso quotidiano no sector L1 da Guiné onde andei com a CArt 1746 do Xime. Operações de desmatação fizemos duas ou três,  sendo uma delas a Cabeça Rapada; fui a Mansambo mais que uma vez, comandei a 2339,  se não me engano 2 vezes,  por impedimento do vosso Capitão (Soares ?) e recordo que vocês eram Malta Porreira.

Revi e revivi as picadas, a intensa chuva, os tornadinhos, as bajudas, tudo.

Um grande agradecimento e um enorme elogio pelo que me foi dado ver e pelo cuidado posto na edição das imagens que não foi de certeza tarefa fácil.

Não há nada como a TROPA MACACA que nós fomos.

Abração do António Vaz
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Guiné 63/74 - P10132: Parabéns a você (447): Adriano Moreira, ex-Fur Mil Enf.º da CART 2412; Arménio Estorninho, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAÇ 2381 e Joaquim Peixoto, ex-Fur Mil da CCAÇ 3414

Para aceder aos postes dos nossos camaradas Adriano Moreira, Arménio Estorninho e Joaquim Peixoto, clicar nos seus nomes.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de Guiné 63/74 - P10129: Parabéns a você (443): José Zeferino, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

domingo, 8 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10131: O Nosso Livro de Visitas (142): Rodrigo Moura, de Leça do Balio, Matosinhos, ex-sold radiotelegrafista, CART 2440 / BART 2857, Piche, 1968/70... Já voltou a Bissau, desde 2000, cerca de 20 vezes...

1. Telefonou-me há dias o Rodrigo Moura. Telefonou-me do Porto. Mas mora em Leça do Balio, Matosinhos. Está, profissionalmente, ligado ao comércio automóvel. Pelo que eu percebi, a empresa representa entre outras a marca BMW. Por esse motivo tem alguns clientes em Bissau, onde vai com frequência. Desde 2000,  já lá terá ido umas 20 vezes. Costuma ficar na Residencial Coimbra. Ou no hotel onde dantes era o nosso QG, Quartel General. Conhece o Xico Allen e o António Camilo. Mas não conhece o Patrício Ribeiro nem o Pepito. 


Foi nosso camarada de armas. Era soldado radiotelegarfista da CART 2440 / BART 2857 (Piche, 1968/70). Já visitou Piche, mais do que uma vez.

Falei-lhe na Tabanca de Matosinhos e no almoço-convívio das 4ªs feiras. Ficou com curiosidade em passar por lá um dia destes. Já alguém lhe tinha falado. Também o convidei a integrar a nossa Tabanca Grande, sugestão bem acolhida.

2. Nota do nosso camarada e colaborador permanente José Martins sobre a CART 2440

(...) "Seguiu em 22 de Novembro de 1968 para Piche, a fim de render a Companhia de Caçadores nº 2403, assumindo, em 1 de Dezembro de 1968, a responsabilidade do respectivo subsector, ficando integrada no dispositivo de manobra do seu batalhão [, o BART 2857]

"A partir de 6 de Julho de 1969, destacou um pelotão para a ponte do rio Caium e desde finais de Janeiro de 1970, outro pelotão para segurança e protecção dos trabalhos de construção e reordenamento de Cambor. 


"Em 12 de Agosto de 1970, foi rendida no subsector pela Companhia de Cavalaria nº 2749 e enquanto dois pelotões seguiram desde logo para Bissau e Bolama, deslocou-se para Nova Lamego a fim de reforçar temporariamente o Batalhão de Caçadores 2893, até 20 de Setembro de 1970, e após o que recolheu igualmente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

"Observações – Tem história da unidade, que pode ser consultada, no Arquivo Histórico Militar (caixa nº 119- 2ª Divisão – 4ª Secção).

"Texto retirado do 7º Volume – Fichas das Unidades – Tomo II - GUINÉ - da Resenha Histórico Militar das Campanhas de África, edição do Estado Maior do Exército." (...).



Sobre o BART 2857, vd. também o respetivo blogue


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Guiné 63/74 – P10130: Convívios (458): VIII Encontro da CART 1742, realizado no dia 26 de Maio de 2012 em Fafe (Abel Santos)




1. O nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742, Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69) fez chegar ao nosso blogue a reportagem do VIII Encontro da sua Unidade, ocorrido no passado dia 26 de Maio na bonita cidade minhota de Fafe.


