quarta-feira, 28 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17520: (De) Caras (80): Maria Sofia Pomba Guerra (1907- c.1970), mais uma "desterrada política", tal como Fausto Teixeira, elogiada pelos históricos dirigentes do PAIGC

1. O nome de Fausto Teixeira parece estar hoje esquecido (espero bem que não esteja proscrito ...), ao não contar da lista dos "antifascistas da resistência"... Pelo menos não aparece na lista das 600 personalidades que constam, como tal,  no respetivo blogue e na respetiva página do Facebook (" notas biográficas de cidadãs e cidadãos que lutaram contra o fascismo e o colonialismo").

Provavelmente falta-lhe um biógrafo ou um "advogado", mesmo que oficioso... Mas o mesmo acontece com outros dos seus companheiros de desventura:  de facto, também não contam dessa lista os nomes de Gabriel Pedro (1898-1972) (igualmente desterrado para a Guiné e depois para o Tarrafal, tal como o seu filho Edmundo Pedro) e de Manuel Viegas Carrascalão (1901-1977) (operário gráfico, anarcossindicalista, preso sob a acusação de bombismo e de pertencer,  tal como Fausto Teixeira e Gabriel Pedro, à "Legião Vermelha", acabando por ser desterrado para Timor em abril de 1927, no navio "Pêro de Alenquer", numa viagem que vai demorar  5 meses, com passagem por Cabo Verde, Guiné, onde desembarcam alguns deles e entram outros, e Moçambique onde é rendido o comandante do navio.). 

Admite-se que, no caso do Fausto Teixeira, a omissão do seu nome  seja  devida, pura e  simplesmente, ao facto de lhe terem perdido rasto, desde que, com 25 anos, foi desterrado para a Guiné, em 1925, não pelo "fascismo" da Ditadura Militar / Estado Novo mas pela I República. 

De qualquer modo, a Guiné e  Timor era dois dos piores sítios do nosso glorioso Império para onde o Estado mandava os desgraçados dos "desterrados políticos", sendo ali entregues à sua sorte. Para este inferno, que eram estas duas colónias, iam em geral os indivíduos de profissões manuais ou, no caso de militares, os soldados e os marinheiros. 

Até no exílio e deportação, todos eram iguais mas uns eram mais iguais do que outros.
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[Foto acima: Maria Sofia Carrajola Pomba  Amaral da Guerra, cortesia do blogue "Silêncios e Memórias", editado por João Esteves]


2. O nome de Fausto Teixeira (ou Fausto da Silva Teixeira] aparece associado ao de Maria Sofia Carrajola Pomba [Amaral da Guerra, por casamento], sobre a qual colhemos as seguintes informações, a partir dessa página do Facebook e outras fontes na Net:

(i) nasce a 18 de julho de 1906, em São Pedro, Elvas, distrito de Portalegre (terra igualmente de uma militante pioneira do feminismo, a médica Adelaide Cabete, 1867-1935);

(ii) licencia-se em Farmácia pela Universidade de Coimbra, no princípio dos anos 30 (no ano lectivo de 1926/27, está no 2º ano, segundo apurámos por conta própria);

(iii)  a partir de meados da década de 30, vai para Moçambique [deve ter sido em 1933:
vd. GUERRA, Maria Sofia Pomba - Dois anos em África / Maria Sofia Pomba Guerra. - : Ed. do Autor, 1935. - XIII, 206 pp.]

(iv) em Lourenço Marques, publica alguns estudos sobre frutos silvestres e produtos exportáveis, é analista no Hospital Miguel Bombarda, lecciona na Escola Primária Correia da Silva, onde tem como aluno o poeta, jornalista e activista moçambicano Rui Nogar (1932-1993);

(iv) terá aderido ao PCP - Partido Comunista Português, em Lourenço Marques, por intermédio de um  ferroviário, o  Cassiano Carvalho Caldas [1915-c..2002/03, ], no final da década de 1930 ou princípios de 1940;

(v) mantém naquela cidade do Índico uma  militância activa, colabora nos jornais "Emancipador" e a "Itinerário", publicação editada entre 1941 e 1955, participa entre 1947 e 1948, na construção de uma estrutura comunista local [Fonte: José Pacheco Pereira, Álvaro Cunhal, vol. 3] e desenvolve, juntamente com Noémia de Sousa, actividades no âmbito do Movimento dos Jovens Democratas Moçambicanos, versão local do MUDJ da metrópole, integrando a direcção;

(vi) em 1949, torna-se na primeira mulher branca a ser presa e deportada para a metrópole: apresentada na PIDE em 23 de novembro de 1949, fica detida em Caxias até 4 de julho de 1950; será então libertada por ordem do Tribunal Plenário de Lisboa, por ter sido absolvida;

(vii) parte a seguir  para Cabo Verde, onde se junta ao marido, médico,  colega de Coimbra [ Platão Zorai do Amaral Guerra] e dali para a Guiné, onde vem a ser proprietária da Farmácia Lisboa;  ensina inglês no Liceu de Bissau (acabado de fundar) [não fica claro se vem para a Guiné como "deportada" ou se de livre vontade...];

(viii) em Bissau, vai procurar reatar a sua actividade política, juntamente com o empresário Fausto Teixeira e o médico Gumercindo de Oliveira Correia: segundo Pacheco Pereira [Álvaro Cunhal, vol. 3];

(ix)  Sofia Pomba Guerra era vigiada pela PIDE (instalada em Bissau a partir de 1957), que sabia que a farmacêutica recebia e fazia circular revistas comunistas francesas e panfletos portugueses, procurando mesmo organizar células comunistas no seio da população trabalhadora urbana (incluindo o incipiente operariado);

(x) o seu apoio, ao embrionário nacionalismo independentista, é reconhecido pelos históricos dirigentes do PAIGC  que não poupam elogios ao seu papel na luta anticolonialista, nomeadamente no auxílio à organização clandestina de reuniões, na prestação de informações relevantes sobre prisões iminentes, como a de Carlos Correia, e na preparação de fugas, como a de Luís Cabral (auxiliado também por Fausto Teixeira);

(xi) está associada, em 1958, à fundação do Movimento de Libertação da Guiné (MLG) (mais moderado que o PAIGC, defendendo uma solução de tipo federalista entre a Guiné e Portugal);

(xii) na sua farmácia trabalham destacados futuros combatentes do PAIGC como Epifânio Souto Amado e Osvaldo Vieira (este, um dos principais combatentes do PAIGC, morto em 1974, mas igualmente suspeito de envolvimento no complô contra Amílcar Cabral que levaria ao seu assassinato em 20/1/1973);

(xiii) Amílcar Cabral [Bafatá, 12/9/1924-Conacri, 20/01/1973], com quem Sofia convive na década de 50, no discurso pronunciado num Seminário de Quadros do PAIGC, efectuado entre 19 e 24 de novembro de 1969, refere-se à contribuição de dois brancos [Fausto Ferreira e Sofia Pomba Guerra]  na fuga de Luís Cabral da capital guineense, afirmando explicitamente que “uma pessoa que teve influência no trabalho do nosso Partido em Bissau, foi uma portuguesa", e acrescentando: "só quem não está no Partido é que não sabe isso. Ao Osvaldo, a primeira pessoa que lhe ensinou coisas para a luta, foi ela, não fui eu. Eu não conhecia o Osvaldo” [Amílcar Cabral, Alguns Princípios do Partido, pp. 21-22];

(xiii) mais tarde, Luís Cabral, nas suas memórias, a Crónica de Libertação [1984], evoca os contactos que manteve com esta “deportada para a Guiné", com a ficha na PIDE e a indicação de se tratar de "um elemento altamente perigoso”:  e acrescenta:  “embora vigiada pela polícia política, cujo chefe veio morar mesmo em frente da sua casa, retomou na primeira oportunidade as suas actividades políticas”;

(xiv) relaciona-se com Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Fernando Fortes, Luís Cabral, a quem dá lições de Inglês do 7.º ano do liceu, e muitos outros;  “apesar da posterior separação da actividade anticolonialista do movimento geral antifascista, a dr.ª Sofia Pomba Guerra continuou, como no passado, a ser a amiga e conselheira de cada um de nós” [idem]; foi ela quem apresentou Aristides Pereira a Amílcar Cabral quando este chega à Guiné no início dos anos 50;

(xv) o rótulo de "desterrada política antifascista e comunista" (sic) acompanha-a por todos os locais por onde passa  mas isso nunca a impedirá de intervir politicamente e manter-se fiel às suas ideias;

(xvi) morre sem chegar a ver a  independência, da Guiné-Bissau,  em data que não sabemos precisar, talvez no início da década de 70;

(xvii)  muito mais tarde, Luís Cabral terá reencontrado em Portugal o marido, o dr. Guerra, “que parecia estar sempre muito distante das actividades da esposa, [mas] era um grande patriota e democrata português que encorajava e apoiava essa actividade” [idem], com a filha mais nova Tafia;

(xviii) é autora de várias publicações  de natureza económica e científica, em Moçambique, outras: “Fruta de Moçambique” (1936), “Alguns frutos silvestres de Moçambique” (1938), “Alguns produtos exportáveis de Moçambique e os seus mercados externos” (1939);

(xviii) colaborou ainda  com o Centro de Estudos Culturais da Guiné Portuguesa:  vd.  GUERRA, Maria Sofia Pomba - Amendoim e palmeira do azeite : pilares económicos da Guiné portuguesa / Maria Sofia Pomba Guerra. In: Boletim cultural da Guiné portuguesa. - Vol. VII, nº25 (1952), p.9-83.
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Fonte: Adapt.com a devida vénia, do blogue "Silêncios e Memórias", editado por  João Esteves > 12 de junho de 2015 > [0998.] Maria Sofia Carrajola Pomba Amaral da Guerra [I]

