quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14173: Historiografia da presença portuguesa em África (52): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte IV (Mário Vasconcelos): Há, pelo menos, 6 comerciantes libaneses em Bafatá: Jamil Heneni, Toufic Mohamed, Rachid Said, Fouad Faur, Salim Hassan ElAwar e irmão











Fotos: © Mário Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


1. Mais anúncios de casas comerciais, da Guiné, que foram publicados  em Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2. (*)

Desta vez fizemos uma seleção dos estabelecimentos abertos em Bafatá... Há surpresas curiosas: já havia, na época,  telefone!... Há pelo menos um empresário com telefone, o Fausto da Silva Teixeira, dono de um serração mecânica, fundada em 1928.  Em Bafatá, deveria ter os escritórios e a residência. As serrações deveriam ser em Fá e em Banjara. [Haveremos de descobrir mais tarde que este homem foi deportado, sem julgamento, para a Guiné em 1925, no final da I República. alegadamente por pertencer ao Partido Comunista Português.]

Todas as caixas comercias têm caixa postal e endereço telegráfico. 

Por outro lado, há um comércio diversificado e até especializado: o Abílio Carvalho Vieira, na sua loja, têm uma secção de produtos farmacèuticos, e a pensão e restaurante Bafatá, além dos pratos regionais e cozinha transmontana (!), oferece "os melhores whiskys (sic) e cervejas geladas" no seu serviço de bar...

Há, pelo menos, 6 comerciantes libaneses em Bafatá, em 1956: 

(i) Jamil Heneni, com grandes plantações de arroz em Jabadá [e não Janbanda], na região de Quínara [, mais um imperdoável  gralha!]; 

(ii) Toufic Mohamed [ou não seria Taufic ? Muitos dos anúncios vêm gralhados;: por ex, Bambadinga, em vez de Bambadinca, Bajicunda em vez de Bajocunda; o que quer dizer a toponímica da Guiné era "estranha" aos nossos jornalistas e tipógrafos...];

(iii) Rachid Said

(iv) Salim Hassan ElAwar e irmão (com sede em Bafatá e filial em Cacine, e não Canine, como aparece no anúncio: mais uma gralha tipográfica a juntar-se a muitas outras desta edição especial da revista de Turismo...); há um membro da família, presume-se, Mamud ElAwar, que era um conceituado comerciante de Bissau;

(v) Fouad Faur, com lojas também em  Piche,  Paunca, Bajocunda e Bambadinca.

Outro comerciante de Bafatá, com boa implantação no leste, era o Adelino A. Esteves, com filiais em Canquelifá, Saré Bacar e Cambaju.

Pela quantidade de anúncios publicados neste nº especial da revista, metropolitana, Turismo, dedicado à província portuguesa da Guiné) (*), parece que quase toda a gente quis "aparecer na fotografia".

Não sabemos se as grandes casas comoa  Gouveia  e a Ultramarina também aparece neste "mostruário" das "forças vivas" da colónia, e nomeadamente as da esfera económica, constituída por  pequenos comerciantes e empresários, de origem metropolitana, caboverdiana e libanesa.

 Como temos vindo a observar, estes anúncios (que nos chegaram às mãos através do nosso camarada Mário Vasconcelos) são um preciosidade, pelas inesperadas informações que nos trazem de lugares que muitos  de nós conhecemos e cuja prosperidade económica, mesmo que relativa, vai ser posta em causa (e em muitos casos destruída) com o início da guerra, iniciada em Tite, na região de Quínara, em 23 de janeiro de 1963, vai fazer amanhã 52 anos!


 [Foto à acima: Mário Vasconcelos, ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, e Cumeré, 1973/74]

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 21 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14169: Historiografia da presença portuguesa em África (48): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte III (Mário Vasconcelos)

Guiné 63/74 - P14172: Parabéns a você (849): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67)

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Nota do editor

Último poste da série de 21 Janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14168: Parabéns a você (848): João Graça, Amigo Grã-Tabanqueiro, Médico e músico que já visitou e trabalhou na Guiné-Bissau

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14171: Memórias de Gabú (José Saúde) (51): Sexo em tempo de guerra, memórias inegáveis. Tabu?

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua fabulosa série.