 VIII ENCONTRO DO PESSOAL DA CART 1742

FAFE - DIA 26 DE MAIO DE 2012

Conforme o estabelecido no programa, os camaradas concentraram-se às 10 horas da manhã na Praça 25 de Abril, junto ao Monumento aos Mortos da Grande Guerra
 
Os primeiros reencontros

As nossas mulheres sempre presentes

Miranda - o Polícia, Abel e Soares

Abel, Mendes e Alves

Lopes - o Pastilhas, Abel e "Pintinho"

Pelas 11 horas foi celebrada Missa na Igreja Matriz de Fafe em sufrágio de todos os camaradas falecidos

Pelas 12 horas procedeu-se à deposição de uma coroa de flores no Monumento aos Mortos do Ultramar

Pelas 13 horas segui-se o Almoço/Convívio na Quinta do Penedo em Arões - S. Romão

Bolo comemorativo do VII Encontro

A difícil tarefa de partir o bolo para ser distribuído pelos presentes

A foto de família para memória futura

No final do Encontro foram distribuídos aos ex-combatentes os certificados de presença no VIII Encontro da CART 1742. 
A cada uma das senhoras foi oferecida uma rosa.
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Notas de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Junho de 2012 > Guiné 63/74 – P10081: Convívios (457): 5º Encontro da 1ª CART da BART 6520, Penafiel, 21 de Abril de 2012 (Manuel Sousa)

Guiné 63/74 - P10129: Parabéns a você (446): José Zeferino, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10106: Parabéns a você (442): António Nobre, ex-Fur Mil da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861 (Guiné, 1969/70)

sábado, 7 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10128: Vídeos da guerra (10): Vida e obra dos Viriatos - CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69) (Parte II) (Henrique Cardoso)


Vídeo (15' 03''): Henrique Cardoso. Alojado no You Tube > Nhabijoes


II parte do vídeo do ex-Alf Mil Henrique J.F. Cardoso sobre a história da CART 2339 (Fá Mandinga e Massambo, 1968/69) (*).

Cópia gentilmente cedida pelo seu/nosso camarada ex-Alf Mil Torcato Mendonça ou Carlos Marques dos Santos (um deles, já não posso precisar), para ser divulgado através do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. No total (partes I e II), o vídeo sobre a CART 2339 (1968/69) tem cerca de 50 m. Realização, digitalização e insonorização do Henrique J. F. Cardoso (Senhora da Hora, Matosinhos).

Esta subunidade esteve na zona leste da Guiné, setor L1 (Bambadinca), ao tempo do BCAÇ 2852 (1968/70) e da CCAÇ 12 (1969/71), subunidade de intervenção ao serviço daquele batalhão. Os Viriatos, nome de guerra desta subnidade de quadrícula, construiram de raíz o aquartelamento de Mansambo, entre Bambadinca e o Xitole. Participaram em grandes operações como a Lança Afiada (Março de 1969):

Sinopse da parte II:

(i) patrulhamento ofensivo e regresso ao quartel,

(ii) o Gr Comb do alf mil Cardoso vai reforçar Candamã, um das últimas tabanca fulas do regulado do Corubal, juntamente com Afiá [, possivelmente em junho de 1969];

(iii) construção do sistema de autodefesa da tabanca (arame farpado, abrigos, treino da população...)

(iv) a vida quotidiana da tropa em Candamã;

(v) uma chuva tropical (estamos em plena época das chuvas, em 1969);

(vi) coluna a Bambadinca,  com picagem do itinerário dentro do subsetor de Mansambo; (vi) regresso a casa, por avião, do alf mil Cardoso;

(vii) regresso do restante pessoal da CART 2339, por barco, no T/T Uíge.




Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Subsetor de Mansambo > Mansambo (sede da CART 2339, 1968/69) e Candamã, tabanca fula em autodefesa do regulado do Corubal > Carta do Xime (1961) > Escala 1/50 mil. Pormenor > A distância em linha reta entre Mansambo e Candamã era de 10 km... pela picada seria 15 km.

Sabemos, pela história do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), que em junho de 1969, a CART 2339 (Mansambo) tem, um Gr Com destacado na Ponte do Rio Udunduma, e outro Gr Comb em Candamã (com uma secção em Afiã); em julho, continua a ter um Gr Comb em Candamã, e outro em Galomaro (reforço do COP 7) (, neste caso, sabemos que é o ; em agosto, idem... Não sei exatamente em que data é o Torcato Mendonça deve ter ido para Candamã. Pode ter sido em junho, agosto ou até setembro...(Vd. aqui as fotos falantes de Candamã, aliás as melhores que temos, em toda a Web, sobre Candamã... faça-se o teste: Pesquisar > Google > Images > Candamã...).