Vd. também a nota biográfica da autoria de historiador João Esteves com colaboração de Helena Pato, sendo a fotografia,  acima publicada, enviada ao João Esteves por uma das netas da biografada, Maria Leonor Guerra Rodrigues Eisman > Página do Facebook Antifascistas da Resistência.
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Nota do editor:

Último poste da série > 26 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17512: (De) Caras (86): Francisco Augusto Regalla (1871-1937), médico militar: a história de uma família ou de um clã (Juvenal Amado / Manuel Coelho / Armando Tavares da Silva / Patrício Ribeiro / Ricardo Regalla Dias-Pinto)

Guiné 61/74 - P17519: Os nossos seres, saberes e lazeres (219): São Miguel: vai para cinquenta anos, deu-se-me o achamento (8) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 14 de Março de 2017:

Queridos amigos,
Não há bem que sempre dure, mas dá satisfação fazer-se este relatório sobre um sonho realizável e realizado, aqui cheguei como aspirante a oficial miliciano, dei duas recrutas, fiz amizades inquebrantáveis, tenho permanentemente vontade de regressar, posso testemunhar, com tanta visita, como São Miguel se desenvolveu e é uma pérola do turismo à escala mundial.
Foi um último dia de viagem bastante longo, graças ao meu amigo Mário Reis pude contemplar essa jóia da natureza que é a Lagoa do Fogo e antes de chegar ao aeroporto ainda voltei à Ribeira Grande, bastante irreconhecível, com exceção do seu belíssimo património arquitetónico religioso e civil.

Um abraço do
Mário


São Miguel: vai para cinquenta anos, deu-se-me o achamento (8)

Beja Santos

O viandante está no último dia da sua itinerância micaelense. Graças à generosidade de um amigo de longa data, Mário Reis, o defensor dos consumidores mais conhecido da região, conta com um passeio que o conduzirá a um dos locais mágicos da ilha, a Lagoa do Fogo. Antes porém, ao raiar da aurora já se pôs a caminho para ir visitar um dos belos jardins de Ponta Delgada, desta feita o escolhido foi o jardim que circunda o palácio dos marqueses de Jácome Correia, hoje sede da Presidência do Governo Regional dos Açores.
Belíssimo jardim, uma amostra eloquente de toda a flora endémica e importada, mete palmeiras, criptomérias, azálias, e tudo mais. Deu para ficar especado a ver os trabalhos de jardinagem, feitos com imenso desvelo. Poucas flores naquele início de Fevereiro, mas impressiona a imensidão exuberante do verde, os belos caminhos, tudo tratado a preceito, como se pode ver.




Aqui viveu uma mulher espantosa, belíssima e infeliz nos seus amores e desamores, Margarida Jácome Correia, com ligações que deram brado, sobretudo a dois intelectuais de alto gabarito, Armando Côrtes Rodrigues e Vitorino Nemésio. Escreveu as suas memórias biográficas “Os amores de uma cadela pura”, desnudou-se ao limite das convenções da época, a sua autenticidade custou-lhe o ostracismo.


Hoje, a rede de estradas facilita a vida do turista quando vai de Ponta Delgada até à Lagoa do Fogo. Diga-se em abono da verdade que o viandante recorda com saudade passeios semelhantes dados nos últimos cinquenta anos envolvendo locais paradisíacos como a Serra de Água de Pau, o Pico da Barrosa e depois a descida até à Caldeira Velha, como hoje vai acontecer. No entanto, temos a neblina a dificultar as panorâmicas, lá se vai subindo a estrada sinuosa até chegar a esse local onde se desfruta uma das visões mais intensas, marcadas pelo vulcanismo adormecido. A última erupção data de meados do século XVI, a Lagoa fica lá bem no fundo, pertence à Rede Natura, está muitíssimo bem conservada, é flora e fauna harmoniosamente conjugadas, por ali passeiam-se umas aves que formam um concerto apropriado. Olhamos para o relógio, toca de partir para a Caldeira Velha, este passeio dos 50 anos ainda tem mais etapas à frente, caso da paragem pela Ribeira Grande.



Cá vamos a caminho da Caldeira Velha, anda-se um bom bocado até se chegar ao banho quente, hoje altamente frequentado. Não há transportes públicos, ou carro ou via pedestre é que asseguram o acesso a este exotismo floral, vale a pena estar para aqui especado a ver estas feridas de água, as pastas borbulhantes da lama vulcânica, os trilhos aliciam os amantes da natureza a passarem horas sem fim neste santuário verde e de águas quentes.



(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17497: Os nossos seres, saberes e lazeres (218): São Miguel: vai para cinquenta anos, deu-se-me o achamento (7) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 27 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17518: Antologia (76): "O Correio durante a guerra colonial", por José Aparício (cor inf ref, ex-cmdt da CART 1790, Madina do Boé, 1967/69)... Homenagem ao SPM - Serviço Postal Militar, criado em 1961 e extinto em 1981.


Um aerograma expedido pelo nosso camarada Silvério Dias, na altura 2º srgt art, CART 1802, Nova Sintra, 1967/69, SPM 4618 [e depois 1º Srg Art, locutor do PFA, Bissau QG/CTIG, 1969/74], para a esposa, a residir em Carnide, Lisboa.

Os indicativos postais tinham 4 dígitos. No caso da Guiné, terminava sempre em 8 (oito).

Foto: © Silvério Dias (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  Em agosto de 1961, foi aprovado o celebre "aerograma", considerado um impresso-carta, isento de porte e de sobretaxa aérea, e que era constituído por 1 folha de papel com o peso máximo de 3 gramas, dobrável em 2 ou 4 partes, mas de forma que as suas dimensões depois da dobragem não excedessem os limites máximos de 150 x 105 mms, e mínimos de 100x70 mms. Dele apenas podia constar o nome, posto, e número e o indicativo de SPM atribuído. 

Na Guiné, o aerograma era carinhosamente conhecido como "bate-estradas" ou "corta-capim".

No final da guerra, o Movimento Nacional Feminino, criado também em 1961, tal como o SPM, estava a imprimir e distribuir 32 milhões de aerogramas por ano. Durante os anos de guerra a expedição média diária foi de 10 toneladas de correio (!!!) para um total transportado de 21 mil toneladas (incluindo aerogramas, cartas, encomendas postais, valores declarados...).

O SPM terá sido um dos serviços militares que melhor funcionou durante toda a guerra colonial... 

Achamos oportuno reproduzir aqui, nesta série antológica, um texto da autoria do cor inf ref José Aparício, de resto nosso camarada na Guiné, na qualidade de comandante operacional da CCAÇ 1790, a subunidade que retirou de Madina do Boé em 6/2/1969 e que, na travesssia do rio Corubal, em Cheche, perdeu 25 dos seus homens (Op Mabecos Bravios).

José Aparício foi cmdt da PSP de Lisboa, a seguir ao 25 de Abril.


2.  O Correio durante a Guerra Colonial 

por José Aparício  [cor inf ref, ex-cmdt CCAÇ 1790, Madina do Boé, 1967/69]

[com a devida vénia ao portal Guerra Colonial 1961-74, da A25A - Associação 25 de Abril];  revisão e  fixação de texto: LG]


Com a deslocação para África de grandes efectivos militares a partir de 1961, as Forças Armadas Portuguesas foram confrontadas com a necessidade óbvia de fazer chegar "O Correio" a todos os locais onde estivessem estacionadas unidades militares. Naturalmente, a grande maioria das forças do exército encontrava-se dispersa no mato em grandes áreas, onde não havia estações dos correios normais, muitas vezes em locais isolados e inóspitos, alguns de muito difícil acesso.

Do antecedente o Exército Português tinha a experiência vivida na Flandres durante a 1ª Grande Guerra, quando foi criado, aprovado, e posto em execução o "Regulamento do Serviço Postal do Corpo Expedicionário Português - CEP" que serviu as tropas portuguesas em França em 1917 e 1918.

No final dos anos 50 início da década de 60, houve necessidade de tornar operacional a Chefia do Serviço Postal da Divisão quando o Exército constituiu e tornou operacional a divisão "Nuno Álvares" integrada no SHAPE. O activar deste serviço nas grandes manobras que então ocorriam durante todo o mês de Setembro em Santa Margarida, e que envolviam cerca de 10,000 militares, aconteceu nas manobras de 1960.

Para exercer as funções de chefia desse serviço postal, o Estado Maior do Exército requisitou aos serviços dos Correios um seu funcionário qualificado que graduou em Capitão, e que desempenhou com toda a eficiência a sua missão. Terminadas as manobras este quadro dos CTT regressou à sua anterior situação.

Quando em 23 de Junho de 1961 foi decidido criar um serviço de correios militar, o general Câmara Pina, Chefe do Estado Maior do Exército [CEME], requisitou de novo aos CTT o mesmo funcionário a quem, depois de graduar de novo em capitão, encarregou expressamente de organizar e pôr em funcionamento um Serviço Postal Militar no Ultramar. Nasceu assim o Serviço Postal Militar (SPM) tendo sido o seu primeiro responsável e Chefe do Serviço o capitão miliciano graduado Ernesto Lourenço Dias Tapadas, que até ao fim desenvolveu um trabalho notabilíssimo.

Aproveitando a experiência adquirida pelo Exército português na 1ª Grande Guerra, adaptou o que achou por conveniente, percebeu rapidamente todo a problemática envolvente, e estabeleceu o seu plano de acção eliminando com muita habilidade e diplomacia todas as dificuldades que foram surgindo com os 2 colossos monopolistas, que eram os CTT Continentais e os CTTU do Ultramar, e também com os serviços de Alfândega metropolitanos e ultramarinos.