As minhas memórias de Gabu

Sexo em tempo de guerra, memórias inegáveis
Tabu?

Indolente, obesa e com um falar melodioso a mulher grande impunha respeito à plebe que por norma a rodeava. A sua tabanca, simples e despida de preconceitos, situava-se entre o quartel novo, onde estava instalada a CCS do BART 6523, e Nova Lamego. Um passeio noturno da rapaziada levava o pessoal a uma visita espontânea à mulher grande.

Noites que procediam ao recebimento do fresco pré eram, normalmente, sinais evidentes para uma emboscada – sem armas pesadas apontadas ao IN ou de fogo cruzado entre as frentes em combate - dos soldados à porta da idosa senhora.

É do conhecimento geral, e não vamos escamotear a inadiável realidade porque se reconhece que o contraditório de opiniões existentes obedece a uma profunda vénia e consequente reflexão, que o sexo foi sempre uma evidente prática comum entre os seres viventes.

Desde os primórdios da humanidade que o ato se pratica em toda a sua extensão. Segundo relatos primários da Religião Cristã, Adão e Eva assumiram o sexo, ainda que virtualmente escondido sob o paladar de uma maçã, mas que no momento de calor e compaixão uniram os seus órgãos genitais e consumaram uma relação sexual.

Neste contexto, importa assumir o ato com frontalidade e não optar pela surdez, procurando o eventual pecador (?) espontâneo imitar a velha avestruz num austero deserto Australiano: ou seja, esconder a cabeça na areia para passar como um ser imaculado!

Os tempos de guerra, prova-se cientificamente, são propícios a encontros amorosos, embora estes se submetam a um clímax instintivo e de uma ocasião efusiva. A guerra do ex-Ultramar não passou incólume a desvarios praticados e não assumidos. A Guiné não foi um caso à parte.

Em Nova Lamego, independentemente de encontros afetivos debaixo de um silêncio colossal, havia quem fizesse render as aventuras de jovens em plena ascensão sexual a troco de patacão. Os pesos (escudos) na Guiné eram bênçãos divinas.

Na minha conceção, embora discutível, admito que o ato sexual praticado pela mulher não passava exclusivamente por uma mera venda do corpo mas pela maneira mais subtil em realizar uns magros pesos para sustentar inadiáveis compromissos familiares. Aliás, os “Filhos do Vento”, uma temática por mim levantada, sintetiza esta irreversível veracidade que nós muito bem conhecemos.

Negócio? Não! Isso eram compromissos de gentes feitas com o sistema. A mulher grande que eu conheci em Gabu tratava o assunto com uma ligeireza quiçá perversa. “Arranjava” bajudas e a malta despejava os seus espermatozoides em vaginas dilaceradas pelos muitos serviços prestados. Consequências? Tudo era tabu! Há quem se refugie numa mítica opção tentando a todo o custo tapar o sol como uma peneira.

Tímidos e envergonhados alguns camaradas afirmavam que voltaram virgens daquelas longínquas paragens africanas. As mãos arrogaram-se às brincadeiras de putos, advogam os mais incautos . Parafraseando um velho político, num momento áureo da Revolução de Abril, dizia ele para o camarada ao lado: “Olhe que não!”…

Não constringiremos cenas passadas. Verídicas! Assumo que não fui imaculado. Hoje, tal como sempre, dou a cara e falo abertamente de um assunto que tende cair no limbo do esquecimento. Deixo em prosa uma etapa da vida que não me passou ao lado. Pratiquei atos sexuais, sim senhor, como tantos outros camaradas de armas em terras guineenses.

Afirmo, com segurança, que numa noite quente, como era hábito, eu e outro camarada, furriel miliciano da minha Companhia, ousámos desafiar a escuridão da tabanca e fomos parar junto a um casal de idosos que gentilmente nos recebeu propondo-nos, de seguida, uma visita à casa do lado, onde uma bajuda feita a espontâneos favores sexuais nos recebeu. Aceitámos.

Discutimos os custos, acertámos o valor e, isoladamente, lá fomos fazer o respetivo serviço. Depois de pagarmos e no meio de uma franca cavaqueira apareceu-nos a bajuda, aquela que tinha saciado os nossos eternos anseios carnais, com uma deficiência descomunal numa das pernas. Infelizmente era coxa.

