quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13538: Manuscrito(s) (Luís Graça (40): Habeas corpus... ou mal de ti que foste à guerra







Lourinhã, Praia de Vale de Frades, com o forte de Paimogo (séc- XVII) à vista > 20 de agosto de 2014.  
Fotos: © Luís Graça  (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG)


Habeas corpus...

por Luís Graça


Sou objeto de desejo,
Logo corpo de delito,
Ou tão só mero ensejo
Para cadáver ex-quesito.

Quesito nº 1 do corpo
É manter-se bem temperado,
Sem a palidez do morto,
Nem na morgue congelado.

A pátria me requisita
O corpo onde eu habito,

Corpo morto não levita,
Nem eu, soldado, já grito.

Há o corpo de doutrina
E o corpo do relatório,
O libelo acusatório
E os detalhes da chacina.

Execução sumária ?
Conto apenas um morto,
Vítima de qualquer malária,
Entre a praia e o horto.

Há o corpo mal dormente
E a figura de corpo presente,
Que ninguém fique para semente,
Ordena o nosso tenente.

Onde acaba o raio do louco
E começa o tal demente ?
Se queres conhecer o teu corpo,
Mata e abre o teu porco.

Se és do corpo de polícia,
Não tens malícia no corpo.
Quem já nasce feio e torto,
Vai engrossar a milícia.

Há o corpo proativo
E o corpo amnésico,
Mais vale ser protésico
Do que triste radioativo.

Há a elite do corpo médico
Bem como o milagre ortopédico,
Há os crentes e os ateus
E ainda o corpo de deus.

A guerra é um circo trágico
Onde há o palhaço faz-tudo,
O herói é o mágico
E o homem-bala um sortudo.

Sangue, suor e lágrimas,
Lágrimas, suor e sangue,
Diz o braço tatuado
No corpo do zé soldado.

Pobre do corpo encapuçado,
Logo vai ser decapitado,
Ou então enforcado
Ou se calhar fuzilado.

Também há o corpo adhoc,
De peito feito às balas,
Contra a tropa de choque
Erguem-se os mortos das valas.

Mal de ti que foste á guerra
Sem voltar à tua terra,
Teu corpo, morto, não grita,
E, se não grita, não levita.

Lourinhã, 19/8/2014
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Nota do editor:

Último poste da série > 8 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13475: Manuscrito(s) (Luís Graça) (39): A felicidade ? É onde nós a pomos e onde nós estamos...

Guiné 63/74 - P13537: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (5): De Oxfordshire para Derbyshire: os primeiros dias

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Julho de 2014:

Queridos amigos,
Consegue-se bom tempo em Maio, em Inglaterra, mesmo com chuvadas intercalares.
O que continua a impressionar-me, e já lá vão umas boas visitas, é a harmonia entre a natureza e o construído, há aquele privilégio do sempre verde, há o sombrio da pedra, aquele diálogo circunspeto entre o antigo e a intrusão da modernidade, tudo se processa sem violências.
Gosto muito da arquitetura de Oxford, os seus parques, os seus museus. E sabe bem vaguear pelo campo.
Prometo continuar, não defraudar as vossas expetativas, neste Verão.

Um abraço do
Mário


Biblioteca em férias (5)

De Oxfordshire para Derbyshire: os primeiros dias

Beja Santos

O fito era percorrer as velhas aldeias da região das Cotswolds, aqui viveu gente insigne, como o escritor Thomas Hardy e William Morris, o genial artista de Arts and Crafts, depois vagabundear por Oxford, uma vez mais, e apanhar um comboio para a região de Derby, passando pelas relíquias da Inglaterra da Revolução Industrial, dos séculos XVIII e XIX.