A definição dos códigos de endereços foi a tarefa imediata a que a Chefia do SPM se dedicou e que se tornou determinante para o lançamento do serviço. Esses códigos eram constituídos por 4 dígitos, dos quais os primeiros 3 definiam a unidade militar, e o ultimo a província ultramarina. Assim, inicialmente o digito 1 correspondia à Índia, o 2 a S Tomé, o 3 a Macau, o 4 a Moçambique, o 5 a Timor, o 6 a Angola, o 7 a Cabo Verde, o 8 à Guiné, e o 9 à Metrópole.

Devido ao cada vez maior número de unidades em Africa, o critério inicial teve de ser rapidamente alterado, e a atribuição dos IP (indicativos postais) passou a ser feita, pelo Estado Maior do Exército [EME] para as unidades mobilizadas no continente, e pelos respectivos Comandantes Militares nos diferentes territórios para as unidades ali organizadas, mantendo-se sempre o ultimo digito definidor do território de destino.

Um problema entretanto surgido foi com os navios da Armada que quando saíam das suas localizações iniciais, e navegavam para outros territórios, e de e para a metrópole, recebiam a correspondência com atraso. Para resolver o problema, o 4º dígito 1, que inicialmente dizia respeito a Índia, passou a ser atribuído aos navios da Armada, em substituição dos dígitos recebidos inicialmente conforme os locais onde se encontravam Após algum tempo, a atribuição de todos os IP foi atribuída a Chefia do SPM.

Entretanto em Agosto de 1961, depois de difíceis e complicadas reuniões entre o Secretariado Geral da Defesa Nacional , a Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones (CTT) e os Correios Telégrafos e Telefones do Ultramar (CTTU), foi aprovado o celebre "aerograma", considerado um impresso-carta, isento de porte e de sobretaxa aérea, e que era constituído por 1 folha de papel com o peso máximo de 3 gramas, dobrável em 2 ou 4 partes, mas de forma que as suas dimensões depois da dobragem não excedessem os limites máximos de 150 x 105 mms, e mínimos de 100 x 70 mms.

As regras estabelecidas para o endereço a colocar em toda a correspondência a enviar para as unidades expedicionárias obrigavam a que dele apenas constasse o nome, posto, e número e o indicativo de SPM atribuído.

A organização geral do SPM consistia numa Chefia em Lisboa, pelo menos uma Estação Postal Principal em cada território, e dentro destes tantas Estações Postais Secundárias quantas as que se revelaram necessárias face ao respectivo movimento postal, e ao número de PMC (Postos Militares de Correio), cada um destes apoiando até 2500 homens.

No fim da cadeia, havia em cada unidade um Encarregado da Delegação Postal da Unidade (EDPU) normalmente o(s) cabo(s) escriturário(s) da(s) unidade(s), que recebiam formação específica para essas funções.

Em 21 de Julho de 1961 entrou em funcionamento em Luanda a Estação Postal Militar Principal nº 6, menos de um mês depois da criação do SPM! Quando se iniciaram as hostilidades na Guiné e em Moçambique já ali se encontrava completamente operacional o SPM.

O SPM foi um serviço totalmente constituído por milicianos, nele tendo servido 202 oficiais e 504 sargentos. O seu quadro foi constituído inicialmente apenas por funcionários dos CTT e CTTU, graduados em oficiais e sargentos conforme a sua posição hierárquica nos seus serviços. A partir de 1966 o recrutamento passou a fazer-se entre oficiais e sargentos milicianos da metrópole a quem era dado um curso específico no Centro de Instrução do SPM no Forte do Bom Sucesso em Lisboa.

O serviço prestado pelo SPM foi notável. Muito para além dos números impressionantes de milhões de aerogramas, cartas, encomendas, vales do correio e valores declarados, por eles tratados e enviados; durante os anos de guerra a expedição média diária foi de 10 toneladas de correio (!!!) para um total transportado de 21 mil toneladas. É que nunca falhou, mesmo nos locais mais perigosos, difíceis e isolados, e os prazos médios entre a expedição e a recepção eram mínimos.

Só quem ali viveu esses tempos pode testemunhar o alvoroço e a alegria da chegada do correio, o conforto e ajuda que todos sentíamos pelas noticias da família e dos amigos.

O SPM foi extinto em 10 de Julho de 1981, cessando toda a sua actividade em 31 de Dezembro de 1981. Com a discrição com que iniciaram os seus trabalhos, assim os terminaram, como se nada de especial tivessem feito, naturalmente sem reconhecimento público assinalável. O SPM que escolheu como divisa do seu guião "A vida por uma mensagem", bem a honrou até ao fim.

Ao Capitão Miliciano Ernesto Tapadas, e a todos os que integraram o SPM durante toda a sua existência, é devida uma enorme gratidão por milhões de portugueses; por todos os que, de 1961 a 1975, serviram na Índia, em África, em Macau e em Timor, e também por todas as suas famílias que em Portugal mitigavam as saudades e as suas angústias com as noticias dos seus filhos tão longe. Os que estiveram na guerra nunca os esquecem!
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Nota do autor:

A informação relevante acima descrita foi retirada de: BARREIROS, Eduardo ; BARREIROS, Luís - História do serviço postal militar. [Lisboa] : E. Barreiros, D.L. 2004. 460 p. : il. ; 30 cm. Ed. bilingue em português e inglês. Bibliografia, p. 458-460. ISBN 972-9119-65-1
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Nota do editor:

Último poste da série > 5 de novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9000: Antologia (75): Tarrafo, crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed, 1965 (8): Ilha do Como, 15 de Março de 1964: E Deus desceu à guerra para a paz (Último episódio)...

Guiné 61/74 - P17517: Blogoterapia (287): Não é fácil ser português (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas)



1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 25 de Junho de 2017:

Ser português não é fácil, e penso que nunca foi fácil para a grande maioria do povo. Lançados à conquista de um império, que nunca resultou numa maior distribuição das riquezas, modernidade nem bem estar, fica-nos o orgulho de que os nossos antepassados fizeram o impensável para um país tão pequeno como o nosso, tanto na expansão como na defesa da nossa nação. Não foi pois por falta de coragem que não chegamos ao tão almejado estádio em que seria equiparada a nossa grandeza exterior, com a riqueza e bem estar interno e que nos elevaria a estatuto entre as nações mais avançadas na arquitectura, na medicina, nas ciências, na educação e, por conseguinte, no progresso que dita o bem estar da sua população.

Os nossos antepassados regaram com o seu sangue terras longínquas, repeliram invasões, guerras civis, revoluções e, por fim, acabamos a construir as cidades para os outros.

Assim chegou a vez da nossa geração e fomos quase um milhão.

Durante 13 anos fomos actores principais numa guerra que nos sangrou, apartou das nossas famílias e, pior, tornou o futuro irremediavelmente perdido para muitos.

Aqui chegados, constato que continuamos a ser usados na nossa boa vontade e orgulho patriótico.

No 20 de Maio fui receber a minha Medalha Comemorativa de Campanha. No momento senti um misto de orgulho e algumas dúvidas.

Orgulho por ir receber a medalha que foi finalmente imposta, quarenta e tal anos depois do meu regresso. Independentemente das razões, entendo que é meu direito reivindicar a mesma, como uma coisa que me é devida.

Dúvidas. Qual real valor que esta condecoração tem. Na mesma cerimónia vi militares no activo receberem também distinções por serviços prestados. Terá sido na Bósnia? No Iraque, em África, onde se fazem hoje comissões de 6 meses como voluntários, mais bem armados, equipados, treinados e remunerados? No caso, as ditas Medalhas por Serviços Distintos tinham a categoria de ouro, prata e bronze. É aqui que começa a minha incompreensão.

Será que no meio de vinte e tal ex-combatentes que foram receber a Medalha Comemorativa das Campanhas, não estariam homens, que no seu tempo praticaram actos de bravura em combate durante as suas comissões, em especial em Angola, Guiné e Moçambique?
Vinte e tal meses em zonas 100% operacionais que até a água se ia buscar com risco de vida. Isto é comparável a quê nos dias de hoje?

O nosso exército é hoje profissional e voluntário, os seus membros relativamente bem remunerados, direi mais, excelentemente remunerados, quando prestam serviço em qualquer zona de conflito, normalmente em missões de policiamento ou de interposição.

Note-se que não estou contra a nossa participação nessas acções, uma vez que a integridade nacional se defende hoje a milhares de quilómetros das nossas fronteiras. Talvez se deva pôr em causa as razões que provocaram a instabilidade neste Mundo e que levaram ao actual estado de coisas, mas isso é outra questão.

Será possível que aqueles jovens soldados (todos graduados alguns com o peito carregado de medalhas), que no sábado foram condecorados por serviços prestados, tenham feito alguma coisa que transcendesse os actos de bravura de alguns de nós há 45 ou mais anos.

Estavam lá veteranos das três frentes, Comandos, tropa normal e paraquedistas, que naquela guerra sofreram o que só nós sabemos. Perfilámo-nos, emocionámo-nos com a homenagem aos mortos (cada um se lembrou dos seus) recebemos as honras dos militares em parada, seguidamente almoçámos no quartel no meio das fardas de gala e camuflados, mas será que nem um de nós merecia uma daquelas medalhas, de bronze ou prata, para já não falar na de ouro?

Quantos ex-combatentes receberam alguma? Soldados anónimos que contribuíram com a sua coragem para salvarem outros. Quem não conheceu um pelo menos? Algumas provas disso foram ignoradas e apagadas, para assim não serem prova viva da gravidade dos ataques. Chegou-se ao cúmulo de mencionar as munições gastas para repelir o ataque como sendo gastas em exercícios.