Ressalve-se, porém, que a rapariga era de facto bonita mas as contingências da vida carimbou-a com um enorme defeito físico. Olhámos um para o outro e em mansinho comentámos: “A nossa amante foi mesmo esta bajuda? Muito bem, o serviço está feito e nada a comentar”, ficou a experiência.

Chegados ao quartel, como era hábito, tomámos um delicioso banho com água barrenta e introduzimos na uretra do pénis uma milagrosa pomada que, ao que tudo indicava, queimava o mais atrevido intruso verme que, ocasionalmente, procurava poiso numa outra superfície humana até então desconhecida.

Numa outra noite e com a luz ténue de uma lamparina a gasóleo já à meia haste, fui ter com a mulher grande e perguntei-lhe se por acaso havia bajuda nova: a mulher já experiente nestas andanças e com um olhar vazio, olhou-me de alto a baixo e atirou-me com esta: “ei furrie você é comando… manga di mau”.

Sinceramente não me apercebi da sua ligeireza ao detetar no camuflado os dísticos que sempre transportava na farda. Acalmei-a e disse que era na verdade ranger, não comando, mas mau… nunca. Coloquei em solene a minha forma de ser e a cordialidade que sempre marcou a minha amizade para com o próximo. A conversa prolongou-se e às tantas, e num repente, a mulher grande brindou-me com o meu desejo. Ficou a certeza que outros anseios se seguiram.

De outros encontros imaginariamente amorosos ressalta também uma visita ao bairro do Pilão, em Bissau. Vagueando entre a imprevisibilidade de ruelas apertadas de tabancas nada iluminadas, algumas completamente às escuras, acompanhado de um velho amigo, desafiei o imprevisto e fui ao encontro dos imortais desejos sexuais.

Confesso que cheguei a temer a aventura. Passaram por nós homens negros, altos, de túnicas compridas, enfim, silhuetas que a determinada altura nos levaram a duvidar da fartura. Cumprimentávamos e eles, simpaticamente, respondiam. Tudo ok, comentámos.

O Pilão era um bairro dos subúrbios de Bissau onde a malta da metrópole por norma não passeava. A noite tinha um cunho arrojado. A palavra passava e os tropas arrepiavam caminho.

Todavia, ousei desafiar essa perigosidade e encontrei uma jovem mulher de corpo descomunal, a quem me entreguei por alguns momentos de delírio sexual. Paguei e aventura terminou aí. Nunca mais a vi!

Concluindo: Porquê escamotear verdades de jovens entregues a elementares gostos sexuais procurando, nalguns casos, tentar passar isento a constrangimentos entretanto criados? Tabu? Ou consequências lógicas dos nossos verdes anos e de uma guerra entretanto inacabada?

Ficam as perguntas avulsas para uma eventual troca de opiniões.

Resenha final: ASSUMAMOS! Deus fez o homem e a mulher e projetou os dois seres com um fim comum: AMAR E… PROCRIAR.

Um abraço camaradas, 
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 


Guiné 63/74 - P14170: Manuscrito(s) (Luís Graça) (43): Um dia hei-de ir a Porto Azzurro

Um dia hei-de ir a Porto Azzurro

por Luís Graça (*)

De Piombino a Porto Azzurro,
no encalce de Napoleão,
o pequeno e genial corso
que ajudou a construir
a Europa das Nações.

Ah!, que ingratos
os tecnocratas de Bruxelas
que alimentam sonhos imperiais,
que nada sabem de história
e que não te puseram na lista dos pais-fundadores,
com direito a pensão vitalícia
e outras mordomias reais!

Que serias tu, bela Itália,
sem o safado parteiro da Europa
e os seus canhões ?
E tu, Garibaldi,
mais os teus descamisados,
e os teus pernetas,
como chegarias a Nápoles e a Palermo,
para conquistar o último Reino das Duas Sicílias ?

Na ilha de Elba, estudo estratégia
que é a arte do general,
do capo,
do condottiere,
do conquistador.
E observo o preclaro voo dos pássaros,
que não têm bússola,
nem GPS,
nem telemóvel,
nem o Google Earth,
e que nunca se perdem
entre o alfa e o ómega,
o norte e o sul,
o leste e o oeste.
Pelo menos não conheço
nenhum brevet de piloto ornitológico.