O primeiro passeio aconteceu nos arredores de uma terra bem curiosa, de nome Faringdon, que tem uma igreja que Cromwell mandou bombardear, naqueles tempos da guerra civil. Algum disse: “Vamos ver uns quilómetros de bluebells, se não for agora não as apanhamos viçosas”.
Estávamos em Maio, o passeio foi de tarde, entrámos no bosque com sombras aconchegantes, o tempo aprazível. E era aquela embriaguez de azul. Os ingleses são assim nos seus cultos às flores. Tudo começa no início de Fevereiro quando os campos húmidos brotam os snowdrops, é o anúncio floral, depois daquele Inverno taciturno, plúmbeo, com cargas de água diluviais, em que a natureza adormece profundamente.

Estes campos de bluebells são um espanto, parecem tapetes viçosos, anunciam a maturidade primaveril. Ora vejam, do grande para o pequeno:



Cambridge ou Oxford, qual delas a mais bela?
Voto por Cambridge, tem mais intimidade, toda ela cheira à vida universitária, sinto-lhe a intimidade. Mas não nego as belezas de Oxford, a sua opulenta biblioteca, os seus colégios históricos, o Ashmolean Museum, profundamente didático, rico em tudo, em escultura, pintura, cerâmica, de todas as épocas. Tive sorte com a luz, gosto deste pátio que dá acesso à Bodleian, uma biblioteca ímpar num edifício ímpar, como se vê há qui uma mistura bem doseada de vários séculos.


Passei pelo Sheldonian Theatre, reputada sala de música, dentro de dias iria passar por lá Maxim Vengerov, ali fazem preleções figuras do mundo, como Kofi Anan. Prudente com o valor das libras, fui ouvir um trio nacional, com uma escolha musical de arrebatados românticos. A sala é esplendorosa, os lugares desconfortáveis, paciência.


E mostro-vos algumas fotografias dispersas de colégios e igrejas. Dá gosto deambular, bisbilhotar, ouvir e perguntar. Vejam lá se gostam:




Gosto muito dos cemitérios ingleses, não é só a tranquilidade, é a ausência do espalhafato dos mortos, acabou-se o terreal e ficamos todos em amenidade, é possível contemplar sem arrepios estas lápides sóbrias, há bancos para ler e meditar, esta atmosfera é um bálsamo, não se sai daqui a pensar nas coroas de espinhos nem nas lágrimas vertidas, ganha-se força para nos alegrarmos com as coisas que o bom Deus nos oferece enquanto estamos vivos, em cemitérios como este até se tem discernimento para preparar em boa forma a passagem para a outra vida.
É assim que penso, é assim que vibro nestes locais de apaziguamento, ouvindo o chilreio das aves e o murmúrio do vento, até porque, por definição, o tempo inglês é instável.


E chega por hoje, vamos viajar amanhã até Swanage, no Dorset, é lindo de morrer, vamos visitar o historiador Ben Buxton. Depois eu conto, até porque andei num velho comboio decorado à moda dos anos 1950.
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13517: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (4): "Carta aberta às vítimas da descolonização”, por Jacques Soustelle

Guiné 63/74 - P13536: Parabéns a você (779): Jaime Machado, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2046 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 25 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13531: Parabéns a você (778): Manuel Carmelita, ex-Fur Mil Radiomontador do BCAÇ 3852 (Guiné, 1971/73)

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13535: Blogoterapia (260): A minha toca (Ernesto Duarte, ex-Fur Mil da CCAÇ 1421)

1. Mensagem do dia 13 de Agosto de 2014, do nosso camarada Ernesto Duarte (ex-Fur Mil da CCAÇ 1421/BCAÇ 1857, Mansabá, 1965/67):

