quinta-feira, 27 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12904: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (35): Grande e sentida homenagem ao Pepito (1949-2014), no bairro do Quelelé, em Bissau, onde fica a sede da ONDG e a casa de família

  
Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente do Quelelé > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito > Cartaz com o célebre frase com que acaba o texto autiobiográfico ("A sombra do pau torto") que o Pepito escreveu em 2008, que nos ofereceu depois de um memorável jantar na  nossa casa  de Alfragide e que o nosso blogue publicou em primeira mão, em 31/7/2008 (*):

 "Recomeçámos tudo mais uma vez, menos por convicção, mais por tradição. Hoje as nossas duas netas, Sara e Clara, sabem que desistir é perder e recomeçar é vencer."...

Foi também com essa convicção, de que "desistir é perder e recomeçar é vencer", que a  Isabel  ("Belocas", para a família e os amigos mais íntimos) e as filhas, Cristina e Catarina, regressaram há dias para  a sua casa no bairro do Quelelé, em Bissau... onde estão grande parte das suas memórias e das suas vidas de trabalho, de resistência, de amor... Sim, por que recomeçar é preciso, Isabel, Cristina, Catarina, Ivan, Henrique, João, Clara!


Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito > O José Filipe Fonseca, da AD, no uso da palavra. É um velho amigo do Pepito e cofundador da AD:

"Em 1991, incluído num grupo de guineenses do qual faziam parte José Filipe Fonseca, Nelson Dias, Isabel Miranda, Roberto Quessangue e Rui Miranda, entre outros, criámos uma organização não-governamental, a Acção para o Desenvolvimento (AD), que pretendia promover uma ética de desenvolvimento local centrada no homem e não no crescimento económico. A AD surgia assim para dar continuidade e potenciar de forma mais aberta as actividades de vulgarização do DEPA." (Carlos Schwarz, " A sombra do pau torto", 2008).



Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito > A Isabel Miranda (se não erro...), no uso da palavra.  É a presidente da direção da AD, casada com o Rui Miranda: conheci o casal em 2008.



Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito > O Rui Miranda (se não erro...), outro cofundador da AD, e marido da Isabel Miranda. As fotos publicadas no sítio da AD não trazem legendas...  Rui Miranda foi nosso camarada no tempo da guerra colonial, o Pepito tratava-o por "nosso furriel".


Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente do Quelelé > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito >  A família mais próxima: as filhas Cristina e Catarina, a viúva, Isabel, e o irmão, Henrique (que vive em Lisboa).



Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente do Quelelé > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito > O  irmão, Henrique Schwarz (que vive em Lisboa, enquanto o outro João vive em Paris, e a mãe, Clara Schwarz, de 99 anos, vive em Paço de Arcos, Oeiras).



Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente > 18 de março de 2014 > Homenagem da AD ao Pepito >  Mais um amigo dos muitos amigos do Pepito transmitindo as suas condolência à Isbael. (Se não erro,  o homem que abraça a Isabel é o Mussa Candé, da Associação dos Moradores de Quelelé.)

Legendas de Luís Graça. Fotos da AD - Acção para o Desenvolvimento.


1. Imagens da homenagem ao Pepito,  Carlos Augusto Schwarz da Silva (Bissau, 1949-Lisboa, 2014), por parte dos funcionários e parceiros da AD, bem como dos seus muitos amigos e admiradores. É no bairro do Quelelé que fica a sede da AD e a casa do Pepito e da Isabel bem como de outros amigos próximos (por ex., o Nelson Gomes).

Sobre a ONGD AD, fundada pelo Pepito e mais uma cinquentena de guineenses, convirá dizer o seguinte: (i) em 2012, em termos de recursos financeiros, mobilizou  mais de  542 milhões de CFA, o equivalente a cerca de  827 mil euros (1 euro=655,957 CFA); metade dessas receitas era proveniente de fundos  da União Europeia; (ii) dava  trabalho a mais de 3 dezenas de profissionais; (iii) tinha um significativo impacto na vida de diversas comunidades onde desenvolvia projetos (Bissau, região do Cacheu, região de Tombali); e, por fim, (iv) as suas contas eram auditadas.

Fotos da AD - Acção para o Desenvolvimento (2014), página na Net e página no Facebook. Aqui reproduzidas com a devida vénia... (**)

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(**) Último poste da série >  17 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12849: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (34): Homenagem nacional e internacional ao Pepito, organizada pelos seus amigos e colaboradores, um mês depois da sua morte: 3ª feira, 18 de março, em Bissau, no Quelelé, no seu "chão"... Seguramente que ele não quereria um "choro" à moda tradicional, mas sim uma festa onde os seus valores, os seus sonhos, os seus projetos e a sua equipa fossem celebrados como um legado vivo, fecundo e proativo... (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P12903: Parabéns a você (709): Armando Pires, ex-Fur Mil Enf.º do BCAÇ 2861 (Guiné, 1969/70; Carlos Vinhal, ex-Fur Mil Art MA da CART 2732 (Guiné, 1970/72); Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 4612/74 (Guiné, 1974) e Maria Dulcínea, Amiga Grã-Tabanqueira


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Nota do editor

Último poste da série:

25 de março de  2014 > Guiné 63/74 - P12896: Parabéns a você (708): Rui Silva, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 816 (Guiné, 1965/67)

quarta-feira, 26 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12902 Agenda cultural (306): Vila Nova de Famalicão > Ciclo de Conferências 2014 > Ideias e práticas do colonialismo português: dos fins do séc. XIX até 1974 > 4 de abril de 2014, 21h30 > Conferência do doutor Sérgio Neto (CEIS20/UC): "De Goa a Luanda, pensamento e acção de Norton de Matos"




Vila Nova de Famalicão > Ciclo de Conferências 2014 > Ideias e práticas do colonialismo português: dos fins do séc. XIX até 1974 > 4 de abril de 2014, 21h30 > Conferência do doutor Sérgio Neto, do
Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX, da Universidadae de Coimbra (/CEIS20/UC): " De Goa a Luanda, pensamento e ação de Norton de Matos". (*)



1. Divulgação do evento, a pedido do Museu Bernardino Machado.

Entretanto, decorreu já. no passado dia 14 deste mês a segunda conferência deste ciclo subordinado ao título "Ideias e práticas do colonialismo português: dos fins do séc. XIX até 1974".