Na história da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71), e relativamente à atividade do mês de agosto de 1969, pode ler-se:

(...) Candamã, tabanca fula em autodefesa do regulado do Corubal, é atacada durante mais de duas horas até ao amanhecer do 30 de Julho. Esse brutal ataque (o PAIGC utilizou um bigrupo e armamento pesado) surgiu na sequência do recrudescimento da actividade IN no tradicional triângulo Xime-Bambadinca-Xitole, após a Op Lança Afiada. (...)

Foi um mês "quente", o de julho de 1969, no setor L1, o mês em que a CCAÇ 12 teve o seu batismo de fogo... Confirmei na história do BCAÇ 2852 (1968/70), Cap. II, pag. 90, bem como na História da Minha Unidade, a CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71).

As coisas andavam bravas lá para aqueles lados (vd. carta de Duas Fontes ou Bangácia, nome do sede do posto administrativo que, com a guerra, terá perdido importância, em detrimento de Galomaro):

Na madrugada de 30 de Julho de 1969, eu estava em , ainda as armas dos defensores da tabanca fumegavam... (só registo a actividade da guerrilha que, haveríamos de saber mais tarde, era comandada pelo Mamadu Indjai, na zona de acção da tua CART 2339, Mansambo):

(i) No dia 1 de Julho, às 20h00, um Grupo IN , estimado em 30 elementos, flagelou à distância o destacamento de Dulombi [, a sudeste de Galomaro / Duas Fontes]... durante duas horas (!). Os camaradas do PAIGC utilizaram Mort 60, LGFog , Metralhadoras Ligeiras e armas automáticas. Causaram 1 morto e 7 feridos, todos civis. Retiraram na direcção Norte...

(2) Em 10, um outro grupo IN (não se sabe quantos) emboscaram um grupo de 4 civis de Dulombi, a partir de uma árvore, em Paiai Numba [, a sul de Padada, vd. carta da Padada]. Só dois dos civis consequiram regressar a Dulombi, para contar o sucedido...

(3) Quatro dias depois, a 14, por volta das 16h05, um bigrupo (cerca de 60 elementos) - que presumivelmente se dirigia a Dulombi - reagiu a uma emboscada nossa em (PADADA 2E4), com Mort 60, LGFog e armas automáticas durante cerca de 35 minutos... Antes de retirar para Sudoeste, o IN causa às NT 1 morto, 2 feridos graves (1 civil), 3 feridos ligeiros, além de danos materiais num rádio CHP (de mal o menos)...

(4) No dia seguinte, às 20h00, um grupo IN (estimado em cerca de 40 elementos) atacou as tabancas de Cansamba e Madina Alage, durante 60 minutos, com Mort 60, LFog e armas automáticas mas, desta vez, felizmente, sem consequências... O IN retirou na direcção da tabanca de Samba Arabe, levando consigo um elemento da população...

(5) A 20, pelas 20h00, tocou de novo a vez a Cansamba, flagelada por um grupo de 30 guerrilheiros, durante 20 minutos, sem consequências... Retirou na mesma direcção (Samba Arabe)...

(6) A 24, às 00h45, é atacado o destacamento de Dulombi, da direcção SSW. O IN, estimado, em 60 elementos, utiliza LGFog e armas automáticas.

(7) Nesse mesmo dia, às 17h20, o aquartelamento de Mansambo é flagelado, a grande distância, com Mort 82, a partir da direcção sudoeste. Sem consequências. Na outra ponta do Sector L1, o Xime é flagelado, às 19h45 por canhão s/r.

(8) Meia hora depois, a sul de Madina Xaquili, a cerca de 1 Km, um grupo IN não estimado reagiu a forças da CCAÇ 2445, causando 6 feridos ligeiros, entre os quais 2 milícias. Simultaneamente, este destacamento é flagelado à distância, com Mort 60 e LGFog. Há apenas danos numa viatura GMC. O IN retira na direcção de Padada. Três Grupos de Combate da CCAÇ 12 (na altura, ainda CCAÇ 2590) tiveram aqui, nesse dia, o seu baptismo de fogo... em farda nº 3 (!).