Tenham coragem
Leiam até ao fim
É um pedido


A MINHA TOCA

Sou serrenho
Nasci na serra
Numa toca
Não na grandeza de uma caverna
Habitada por homens superiores
Tinha como vizinhos
As raposas astutas
Passava o Sr. Melro
Sempre impecavelmente vestido
No seu fato preto de alta pena
Lá mais ao longe voava a cotovia
Também cantava o rouxinol
Bebia água pura com sabor a champanhe
No riacho ao lado passeavam-se peixinhos
Cantavam as rãs e os sapos
Os corvos também apareciam, com o seu mistério
Comia frutos silvestres com as aves e as abelhas
Colhia das árvores as frutas com que me banqueteava
Em noites de trovoada, eram lindos os desenhos feitos com os relâmpagos
Em noites calmas, ouvia-se o gemido do mocho e da coruja
Nas noites em que o vento dava concertos
As árvores dançavam loucamente
Qual artistas de cabarés de elite
Ou mesmo como nos palcos dos bailados
Mas a fama do império chegou à minha toca e eu tive que partir
A desilusão não conta
Voltei mais louco
Perdi-me
Iludi-me não voltei à minha toca
Fiquei numa gaiola normal e modesta
Havia gaiolas de luxo
Havia até gaiolas douradas
Todas tinham porta com fechadura
Também havia jaulas com celas
Tinham presos por que tinham falado
As gaiolas hoje são em excesso
Há carência de jaulas
Há tanta gente que fala, fala e não esta preso
Gostava que não fosse assim
Vou voltar a procurar a minha toca sem porta
A minha gaiola com porta e fechadura
Onde criei o meu mundo e dos meus
Foi assaltada
Foi devassada
Não ficou nada de valor
Nada com valor moral
A porta e a fechadura da gaiola alta palavra em tecnologia
Vou voltar à minha toca
Aos meus antigos vizinhos
Riam-se da caricatura da mensagem!
Mas pensem pelo menos uma vez
No quanto estão inseguros
E o valor que as vossas coisas têm e que se não apercebem
Não quero lançar o medo
Não! Isso nunca!
Mas quem sabe pode haver uma coisita a fazer e fazerem e assim, não terem razões para dizerem, casa roubada tranca na porta!

Um grande abraço a todos
Ernesto Duarte
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13521: Blogoterapia (259): Mensagem de agradecimento de Rui Alexandrino Ferreira à tertúlia, a propósito do lançemento do seu último livro "Quebo - Nos confins da Guiné" e da passagem do seu 71.º aniversário

Guiné 63/74 - P13534: Estórias do Juvenal Amado (52): Portugal, fábrica de soldados

1. Em mensagem do dia 20 de Agosto de 2014, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos um texto dedicado ao Portugal dos anos 60 e 70, à época autêntica fábrica de soldados.


ESTÓRIAS DO JUVENAL

52 - FÁBRICA DE SOLDADOS

Uma das recordações que tenho daquele tempo prende-se com os comboios.
Comboios diferentes dos de agora. Diferentes no uso, nos passageiros e na função para a qual tinham sido requisitados. Falo dos especiais para militares, sempre a abarrotar de fardas verdes e boinas castanhas, que cruzavam de Norte a Sul o nosso país, para fins-de-semana e regressos aos quartéis, mas também dos transportes para os embarques. Esses eram menos visíveis, pois saíam dos centros onde se formavam os batalhões directos sem paragens, a meio da noite e iam descarregar a sua carga humana em Sta Apolónia ao amanhecer .

Eu esperava o meu no Valado dos Frades, terra produtora de produtos hortícolas, artigos de faiança e porcelanas (*) a meia dúzia de quilómetros de Alcobaça e outro tanto da Nazaré, estância balnear frequentadas por nós naqueles anos, no meu caso desde criança.

De comboio até à idade da tropa, viajei esporadicamente para Lisboa e regresso. Bem diferente foi o meu conhecimento com esse meio de transporte após a incorporação.
Fui para Coimbra e posteriormente para o Porto neles. Eram comboios modernos vulgo automotoras, em que a 2.ª classe era ocupada pelos praças, a 1.ª por oficiais e sargentos numa divisão hierárquica imposta pelas leis militares.

Nos cais de embarque ficavam muitos familiares e namoradas a ver-nos partir normalmente com um até ao próximo fim-de-semana. Era assim que me despedia dos meus, até nas vésperas do embarque eu mantive o “até para a semana” já sabendo que essa semana seria dali a muito tempo.