Nove meses é o tempo suficiente
para se nascer e se morrer,
entre a ilha de Elba e a estação de Waterloo.
É o tempo ontológico,
o do ser e do saber-ser.
E num só dia dei a volta à ilha,
de bicicleta,
um fait-divers que hei-de pôr
no meu currículo hipocrático.

Move, Europe,
mexe-me a merda desse rabo,
levanta o cu do selim,
põe-me essa mama tesa,
pedala, Europa, velha Europa,
anaconda,
eriçada,
anafada,
encastelada,
cercada,
crispada,
na tua feia fortaleza de Schengen.

Em Porto Azzurro
percebi que pode haver dias felizes
na vida dos homens e das mulheres.
Apaixonei-me pela felina Ornella,
a Muti,
a deusa mediterrânica,
que guardava na Ilha de Monte Cristo
os segredos do amor,
o elixir da vida,
que é breve a vida do espadachim
que há em ti
e que há em mim.

Ainda se podia pressentir,
ao pôr do sol na ilha,
na ponta mais além,
a presença encantatória
do Alexandre Dumas,
romântico ma non troppo,
em recorte subtil,
em versão light.
Que a ficção fica sempre aquém
da vida…

Mas do que eu mais gostei
foi de dançar o Dime la verità
com os guardiões da ilha,
os velhos e as velhas de Seccheto,
quiçá os últimos habitantes,
da velha Europa
que eu amo,
ou da bela e pimba,
divina, pérfida, mafiosa Itália
que me repele e me seduz.
Ele há coisas
que os miseráveis tecnoburocratas de Bruxelas
e os seus lacaios
nunca entenderão.

Em Porto Azzurro,
olhando em redor o mare nostrum,
o mar que já foi nosso,
e as ruínas da minha civilização,
ou o esqueleto do vosso projeto europocêntrico,
estudei filosofia,
fui discípulo do Erasmus,
voltei à escola de Salerno,
reli o seu livrinho de cabeceira
sobre a arte de conservar a saúde
e manter o equilíbrio dos quatros humores,
e percebi, mesmo que por breves instantes,
a importância da ontologia,
que é o tratado que trata
mais do ser do que do ter.
Do ser autêntico,
sem jantes
nem implantes.

Luís Graça
v8 21jan2015
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(*) Com o João Graça (**),

Foto de João Graça (2006), em Porto
Azzurro.  Cortesia  do autor
(**) ELBA > A viagem de Piombino, na costa toscana, a Porto Azzurro, em Elba, faz recordar aquilo que terá sido a deportação de Napoleão, em Maio, mas de 1814. Aqui viveu durante 9 meses, onde partiu rumo a Paris para reconquistar o poder. Mas foi derrotado na famosa baltalha de Waterloo em Junho de 1815. Dizia eu que a viagem, aparte o barco hoje movido a motor, faz recuar a esses tempos. Tempos de definição geo-política europeia. Pelas ilhas selvagens, pelos aves que me giravam em torno, pela vegetação verdejante e inóspita.

Em Porto Azzurro passou-nos pela cabeça a ideia mais iluminada destes dias. A de alugar bicicletas para nos deslocarmos ali. Dito e feito. Ao fim da tarde chegamos à outra ponta para um merecido repouso, depois de um longo caminho que terminava com 4 km a subir. Do lado sul da ilha avistava-se a ilha de Monte Cristo, que serviu de inspiração a Alexandre Dumas. Recordo-me de seguir apaixonado a mini-série "O Conde de Monte Cristo",  com Gerard Depardieu e Ornella Muti. E qual o meu espanto, quando a vejo, diante dos meus olhos, ali, vejo a ilha de Monte Cristo.

O dia, no entanto, estava ainda longe de acabar. Apesar do cansaço físico, e mesmo depois de tanta boa disposição, ainda tivemos pedalada para dançar numa festa popular em Secchetto. Nada sabíamos desta festa. Encontrámo-la por mero acaso. Gente dali, daquela terra longe de tudo, mas cheia de hospitalidade. Dançar com os velhotes música pimba é uma experiência que todos nós já passámos, nalgum dia de Agosto da nossa vida quando se volta à terrinha e se encontram os emigrantes (como eu). Mas dançar o "Dime la verità" com os velhotes de Secchetto é único. Juro-vos...