Fica aqui o resumo dessa sessão, de acordo a página dio Museu Bernardino Macahado (**):

(...) O Prof. Jorge Paulo Fernandes, na última conferência, intitulada “As Ideias Colonialistas de Aires de Ornelas”, realizada no dia 14 de Março do corrente ano no Museu Bernardino Machado, iniciou por evidenciar se faria hoje sentido em recuperar as ideias colonialistas de Aires de Ornelas.

Figura chave portuguesa nos finais do século XIX e nos princípios do século XX, será com Aires de Ornelas que o império colonial se tornou na chave política portuguesa até 1974. Pertencendo à geração colonialista de 1895, o Prof. Jorge Paulo Fernandes evocou Aires de Ornelas em três perspectivas: o homem, a experiência africana e as ideias colonialistas.

Aliás, estas mesmas começaram a ser difundidas pela imprensa, nomeadamente em dois títulos, nomeadamente enquanto director do “Jornal das Colónias” e na “Revista do Exército e da Armada”, fundada por Aires de Ornelas.

Numa fase inicial, Ornelas incorporou no movimento, sem sucesso e numa “fantasia sem preocupação”, nas palavras do Prof. Jorge Paulo Fernandes, que pretendia restaurar Portugal através de uma ditadura militar, numa altura em que o rotativismo estava a ser fortemente criticado pelos republicanos.

Em 1906, perante a dissidência do Partido Regenerador, Ornelas ficará ao lado de João Franco, será Ministro da Marinha e do Ultramar no governo de 1906 a 1907. Estará, assim, com o príncipe Filipe na viagem a África, indo, logo a seguir à implantação da República, para o exílio, chegando a chefiar a revolta militar de Monsanto em 1919.

A questão a saber para o Prof. Jorge Paulo Fernandes é se Aires de Ornelas é um reacionário, tradicionalista ou uma figura do tradicionalismo monárquico. Fiel monárquico, Ornelas nunca nega a ordem pela monarquia constitucional. Será, enquanto conselheiro do Rei D. Manuel em Londres, uma figura de cautela e de moderação, conselhos que incutia no próprio Rei.

No seu contacto com África, Ornelas será o que irá definir a estratégia militar em África, numa altura em que o Estado português irá possuir o armamento mais moderno e completo da época. Desta forma, com um investimento em tecnologia militar e médica, melhor preparação técnica, permitiram tais condições uma série de vitórias africanas, novas proezas que farão olhar para África de forma diferente.

Defendia Ornelas para África a soberania portuguesa pelas soberania das armas, assim como o darwinismo social (isto é, a reacção musculada). Ao mesmo tempo, Ornelas defendia igualmente uma reacção nacionalista africana, reclamando uma política administrativa para as colónias.


Defensor de uma descentralização administrativa, projectando a municipalização (ideia que já vinha de Mariano de Carvalho, uma autonomia administrativa realizada pelos portugueses de Moçambique, não da metrópole), na prática tais ideias não tiveram a sua consequência; e se esteve ao lado dos vencedores, acabou, nas palavras do Prof. Jorge Paulo Fernandes, um derrotado: o império pelo qual sonhou, terá ganho na sua importância estratégica, enquanto que as ideias descentralizadoras não tiveram o seu seguimento. (...)

2. Norton de Matos (1867-1955)

(i) Jorge Maria Mendes Norton de Matos nasceu (1867) e  morreu (1955) em Ponte de Lima; 

(ii) Frequentou o colégio em Braga, tendo ido depois, em 1880, para a Escola Académica, em Lisboa; 

(iii)  Em 1884, iniciou o seu curso na Faculdade de Matemática em Coimbra;

(iv)  Fez o curso da Escola do Exército e, em 1898, partiu para a Índia;

(v) Começou aí a sua carreira na administração colonial, como diretor dos Serviços de Agrimensura;

(vi) Finda a  sua comissão, viajou por Macau e pela China em missão diplomática;

(vii) O seu regresso a Portugal coincidiu com a proclamação da República (1910);

(viii) Dispondo-se a servir o novo regime, Norton de Matos foi nomeado chefe do estado-maior da 5ª  divisão militar;

(ix) Em 1912 tomou posse como governador geral de Angola; s sua atuação nesta  colónia revelou-se extremamente importante, ao impulsionar fortemente o seu desenvolvimento, e protegê-la da ameaça contínua que pairava sobre o domínio colonial português, por parte de potências europeias rivais (Inglaterra, Alemanha e Itália); ficará para sempre associado à criação da cidade de Nova Lisboa (hoje, Huambo), em 1912;

(x) Foi demitido do cargo em 1915, como consequência da nova situação política que se vivia em Portugal durante a Primeira Guerra Mundial;

(xi)  Foi depois chamado, de novo, ao Governo, ocupando o cargo de ministro das Colónias, embora por pouco tempo: em 1917,  é obrigado a exilar-se em Londres;

(xii) Mais tarde, é promovido a general por distinção e nomeado Alto Comissário da República em Angola;

(xiii) Na primavera de 1919, foi delegado português à Conferência da Paz de Veersalhes;

(xiv) Em junho de 1924, exerceu as funções de embaixador de Portugal em Londres, cargo de que foi afastado aquando da instauração da Ditadura Militar (1926-1930);

(xv)  Em 1929, foi eleito grão-mestre da Maçonaria Portuguesa;

(xvi) Recebeu diversas condecorações, entre outras,  a Grã-Cruz de Torre-e-Espada;

(xvii) Em 1948, participou nas eleições presidenciais de 1949, contra o candidato do regime do Estado Novo, o general Óscar Carmona (1869-1951).

Fontes: InfopédiaWikipédia e Almanaque Republicano (, blogue donde retirámos a foto acima, com a devida vénia)

Guiné 63/74 - P12901: Lembrete (1): 5ª feira, 18h30, FNAC Chiado, Lisboa, a nossa amiga Catarina Gomes, filha de ex-combatente, e jornalista, apresenta o seu primeiro livro "Pai, tiveste medo?"... Entre outros grã-tabanqueiros, estarão presentes o nosso camarada Zé Teixeira e o seu filho Tiago, médico (uma das 12 histórias pertence-lhe; outra é de um dos filhos do João Bacar Jaló)

Título: Pai, tiveste medo?
Autor: Catarina Gomes
Género: História
Editora: Matéria-Prima
Local: Lisboa
Ano: 2014
Número de páginas: 248
PVP: € 15,50


1.  Doze histórias de filhos de combatentes da guerra colonial, umas contadas, outras advinhadas, sobre as perguntas feitas aos pais, ou que nunca chegaram a ser feitas.
:
"Chega ao fim um longo processo. No dia 27 deste mês, uma quinta-feira, às 18h30, vai ser lançado o meu primeiro livro. Vai ser na Fnac do Chiado.