As provas de heroísmo foram apagadas como apagaram os buracos feitos pelas armas do inimigo e, quanto muito, foram as companhias ou batalhões galardoados no final das comissões pelo cômputo geral do serviço, beneficiado destes louvores os comandantes que viram assim averbadas estas às suas folhas de serviços.

Quanto à medalha, vou guardar a minha como memória daquele tempo, mas lamento que ela cheire a prémio de consolação e que, ao nos serem entregues hoje, se queiram justificar perante nós de alguma coisa, em vez de praticarem a mais elementar justiça para quem deu tanto si.

Dentro de alguns anos haverá milhares de veteranos a viver sozinhos, sem rendimentos para irem para um lar, com valores hoje a rondar os 1000 € (que muitos casais de reformados hoje não aufere), mais medicamentos, fraldas e cuidados de saúde complementares.

Nessa altura para que servirão as medalhas?
Que nos irão fazer?

A Pátria sempre teve filhos e enteados, mas une-nos, apesar das nossas diferenças sociais e até politicas, um sentimento que nos enche o peito. Podemos não estar de acordo com governos e governantes mas a Pátria somos nós, ama-se, não se discute, não se vende e não se renega, por muito que em nome dela nos maltratem.

Dela espera-se só o reconhecimento, pelo amor que lhe damos, na maioria das vezes sem retribuição alguma.

Um abraço
Juvenal Amado

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2. Comentário do editor:

Não é meu hábito "deitar faladura" a seguir aos textos dos camaradas, mas o tema que o Juvenal traz à liça, sugere-me alguns comentários.

Quanto à atribuição da Medalha Comemorativa das Campanhas, logo no fim da nossa comissão ficou registada na Caderneta Militar de cada um. Vejam a página 12.
Conclusão, a Medalha devia ter sido distribuída na altura. Como não foi, e todos nós mudámos de residência inúmeras vezes depois de passarmos à disponibilidade, digamos que as autoridades militares perderam o nosso rasto, não sabendo sequer se somos vivos. Restava fazer o que agora vem a ser feito, requerer a Medalha, dando sinal de que ainda estamos vivos. "Estes" nunca a negaram e estão a distribuí-las às centenas, anualmente.
Já agora, a culpa disto tudo foi da "outra senhora", a quem poucos afrontavam então.

Quanto às Medalhas de Serviços Distintos, a coisa é mais complicada, pois a sua atribuição dependeria de proposta dos respectivos Comandantes.
Já se sabe que conforme a hierarquia ia descendo, mais difícil era o acesso às mesmas. E nós, caro Juvenal só tínhamos direito à de cobre, à de folheta, melhor dizendo.
Voltamos à mesma, não vale a pena pensarmos nisso agora.

E o mais sensível para nós, as actuais missões no estrangeiro.
Não há comparação possível com o nosso tempo. Quantas localidades tinham telefone na Guiné?
Os militares de hoje têm ao seu dispor toda uma panóplia de meios de comunicação que há cinquenta anos eram impensáveis.
Os vencimentos são tão diferentes que é pecaminoso fazer qualquer comparação.
Os actuais militares ganham muito? Não, nós é que ganhávamos pouco. O problema foi nosso, que vivemos noutros tempos de míngua.
O tempo de missão foi consideravelmente reduzido porque os efectivos são suficientes para a rotação dos mesmos.

Os militares de hoje são  considerados e reconhecidos? Ainda bem, pena que não tenha sucedido isso connosco.
Não te esqueças Juvenal, que pela esquerda radical, a seguir ao 25 de Abril, fomos considerados fascistas, colonialistas e outras coisas terminadas em istas, sorte tivemos em não sermos presos. Talvez  porque éramos muitos. Já nem falo na entronização daqueles que se negaram a ir para a guerra, transformados em verdadeiros patriotas.

Finalmente, o nosso fim de vida, para uns em carência, para outros mais desafogado.
A falta de condições básicas terá a ver com a condição de ex-combatente? Em alguns casos sim, mas não podemos generalizar. Cada caso tem de ser analisado, e arranjar-se a solução adequada. A nossa condição de ex-combatente não se pode sobrepor à daqueles que por serem mulheres ou homens mais afortunados, não foram à guerra.

Que queremos afinal? Respeito, reconhecimento pelo nosso esforço e apoio aos estropiados e afectados física e psicologicamente pela guerra.

CV
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17491: Blogoterapia (286): Uma memória daquele espaço em Casal dos Matos, Pedrógão Grande (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17516: Parabéns a você (1278): Vítor Caseiro, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 4641 (Guiné, 1973/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 24 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17506: Parabéns a você (1277): António Branco, ex-1.º Cabo Reabast de Material da CCAÇ 16 (Guiné, 1972/74) e Vasco Joaquim, ex-1.º Cabo Escriturário do BCAÇ 2912 (Guiné, 1970/72)

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17515: Facebook...ando (45): A cotovia dançante (Manuel Luís R. Sousa, SAj Reformado)

Cotovia
Com a devida vénia ao autor da foto


1. "A cotovia dançante" é um texto do nosso camarada Manuel Luís R. Sousa, Sargento-Ajudante da GNR na situação de Reforma, (ex-Soldado da 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4512/72, Jumbembem, 1972/74), publicado por ele no Facebook que não resisti e incluir no nosso Blogue. 
As memórias e as gentes de Trás-os-Montes são para mim um fascínio.
Carlos Vinhal


A cotovia dançante

Nos anos sessenta do século passado, ainda durante a vigência do Estado Novo, as famílias mais abastadas ou remediadas de Trás-os-Montes, tinham como um dos seus principais objectivos mandar educar os seus filhos, afastando-os do trabalho duro do campo de onde provinham os seus principais rendimentos, recorrendo ao trabalho de assalariados, daqueles que não estudavam, para manterem as suas terras granjeadas.
Terem um filho doutor, engenheiro, professor, médico, ou outras profissões qualificadas, era algo que lhes dava orgulho, estatuto.

Era notório o frenético bulício em casa dessas famílias com a ansiedade de receberem os meninos ou as meninas, ainda na fase dos estudos ou já a trabalharem, por altura das férias da Páscoa, Natal e, eventualmente, em fins-de-semana, reservando-lhes os miminhos da época que a terra dava, ou, então, desdobravam-se em canseiras, quando eles não vinham a casa, a despachar-lhes esses mimos através do Caminho-de-ferro ou mesmo pelos correios.
Destas iguarias, destaco as frutas da época, os folares por altura da Páscoa, por exemplo.

Quando estes seus rebentos vinham à terra destacavam-se, em relação aos trabalhadores do campo, pelo seu aspecto citadino, bem vestidos e mais polidos no trato, mantendo-se um pouco distantes, conscientemente ou não, dos jovens da aldeia seus contemporâneos que não tiveram possibilidades de estudar, ainda que, alguns, com capacidade para tal, não abrindo mão do seu estatuto maior. “Que tirassem o cavalinho da chuva” um ou outro jovem “inculto” da aldeia se sonhassem sequer fazer a corte a algum ou alguma dessas criaturas “eruditas”, que até tinham sido colegas de classe e de carteira durante o ensino primário.
“Cada macaco no seu galho”, melhor dizendo, as diferenças sociais, naquele tempo, tinham uma fronteira bem definida.

Depois, a partir de 1974, após a revolução de Abril, com a generalização do ensino, abrangendo todas as famílias, esbateram-se todas aquelas diferenças sociais.
Alargou-se, portanto, a um maior número de jovens a possibilidade de saírem da terra para estudarem e trabalharem também nos grandes centros urbanos, enveredando por profissões mais ou menos qualificadas no sector terciário da economia, nos serviços, regressando também a casa por altura das festas do ano, onde os pais e restantes familiares os recebiam rejubilando de alegria.
Só que, com esta mudança, em total desequilíbrio, a sangria das gentes das aldeias aumentou exponencialmente, até porque coincidiu também com o fenómeno migratório do país, concretamente a emigração, levando à desertificação do interior, particularmente de Trás-os-Montes.
Ou seja, aquelas gerações de jovens, hoje já “entradotes”, com filhos adultos, outrora recebidos com exultação e mimados pela família quando periodicamente regressavam a casa, actualmente chegam à aldeia e notam, com mágoa, que as cortinas da janela da casa que os acolhia se mantêm estáticas no interior da vidraça, eventualmente com teias de aranha, por entre as quais, tantas vezes, surgia o primeiro sorriso de boas-vindas, sinal de que os que antes os recebiam em festa já partiram, dando lugar a um silêncio sepulcral que faz doer a alma.

Hoje, no meu caso pessoal, embora morando longe pelas razões já referidas, e ligado que estou sentimentalmente a essas terras de família parcialmente abandonadas naquelas circunstâncias, desloco-me frequentemente a Freixiel, Vila Flor, em que se concentra toda esta história, a fim de, na medida do possível, ir adiando o abandono completo de uma ou outra propriedade: podar algumas videiras para, no tempo, ter a possibilidade de comer uns “mouriscos”, aplicar herbicida, apanhar azeitona, etc.

Nesta rotina anual de tentar preservar essas humildes leiras que a geração anterior nos deixou, no mês de Fevereiro deste ano, 2017, pondo as rodas ao caminho de cerca de duzentos quilómetros, a partir de Vila do Conde, podei as videiras nas “Melaínhas”, é assim que se chama uma das propriedades, e, nessa altura, podei também um grande damasqueiro, almejando deliciar-me com os frutos, cuja maturação ocorre em Junho.
Com vista a recuperar a excelente qualidade de uma macieira existente na propriedade já na fase decadente do tempo útil de vida, enxertei uma outra pequena de duas que tinha ali plantado em Novembro do ano passado, precisamente para esse efeito.

Em Março, voltei ali para aplicar o herbicida, tendo verificado que o referido damasqueiro já mostrava umas dúzias de damascos na fase inicial da sua formação que espreitavam por entre a rebentação da ramagem depois da poda.