(9) No dia seguinte, à 1h20, é atacado o destacamento de Quirafo, durante 3 horas (!), por um grupo estimado em mais de 100 elementos, que utilizam 3 Canhões s/r, 3 Mort 82, vários Mort 60, RPG 2 e 7, Metr Lig e outras armas automáticas... Felizmente, há apenas 1 ferido, mas as instalações do destacamento ficam praticamente destruídas, bem como os rádios DHS e AN/RC-9 e quatro G-3... O arame farpado fora cortado em vários pontos...

(10) A 26, há uma nova flagelação do Xime, às 17h45, da direcção Sul. Com Canhão s/r e Mort 82. Durante 10 minutos. No Xime está a CART 2520, com menos dois pelotões (um destacado em Galomaro e outro - duas secçõas - na Ponte do Rio Udunduma).

(11) No dia seguinte, 27, às 16h50, Mansambo volta a ser flagelado, à distância, durante 10 minutos, com Mort 82. Sem consequências.

(12) Em 28, por volta das 22h30, o dcstacamento de Madina Xaquili vai conhecer o inferno: durante 1 hora e meia, é atacado de todas as direcções, por um grupo de cerca de 60 elementos, com Mort 82, Mort 60, LGFog e armas automáticas. Há dois feridos.

(13) A 29, às 10 da manhã, um grupo IN reagiu, durante 10 minutos, a um patrulha nossa, a 200 metros a SW de Dulombi, que acabava de sair na sequência do rebentamento de uma mina A/C. O IN, que utilizou Mort 60, LGFog e armas automáticas, causou 2 feridos civis.

(14) A 30, às 18h00, Mansambo sofre nova flagelação à distância, da direcção SW. Durante 20 minutos. Com Canhão s/r e Mort 82. Sem consequências.

(15) A fechar o mês (quente) de Setembro, é a vez da tabanca em audodefesa de Candamã [, já no limite leste da ZA da unidade de quadrícula de Mansambo, ] conhecer o inferno: a 30, às 3h40, um numeroso grupo IN (80 a 100 elementos) ataca a tabanca, até de madrugada, durante 2 horas e 20 minutos, utilizando 2 Canhões s/r, Mort 82, 3 Mort 60, LGFog, Metralhadora Pesada, Pistolas-Metralhadoras e Granadas de Mão Defensivas, causando um 1 ferido grave e 4 feridos feridos às NT e 2 mortos, 3 feridos graves e vários ligeiros à população civil... Valeu o comportamento heróico dos homens de Mansambo - menos de um pelotão (uma secção estava em Afiá)!... Homens que eu conheci e abracei, nessa mesma madrugada, quando a aldeia ainda fumegava, na sequência de incêndio de várias tabancas!
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Nota do editor:

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10127: Estórias dos Fidalgos de Jol (2) (Augusto S. Santos): A noite da hiena

1. Segunda história enviada pelo nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), em mensagem no dia 30 de Junho de 2012.


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL (2)

A NOITE DA HIENA

Havia rumores (através da população) de que poderia estar para breve um possível ataque ao nosso quartel, daí que se acentuasse a nossa vigilância nocturna e se redobrassem alguns cuidados.

Foi numa dessas noites longas que, após ter saído da messe, e me ter dirigido para o meu abrigo, ainda com as calças na mão e já de chinelos prontinho para me deitar, somos todos surpreendidos por uma curta rajada, com todo o pessoal de G3 em punho, em trajos menores e com algumas quedas pelo meio, a correr para a vala.

Rápida foi notícia de que alguém que tentava ultrapassar o arame farpado, havia sido abatido.

Passaram no entanto alguns minutos (que mais pareceram uma eternidade à espera de um possível ripostar por parte do inimigo) sem que felizmente nada se registasse. Organizado todo o esquema para se verificar o que efectivamente tinha dado origem aos tiros, lá se chegou à conclusão que o inimigo não era mais do que uma hiena que, por motivos óbvios, se havia aproximado em demasia do curral das vacas, e que tinha sido abatida por uma das sentinelas.

Não passou de um valente susto, aquela que ficou conhecida como a noite da hiena.