JonnyGrace [João Graça] > arriverdecci portogallo > 1/6/2006 > Elba

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Nota do editor

Guiné 63/74 - P14169: Historiografia da presença portuguesa em África (51): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte III (Mário Vasconcelos)






1. Mais alguns anúncios de casas comerciais, da Guiné, que foram publicados na revista Turismo, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2.


Tudo indica que, neste nº especial da revista, dedicado à província portuguesa da Guiné) (*), toda a gente tenha querido "aparecer na fotografia". Referimo-nos às "forças vivas" da colópnia, e nomeadamente as da esfera económica, os pequenos comerciantes e demais empresários, portugueses, caboverdianos e libaneses, que operavam na Guiné.
Na amostra de hoje, temos: 

(i) o José Zauad (que, pelo apelido, parece ser libanês),  que tinha estabelecimento comercial em Campeane, na região de Tombali!...

(ii) o Armindo G. Ferreira, estabelecido em Cadique, Catió, também na região de Tombali;

(iii) o José David Doutel, de Cadique. Salancaur, Catió, região de Tombali;

(iv) e, pro fim, o António R. Silva Ribeiro, que seria de Bissorã, e não de Comissorã (mais do que provável gralha tipográfica).

Todos se dedicavam ao "comércio geral: compra e venda de produtos da província"... Em 1956, era já "politicamente correto", escrever-se "província" e não "colónia", como mandava a reforma administrativa ultramarina de 1951.

 Como temos vindo a observar, estes anúncios são um preciosidade, pelas inesperadas informações que nos trazem de gentes e de lugares que vão ser varridos pela guerra, oficial ou oficiosamente iniciada em  Tite, região de Quínara, em 23 de janeiro de 1963...

Refletem, por outro lado,  o clima de relativa tranquilidade e prosperidade em que então se vivia, em 1956... No texto a seguir, apresentam-se alguns dados sobre a economia da época, de acordo com a citada revista Turismo, de jan/fev de 1956. 

O grosso das exportações  (87%, em tonelagem) ía para duas oleaginosas, o amendoim e o coconote. Por outro lado, numa década (1941-1950), as importações passavam de 49 mil contos para 128 mil (um aumento de 260%). As exportações, por sua vez,  passavam, no mesmo período, de  65 mil para 118 mil contos (um aumento de 180%).

[Foto à direita: Mário Vasconcelos, ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, e Cumeré, 1973/74]


Fotos: © Mário Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

Guiné 63/74 - P14168: Parabéns a você (848): João Graça, Amigo Grã-Tabanqueiro, Médico e músico que já visitou e trabalhou na Guiné-Bissau

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Nota do editor

Último poste da série de 19 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P14161: Parabéns a você (847): José Crisóstomo Lucas, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2617 (Guiné, 1969/71) e Manuel Mata, ex-1.º Cabo Apont de Armas Pesadas do Esq Rec Fox 2640 (Guiné, 1969/71)

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14167: Historiografia da presença portuguesa em África (50): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte II (Mário Vasconcelos)













1. Mais alguns das dezenas de anúncios de casas comerciais inseridos na revista Turismo, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2 (nº especial dedicado à província portuguesa da Guiné) (*). 

 Não havia, nessa época, de relativa paz e prosperidade, apenas "comerciantes do mato" (desde Ingoré, na região do Cacheu, a Darsalame, na região de Quínara) que se dedicavam à "compra e venda de produtos da província" (e que eram bem poucos: arroz, mancarra, coconote...). 

Também vamos encontrar, sobretudo em Bissau, casas com bons instalações, e edfícios recentes, que se dedicam ao comércio "por grosso e atacado", de artigos nacionais e estrangeiros, com secções como vestuário (fazendas, camisaria, chapelaria),  mas também  bijuteria, brinquedos, papelaria, etc., como era o caso da casa Salgado & Tomé, em Bissau (foto acima). 