Mas quando saí do Porto na direcção de Abrantes conheci outro tipo de composições ferroviárias que pareciam ter recuado no tempo até ao do Século XIX após a vila do Entroncamento no seu cadenciar tipo “muita terra pouca terra”. Desconfortáveis pois tinham bancos de madeira, lentos, paravam em todas as estações e apeadeiros para além de raparmos um frio danado.

Logo no dia que fui transferido com mais camaradas condutores e uma dúzia de soldados de Pel Rec, rumamos a Abrantes findas que foram as respectivas especialidades, levamos uma noite inteira para chegar ao nosso destino. Saindo da orla costeira parecia que mergulhávamos noutro país facto que vim a comprovar nas horas que levava a chegar a Sta. Margarida bem com a sair de lá.
Mas os comboios passavam sempre a abarrotar de soldados, muitos deles nunca tinham visto o mar, encheriam pouco depois os porões de navios rumo à Guiné, Angola e Moçambique a sabor da incerteza. Portugal parecia dormente, aceitava esse fardo como se fosse cumprir um destino e os pais, viam partir os filhos esperando pelo seu regresso sãos e escorreitos. Cada um guardava a sua própria dor, que não se podia medir, nem pesar, nem comparar.

Quando embarquei já milhares de jovens tinham embarcado antes de mim durante os 10 anos de guerra, entre eles o meu irmão mais velho seis anos que eu. Parecia que o país não se esgotava. Na verdade naquele tempo, Portugal mais parecia uma fábrica de soldados.

Um abraço
Juvenal Amado
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(*) - N.A. O valado dos Frades pertence ao concelho da Nazaré, mas na verdade Alcobaça também sente essa vila como sua. Os seus campos agrícolas misturam-se com os da Cela e a ligação com o tipo de indústria, reforça os laços que nos unem. Muitos de habitantes dessa hoje vila, trabalhavam em Alcobaça e a própria fábrica de porcelanas SPAL, é como o nome indica uma emanação da nossa proximidade.

Recruta - CICA 4

Juramento de Bandeira

Partida para Sta. Margarida

Abrantes - Já mobilizado
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de Maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13104: Estórias do Juvenal Amado (51): Amendoins e bajudas, cheiros antigos

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13533: "Francisco Caboz", um padre franciscano, natural de Ribamar, Lourinhã, na guerra colonial (Horácio Fernandes, ex-alf mil capelão, BART 1913, Catió, 1967/69): Parte VII: (i) A ideia peregrina de adotar um criança, de cinco anos, filha de um soldado algarvio e de uma mulher fula, uma "filha do vento" (ii) gozo de licença de férias na metrópole; (iii) colocação, em maio de 1969, no batalhão de Bambadinca, antes de acabar a sua comissão, de rendição individual...


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS / BART 2917 (1970/72 > A parada do quartel de Bambadinca, a capela (que servia também de casa mortuária...) e, à direita, a secretaria da CCAÇ 12 (1969/74). O Horácio Fernandes, nas suas memórias da Guiné, diz que esteve aqui, como capelão de maio a dezembro de 1969. Mas a malta desse tempo não se lembra dele...

Foto: © Benjamim Durães (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG)


Guiné-Bissau > Região de Baftá > Bambadinca > Março de 2007 > O anterior da capela onde, entre outros, rezaram missa capelães como o Horácio Fernandes (CCS/BCAÇ 2852, maio/dezembro de 1969) o Arsénio Puim (CCS/BART 2917, 1970/71).

Foto: © Carlos Silva (2007). Todos os direitos reservados.



1. Continuação da publicação do testemunho do nosso camarada, o grã-tabanqueiro Horácio Fernandes.que foi alf mil capelão no BART 1913 (Catió, 1967/69) (*)

[ Horácio Fernandes: foto à esquerda  tirada pelo nosso saudoso Victor Condeço, 1943-2010, que foi fur mil mecânico de  armamento, CCS/BART 1913].