Chegado agora o mês de Junho, pelos meus cálculos, achei que estava na altura de ali regressar com alguns objectivos bem definidos: aplicar novamente o herbicida nas ervas que germinaram no verão; inteirar-me do estado de evolução da enxertia da macieira; apanhar os damascos do damasqueiro que tinha podado; saborear as cerejas de três cerejeiras, duas das quais ainda pequenas que, entretanto, eu também tinha enxertado há dois ou três anos; apalpar uns figos lampos e deleitar-me com eles caso estivessem maduros.

Cheguei à aldeia num dia particularmente quente, cerca do meio-dia, o que me obrigou a fazer uma sesta prolongada até ao fim da tarde.
Já a serra “Tinta” se entrepunha entre o sol- poente e as “Melaínhas” ao fim da tarde, quando ali cheguei, agora pela fresca, para aferir do estado do terreno para no dia seguinte, bem cedo, aplicar o herbicida e particularmente curioso em ver o estado de tudo o que acima enumerei:
A pequena macieira, uma das duas que plantei, para minha satisfação, apresentava a enxertia consolidada, com dois rebentos já bem desenvolvidos;
Dirigindo-me ao damasqueiro, de pujante de ramagem, apenas encontrei três ou quatro damascos no chão, apressando-me a apanhá-los e a disputar a minha parte com as formigas, neles engalfinhadas aos centos, desalojando-as com duas assopradelas, que com sofreguidão saboreei a sua excepcional doçura;
As cerejas, nem uma para a prova. Já os pássaros tinham passado com a “cesta” antes de mim;
Os figos lampos estavam ainda duros como cabaças e nem um pude tragar. Portanto, apenas com a boca doce dos damascos, que resgatei da voracidade das formigas, limitei-me a acabar de dar volta à propriedade, constatando também que as oliveiras já mostravam a azeitona formada, depois da floração, do tamanho aproximado de grãos de chumbo, deixando antever, se tudo correr bem, uma generosa colheita.

Ao lusco-fusco, entrei no caminho que ladeia a terra para voltar a casa.
Sem viva alma por ali àquela hora, do outro lado do caminho, pousada nos arames da vinha do vizinho Pedro Melo, vi uma cotovia a executar eventualmente os últimos acordes do dia do seu canto, como que a assinalar a hora do recolher, visto que a noite já avançava.
Por cortesia para com a ave, parei e procurei imitar o seu canto com o meu assobio natural, vocal.
Ora, esta apercebendo-se de que eu falava a mesma linguagem, com algum sotaque, eventualmente, ou seja, que cantava a mesma canção, circundou-me algumas vezes em voo lento, como curiosa em observar-me. Depois, ora pousava na parede da nossa propriedade no meu lado esquerdo, ora nos arames da vinha do vizinho, do lado direito, à minha frente, a responder-me a cada vez que eu assobiava e a imitava, exibindo-se numa espécie de bailado.

Como se não bastasse já estar fascinado pela simpatia e destreza da ave, ali imobilizado como uma estátua, esta, a dada altura, pousou no caminho à minha frente, a escassa meia dúzia de metros, numa sucessão de vénias, ora envolvendo-se no pó do caminho, rojando sucessivas vezes o peito no chão, ora exibindo a plumagem eriçada como a querer atingir o meu tamanho, pondo em destaque a crista de plumagem que caracteriza a espécie, num ritual idêntico ao de, sendo macho, atrair uma fêmea.
- Por quem és, cotovia, quem sou eu para merecer de ti tanta deferência…! Pensei cá comigo.

Inebriado com todo aquele episódio, de repente fui tomado por um estranho arrepio na espinha, ao lembrar-me de alguém, que já partiu, de cujo rosto irradiava o sorriso com que nos recebia, feliz, habitualmente por entre aquelas cortinas de renda branca da janela, ao ser alertado pelo trabalhar do motor do carro quando chegávamos. Cortinas que, nostálgico, vi imóveis, como habitualmente acontece depois da sua partida, nessa manhã quando ali parei o carro em frente a casa ao terminar a viagem.

Perante esta sensação estranha, interiorizei em mim, sem que para isso tenha qualquer explicação plausível, que esse ente querido estava a comunicar comigo através da dança daquela pequena ave, saudando-me por me empenhar em zelar aquelas terrinhas que nos deixou, e perguntando-me por novas de toda a prole, que ela, como matriarca que era, devotada e incondicionalmente amava. Fantasias ou ilusões minhas, claro.
Ou não...

Depois daquele nosso “diálogo” de um ou dois minutos, a cotovia dançante circundou-me mais uma vez em voo rasante, como a despedir-se, e partiu embrenhando-se na noite que já caía.

Manuel Sousa
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17012: Facebook...ando (44): Quem não chora não mama e, para a tosse, um chazinho de cascas de cebola com limão, adoçado com um pouco de mel (Manuel Luís R. Sousa)

Guiné 61/74 - P17514: (In)citações (109): Portugal a arder - destruição, desolação e morte (Francisco Baptista, ex-Alf Mil)

Floresta Portuguesa
(Imagem editada)


1. Em mensagem de hoje, dia 26 de Junho de 2017, o nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), manda-nos uma reflexão sobre o assunto da actualidade, os incêndios em Portugal.


PORTUGAL A ARDER - DESTRUIÇÃO, DESOLAÇÃO E MORTE

Os grandes incêndios começaram no dia 17 de Junho, sábado, em Pedrogão Grande, e foram-se espalhando por Castanheira de Pera, Góis e Pampilhosa da Serra na zona centro do país

A nossa alma foi queimando as asas na contemplação da grande tragédia que as televisões relatavam e mostravam, que atingiu o que melhor tem a Pátria, as suas gentes, as suas árvores, arbustos, plantas, as suas florestas. E ficou a dor, uma dor amarga e negra que nos roubou a alegria dos dias claros e luminosos de Verão com a partida desta gente, tão autentica, tão próxima da vida da natureza, mulheres, homens, meninos que eram a energia, a simpatia, a alegria e o futuro, e se perderam no imenso braseiro deste desastre nacional. As plantas que na primavera despontam e cobrem a terra de verde e de flores variadas, numa sinfonia de cores que só as aves sabem cantar, os arbustos e as árvores plantadas ou semeadas pelos homens, pelos ventos ou pelas aves, que na sua quietude nos pintam em altura o olhar em tons variados, e nos dão uma sombra amiga que nos protege e refresca para além doutras dádivas mais palpáveis, arderam em grandes labaredas.

Os culpados destas tragédias anuais, este ano mais cruel pelo sacrifício e morte de tantos seres humanos, que ainda ontem falavam, riam, gritavam, cantavam choravam, liam, escreviam, dançavam, amavam, cresciam, construíam, plantavam couves, flores, batatas, tomates, vagens, pereiras, macieiras, videiras, somos nós. Os culpados destes fogos imensos que varrem os campos, somos todos nós que abandonámos os campos e fomos para as grandes cidades e deixámos alguns camponeses, poucos, a tratar do país interior cada vez mais pobre e mais desértico.

Alguns já vivem há longos anos nas grandes cidades do litoral onde a riqueza e o dinheiro fluem mais, como os grandes rios e as marés dos oceanos. Outros com muitas gerações anteriores a viver com dureza e fraco rendimento nos campos e montes do interior, estudaram pelos livros dos naturais das grandes cidades e aprenderam que o futuro da vida nos campos continuaria a ser pobre e miserável e fugiram desse destino sem futuro para outras paragens e outros litorais e as terras onde nasceram e se criaram, foram ficaram cada vez mais abandonadas.
Nesses terras do esquecimento, cada vez mais desérticas, ficaram os velhos, os simples e alguns que nascidos nelas criaram raízes tão fortes que não lhes permitiam sair.

Não se pode pedir a esses, tão poucos, que defendam a imensidão dos campos e das florestas que os rodeiam, que lhe embelezam os dias mas também os ameaçam sempre que chegam as estações quentes.

Portugal não pode ser um país de praias e de cidades monumentais do litoral, por onde os naturais e os turistas se passeiam e fotografam que esconde uma natureza negra e morta pelas calores e chamas dos Verões, cheio de cruzes a assinalar a memória dos mortos que arderam nessas fogueiras quando tentavam fugir-lhes.

Nós homens atraídos pelos mares, já numa fase adulta da humanidade, não somos filhos deles. Nós homens somos filhos da terra, dos campos, das florestas, durante milhares e milhares de anos fomos caçadores, pastores, agricultores não podemos abandonar a terra-mãe que nos gerou e nos criou.

Não basta chorar os mortos, sentir o desgosto enorme dos seus familiares e amigos, lamentar a miséria em que muitos ficaram, importa sobretudo criar um amplo movimento de solidariedade activa que nos responsabilize a todos. E porque a caridade só se manifesta em força em tempo de calamidades deviam ser tomadas medidas, acordadas por todos os políticos dos vários quadrantes, que tivessem a adesão da grande maioria dos portugueses, a fim de ser criado um fundo a nível nacional, para prevenir os incêndios pela limpeza das matas a par de outras medidas necessárias

A tarefa imensa de preservação dos campos, das suas culturas, das suas florestas, da beleza das suas paisagens é uma tarefa patriótica que deve contar com o contributo de todos os portugueses, pois os que ainda vivem no meio rural, sozinhos, não têm todos os meios necessários para esse fim.

Falo duma culpa colectiva pela passividade e sonolência das consciências ao não exigirem aos políticos dos sucessivos governos, desde há décadas, a atenção que todo o país no seu conjunto merece. Quando os problemas existem longe da nossa casa temos tendência a esquecê-los depois do desgosto e do choque inicial.