"É sobre a forma como a guerra colonial chegou à geração dos filhos de ex-combatentes, como é o meu caso. São 12 histórias muito diferentes. Cada história pertence a um filho. É um livro sobre histórias de guerra contadas e outras adivinhadas, sobre perguntas que os filhos fizeram aos pais, outras que nunca ousaram fazer. Gostava muito de vos ver por lá." (Catarina Gomes, 3 de março de 2014, página do Facebook)..


2. Catarina Gomes [, foto á esquerda, retirada com a devida vénia da respetiva página do Facebook]:

(i) Filha de camarada nosso que fez a guerra colonial em Angola, infelizmente já desaparecido;

(ii) jornalista do Público desde 1998, tendo-se interessado pelas ´
áeras da Justiça e da saúde; mas o que mais gosta de escrever "são reportagens e histórias de vida";

(iii) entre 2002 e 2003 fez uma pausa para pensar nas lides do jornalismo à distância, rumou a Londres onde tirou o Master of Science in Media and Communications na London School of Economics and Political Science;

(iv) em 2011 aventurou-se como argumentista do documentário Natália, a Diva Tragicómica (RTP2/Real Ficção);

(v) tem feito jornalismo de investigação sobre temas "marginais" da guerra colonial, como por exemplo,  os filhos que deixámos no TO da Guiné, os "filhos do vento";

(vi) tem uma dezena de referências no nosso blogue, e está na altura de a convidar a sentar-se à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande; de resto, os filhos e filhas dos nossos camaradas nossos filhos e filhas são... 


Guiné 63/74 - P12900: Brochura, "Deveres Militares", SPEME, 2ª ed, 1969 (Fernando Hipólito): Parte IV: Quando os solípedes ganhavam aos bípedes em mimos, carinhos e cuidados: art. 96º do antigo RDM








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Continuação da reprodução da brochura "Deveres Militares"... A lista dos deveres de um militar é (ou era) longa...Publicamos hoje os deveres dos plantões... às cavalariças (artº 96º do RDM que estava em vigor do nosso tempo)...

Parece que, na tropa, o solípede (leia-se, o animal que tem um só casco ou uma só unha em cada membro inferior) ganhava ao bípede (ou seja, a besta que andava em dois pés ou que se deslocava sobre as duas patas posteriores)...em mimos, carinhos e cuidados!

E a propósito de cavalos e cavaleiros há muitos dichotes, ditados, provérbios... populares. Aqui vão algums de que eu gosto mais: (i) As manhas do cavalo só as sabe seu dono; (ii) Cavalo com quatro pés cai, quanto mais só quem tem dois; (iii) Cavalo que há-de ir à guerra, não corra bobo nem o abane a égua; (iv) Coices de garanhão, para égua carinhos são; (v) Em compar cavalo e escolher mulher, fecha os olhos e encomenda-te a Deus; (vi) Enquanto o meu tiver besta, para que quero cavalo ? ; (vii) Cavalo, mulher e arma não se emprestam; (viii) Não cavalgues em potro, nem gabes tua mulher a outro; (ix) A soldado novo, cavalo velho;: (x) Quanto maior é a besta, maior o coice....

O nosso saudoso RDM foi substituído pelo atual RDM - Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/77, de 09ABR, com diversas alterações. (Entro em vigor em 10 de abril de 1977, e foi promulgado pelo então Presidente da República António Ramnalho Eanes)

Imagens: Fonte: "Deveres Militares", 2ª edição, SPEME, 1969. A 1ª edição é de 1963. E há uma 4ª edição de 1973.


1. O documento chegou-nos, digitalizado, por intermédio do Fernando Hipólito e César Dias.  O Fernando Hipólito [, foto atual à direita, ] é o nosso novo grã-tabanqueiro, com o nº 650... Passou pelo CISMI, Quartel da Atalaia, Tavira, 3º turno, 1968. Foi fur mil, CCAÇ 2544, Angola, 1969/71. Esteve a maior parte do tempo no leste, em Lumege. Há um blogue sobre Lumege e a malta que por lá passou. E onde o Fernando Hipólitio colabora. Já lhe pedi uma foto atual, "decente", para substituir esta, do "Correio da Manhã"..

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Nota do editor:

Postes anteriores da série:

19 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12856: Brochura, "Deveres Militares", SPEME, 2ª ed, 1969 (Fernando Hipólito): Parte I: Os dez primeiros deveres de um militar...
20 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12859: Brochura, "Deveres Militares", SPEME, 2ª ed, 1969 (Fernando Hipólito): Parte II: Era longa a lista dos nossos deveres militares (e curta a dos direitos): Aí vão mais, do 11º ao 20º

23 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12885: Brochura, "Deveres Militares", SPEME, 2ª ed, 1969 (Fernando Hipólito): Parte III: Será que a lerpa, jogada no CTIG, nas longas noites de insónia, violava o nº 21º do art. 4º do RDM - Regulamento de Disciplina Militar, então em vigor ? Ou as bebedeiras de caixão à cova... não caíam sob a alçada do nº 24 º ?

terça-feira, 25 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12899: Agenda cultural (306): Relatos de investigação na Guiné-Bissau - Da Água à Saúde, a cargo do Professor Adriano Bordalo e Sá, dia 28 de Março de 2014 no Salão Nobre do Clube Fenianos Portuenses, Rua do Clube Fenianos, 29, Porto

1. Da Tabanca Pequena ONGD, recebemos hoje, 25 de Março de 2014, a seguinte mensagem:


C O N V I T E 

RELATOS DE INVESTIGAÇÃO NA GUINÉ-BISSAU: DA ÁGUA À SAÚDE



Subordinada ao tema RELATOS DE INVESTIGAÇÃO NA GUINÉ-BISSAU: DA ÁGUA À SAÚDE, o Professor Doutor Adriano Bordalo e Sá do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto (ICBAS-UP) e investigador do Ciimar, irá proferir uma palestra no próximo dia 28 de Março, às 18 horas, no salão nobre do Clube Fenianos Portuenses, à Rua do Clube Fenianos, 29, (ao lado da Câmara Municipal do Porto).