Esse tstemunho é um excerto do seu livro autobiográfico, "Francisco Caboz; a construção e a desconstrução de um padre" (Porto: Papiro Editora, 2009, pp. 127-162). O livro já aqui foi objeto de recensão crítica por parte do nosso camarada Beja Santos.

O Horácio Fernandes (n. 1935, Ribamar, Lourinhã) vive há 4 décadas no Porto. Vestiu o hábito franciscano, tendo sido ordenado padre em 1959. Deixou o sacerdócio no início dos anos 70. É casado, tem 3 filhos. Está reformado da Inspeção Geral de Educação onde trabalhou 25 anos na zona norte. Em 2006 doutorou-se em ciências da educação pela Universidadfe de Salamanca, Espanha.

Francisco Caboz é o "alter ego" do Horácio Fermandes. O livro começou por ser uma tese de dissertação de mestrado em ciências da educação, pela Univeridade do Porto, Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, (1995): Francisco Caboz: de angfélico ao trânsfuga, uma autobiografia (147 pp.) (A tese de dissertação, orientada pelo Prof Doutor Stephen R. Stoer, já falecido, está aqui disponível em formato pdf).

Nesta VII  parte (pp. 155-158), o autor aborda sucintamente 3 pontos:  (i) a sua " ideia peregrina" de adotar um criança, de cinco anos, filha de um soldado algarvio e de uma mulher fula, uma "filha do vento";  (ii) gozo de licença de férias na metrópole; e (iii) colocação, em maio de 1969, no batalhão de Bambadinca [, BCAÇ 2852], antes de acabar a sua comissão, de rendição individual...

O Horácio Fernandes não identifica o batalhão de Bambadinca. Mas em maio de 1969, quem lá estava, em Bambadinca, no setor L1, zona leste, era o BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70). E se assim é, ele e eu estivemos no mesmo sítio, ainda alguns meses, sem nunca nos termos cruzado e reencontrado...O nosso capelão terá pelo menos conhecido o Xime (e possivelmente Mansambo, Xitole e Saltinho), além de Bambadinca,  Bafatá e Nova Lamego... Faz referência a colunas logísticas que iam aos diferentes aquartelamentos do setor L1.

Eu e o Horácio somos parentes, pertencemos ao clã Maçarico, de Ribamar, Lourinhã: a minha bisavó paterna e o seu bisavô paterno, nascidos por volta de 1860, eram irmãos. De qualquer modo, eu deixei de ter contacto com ele por volta dos meus 12 anos...

Foi o nosso camarada e amigo Alberto Branquinho quem descobriu o paradeiro do seu antigo capelão . Tenho a autorização verbal do autor, dada por altura do nosso reencontro, 50 anos depois da sua missa nova (em 15 de agosto de 1959, em Ribamar, sua terra natal), para reproduzir esta parte do livro, relativa à sua experiênciade como capelão militar na Guiné, muito marcante e decisiva para o seu futuro como homem e como padre. (LG)


Férias na metrópole e colocação em Bambadinca, em maio de 1969...









(Continua)
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P13532: Notas de leitura (626): Mário Soares e a descolonização da Guiné (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Fevereiro de 2014:

Queridos amigos,
O historiador David Castaño é autor de um livro recente sobre o papel de Mário Soares na revolução portuguesa.
No artigo ora em análise, Castaño procede a exame o ideário dos oposicionistas ao regime de Salazar e a evolução operada em Soares sobretudo após a criação da Ação Socialista Portuguesa.
Descreve os equívocos, ilusões e crispações vividos logo no arranque do I Governo Provisório e como foi evoluindo o sentir da descolonização da Guiné, negociações que Soares acompanhou do princípio ao fim e que foram, aliás, as únicas negociações em que Soares agiu como principal negociador português.