Não pretendo discutir as culpas circunstanciais do incêndio em Pedrogão Grande e nas terras próximas já que não me compete a mim nem pertence ao âmbito do nosso blogue. Essa discussão está já a ser feita pelas forças políticas e por outras entidades que têm competência para tal.

Estes grandes incêndios irromperam duma forma súbita e explosiva no dia 17 de Junho de 2017, num dia quente de fins de Primavera. Longos dias quentes tem o Verão, com muitos incêndios, oxalá não se volte a repetir um desastre semelhante.

Francisco Baptista
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17504: (In)citações (108): Incêndios florestais - Catástrofe nacional anual, até quando? (Coutinho e Lima, Coronel Art Ref)

Guiné 61/74 - P17513: Notas de leitura (972): “A Colonização Portuguesa da Guiné 1880-1960”, por João Freire, 2016, edição da Comissão Cultural da Marinha (4) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Junho de 2017:

Queridos amigos,
Com a apreciação da política do Estado Novo na Guiné (1930-1960), dá-se por terminada a recensão da investigação de João Freire que merece encómios pela forma como foi entrosando a presença da Marinha na colónia da Guiné, como foi determinante em operações militares e na sufocação de revoltas, como ofereceu sempre figuras de prestígio na governação, caso de Manuel Sarmento Rodrigues.
O autor possibilita novos ângulos de visão sobre o papel da Marinha na consolidação colonial, repertoria um elevadíssimo número de iniciativas e destaca a importância do trabalho da Missão Geo-Hidrográfica da Guiné.
Uma obra de referência, um cabouco valioso para que um dia se constituirá como a História da Guiné Portuguesa.

Um abraço do
Mário


A colonização portuguesa da Guiné, 1880-1960, por João Freire (4)

Beja Santos

“A Colonização Portuguesa da Guiné 1880-1960”, por João Freire, 2016, edição da Comissão Cultural da Marinha, foi uma das edições preeminentes do ano transato, no que tange à investigação guineense no período colonial. João Freire manipula expeditamente a heurística e a hermenêutica, por cada capítulo abordado tece conclusões, assume responsabilidades interpretativas, nunca deixa o leitor à deriva ou no território das especulações. É uma viagem cronológica onde os assuntos da Marinha colonial têm peso preponderante.

O Estado Novo revê em profundidade a política colonial, mas logo no tempo dos governos militares procura-se na Guiné uma nova moldura jurídica de intervenção. Foi o caso do “Regulamento de Trânsito, Fixação e Deslocação dos Indígenas”, com data de 6 de Junho de 1932, prevê-se a existência da “Caderneta Indígena”, foi uma tentativa para fixar e sedentarizar as populações. O imposto de palhota passou a ser designado por imposto indígena, ganha foros de obrigação individual, ativaram-se os serviços de recenseamento e cobrando do imposto indígena.

As questões etnológicas e etnográficas passam a merecer algum cuidado. Jorge Velez Caroço (familiar do antigo governador) lança um questionário etnográfico, já está de pé uma “Comissão de Civilização e Assistência a Indígenas”. As grandes mudanças formais vão emergir nos anos 1950, já numa atmosfera internacional favorável à descolonização. O Ato Colonial de 1930 conhece modificações: onde havia colónias passaram a existir províncias ultramarinas, o Concelho do Império Colonial passou a Concelho Ultramarino. Na Guiné, este templo político é de uma enorme lentidão. A administração pretende enquadrar e identificar os indígenas, a ideia é que cada um deles tenha um documento com fotografia, impressão digital e dados antropométricos, saber-se se satisfez o pagamento do imposto, registam-se os castigos e condenações sofridos, os contratos de trabalho assalariado, a situação militar, as vacinas recebidas, o registo de eventuais diagnósticos médicos. Em 1954 é aprovado o Estatuto do Indigenato: “Consideram-se indígenas os indivíduos de raça negra ou seus descendentes que, tendo nascido ou vivendo habitualmente na província, não possuam ainda a ilustração e os hábitos individuais e sociais pressupostos para a integral aplicação do direito público e privado dos cidadãos portugueses”. A par deste paternalismo e da lentidão habitual das reformas legislativas, adota-se a Lei da Nacionalidade, em 1959, que constituiu mais um pequenino passo no sentido da igualdade jurídica de todos aqueles que estavam sujeitos à soberania portuguesa: “Os indivíduos nascidos em território português presumem-se portugueses, desde que o respetivo nascimento não contenha a menção de qualquer circunstância, que nos termos da lei, contrarie essa presunção”.

João Freire faz-nos uma apreciação da Guiné no período ditatorial, e desvela alguns elementos esclarecedores da governação de Luís Carvalho Viegas, que chegou à colónia em Março de 1933, é do seu tempo a última campanha de pacificação, a abertura de novas estradas, a construção de uma ponte sobre o rio Corubal (permitindo uma futura ligação de Buba para as regiões do Boé e do Gabu), passaram a existir novas carreiras rodoviárias, melhoram os seus serviços meteorológicos bem como os cuidados de saúde, isto para já não falar nos progressos realizados no fornecimento de energia elétrica para iluminação pública e particular. Em 1941 assinala-se a chegada de um novo governador, Ricardo Vaz Monteiro, procede-se à transferência da sede do governo de Bolama para Bissau. Carlos Alberto da Encarnação Gomes escreverá na Revista da Armada em 2012: “Bolama, cidade que havia sido capital mas que, ao tempo, se encontrava num processo de degradação e abandono significativos. Grande parte dos edifícios, para evitar a derrocada, estavam escorados com troncos de palmeira, e dos serviços que anteriormente dispunha somente funcionavam a Imprensa Nacional, o hospital que dispunha de um único médico formado pela Escola Médica de Goa, e o grande hotel, que de grande somente tinhas as instalações […] Para além de um clima mais temperado, verificava-se, em Bolama, um fenómeno raro que consistia na migração diária de vários milhares de morcegos que, ao amanhecer, vinham do continente e ao anoitecer para lá regressavam”. Surge na época a figura do Comandante Militar da Guiné, pensa-se na construção de um aeródromo internacional junto de Bissau, chega a radiodifusão.

Considera-se a chegada do novo governador, Manuel Sarmento Rodrigues, como o momento de grande viragem. Como observa João Freire, foi Sarmento Rodrigues quem soube mobilizar vontades e obter ajudas financeiras e institucionais para dar impacto às comemorações do V Centenário da Descoberta da Guiné; vão ser tempos de melhoria para os serviços de saúde, novas estradas, nova imagem da capital da colónia. Basta ler os elucidativos Anuários da Guiné Portuguesa de 1946 e 1948 organizados por Fausto Duarte para se perceber a dimensão das transformações. Em 1949 chega a Bissau o novo governador, Raimundo Serrão, que irá prosseguir as obras públicas iniciadas pelo seu antecessor. É na governação de Diogo de Melo e Alvim, que chegara à Guiné em 1954, que ocorrerá a primeira visita de um Presidente da República à Guiné, Craveiro Lopes fará uma demorada viagem em 1955. Em Agosto de 1956 assume funções Álvaro Silva Tavares, o único civil a exercer o cargo, se nos lembrarmos que Correia e Lança apenas o fez a título de interino, no século anterior. António Peixoto Correia governará a Guiné entre 1959 e 1962. De acordo com uma publicação oficial, em 1960 existiriam na Guiné 3300 km de estradas (das quais 60 km eram asfaltadas). Quando ao domínio da saúde, estavam em funcionamento o Hospital Central de Bissau, o hospital sub-regional de Bolama, 9 hospitais regionais, 1 hospital de tuberculosos, 1 hospital de leprosos, 1 maternidade central e 15 regionais. Em 21 de Dezembro de 1962 aterra em Bissau o novo Governador, Vasco Martins Rodrigues. Um mês depois, estala oficialmente a guerrilha. O autor desenha a evolução da economia com relevo a partir do pós-guerra, carreia elementos sobre a demografia, a vida social, recreativa e cultural da Guiné. Na síntese de interpretação conclusiva, dirá: a Guiné nunca foi uma prioridade nas preocupações do governo de Portugal, não constituía uma posição-chave no domínio da geoestratégia; para os portugueses foi sempre fascinante o mosaico étnico, o território sulcado por braços de rios e matas exuberantes, no entanto foi sempre claro que o território não atraía os colonizadores, tão somente os mercadores e os agentes da administração; é a partir da segunda metade do século XIX que se desenvolvem focos de agitação e preocupações com a ocupação efetiva da colónia, os comerciantes europeus traziam armas de fogo, panos de algodão e produtos ao gosto dos africanos e transacionavam oleaginosas, couro, algum marfim, desenvolve-se um pequeno funcionalismo, ingrediente indispensável para legitimar a presença portuguesa, na alfândega e na fazenda; é igualmente na segunda metade do século XIX que se irão dar mudanças demográficas elas próprias conducentes a lutas interétnicas e disputas permanentes para a ocupação do solo, o ocupante colonial, à semelhança do que outros ocupantes noutras colónias fizeram, dividiram para reinar, viveu-se sempre num equilíbrio precário de antagonismos em que os interesses comerciais, quando se sentiam lesados, promoviam campanhas de descrédito dos governantes, na colónia e em Lisboa.

E em jeito de despedida, o autor recorda que à Marina coube sempre a organização dos fluxos de movimentação marítima e o controlo dos espaços costeiros e fluviais, teve um desempenho determinante nas operações militares entre 1890 e 1915.