Serão relatadas experiências do trabalho levado a efeito na Guiné-Bissau nos últimos 7 anos.

No final, está previsto um debate com a assistência.

A conferência tem o apoio da ONG Mundo a Sorrir e a colaboração do Clube Fenianos Portuenses.

Aproveite e passe em www.facebook.com/clube.fenianos.portuenses.oficial e faça um Like
E visite o nosso sitio em www.clubefenianos.pt

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Nota do editor

Último poste da série de 21 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12870: Agenda cultural (295): O camarada "pifaniano" Silvério Dias, ex-1º srgt, locutor do PFA - Programa das Forças Armadas, e "poeta todos os dias", convida os poetas da Tabanca Grande para a sessão de hoje, "Há Poesia no CASO", ou seja, no Centro Acção Social de Oeiras, às 17h00

Guiné 63/74 - P12898: Convívios (573): O Almoço de despedida do inverno da Magnífica Tabanca da Linha foi no passado dia 20 de Março de 2014 (José Manuel Matos Dinis e Manuel Resende)



1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 21 de Março de 2014:

Bom dia Carlos,
Faço seguir outra espécie de reportagem sobre o último e fresquinho encontro da Magnífica.
Seguem anexas algumas fotografias do conceituado repórter fotográfico Manuel Resende, e a propósito, numa das fotografias do grupo, verifica-se que o Colaço está sentado ao lado das senhoras, talvez ainda lembrado da extraordinária trunfa que ostentou até recente data, acho que desde os tempos do PREC, e faria tanta inveja a muitas cabeleiras do belo sexo, pelo que te peço para incluíres um dos seus retratos anteriores.
Esta notícia inclui ainda uma importante omissão para o País, pois dele não saiu qualquer declaração, não por falta de ideias, mas por falta de quorum, que éramos só 33 mastigantes, número insuficiente para os 70 da ordem.

Com um grande abraço
JD


Ainda não tina acabado de ouvir as doze badaladas do meio-dia, e tocou o telefone com o expedito Mário Pinto a certificar-se do local do encontro. Ansioso, tinha sido o primeiro a chegar, orientado pelo treinado faro a bacalhaus que vai devassando por todo o território nacional. Nem careceu de GPS. Cheguei ao local meia-hora depois, e já se agrupava um perigoso grupo de assalto, que, a seco, papagueava tácticas e contra-tácticas, aperfeiçoando o método como, aliás, se impõe nas operações bem congeminadas e melhor conseguidas.

Faltava o Miguel - que foi colocar um contador no braço - para o reconhecimento aéreo, mas o pira Sacoto já trazia inspiradas as excelentes fotografias aéreas sobre o alvo, contributo de muita valia para o dispositivo final. Calmos, mas determinados, iam chegando outros elementos, conformemente às incumbências de cada um.

Para dar uma nota de alegria na paisagem de pinheiros e mar, as senhoras juntavam-se em sereno colóquio, onde davam conta das façanhas dos maridos, todos veteranos e activos comedores de bacalhaus mais dos produtos acolitados, que, na circunstância, veio a verificar-se, tratar-se de batatas assadas e grelos. Ai grelos, verdinhos, que estavam tão bons!

Enquanto os machões mentiam convictamente sobre fantasiosos antecedentes no local, o Senhor Comandante que revelava um excelente aspecto, e o sorrizinho malandro de quem a tudo corre na perfeição, logo me chamou para dizer que não esquecesse os pormenores. Ora, com a minha incontrolável tendência para a distração, neste momento dramático de pôr tudo em pratos limpos, só me ocorrem os pormaiores, mas espero que a reportagem não saia viciada, e que consiga evitar a correspondente porrada.

Neste encontro houve estreias e um recorde mundial:

Entre as estreias, já foi referido o novel aviador Sacoto, que se incumbiu da importante tarefa; o animado e contagiante Carlos Rios; o Vieira, que desde a capital conseguiu trazer o corpulento Pinto; e por último, mas não menos importante, com surpresa e sucesso na função, estreou-se a bengala de pau do Senhor Comandante. O recorde mundial regista o maior número de senhoras presentes em encontros desta Magnífica Tabanca, e é de toda a justiça salientar que se bateram tão bem quanto os confrades. Mas não há bela sem senão: o Com-Chefe Luís Graça continua a desenvolver actividades esforçadas que, pelo menos, devem causar alguma sensação no preenchimento do IRS, e, novamente, não compareceu. Aquilo, da outra vez, foi um raio faiscante, e, se calhar, teremos que aguardar alguns anos, para que o consagrado fundador do blogue possa tornar-se assíduo junto da cambada.

O tempo estava assim a modos que de meia-cura, pois não desagradava a friorentos, nem a calorentos. Até que alguém (ah! fui eu) se lembrou de convocar a força para as hostilidades. Adoptou-de então um dispositivo de grande eficácia, consubstanciado pelo ataque surpresa e mais ou menos à balda, sem lugares fixados, onde cada um escolhia o lugar do pleito, numa perspectiva de encher os olhos, que as entradas eram miúdas para tanta guerreirice.

Algum tempo decorrido, sem baixas a registar, acabou, como, dizem, tudo acaba, o escasso fartote dos condutos, mai-los doces rematados a cafés, que outros ainda prolongaram em injustificados digestivos (face ao volume da operação), que esta malta não é brutamontes, e revela estomagozinhos delicados.

Não havendo mais despojos daquela guerra, apresentou-se a ocasião de registar para a História, com maiúscula, claro, as imagens testemunhais da última glória depois da entrega do império. Novamente no exterior, os olhares ainda extasiaram pela delicada colina verde abaixo, que a renda marítima limitava e a brancura do Farol do Raso dava maior expressão, até se perder no horizonte vasto (estive a pensar, se poderia escrever vastidão horizontal, mas o Manuel Joaquim poderia não apreciar, e decorrida escassa meia-hora decidi pela outra expressão) até às nossas posições atlânticas nos Açores e na Madeira, onde, não sei quando, os bravos Magníficos poderão afoitar-se em novos e avançados cometimentos.

Afinal, a treta não conhece limites. Só espero que esteja do agrado do Senhor Comandante, pessoa arguta, homem sério, simpático até, mas que tem a estranha tentação de me bater, sem que eu perceba porquê. Ao fim destes anos, nem um louvorzito me deu, só exige, só exige...