Um abraço do
Mário


Mário Soares e a descolonização da Guiné

Beja Santos

A revista Relações Internacionais R:I publicou no seu número de setembro de 2012 o artigo intitulado “Abrindo a Caixa de Pandora: Mário Soares e o início da descolonização”, por David Castaño, investigador do ISCTE e do IPRI, doutor em História Contemporânea e autor do livro “Mário Soares e a Revolução”, Publicações Dom Quixote, 2013. Dá-nos uma grande angular da evolução do pensamento de Soares acerca da do património colonial, clarifica o confronto entre Soares, ministro dos Negócios Estrangeiros e Spínola, presidente da República, e descreve toda a intervenção de Soares na descolonização da Guiné, aliás a única em que interveio.

Primeiro, em 1960, Soares é um dos redatores do Programa para a Democratização da República, documento que registava o ideário da oposição “democrática, republicana, liberal e socialista”. No tocante à política ultramarina, este sector de oposição reclamava “a imediata institucionalização da vida democrática, sem discriminação racial ou política, para todos os territórios e todos os povos”. Indicavam-se várias medidas destinadas à criação de elites locais, entre outras. Ou seja, estava-se ainda longe de falar em autodeterminação e de independência. A proposta foi rapidamente ultrapassada com os acontecimentos de 4 de fevereiro de 1961, em Angola. Neste novo contexto, estes oposicionistas defendiam que o problema ultramarino era essencialmente político, havia que “reencontrar na paz – nunca na guerra – o caminho do diálogo entre as populações”. Um segmento expressivo da oposição cerrou fileiras em torno da defesa da África portuguesa. O livro de Frantz Fanon, entretanto, abalava as gerações mais jovens, a guerra da Argélia tornava-se-lhes claro que chegara a hora de dar um novo rumo às colónias. A Ação Socialista Portuguesa, a partir de 1964, condena política colonial da ditadura, reclama “o direito à autodeterminação e à independência das populações submetidas à nossa soberania”. Em 1970, numa conferência em Nova Iorque, Soares defendeu que a democracia era “incompatível com o prosseguimento da guerra colonial, e defende o fim da guerra". Estas declarações foram um dos motivos que o conduziram ao exílio.

Segundo, à chegada a Lisboa, na Estação de Santa Apolónia, Soares declarou que uma das prioridades imediatas passava por assegurar o “respeito pelos princípios de autodeterminação”, referiu-se aos contactos que durante o exílio tivera com líderes dos movimentos africanos alertou para o perigo do desenvolvimentos de movimentos separatistas brancos. Spínola pede-lhe para efetuar uma viagem pelas principais capitais europeias a fim de explicar o sucedido em Portugal. Durante esse périplo, Soares apercebe-se que quase todos os líderes europeus pressionam os contactos com os movimentos de libertação. Já ministro dos Negócios Estrangeiros, reúne-se com James Callaghan, primeiro-ministro da Grã-Bretanha. Castaño escreve: “Soares defendeu que a prioridade era a Guiné. Era necessário alcançar um cessar-fogo, separar a questão de Cabo Verde e preparar-se a realização de um referendo quando se realizassem as eleições em Portugal. Em sua opinião, Portugal não podia reconhecer imediatamente a Guiné-Bissau pois não existia um mandato popular nesse sentido já que o Governo em funções tinha origem num golpe militar, pelo que só depois de realizadas eleições em Portugal e consultados os guineenses se poderia dar esse passo”.