Insista-se nos méritos do trabalho de João Freire, ao consorciar em permanência a política guineense e os contributos da Marinha ao longo dos séculos, um olhar refrescado sobre a presença portuguesa na Guiné.
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17505: Notas de leitura (971): “A Colonização Portuguesa da Guiné 1880-1960”, por João Freire, 2016, edição da Comissão Cultural da Marinha (3) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17512: (De) Caras (79): Francisco Augusto Regalla (1871-1937), médico militar: a história de uma família ou de um clã (Juvenal Amado / Manuel Coelho / Armando Tavares da Silva / Patrício Ribeiro / Ricardo Regalla Dias-Pinto)


Guiné-Bissau > Galomaro > 2017 > O ramo da família Regalla em Galomaro


Foto (e legenda): © Juvenal Amado (2017). Todos os direitos reservados. (Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


1. Mensagem de Juvenal Amado

23/06/2017



Luís,  talvez o Ricardo (*) tenha vontade de ver esta foto publicada por uma neta do Sr Regála, o nosso grupo de Galomaro Destino Passagem, do Facebook.

Pensei que iriam gostar de ver a minha Avó Maria e os herdeiros do Sr. Regalla, como estão Hoje!! Os filhos, por or ordem:

Agnelo, 
Celina,
Crisanta (minha mãe),
 Augusto, 
Hazel,
Fatima, 
Nair


2. Mensagem de Manuel Coelho:

24/06/2017




 Caro Luis, por mim podes usar as fotos que entender, livremente.

Vejam só os laços familiares que se descobrem com algum trabalho.
Boa sorte para o livro sobre a família,
abraço

3. Comentário de Armando Tavares da Silva (*):


O capitão/major-médico Francisco Augusto Resgalla vem largamente referido no meu livro "A Presença Portuguesa na Guiné,História Política e Militar, 1897-1926" (Caminhos Romanos, 2016).


4. Comentário de Patricio Ribeiro (*):

Meus amigos,

A  família Regala é muito grande, desde Golomaro, Cabedu, Cobumba e Bissau, com quem privo com frequência.

São pessoas influentes e muito envolvidas com Guiné em diversos sectores, e fazem o favor de serem meus amigos. (**)

Desde o calor de Bissau,
O vosso amigo. Patrício Ribeiro

5. Comentário de Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto (*):

Desde já e mais uma vez o meu agradecimento a todos.

Certamente o livro que estou prestes a publicar irá esclarecer muito mesmo sobre este personagem que é meu bisavô, pai da minha avó Idalina com quem tive a sorte de privar durante longos anos e marido de minha bisavó e sua mulher Palmira Alice Pinheiro Sanches Moreira Regalla (Corujeira),  de Mira, que infelizmente morreu muito cedo.

Muito gostaria de poder adquirir o livro publicado por Armando Tavares da Silva, "A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar, 1897 - 1926)" pelo que peço que me digam onde o poderei comprar.

Cumprimentos e um caloroso abraço a todos,

Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto

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Notas  do editor:

(*)  Vd. poste de  25 de junho de  2017 > Guiné 61/74 - P17509: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (43): o coronel médico, meu bisavô, Francisco Augusto Regalla (Aveiro, 1871 - Mindelo, 1937): pedido de utilização de foto da fortaleza da Amura de cuja guarnição ele fez parte em 1915 (Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto, Cascais)


  (**) Último poste da série > 20 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17489: (De) Caras (85): o testemunho de Manuel Amante da Rosa, embaixador plenipotenciário de Cabo Verde em Itália, sobre o Fausto Teixeira: "era uma figura distinta, opositor ao regime de Salazar, vigiado pela PIDE/DGS, amigo do meu pai que lhe comprou, no início dos anos 70, o último navio que ele levou para a Guiné, um antigo cacilheiro que fazia carreiras regulares para o Xime e para os Bijagós ...Morreu depois do 25 de Abril em Portugal".

domingo, 25 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17511: In Memoriam (299): Dr. Alfredo Roque Gameiro Martins Barata (1938-2017), ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 675, Binta e Guidaje, 1964/66 (José Eduardo R. Oliveira)



1. Mensagem do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO) (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), com data de 25 de Junho de 2017, dando-nos conta do falecimento do ex-Alf Mil Médico, Dr. Alfredo Roque Gameiro Martins Barata, sepultado no passado dia 20 de Junho:

Caro Amigo Carlos

Assunto: In memoriam do Médico da CCaç 675

Votos de que esteja tudo bem contigo e com os teus.
Depois de longa ausência volto à tua presença com uma notícia sempre difícil de transmitir: - partiu desta vida o Alferes Alfredo Roque Gameiro Martins Barata, que foi Médico da CCaç 675, que esteve no Norte da Guiné (Binta e Guidage) entre Junho de 1964 e Abril 1966.
Depois de doença prolongada foi a sepultar no passado dia 20 de Junho corrente.
Contava 79 anos.

Além de admirável ser humano foi excelente médico não só na Guiné mas também depois do regresso a Lisboa , onde continuou a ser “Anjo protector” dos antigos militares da “675” e dos seus familiares, quando precisaram de apoio médico.

Junto um texto e uma foto.
Grande abraço de Alcobaça.
JERO


IN MEMORIAM

Dr. Alfredo Roque Gameiro Martins Barata (1938-2017)
Ex-Alferes Mil. Médico da CCAÇ 675

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Médicos da Tropa!

Para situar o leitor há que referir que o Médico da nossa “estória” estava destacado no norte da Guiné já há cerca de um ano. Vinha de férias para a Metrópole e como o avião da TAP não fazia escala na “nossa guerra” tinha que utilizar alguns meios de transporte alternativos para chegar até Bissau.

Como o seu “Hospital” ficava em Binta, junto ao Rio Cacheu, a primeira fase para chegar a Lisboa obrigava a uma viagem de barco até à sede do Batalhão, que se situava em Farim.
Depois seguia-se uma viagem de “Dakota” (um velho avião da 2.ª Grande Guerra Mundial) que transportava passageiros e carga para Bissau, a capital da Província. Perto de Bissau, mais propriamente em Bissalanca, pousavam os “SuperConstelation” da TAP que nos transportavam para a Lisboa que ficava apenas a …9 horas de voo!
A partir daqui o registo é do”nosso Alferes Médico” e consta das páginas do Diário da CCaç 675, que prestou serviço na Guiné de princípios de Maio de 1964 a finais de Abril de 1966.


"…Estávamos em Binta havia 7 meses, nenhum barco tinha ainda sido atacado e, para ir à Metrópole como seria o meu caso dentro de pouco tempo, qualquer um de nós seria capaz de se meter a caminho nem que fosse a nado.
Porque apesar de todos os melhoramentos que tornam a vida menos dura em Binta, Binta é Binta e Lisboa é Lisboa.
Ora a primeira meta da viagem era precisamente Farim e foi fardado de «ronco» amarelo, de galões dourados e tudo, com máquina fotográfica na mão direita e o saco de bagagem na esquerda que embarquei, despreocupadamente, (e por que não?) certa manhã de Fevereiro numa ronceira LDM rumo àquela vila.
Não ia só. Comigo ia uma pequena multidão colorida e palradora: eram mulheres indígenas cuidadosamente sentadas no chão, com as saias bem enroladas entre as pernas, tendo a seu lado um estendal de tachos e meias-cabaças cheias de tomates e arroz, era um cabrito barulhento e saltitante, eram pretos acocorados fumando cachimbo ou mastigando cola, eram alguns companheiros de Binta (entre os quais o nosso Primeiro Santos) que na proa conversavam.
Toda esta feira flutuante dava uma nota colorida e alegre àquela austeridade cinzenta-bélica tão característica dos navios de guerra. Abandonada a um canto, uma metralhadora apontava para o ar e chamava-nos à verdade: estávamos em guerra. Uns tiros isolados podiam atingir toda esta gente amontoada...
Mas, logo a seguir, a nossa atenção saltava para a vida, para o Sol e para a natureza que nos envolvia.
Chegámos finalmente a Farim, onde, depois de umas horas de espera inútil soubemos que o voo do Dakota tinha sido adiado para o dia seguinte. Paciência só no dia imediato chegaria a Bissau.

Para não ter de dormir numa cama estranha, num ambiente estranho, numa terra estranha, aproveitando o transporte da LDM resolvi deixar a bagagem e voltar rio abaixo até Binta.
A viagem de regresso com os mesmos companheiros foi mais calma. Entardecia. A lancha empurrava as águas paradas, levantando com o seu barulho bandos de pássaros e macacos que na margem, escolhiam poiso para a noite.
No dia seguinte de madrugada, embarquei novamente a caminho de Farim, Bissau e Metrópole, desta vez só, sem o bulício da véspera.
O dia começava a amanhecer, cinzento e húmido; mais tarde viria o sol brilhante e quente. Agora pairava uma neblina ténue junto ao tarrafo que escondia os ramos mais altos e que pouco a pouco se ia desvanecendo com o romper da claridade.
No interior do barco a tripulação tomava a seu café. Em cima, o piloto olhava atento o rio pela vigia largamente aberta na cabine blindada, cortando curvas para abreviar caminho.

Encostado à torre da peça desguarnecida, passava os olhos pelas margens do rio sempre belo, pensando comigo mesmo: - Aqui é a foz do Caur, mais adiante Tambato Mandinga... Mas há aqui uma aberta nas árvores das margens... Se não me engano... Que deixa ver as moranças da tabanca... Sim, é ali. (Já lá tínhamos chegado e com efeito era ali).