Da esquerda para a direita: Mário Pinto, Vieira e David Ventura


Da esquerda para a direita:CMDT Rosales, José Carioca, Armando Pires, José Colaço, Veríssimo Ferreira e David Ventura


José Colaço e Hélder Sousa


Da esquerda para a direita: Jorge Pinto, Fernando Marques e esposa Gina. Com camisa clara, Luís Moreira


Mário Fitas e sua esposa Maria Helena


Manuel Joaquim e sua esposa Deonilde


Da esquerda para a direita: Francisco Palma, Manuel Resende e Carlos Rios


Da esquerda para a direita: Carlos Rios, Manuel Joaquim e José Horta 


O CMDT Jorge Rosales e o Adjunto Zé Dinis junto de um grupo de senhoras


João Sacoto e Hélder Sousa 


Os magníficos tabanqueiros  e tabanqueiras da Linha: Por trás de grandes mulheres estão sempre grandes homens... Foto de grupo

Fotos:  © Manuel Resende (2014)

Selecção de fotos e respectivas legendas da responsabilidade do editor
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Nota do editor

Último poste da série de 23 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12892: Convívios (572): 31.º Encontro Nacional dos ex-Oficiais, Sargentos e Praças do BENG 447, a realizar no próximo dia 17 de Maio de 2014 na Tornada, Caldas da Rainha

Guiné 63/74 - P12897: (De) Caras (16): Quem tramou o alf mil capelão Mário de Oliveira, do BCAÇ 1912 (Mansoa, 1967/69) ?... Não foi o BCAÇ 1912 que expulsou o Mário de Oliveira, a PIDE tinha escritório aberto em Mansoa (Aires Ferreira, ex-alf mil inf, minas e armadilhas, CCAÇ 1698, Mansoa, 1967/69)


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 1912 (1967/69) >  O alf mil capelão Mário de Oliveira entre soldados da CCS/BCAÇ 1912 e/ou da CCAÇ 1686 (que esteve sempre em Mansoa e a que pertenceu o Aires Ferreira, alf mil inf, minas e armadilhas, e membro da nossa Tabanca Grande) . O Mário de Oliveira viria a receber ordem de expulsão da Guiné em 8 de Março de 1968.

Foto: © Padre Mário da Lixa (2003) (com a devida vénia...)

1. Em toda a história da guerra colonial, no CTIG, houve dois casos de capelães militares que foram "expulsos"... Não sabemos ao certo por quem: (i) o bispo castrense (ii) a hierarquia militar; ou (iii) a polícia política ... Eu diria antes que foram dois erros de "casting" (sem que isto nada tenha de ofensivo para com os visados)...

Um deles é o padre Mário de Oliveira, que será sempre até morrer, o padre Mário da Lixa (*)... Foi capelão do BCAÇ 1912 (que esteve sediado em Mansoa, 1967/69)... Recorde-se que o BCAÇ 1912, mobilizado pelo RI 16, partiu para o CTIG 8/4/1967 e regressou a 16/5/1969.. O cmdt era o ten cor  inf  Artur Afonso Pereira Rodrigues. Subunidades de quadrícula:  CCAÇ 1686 (Mansoa); CCAÇ 1685 (Fá Mandinga, Fajonquito,  Fá Mandinga, Mansoa); e  CCAÇ 1684 (Bissau, Ingoré, São Domingos, Susana, Mansoa).

O outro caso de um capelão "expulso" foi o açoriano Arsénio Puim (que deixou, de resto, o sacerdócio em finais dos anos 70): foi capelão do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72).

Curiosamente, os dois são membros da nossa Tabanca Grande... Mas quantos capelães passaram pela Guiné ? É uma boa pergunta, a que não sabemos,  para já, responder...Seguramente algumas largas dezenas ou algumas centenas, já que, em princípio  havia um capelão por batalhão (c. 600 homens)...

Ora, ao que sabemos, foram apenas estes dois homens, e nossos camaradas,  os únicos capelães a entrar  em rota de colisão com a dupla hierarquia da Cruz e da Espada... Não os queremos nem santificar nem diabolizar, mas apenas ouvir (e saber ouvir) as suas histórias... Felizmente estão os dois vivos e têm inclusive participado em convívios anuais dos respetivos batalhões...

Temos cerca de 6 dezenas de referências a capelães no nosso blogue. Aliás,  temos mais dois capelães  registados no blogue:  o Augusto Baptista e  o Horácio Fernandes (este de resto contemporâneo do Mário de Oliveira)... É pena não haver mais capelães da Guiné a querer dar a cara neste blogue, que está aberto a todos os camaradas que por lá passaram, por aquela "terra verde e rubra"...

A nossa pergunta,  de momento, é: quem tramou  o Mário de Oliveira ? (**) (LG)

2. A este propósito, fomos recuperar o depoimento do Aires Ferreira, ex-alf mil inf, minas e armadilhas, da CCAÇ 1686 (Mansoa), do BCAÇ 1912 (Mansoa, 1967/69). O Aires Ferreira esteve em Mansoa de 13/4/1967 a 13/5/1969, e conviveu, portanto, com o Mário de Oliveira, como se depreende deste episodio que ele já aqui em tempos nos contou, aquando da sua apresentação, em  28/7/2006, à Tabanca Grande:


2.1. Missa em Cutia
por Aires Ferreira


Cutia era um destacamento que tinha um grupo de combate e ficava entre Mansoa e Mansabá  e entre o Morés e o Sara - Sarauol.

O Batalhão tinha um capelão que, um certo domingo, lá para o fim de 67, resolveu ir celebrar missa a Cutia. Para isso, arranjou uma escolta de voluntários que, comandados pelo furriel S.S., lá foram, com 2 Unimogues e o jipe do capelão.

A missa foi celebrada e no regresso, um dos Unimogues despistou-se e uma grande parte do pessoal da escolta ficou com ferimentos muito graves, tendo os restantes seguido até Mansoa para pedir auxílio.

Nesse Domingo eu estava de Oficial de Dia ao quartel de Mansoa e desconhecia totalmente este assunto. Cerca da hora de almoço, passava junto à porta de armas, encontrei o Ten. Cor, o Comandante do Batalhão, que me disse:
- Alferes Ferreira, o seu grupo está todo destroçado na estrada de Cutia, o que está aqui a fazer? Vá já para lá.
- Não posso, estou de serviço - disse eu e apontei a braçadeira.
- Dê cá, eu fico com ela. O piquete vai já atrás de si com a ambulância.