Augusto Silva Santos


Foto 6 > Jolmete, Junho de 1972 > Chegada de mais uma operação

Foto 7 > Jolmete, Junho de 1972 > Entrada da Messe

Foto 8 > Jolmete, Junho de 1972 > Entrada do Quartel

Foto 9> Jolmete, Agosto de 1972 > Convívio


Foto 10 > Jolmete, Agosto de 1972 > Estrada de Gel
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10113: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (1): Mandem a Marinha

Guiné 63/74 - P10126: Patronos e Padroeiros (José Martins) (33): S. Cristóvão - Patrono dos Condutores




1. Em mensagem do dia 30 de Junho de 2012, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), enviou-nos mais um trabalho para a série Patronos e Padroeiros.






Patronos e Padroeiros XXXIII

 Patrono dos Condutores

São Cristóvão – Baixo-relevo existente nas escadinhas com o nome do santo, em Lisboa
© Foto José Martins (29/11/2012)


São Cristóvão

Sendo um santo venerado pela Igreja Católica, Igreja Ortodoxa Oriental e Ocidental, e das Igrejas Anglicana e Luterana, nada ou pouco se sabe acerca da sua vida. Além de santo muito popular, está ligado a quem viaja, nomeadamente a quem desenvolve a sua actividade profissional na estrada. Mesmo os que não são “crentes”, profissionais ou amadores, dedicam-lhe na sua viatura um local, mesmo que recôndito, para transportar uma medalha, invocando a sua protecção.

O seu culto foi reconhecido tardiamente, cerca de 1550, e o seu dia é celebrado a 9 de Março nas igrejas orientais e a 25 de Julho nas igrejas ocidentais, em conjunto com outros Santos Mártires.

Conta a história, ou lenda, que a um rei pagão, cujo reino se situava na zona arábica e cuja esposa devido a sua devoção e oração à Virgem Maria, os abençoou com o nascimento de um filho, a quem baptizaram com o nome de Offerus e o consagraram ao Deus Apolo.

A criança foi crescendo em tamanho e em força e, resolveu que só serviria os que fossem fortes e poderosos. E assim tentou proceder.

Procurou quem quisesse o seu trabalho e passou a servir, não só um poderoso rei, mas também um outro individuo que afirmava ser o próprio demónio. Porém, em pouco tempo descobriu que o rei temia o nome do diabo, enquanto o demónio tremia com medo de encontrar uma cruz na estrada.

É por esta altura que um frade eremita encontra Offerus. Toma-o por amigo, baptiza-o e dá-lhe a conhecer a fé cristã, mas o catecúmeno não aceita jejuar e a rezar a Cristo, como lhe aconselhava o seu amigo frade.

Os antigos amos, o rei e Satanás, já não lhe inspiravam confiança, pelo que deixou de os servir e, devido a sua estatura e força, aceitou uma tarefa: ajudar as pessoas a atravessar um rio, perigoso pela impetuosidade das águas, que já tinha originado a morte de muitos que tiveram necessidade de o atravessar sem ajuda.

Certo dia, apresentou-se-lhe uma criança pedindo-lhe que o transportasse para a outra margem. Tomou a criança sobre os ombros e, à medida que avançava para a outra margem, a criança parecia aumentar de peso, como se carregasse o mundo sobre os seus ombros. Quando disse à criança a sensação que tinha tido, ao transportá-la da outra margem, esta respondeu-lhe: Eu sou o Criador e Redentor do Mundo. E mais. Disse-lhe para fixar o seu bastão em terra.

Offerus assim fez e, no dia seguinte e naquele local, estava uma exuberante palmeira, e o povo passou a chamar-lhe Christophorus, que significa “aquele que carrega Cristo”, ajudando à conversão de muitos, para desespero do rei da região.

Cristovão, a mando do governador de Antioquia, foi preso e martirizado, vindo a falecer no ano de 521 dC, tendo sido canonizado por volta do ano de 1550.

Oração do Motorista:

“Ó Senhor, por intercessão de São Cristóvão, padroeiro dos motoristas, dai-nos firmeza e vigilância nos muitos caminhos da vida em busca de trabalho, lazer, felicidade e realização.