Por sua vez, o A. V. d' Oliveira & Ca. tinha armazém e escritório em Bissau, com filiais em Bafatá, Mansoa, Bissorã, Bula e Cacheu. Também se dedicava ao "comércio geral" e ao "import/export"...

E em Bolama, ficamos a saber que havia A Competidora, de António de Almeida, que importava e vendia sobretudo "materiais de construção", ams também "artigos de papelaria" e "material fotográfico".

Para além do comércio, por grosso ou a retalha, também há pequenas indústrias: é o caso da "serração mecânica" de Manuel de Jesus Morais, "exportador de madeiras", em Bubor, Farim.


[Foto à esquerda: Mário Vasconcelos, ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, eCumeré, 1973/74]

Estes anúncios refletem inegavelmente  o clima de relativa prosperidade económica  e paz, que a província vivia em meados da década de 1950... A partir de 1961 (com os antecimentos em Angola e na Índia Portuguesa) e provavelmente já antes, com os acontecimentos de 3 de agosto de 1959 (no cais do Pidjiguiti), muitos dcstes comerciantes acabam por se retirar das zonas mais isoladas do interior, e fixam-se em Bissau ou regressam à metrópole...

Recorde-se que faz 52 anos, no próximo dia 23 de janeiro de 2015, que se iniciou oficialmente a guerra de guerrilha com o ataque a Tite...


Fotos: © Mário Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

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Guiné 63/74 - P14166: Notas de leitura (672): Do livro "Família Coelho", edição de autor, 2014, de José Eduardo Reis Oliveira (JERO) (4): Como era Alcobaça nos tempos dos primeiros Coelhos

 


1. Do livro, Família Coelho,(*) da autoria do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO) (ex- Fur Mil da CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), aqui fica mais um apontamento, ainda dedicado a Alcobaça.



Parte IV

Que figuras notáveis: - É o tempo de (entre outros) Manuel Vieira Natividade (que nasceu em 1860 no Casal do Rei), do Dr. Brilhante, do Dr. Décio Sanches Ferreira, de António de Sousa Neves. Joaquim Ferreira de Araújo, que em 1878 é o fundador da Companhia de Fiação e Tecidos de Alcobaça, é também figura de destaque na sociedade alcobacense.

Que qualidade de vida: - O estado moral e intelectual da maioria moradores era baixo.
Em geral não eram letrados e o pouco tempo livre, depois das suas duras ocupações diárias, era passado em tabernas.
Quem tinha posses, ou necessidade de viajar, apanhava os carros da Mala Posta, na Rua D. Pedro V. Uma viagem à Batalha, com partida de diligência, frente ao Hotel Alcobacense, demorava duas horas e custava 3.000 réis (3$000).


O Asilo da Infância Desvalida de Álvaro Possolo prestava serviços humanitários e dava assistência às crianças. Desde 1888 funcionava a Associação dos Bombeiros Voluntários de Alcobaça, de que foi 1.º Comandante Manuel Vieira Natividade.



O Hospital da Misericórdia de Alcobaça, inaugurado em 15 de Agosto de 1890, passa por grandes dificuldades económicas em 1900.


Em redor do coreto do “Rossio” já havia 22 candeeiros com luz eléctrica.
Em 30 de Abril de 1899 as gentes de Alcobaça viram passar pela primeira vez um automóvel!

Que hábitos: - Só nas famílias abastadas havia alguma convivência entre senhoras e meninas, através de reuniões em casa de uns e de outros.

Nas classes mais elevadas os homens, depois do trabalho, iam para as boticas e não é difícil adivinhar quem frequentaria os saraus literários, o teatro e os bailes de máscaras.


Nas classes baixas os homens trabalhavam de sol a sol, faziam umas “libações” no “pós-laboral” e seguiam para casa normalmente “entornados” onde os esperavam as mulheres e os filhos, eventualmente candidatos a uns sopapos para “animar” o serão! As mulheres tinham filhos, criavam-nos como podiam e, sempre que tinham algum tempo disponível, “faziam meia“ e juntavam-se para conversar. Para “teatro” bastavam-lhes as “comédias” e os “dramas“ diários, embora um grupo teatral alcobacense – Grupo Dramático Villa Nova – tivesse conseguido grande aceitação junto de uma população menos favorecida mas, nem por isso, menos ávida de conhecimento.