Tinham-se iniciado em Londres negociações com uma delegação do PAIGC, Soares acreditava que se ia conseguir um acordo de cessar-fogo, a troca e a libertação de prisioneiros, estabelecer-se-ia a retirada de tropas portuguesas e alguns pontos do território, seguir-se-iam negociações para implementar o princípio da autodeterminação, Soares contava igualmente com a boa vontade da OUA do bloco de Leste. Só que as negociações não evoluíram como o ministro português perspetivara. Os negociadores do PAIGC mostraram-se rígidos, recusaram e consideraram muito grave a proposta de consulta às populações, recordaram que o Estado da Guiné-Bissau já era reconhecido por 84 Estados e que em breve a Assembleia Geral das Nações Unidas podiam admiti a Guiné-Bissau e mais recordaram que a Assembleia Geral já tinha adotado uma resolução em que condenava Portugal pela ocupação ilegal de uma parte do território. As negociações foram interrompidas. No resumo das conversações de Londres, o chefe da delegação do PAIGC, Pedro Pires, anotava que os negociadores portugueses reconheciam que os seus soldados já não queriam combater. A pressão internacional crescia, os países africanos e os países escandinavos defenderam junto de Mário Soares que Portugal deveria reconhecer, sem qualquer tipo de consulta, o Estado da Guiné-Bissau. Mas Spínola mantinha-se intransigente, queria a realização de consultas populares. E Soares parte para Argel, o PAIGC mantém a sua postura intransigente. Soares mudara entretanto de posição, ele que se revelara defensor da realização de um qualquer tipo de consulta, mesmo para o caso guineense, deixava claro que passara a ser partidário do reconhecimento imediato da Guiné-Bissau. “Numa reunião dos ministro dos Negócios Estrangeiros dos países da NATO, realizada em Otava, nos dias 18 e 19 de junho, Soares informou Callaghan que o caso guineense era peculiar e que a independência poderia vir a ser alcançada sem a realização prévia de uma consulta popular”. Soares reúne-se com Kurt Waldheim, secretário-geral da ONU, e expõe-lhe francamente as diferentes posições em jogo, Waldheim defendeu que se devia fazer uma distinção entre a situação da Guiné-Bissau que já tinha a independência reconhecida.

Terceiro, é a descolonização e as suas vias possíveis que vai precipitar a crise política que levará à queda do primeiro-ministro, Palma Carlos, defensor da aprovação de uma constituição provisória que claramente reconhecesse o princípio do direito à autodeterminação. Os acontecimentos sucediam-se em turbilhão, Waldheim é confrontado com o pedido de adesão da Guiné-Bissau às Nações Unidas, Soares é informado pelos mais variados canais diplomáticos que a maioria esmagadora dos Estados aprova a ideia. O MFA da Guiné intervém, no início de julho aprovara uma moção em que se defendia que “a realidade político-social da República da Guiné-Bissau e do PAIGC” não era “compatível com o seu enquadramento nos limites de uma autodeterminação pela via de um referendo ou qualquer outro processo semelhante”, exigia-se que o Governo português reconhecesse “imediatamente e sem equívocos a República da Guiné-Bissau e o direito à autodeterminação e independência dos povos de Cavo Verde”. Spínola apercebe-se que não tem margem de manobra e promulga a Lei 7/74, que irá ficar a ser conhecida como a lei da descolonização. No início de Agosto, Waldheim chega a Lisboa. No comunicado final da visita, o Governo português declarava-se pronto a reconhecer a República da Guiné-Bissau como Estado independente e disposto a celebrar imediatamente acordos com a República da Guiné-Bissau para a transferência imediata da Administração. A 8 de agosto as negociações foram retomadas em Argel e no dia seguinte os representantes de Portugal e do PIAGC alcançaram um protocolo de acordo. A 26 de agosto, novamente em Argel, assinou-se o acordo e ficou agendado para 10 de setembro o reconhecimento da Guiné-Bissau.

Estas foram as únicas negociações em que Mário Soares agiu como principal negociador português. A partir de julho, com a chegada do major Melo Antunes ao governo como ministro responsável pela descolonização, o MFA tomou as rédeas do processo.
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13524: Notas de leitura (625): “Che Guevara: La clave africana, Memorias de un comandante cubano, mebajador en la Argelia postcolonial”, por Jorge Serguera (Papito) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P13531: Parabéns a você (778): Manuel Carmelita, ex-Fur Mil Radiomontador do BCAÇ 3852 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13529: Parabéns a você (777): António Fernando Marques, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 12 (Guiné, 1969/71)

domingo, 24 de agosto de 2014

Guiné 63/74 - P13530: Efemérides (173): Romagem anual ao Cemitério de Lavra / Matosinhos, de homenagem aos combatentes mortos na Guerra do Ultramar, levada a efeito no passado dia 8 de Agosto de 2014

ROMAGEM AO CEMITÉRIO DE LAVRA DE HOMENAGEM AOS COMBATENTES LAVRENSES MORTOS NA GUERRA DO ULTRAMAR

8 DE AGOSTO DE 2014

No dia 08 de Agosto de 2014, realizou-se em Matosinhos, na localidade de Lavra, a tradicional romagem anual ao cemitério em homenagem aos combatentes lavrenses mortos na Guerra do Ultramar.