José Marcelino Martins
30 de Junho de 2012
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10114: Patronos e Padroeiros (José Martins) (32): Jozé Maria das Neves Castro - Patrono do Instituto Geográfico do Exército

Guiné 63/74 - P10125: Notas de leitura (377): Massacres em África, de Felícia Cabrita (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 16 de Maio de 2012:

Queridos amigos,
O objetivo destas recensões é juntar o maior número de possível de materiais para quem quiser conhecer ou estudar aquela guerra que vivemos.
Tive que ler duas vezes com muito cuidado a reportagem da Felícia Cabrita sobre a operação Tridente. Creio que a jornalista brincou com coisas sérias, vinha na predisposição de registar uma epopeia, sonegou dados e transformou os cerca de 70 dias que durou a batalha num cerco de Leninegrado, um épico de onde certamente esperava que a convidassem a fazer uma série televisiva para mostrar como os militares portugueses se revelaram incapazes de conquistar posições onde pontificavam mulheres heroínas.
É uma reportagem inqualificável, convém deixar escrito.

Um abraço do
Mário


Massacres em África

Beja Santos

A jornalista e escritora Felícia Cabrita conheceu a notoriedade em reportagens sensacionais denunciando, por exemplo, o caso Casa Pia. É autora de séries televisivas como “O Ouro Negro”, “Capitão Roby”, “Ballet Rose” e a “Joia de África”. O seu livro “Amores de Salazar” tem tido reedições sucessivas e estes “Massacres em África” vão já em terceira edição (A Esfera dos Livros, 2011). A jornalista investigou um conjunto de situações que vão desde o massacre em S. Tomé, no tempo do governador Carlos Gorgulho, em 1953, as atividades terroristas em Luanda, em 1961, até à execução de Sita Valles e o drama de uma mãe que pretende tudo saber sobre a morte de um filho em Angola, numa ação de comandos do Galo Negro. Quando se esperava encontrar referências ao massacre do Pidjiquiti vamos encontrar a operação Tridente e mais adiante a morte de vários oficiais, em 20 de Abril de 1970, em pleno chão manjaco.

Depois de lida a reportagem que Felícia Cabrita efetuou na Ilha do Como, de colaboração com Nino Vieira, fica-se com sérias dúvidas se alguma vez consultou a documentação existente em Portugal sobre esta operação. Em estilo bombástico, a jornalista usa sem artifícios o enredo de uma telenovela, com arremedos de caráter épico: “Mal pisei terra, tinha à espera alguns dos combatentes que enxovalharam a tropa portuguesa. Começámos por fazer o reconhecimento do terreno. Parecia ter caído no Vietname. Fora em Como, a sul da Guiné, que, em 1963, fora hasteada a bandeira de independência. Para pôr fim à afronta, mil e tal homens dos três ramos das Forças Armadas, crentes de que ali estava instalado o santuário da guerrilha apetrechada à soviética com abrigos antiaéreos, hospitais construídos abaixo do chão e centenas de guerrilheiros com armamento sofisticado, partiram para o ocupar. Por lá andaram por dois meses e meio à sede e à fome sem conseguirem penetrar na mata que, afinal, era defendida por mulheres e um punhado de homens”. De premeio, temos peripécias mirabolantes e os picantes da superstição e da macumba: “Numa tabanca perto da praia, vive Sona Camará, uma balobeira, mulher de visões capaz de influenciar os mortos para o combate. Sempre estive do lado das minhas fontes sem sobranceria. Os homens são conduzidos a maior parte das vezes pela sua fé ou pela ausência dela”. Confessa que depois de publicada esta reportagem no Expresso Alpoim Calvão a chamou de doida. Sona Camará aparece na reportagem como uma padeira de Aljubarrota, no Como estariam 20 guerrilheiros, 8 armas e 4 granadas. Nino Vieira, escreve, pedira reforços a Como para atacar um quartel (historicamente improvável, Nino fora para Cassacá, para uma reunião convocada por Amílcar Cabral que acabou por se transformar em congresso). E temos aqui um relato de batalha, os homens dividem-se em grupos de 5 e vão travar as tropas portuguesas no tarrafo. Se passou a haver a lenda de Sona Camará também nasceu a do Kabi, o Leão. Felícia Cabrita viaja com Nino Vieira até ao Como. Temos mais espetáculo: “Aterrámos em Como, onde jipes militares nos aguardam. O chefe da segurança trepa para os estribos de todo-o-terreno que leva o presidente. As mulheres dos bijagós, nas saias de palha de arroz multicolores dançam ao ritmo da batucada. Ao almoço fala-se daquilo que os une, não do que os separa. Da pobreza. Sona Camará, a mulher que batizou Nino de Leão, leva-o à sua baloba, onde abundam as garrafas de aguardente de cana com que alimenta os espíritos”. Nino Vieira fala da sua juventude e da instrução militar que recebeu na China.