E os nossos COELHOS?

No “moinho do Couto” trabalhava-se bastante. A roda vertical, exterior ao edifício, era movimentada dia e noite, pelo rio.


A moagem funcionava no piso térreo e a habitação era no primeiro piso. No piso térreo, iluminados por uma pequena janela, alinhavam-se quatro pares de mós, duas para o trigo, talhadas em calcário (as alveiras) e duas para o milho, talhadas em granito (as segundeiras)

E nos primeiros anos do novo século chega ao fim a vida do “Casal Fundador". Em 1901 morre a “Avó” ROSA MARIA, de que infelizmente pouco se sabe.)

É o ano em que chegaram a Alcobaça os refugiados boers da Guerra do Transvaal).

E cinco anos depois, em 1906, deixa o mundo dos vivos o Avô Porraditas com 80 anos de idade. Uma vida de trabalho e canseiras iniciada ao som dos assobios dos búzios de barro presos nas espias das velas brancas de linho dos Moinhos de Alqueidão da Serra e terminada junto às águas calmas do Rio Alcoa, em terras de Santa Maria de Alcobaça.


Os “sete magníficos” começam a voar sozinhos, ou melhor, porque são COELHOS ganham direito às suas raízes... enfrentando a vida sem desfalecimentos – a maioria deles à martelada porque... trabalham a arte do ferro... e são bons no seu ofício.

Serralheiros e, nos intervalos, bombistas: Quatro irmãos (o Joaquim, o Zé “Preto”, o Júlio e o António “Russo” ), hábeis serralheiros, com oficina na Rua Frei Estêvão Martins, viveram intensamente os tempos conturbados do assalto ao Quartel em Janeiro de 1919.


A página 137, do livro de Bernardo e Silvino Villa Nova, “Breve História de Alcobaça” é referido que em 11 de Janeiro de 1919, civis armados, auxiliados por oficiais revoltosos de Regimento de Artilharia 1, aquartelado em Alcobaça, tomaram posse do quartel, prenderam o Comandante e alguns oficiais e seguiram para Santarém, principal núcleo do movimento revoltoso.

No dia 13 seguinte, encontrando-se Alcobaça desguarnecida, entrou nela tropa de Infantaria 7, fiel ao Governo, tendo-se seguido a prisão de largas dezenas de pessoas... e até 24 do mesmo mês viveu-se um regime de terror, com violação de domicílios e atropelos vários.

Pois também os quatro irmãos da nossa história e a sua oficina estivaram na mira das forças da ordem de então por terem sido denunciados por inimigos políticos. Eram acusados do fabrico de bombas para a revolução.

Foi um elemento da GNR, que no final da busca, certamente cansado, enfarruscado e desiludido por nada ter encontrado que proferiu a frase que veio a tornar conhecida a oficina dos 4 irmãos:
- Que oficina danada!...


Quanto às bombas elas estavam lá perto, dentro de um cesto que, preso por um arame, estava mergulhado nas águas escuras do Rio Baça que passava nas traseiras da oficina.


Se têm aberto a janela enferrujada das traseiras e puxado o arame estes nossos parentes teriam ido mesmo presos. Parafraseando a histórica expressão do soldado da GNR tiveram uma sorte danada!... O dia a dia da oficina era duro, trabalhando-se de sol a sol, recebendo-se à semana por conta das obras encomendadas.


Vestiam fatos de ganga, fechados até ao pescoço, e protegiam a cabeça com bonés com pala de oleado.

Pela ordem natural das coisas estes nossos COELHOS da primeira Geração vão envelhecendo junto dos COELHOS da segunda geração, que se fazem à vida desfrutando... novos tempos... num Portugal e numa Alcobaça um pouco melhor da que tiveram seus Pais e Avós.
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Notas do editor

(*) Poste anterior de 14 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14149: Notas de leitura (670): Do livro "Família Coelho", edição de autor, 2014, de José Eduardo Reis Oliveira (JERO) (3): Como era Alcobaça em 1890

Último poste da série de 19 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14163: Notas de leitura (671): “O Império da Visão, fotografia no contexto colonial português (1860-1960)”, com organização de Filipa Lowndes Vicente, Edições 70, 2014 (Mário Beja Santos)