A cerimónia foi promovida pelo Núcleo de Matosinhos, em colaboração com a Junta da União das Freguesias de Perafita, Lavra e Santa Cruz do Bispo.

Pelas 11H00, após concentração dos participantes, do porta guião do Núcleo e, de um clarim, caixa de guerra e uma secção tudo da Escola Prática dos Serviços, deu-se inicio à cerimónia com o hastear da bandeira nacional seguido da deposição de uma coroa de flores no memorial em frente ao edifício daquela localidade pelos Presidentes da Junta e da Mesa da Assembleia Geral do Núcleo.

 Momentos que antecederam o hastear da Bandeira Nacional

Força presente nas cerimónias

Coroa de flores depositada no memorial em frente ao edifício daquela localidade pelos Presidentes da Junta e da Mesa da Assembleia Geral do Núcleo.

Posteriormente, os participantes seguiram em romagem ao cemitério local em marcha cadenciada pela caixa de guerra, acompanhando o porta guião do Núcleo e a força militar.

 Deslocação para o cemitério local. Como Porta-Bandeira o camarada Amorim

Pelas 11H15, já no cemitério junto ao Panteão onde se encontram os lavrenses que tombaram pela Pátria e dando continuidade ao programa traçado, foram proferidas alocuções alusivas ao ato pelos: Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Núcleo, Sr. Ribeiro Agostinho e pelo Presidente da Junta da União das Freguesias de Perafita, Lavra e Santa Cruz do Bispo, Sr. Rodolfo Mesquita.

Ex-combatentes da Guerra do Ultramar e Força Militar presentes

O Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes, ex-combatente Ribeiro Agostinho, na sua intervenção

Presidente da Junta da União das Freguesias de Perafita, Lavra e Santa Cruz do Bispo, Dr. Rodolfo Mesquita, no uso da palavra

Concluídas as intervenções, foi iniciada a homenagem aos mortos com a deposição de uma coroa de flores, no referido Panteão, pelos dois representantes, continuando com os respetivos toques de homenagem aos mortos e na altura do minuto de silêncio, foi proferida uma prece pelo sócio combatente, Sr. Abel Moreira dos Santos.

Deposição de uma coroa de flores no Panteão existente no cemitério de Lavra pelo Dr. Rodolfo Mesquita e pelo ex-Combatente Ribeiro Agostinho

O ex-combatente Abel Santos que teve a seu cargo a prece.

Por último, foi cantado o Hino Nacional.

Terminada a cerimónia, foi servido um porto de honra no Polo da União de Freguesias a todos os participantes, onde, num ambiente de franco convívio e camaradagem, foi oferecido ao Presidente do executivo da União de Freguesias uma lembrança do Núcleo, materializando-se assim a continuidade da excelente parceria entre as duas instituições.

O Porto de Honra.

Momento da entrega de uma lembrança pelo ex-Combatente Ribeiro Agostinho, Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes, ao DR. Rodolfo Mesquita, Presidente da Junta da União das Freguesias de Perafita, Lavra e Santa Cruz do Bispo

Texto e fotos: Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13494: Efemérides (172): Ainda o Naufrágio no Rio Geba em 10 de Agosto de 1972, aflorado no P10246

Guiné 63/74 - P13529: Parabéns a você (777): António Fernando Marques, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 12 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 22 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13523: Parabéns a você (776): Carlos Cordeiro, ex-Fur Mil Inf (Angola) - Grã-Tabanqueiro, Prof. Universitário em Ponta Delgada, e J.L. Vacas de Carvalho, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2206 (Guiné, 1969/71)