Chegou a hora da reportagem entrar na operação. A vivacidade da repórter não tem freio: a aviação larga panfletos nas ilhas, as mulheres e os poucos guerrilheiros põem-se em movimento. Se tudo já faz prever o épico temos agora cinema a três dimensões: Muk Na Pono era um jovem que nada assustava, pegou na Mauser e foi à luta, N’Dine Na Barne entrincheirou-se na mata com a única metralhadora pesada que havia; do lado português, Júlio Santos sente-se protagonista de O Dia Mais Longo, filme do desembarque da Normandia; começam as baixas e o suplício de remover os feridos para um improvisado posto de socorros; do lado português, acentua a repórter, há medo e desespero, há quem invente doenças e há gente enlouquecida e segue-se uma descrição para fazer chorar as pedras da calçada: “Joaquim Ganhão negou-se a olhar para Henrique, porque coreu entre os soldados mil e uma coisa. Que o corpo estava decepado, os olhos furados, ele acreditou e chorava como uma criança”. A epopeia, a fazer fé no que escreve a jornalista, andou sempre do lado guerrilheiro: enquanto as forças portuguesas disparavam fogo, os guerrilheiros levavam os seus feridos no fundo das canoas, esgueiravam-se entre fragatas e regressavam atafulhados de armas. A força portuguesa queria progredir mas não podia: “Na mata de Como vivia-se ao ritmo das bombas. As copas dos poilões e das palmeiras formavam uma carapaça que abrigava a guerrilha. A tropa portuguesa experimentou tudo para perfurar a selva que se fechada como uma ostra para os expulsar. O napalm apagava-se num segundo, mal encontrava a folhagem densa e verde, e as bombas lançadas pelos velhos Dakotas rebentavam assim que tocavam o topo dar árvores. Tentaram bombas de profundidade com 250 kg de trotil que só tinha poder de sopro, rebentavam os tímpanos da tropa e faziam pouco estragos. Nas primeiras três semanas, explodiram 262 bombas, foram lançados 347 foguetes e dispararam 31 846 balas”. Maior heroísmo não podia haver: “As mulheres faziam sabão, continuavam a parir, e à noite subiam para cima das árvores, espiavam a floresta enquanto os guerrilheiros descansavam”.

Do lado português aumentavam as neuroses, militares que se motivavam, até o médico Francisco do Nascimento tomava Librium 10 para se manter de pé. Até há cenas de um Apocalypse Now: “Ao domingo, no fim da tarde, na imensa praia de Caiar, onde o comando estava instalado, o médico assistia à missa do padre Gama, foi das mais lindas que ouviu, e por uns momentos sossegava. Ao fundo, na areia molhada, Alpoim Calvão cantava ópera ou descarregava a arma nas garrafas de cerveja”. Os dias arrastavam-se, havia um alferes conhecido por Shelltox que se vangloriava de matar até se fartar, talvez fosse um gabarola, do dia em que foram rodeados pelo inimigo recuou sem dar ordem de retirada. Fernando Cavaleiro, o comandante da operação Tridente garantia o sucesso da operação mas ninguém acreditava, escreve a jornalista que sintetiza: as derrotas são osso duro de roer. Terá entretanto ouvido Alpoim Calvão que tinha outra leitura: “Não há vitórias absolutas, mas também não foi uma derrota. Já não havia gente suficiente na ilha que justificasse a nossa presença. Mas Como foi uma grande escola, encontrámos o inimigo muito aguerrido e manobrador”. As mulheres guerreiras personificaram as gesta sublime, a tal ponto que Amílcar Cabral, quando soube das baixas, ordenou que abandonassem a ilha, mas Cadi Camará, a única mulher que usava pistola que conhecia as profecias, gritou aos homens: “Se estão com medo, dispam as vossas calças e vistam as nossas saias que nós vamos combater”.

Não tivesse lido o que outros camaradas aqui têm escrito sobre a operação Tridente e teria de cismar como é que mil e tal portugueses tinham sido travados por um punhado de homens e mulheres extraordinárias, tudo previsto por uma balobeira que previa um milagre. São estes despautérios que levam a perguntar como é possível ser tão leviano na descrição da operação Tridente.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 2 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10101: Notas de leitura (376): "Aviltados e Traídos - Resposta a Costa Gomes", por Mello Machado (Mário Beja Santos)