Guiné > Região do Oio > Mansoa > c. 1969/71 >
O destacamento de Cutia. Foto de César Dias
Assim foi. Lá fui, munido da pistola Walther, com um condutor que por ali apareceu e chegámos depressa. A cena era trágica. Havia 5 ou 6 militares gravemente feridos e deitados na berma. O único militar que ali estava capaz de dar uns tiros para defender o local, se o IN por ali aparecesse, era … o Capelão, que de joelhos na estrada, junto ao jipe, fazia as suas orações, de G3 ao lado.

Logo de seguida chegou o necessário auxílio e todos os feridos foram evacuados e tratados.

O Alferes Capelão que faz parte desta história era… o Padre Mário Pais de Oliveira, bem conhecido desta Tertúlia,  e a quem envio um grande abraço.

Aires Ferreira

2.2. Comentário adicional  do Aires Ferreira, com data de 15/9/2006:


Igreja de Mansoa. c. 194/66. Foto de Tony Borié

Luís Graça:  Não foi o BCAÇ 1912 que expulsou o Padre Mário do seu seio. Penso que nem tinha autoridade para o fazer. O que aconteceu, foi que o Padre Mário politizou fortemente as homilias das missas dominicais na Igreja Paroquial de Mansoa e isso criou problemas ao Comando do Batalhão. Além disso, a PIDE tinha em Mansoa um funcionário com escritório aberto.

Sei que o Comando foi por várias vezes chamado a Bissau e por fim o Padre Mário saiu de Mansoa. 

Estávamos em 1967, éramos todos muito jovens e acho que faltou uma pitadinha de bom senso ao Padre Mário, para levar a água ao seu moinho. Ele que me perdoe, mas foi o que pensei na altura.

Aires Ferreira




Guiné > Mapa geral da província (1961) > Escala 1/500 mil  > Região do Oio > Detalhe: posição relativa de Cutia no triângulo Bissorã- Mansabá- Mansoa.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2014)



Padre Mário da Lixa. Foto da sua página,
aqui reproduzia com a devida vénia
2.3. Sobre a sua experiência na Guiné entre finais de 1967 e princípios de 1968,  como capelão militar, o Mário de Oliveira, disse o seguinte:

(...) "Na guerra colonial, vivi integrado no Batalhão 1912, sedeado em Mansoa. Era o único padre capelão. Havia outro padre em Mansoa, mas na igreja da Missão, com quem sempre dialoguei, durante os quatro meses que lá vivi e actuei. Mas como capelão militar era o único padre no Batalhão.

"Enquanto não me expulsaram, pude privar de perto com as diversas chefias militares e com as centenas de soldados rasos que davam corpo ao Batalhão. Encontrei homens que estavam na guerra com convicção. A tese oficial do Regime sobre a guerra estava bem interiorizada neles. E eram generosos, à sua maneira, na entrega de si mesmos àquela causa, sem se aperceberem que era uma causa perdida. Mas havia também os que se aproveitavam da guerra, com sucessivas comissões, bem remuneradas, e quase sempre longe dos perigos das frentes de combate. Dizê-lo, não é novidade para ninguém. E havia os oficiais milicianos que, duma maneira geral, estavam na guerra contrariados e cuja preocupação maior era poderem regressar à sua família e à sua terra sãos e salvos" (...).

Fonte: Vd. post de 27 de Junho de 2005 > Guiné 60/71 - LXXXV: Antologia (5): Capelão Militar em Mansoa (Padre Mário da Lixa) (***)

Num outro texto, também publicado na I Série do nosso blogue, em 17/5/2006, o Mário de Oliveira explicou como é que foi apanhado pela armadilha da guerra colonial e o que é que a sua experiência, como capelão militar no CTIG, representou para ele, como homem, cidadão e padre:

(...) Acordei para a Guerra Colonial, quando, em 1967, fui chamado ao Paço episcopal do Porto - tinha então 30 anos de idade e cinco anos de padre, na Diocese, e era professor de Religião e Moral no Liceu D. Manuel II - para ser informado, de viva voz, pelo Bispo-Administrador Apostólico, D. Florentino de Andrade e Silva, de que o meu nome já tinha sido enviado para Lisboa, pelo que, em breve, iria ser chamado a frequentar um curso de capelães militares, na respectiva Academia Militar!
Não me perguntou o Bispo se eu estava disposto a ir, se tinha alguma coisa a objectar. Não me consultou. Apenas me informou e deu-me a ordem de marcha. Como se a Igreja fosse um enorme quartel, onde a generalidade dos seus membros apenas obedece, cumpre ordens dos superiores, auto-apresentados como infalíveis, como donos da verdade, como rostos visíveis de Deus, senão mesmo, o próprio Deus na terra.

A verdade é que eu, nessa altura, embora ficasse mudo de espanto e como que apunhalado no peito, não ousei sequer contradizer o Bispo. E lá fui para a Academia Militar, com mais umas dezenas de outros padres do país, pelos vistos, todos mais ou menos incómodos, por razões as mais diversas, nas respectivas dioceses.

Ao fim de cinco semanas de curso intensivo, fui dado como apto e parti para a Guiné-Bissau, a fim de me integrar, como alferes capelão, no Batalhão 1912, que já operava militarmente em Mansoa, a 60 kms de Bissau.

Hoje, também eu me pergunto: Como é que isto foi possível? Como é que eu nem sequer me lembrei de formular objecção de consciência? Como é que fui logo obedecer a semelhante ordem? (...)

______________

Notas do editor

(*) Da página pessoal do Padre Mário da Lixa, retirámos alguns apontamentos autobiográficos que nos ajudam a entender melhor a o seu percurso como homem, cidadão e padre bem como a sua curta passagem pela Guiné.

(i) Nascido em 1937, na freguesia de Lourosa, concelho de Santa Maria da Feira, numa família da classe trabalhadora, entrou no seminário em 1950;

(ii) Em 1962, foi ordenado padre, na Sé Catedral do Porto, pelo bispo D. Florentino de Andrade e Silva, Administrador Apostólico da Diocese, que substitui o Bispo D. António Ferreira Gomes (1906-1989), exilado por ordem de Salazar em 1959...

(iii) A partir de 1963 foi professor de religião e moral em dois liceus do Porto;

(iv) Em Agosto de 1967 "foi abruptamente interrompido nesta sua missão pastoral pelo Administrador Apostólico da Diocese, por suspeita de estar a dar cobertura a actividades consideradas subversivas dos estudantes (concretamente, por favorecer o movimento associativo, coisa proibida pelo regime político de então)";

(v) Nomeado capelão militar, "sem qualquer consulta prévia, pelo mesmo Administrador Apostólico", viu-se compelido a frequentar, durante cinco semanas seguidas, um curso intensivo de formação militar, na Academia Militar, em Lisboa;

(vi) Em Novembro de 1967, desembarca na Guiné-Bissau, na qualidade de alferes capelão do Exército português, integrado no BCAÇ 1912, com sede em Mansoa;

(vi) Menos de cinco meses depois, em março 1968,  é "expulso de capelão militar, por ter ousado pregar, nas Missas, o direito dos povos colonizados à autonomia e independência", e mandado regressar à sua diocese, sendo "rotulado pelo Bispo castrense de então, D. António dos Reis Rodrigues, como padre irrecuperável ";

(viii) Em Abril de 1968, foi nomeado pároco da freguesia de Paredes de Viadores (Marco de Canaveses);

(ix) Em Junho de 1969 é exonerado da paróquia de Paredes de Viadores pelo mesmo Administrador Apostólico da Diocese do Porto, que o havia nomeado;

(x) Em Outubro de 1969 está a paroquiar a freguesia de Macieira da Lixa (Felgueiras), por nomeação do Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, entretanto, regressado do exílio;

(xi) Em Julho de 1970 é preso pela PIDE/DGS;

(xii) Em Março de 1971 sai da prisão política de Caxias, depois de ter sido julgado e absolvido pelo Tribunal Plenário do Porto;

(xiii) Volta a ser preso pela PIDE/DGS em Março 1973; quando sai em liberdade, em Fevereiro de 1974, é "informado, de viva voz, pelo Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, que já não era mais o pároco de Macieira da Lixa";

(xiv) Em 1975 torna-se jornalista profissional;

(xv) Em Julho 1995, e a convite do jornal Público, "regressou à Guiné-Bissau, onde permaneceu durante uma semana, com o encargo de escrever uma crónica por dia sobre o passado e o presente daquela antiga colónia portuguesa" (...).




Guiné-Bissau > Região do Oio > Mansoa > 1995 >  O jornalista Mário de Oliveira com o padre missionário que foi encontrar em Mansoa.

Foto:© Padre Mário da Lixa (2003) (com a devida vénia...)


(**) Último poste da série > 21 de fevereiro de 2014 >  Guiné 63/74 - P12753: (De)caras (15): O meu primo Agnelo, e meu conterrâneo da ilha de Santo Antão, comandante do PAIGC, com quem me reencontrei no pós-25 de abril, em Bissau, era eu empregado bancário, no BNU - Banco Nacional Ultramarino (António Medina, ex-fur mil op esp, CART 527, Teixeira Pinto, 1963/65, a viver nos EUA, desde 1980)

Guiné 63/74 - P12896: Parabéns a você (708): Rui Silva, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 816 (Guiné, 1965/67)

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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Março de 2014 > Guiné 63/74 - P12893: Parabéns a você (707): Braima Djaura, ex-Soldado Condutor Auto Rodas da CCAÇ 19 (Guiné, 1972/74)

segunda-feira, 24 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12895: Notas de leitura (575): "Como Fui Expulso de Capelão Militar", por Padre Mário de Oliveira (Mário Beja Santos)






Capa do livro “Como eu fui expulso de capelão militar”, por Mário de Oliveira (Edições Margem, 1995)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Outubro de 2013:


Queridos amigos,
São assim as surpresas da Feira da Ladra.
Estou já regalado com livros encontrados de leituras que fiz na meninice e que espero que venham a ser úteis para um livro que ando a congeminar sobre as minhas memórias de fedelho, eis quando uma bela capa me chamou a atenção.

Porque o Padre Mário não se faz rogado, capas só de grandes autores como Inácio Matsinhe e neste caso Roberto Chichorro, um dos nomes maiores da pintura moçambicana. O título tinha o seu picante, e a decisão ficou tomada quando vi que se tratava da memória dos quatro meses em que ele viveu na Guiné-Bissau como capelão.
Posso imaginar a turbulência que ele lá provocou, nos meios castrenses. Também assim se fez a história da Guiné, com padres revoltosos.

Um abraço do
Mário



Como fui expulso de capelão militar: O Padre Mário de Macieira da Lixa explica-se, mostra o seu diário

Beja Santos


“Como eu fui expulso de capelão militar”, por Mário de Oliveira (Edições Margem, 1995) é o testemunho do Padre Mário de Oliveira que em Março de 1968 foi expulso de capelão militar depois de integrar durante quatro meses um Batalhão na Guiné.

 Sacerdote polémico, vive desde Outubro de 1975 como padre sem ofício pastoral, dedica-se a um projeto denominado Igreja Popular e é jornalista. 

Antes de ser capelão militar na Guiné-Bissau, foi professor de Religião e Moral no então Liceu D. Manuel II e era assistente diocesano da JEC. Terão chegado queixas ao administrador apostólico da Diocese do Porto acerca do seu trabalho com os jovens, foi despachado para a Academia Militar para frequentar o curso de Capelões. 

Não guarda em grande conceito o Bispo castrense, D. António dos Reis Rodrigues. Tece comentários amargos à conivência da hierarquia da Igreja Católica com o regime de Salazar. Naqueles meses da Guiné escreveu um diário e explica as reservas utilizadas: 

“O diário propositadamente omite o nome das terras por onde passei. Tão pouco divulgo o número do Batalhão em que fui integrado e no seio do qual desencadeei a ação que culminou com o meu afastamento compulsivo”.

O diário começa no dia 28 de Outubro de 1967: 

“Não sinto saudades. Não chorei à partida. E não esforço. Mas costumou-se a separação. Só Deus me aguentou. Se Ele não fosse o ideal da minha vida, não teria saído”

No dia seguinte, o capelão do Batalhão celebrou Missa no porão do Uíge: 

“Não me satisfez a Missa. Está numa linguagem que não se entende. Celebrámos a Festa de Cristo Rei e ninguém terá entendido isso”

Percebe que não houve fraternidade, no final da Missa foram todos a correr para os bares. E no dia seguinte houve instrução, tece outro tipo de recriminações: 

“O major falava das moças pretas. E pude ouvi-lo a instruir como conhecer quando o soldado poderia usá-las sexualmente. E quando elas, por sinais já convencionais, deixassem perceber concordavam, que era só procurar um sítio para isso. Ouvi bem! Nenhum estímulo a saberem servir, a respeitar, a permanecer fiéis. Será isto civilizar? Será isto amar o preto, respeitá-lo?”.

A viagem prossegue maravilhosamente e a 1 de Novembro o Capelão apercebe-se que estavam perto da Guiné, aqui chegarão no dia seguinte. A 4 regista os muitos soldados que vê em Bissau, as viaturas do Exército e escreve: 

“Tenho a sensação de estar num país estrangeiro. Não se entende os que os nativos dizem entre si. Outro defeito grave do passado. Nem a língua comum se procurou dar ao nativo

A 8 marcha para o seu Batalhão, à noite aproximou-se do edifício das praças, encontrou muita gente na jogatina. Medita sobre o que poe fazer para a valorização pessoal, ali não há clima de virtude. Os dias que se seguem são de contacto com as unidades, desloca-se e celebra Missa num fortim: 

“Ali estão perdidos dias seguidos. Estiveram presentes. Também o que estava de vigia no ponto mais alto, pois ficava mesmo em frente do altar. Num cenário de guerra, Cristo nasceu. E falou”

Vai registando factos para si surpreendentes: um inimigo que fugiu da prisão; a chegada de uma companhia de uma operação, chegaram eufóricos porque mataram e feriram e não tiveram baixas; vai registando depoimentos, acompanha o tenente médico pelas tabancas.

Por vezes, espraia-se em dissertações sobre a evangelização em África, mas acontecimentos triviais ou inusitados são transcritos para o papel como aquele Pedro que estava louco de amores pela Mariana e atirou duas granadas de sopro que feriram a bajuda. Reflete sobre a Missa. 

Numa coluna que se deslocou a Bissau rebentou uma mina em plena estrada, o capelão ia num jipe, a tudo assistiu. Escreve sobre o Advento. A 8 de Dezembro, exalta Maria, mãe da humanidade. Visita a cadeia onde se encontra pessoal preso em operações, há ali também suspeitos. Sente-se nas suas reflexões que está a entrar num caldeirão emocional. Nunca esquece os soldados feridos, acompanha-os, reza com eles. Continua a visitar os destacamentos e as tabancas. Começou a preparação litúrgica do Natal, toma nota dos maus tratos dados aos nativos que se recusaram a fazer capinações. 

Escreve longamente na vigília de Natal e a 25 regista que chegaram dez feridos, um dos quais já sem pernas, mais uma mina anticarro. 

“Nunca passei uma noite de Natal tão esquisita. Estive no refeitório das praças, em confraternização geral, com oficiais da companhia que jantava e os comandos. Mas não estava bem. Nunca senti saudades de ninguém. Apenas sofria". 

A 26, é procurado por um alferes que manifestara vontade de se confessar e que pediu para comungar.

Já não esconde o seu estado de revolta, refere a situação desumana dos prisioneiros, as torturas a que são submetidos. Em 1 de Janeiro, houve um ataque ao aquartelamento onde estava o capelão. Morreu um soldado milícia e ele rezou a seu lado. Os textos ganham dureza: construímos a paz ou alimentamos uma guerra, o texto da sua homilia vai suscitar polémica. O seu chefe religioso de Bissau vai inteirar-se da situação. 

O seu diário é tão confuso quanto a sua incompreensão ao destino que lhe está reservado. Continua a celebrar Missa, percebe-se que o deixam andar pelos destacamentos, não o querem no Batalhão. Regista a 30 de Janeiro: 

“Vivo horas difíceis. Estou a ser rejeitado e mal interpretado. Deus é o meu apoio, a minha força, o meu refúgio. Soube, ontem, que veio cá ao quartel um agente da PIDE para falar com um dos comandantes. Foi pedido o meu cadastro. Será pelas homilias. Como português e como cristão, apenas quero dar o meu contributo para a solução do problema que nos mantém cá na Guiné”

No dia seguinte chega uma mensagem para se apresentar em Bissau. E escreve: 

“Mas que mal fiz eu? Será um crime pregar aos cristãos a Palavra de Deus com clareza e objetividade e querer que as relações em Batalhão e fora dele sejam mais realizadas no Amor uns aos outros?”

Sente-se caluniado, até admitiram a hipótese de ter vindo assalariado por um grupo de revolucionários do Porto.

As suas homilias são cada vez mais incómodas, o Padre Mário tira toda a incandescência possível das homilias: 

“Muita gente, mesmo de responsabilidade, confundiu o Reino dos Céus com a vida ultraterrena, à qual se chegava abandonando esta. Não sei mesmo como foi possível fazer da religião um conjunto de práticas de piedade que nada tinham a ver com a vida no mundo, quando o Evangelho de Cristo é todo ele atividade contínua e entusiasta no mundo”

Exalta a sociedade nova, critica os ociosos e recorda o cristianismo primitivo. A 17 de Fevereiro, o seu chefe religioso apareceu e falou-lhe em particular, perguntou-lhe se aceitava mudar de unidade, ir para outro batalhão, recomendou-lhe que usasse da prudência no futuro. A 22 de Fevereiro, volta a Bissau, encontra-se com o chefe religioso de Lisboa. E diz ao seu superior que não achava justo mudar de batalhão, não praticara qualquer crime. O seu chefe reagiu mal: 

“Há já um mês que queriam mandá-lo para Lisboa. Eu é que o fui segurando aqui. Mas, já que agora me fala dessa maneira, não muda de Batalhão: vai para Lisboa e lá vê-se o que se há de fazer”

No fim de Fevereiro recebe instruções para embarcar para Lisboa. E conclui:

“Ouvi do meu bispo as piores referências! Não quis ouvir-me. Não me deu oportunidade de o informar, pormenorizadamente, do que se tinha passado. Não se mostrou interessado em conhecer a mensagem que anunciara no correr dos quatros meses”

É considerado irrecuperável para determinadas atividades sacerdotais. E daqui parte para casa dos pais, em Lourosa, onde chegou pela meia-noite. Era dia dos seus anos.
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Março de 2014 > Guiné 63/74 - P12864: Notas de leitura (574): "Pai, tiveste medo?", por Catarina Gomes (Mário Beja Santos)