De repente, ali mesmo, um clarão reluz, e outro e mais outro.
Antes que me pudesse aperceber do sucedido, caí, não sei se obedecendo ao instintivo "deitar" das instruções de combate, se por ter sentido uma pancada quente e indolor no flanco esquerdo que me puxava para o chão.
As ideias de baço, de hemorragia, de esplenectomia que passaram no espírito, desapareceram rapidamente logo que verifiquei que tudo não passava de um ferimento muscular parietal.
Entretanto a lancha virara de bordo, a fim de conseguir melhor posição de tiro.
O artilheiro subiu ao seu posto de combate e com umas rajadas potentes de calibre 20 mm "calou" o tiroteio inimigo.
Aproveitei para acenar para o local onde deveriam estar os terroristas para que eles, quando fizessem o relatório da "operação", não dissessem que tinham abatido um alferes da tropa de Binta... A lancha voltou ao seu primitivo rumo e continuou Cacheu acima, a caminho de Farim.
Fez-se o balanço da situação; quando souberam que tinha sido atingido de raspão os homens da lancha excederam-se em cuidados pondo ao dispor o material de enfermagem de bordo e oferecendo café quente que aceitei com agrado. Estava em jejum e à minha volta percebia um estranho cheiro a carne assada que depois vi que provinha das feridas.
Discutia-se o ataque; uns diziam que tínhamos sido atingidos com uma bazucada, outros, como eu, sustentavam que os rebentamentos ouvidos não passavam de granadas de mão lançadas da margem para "ronco".
Os malandros tinham visto um oficial a 80 metros, de pé, isolado na coberta da lancha, feito "pato" com as mãos cruzadas ao fundo das costas e esperaram que o alvo ficasse no enfiamento de tiro para abrir fogo.
Pouco depois desembarquei em Farim. O "Dakota" já tinha chegado e, quando a correr a1cancei o Comando, já o avião se preparava para deslocar.
Ainda não era dessa vez que ia para Bissau.
Teria que esperar mais um dia, talvez dois, e, à noite dormi numa cama estranha, num ambiente estranho e numa terra estranha.

Alferes Mil. Médico Alfredo Roque Gameiro Martins Barata".


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O tempo passa e há poucos dias estive na festa de aniversário dos 70 anos do meu Médico.
Setenta anos. Continua jovem, tranquilo, amável e …distraído.
Como não podia deixar de ser recordámos a viagem acidentada do Rio Cacheu.
"Ah sim, lembro-me. Teve um bocado a ver com a guerra do Raul Solnado".
Os filhos a seu lado olhavam-no espantados pois não conheciam essa aventura de seu Pai.
Dei-lhes a ler a “estória” do Diário da CCaç 675, que aqui reproduzo.
De espantados passaram a… pasmados.

Além de excelente Médico foi “Anjo da Guarda” de muita gente - desde os tempos da Guiné até aos dias de hoje ajudou inúmeros ex-militares da sua Companhia e …passou ao lado de uma carreira de escritor.
Digo eu.
JERO

Nota: - Os desenhos que reproduzimos parcialmente são da autoria de seu irmão, Arquitecto José Pedro Roque Gameiro Martins Barata.

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2. Comentário do editor:

Caro JERO,
Bonita esta tua homenagem ao Dr. Pedro Roque Gameiro Martins Barata, publicando esta estória tragico-cómica.

Para ti o nosso abraço solidário porque sabemos estás a sentir a partida deste teu companheiro das horas que ambos dedicaram a favor de quem precisava de cuidados sanitários. Como referes, continuou a dedicar o seu saber, ajudando os antigos camaradas, e seus familiares, quando dele precisassem.

À sua família enlutada apresentamos as nossas condolências.

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Nota do editor

Último poste da série de 16 de maio de 2017 > Guiné 61/74 - P17362: In Memoriam (298): Agostinho Valentim Sousa Jesus (1950-2016), ex-1.º Cabo Mecânico Auto da CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74)

Guiné 61/74 - P17510: Blogpoesia (516): "Paz e a justiça..."; "Sermão da natureza" e "Raridade...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728



1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Paz e a Justiça... 

Duas faces da mesma moeda. 
Numa, tem a bandeira. 
Na outra, a caravela. 
Foi cunhada na eternidade. 
Para correr no mundo. 
Seu estalão é a fraternidade. 
De cotação constante. 
O seu giro é a troca. 
Ela só faz feliz 
Quem a arrecadar... 

Berlim, 25 de Junho de 2017 
10h12m
Jlmg

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Sermão da Natureza

Ó vós governantes desalmados deste País,
Ouvi bem a Natureza em altos berros:
Nem mais um só eucalipto nesta terra
E os que há sejam cortados rentes, um a um.
Vede bem o que fizestes,
Servindo o vil interesse de alguns mesquinhos
E esquecendo o bem geral, a troco de tudo que recebestes, ocultamente.

Muito antes da celulose está a pessoa de cada um.

Aprendei ao menos com esta lição.
Tantas vidas
Tantas casas e tantos sonhos.
Tanta dor que jamais se extingue.

Que os remorsos vos consumam
Até às cinzas.

Berlim, 24 de Junho de 2017
7h51m
Jlmg

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Raridade...

É raro um céu sem nuvens
E um mar sem ondas.
Como a paz da alma.
Há sempre sombras.
Roubam a luz e a alegria.

Viver com pouco é uma arte.
O caminho certo
Que nos faz felizes.

Sorrir à sorte
Que está sempre à espreita
E lutar por ela,
Quando ela falta,
É o remédio santo
Que a faz voltar.

A que saberia a vida
Sem o sabor da esperança?...

Bar do Reichelt em Berlim, 19 de Junho de 2017
9h32m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17483: Blogpoesia (515): "Coro dos pardais"; "Mergulho no passado" e "Não são precisas asas...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P17509: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (43): o coronel médico, meu bisavô, Francisco Augusto Regalla (Aveiro, 1871 - Mindelo, 1937): pedido de utilização de foto da fortaleza da Amura de cuja guarnição ele fez parte em 1915 (Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto, Cascais)


Capa do livro de Ricardo Regalla Dias-Pinto, em preparação. Cortesia do autor



1. Mensagem do nosso leitor Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto

Data: 17 de maio de 2017 às 22:37
Assunto: Fotografia

Exmo. Senhor
Prof. Luís Graça

Estou a escrever um livro sobre a minha família.

O meu bisavô Francisco Augusto Regalla, combateu em 1915 na Coluna de Operações em Bissau pelo que gostava muito de pedir autorização para colocar uma vossa fotografia, mais propriamente a nº 3 da Fortaleza de Amura de cuja guarnição o meu bisavô fez parte durante algum tempo.

Naturalmente que, caso autorizem, terei o maior prazer em nomear o vosso blogue nos agradecimentos do referido livro que terá o título:

Família Regalla: A Hora da Verdade!

Agradeço desde já o tempo por vós dispensado aguardando com confiança a breve resposta.


Melhores e mais respeitosos cumprimentos,

Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto



 Guiné > Bissau >Fortaleza da Amura > Entrada do lado sul (frente ao porto e ao rio Geba).  Foto (º 3)  de Manuel Caldeira Coelho (ex-fur mil trms, CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68)

Foto ( e legenda): © Manuel Coelho (2011). Todos os direitos reservados. (Edição:  Blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné)


2. Resposta do nosso editor, em 22 do corrente:

Ricardo:

Em primeiro lugar, obrigado pelo seu contacto.

Em segundo lugar, parabéns pelo seu projeto: todos temos o "dever de memória", e no seu caso acho lindo que esteja a escrever a história de vida do seu bisavô Francisco Augusto Regalla.

Será que é o coronel médico Francisco Augusto Regalla, nascido em 1871, em Aveiro, e falecido em 1937, no Mindelo ? Pai de Agnelo Augusto Regalla; Mário Augusto Monteiro Regalla; Armanda Monteiro Regalla; Crizanta Monteiro Regalla e Hélia Regalla ?

Alguns dos meus camaradas (e eu próprio) passaram por Galomaro, estiveram em Galomaro ou fizeram operações no regulado do Cossé. Boa parte dos meus soldados africanos (da CCAÇ 12) eram oriundos do Cossé (, outros de Badora).

Em 1969/71, esse seu bisavô já não era vivo. Em todo o caso, nessa altura, havia um comerciante, casado e com família, que dava pelo nome de Regala (ou Regalla)...Seria mais provavelmente seu avô ou um dos seus tios-avôs... Não me lembro do nome próprio, só do apelido de família. Tinha em Galomaro um café e restaurante muito frequentado pelo tropa portuguesa, e em geral com agrado...Naturalmente, não se livrava da suspeita de simpatia pelo PAIGC...

Vou pô-lo em contacto com alguns dos meus camaradas que conheceram pessoalmente esses seus parentes, o sr. Regala e a família de Galomaro...

Quanto ao pedido que me faz, não tenho qualquer objeção, pelo contrário, em satisfazê-lo. Pode usar a foto, com indicação da fonte (autor e blogue)... Mas tenho dúvidas quanto à foto em causa... Será esta a foto nº 3 (Fortaleza da Amura, Bissau, entrada do lado sul, frente ao porto e ao rio Geba) ?

Se sim, os créditos fotográficos são de Manuel Coelho, a quem vou dar conhecimento do seu pedido. Gostaria que ele também lhe desse o seu OK, como autor da foto.

Para já é tudo, embora eu gostasse de saber, muito sumariamente, a razão de ser do título do seu livro: "Família Regalla: A Hora da Verdade!"...E, se nos der autorização, gostaríamos de divulgar também, no nosso blogue, o seu pedido. Haverá com certeza mais camaradas nossos que conheceram o sr. Regala (ou Regalla) de Galomaro e que podem até ter fotos dele (ou com ele) que disponibilizem, digitalizadas, para o seu projeto.

Disponha sempre,

Boa saúde, bom trabalho. Luís Graça

3. Mensagem do Ricardo Regalla Pinto-Dias na sua página do Facebook, de 22/12/2016, sobre o livro que está a escrever com a história da família:

Este é já mais do que um desejo, é uma realidade que surgirá a público no ano de 2017.

Será o livro que contará a história da minha família e o seu contributo para a sociedade portuguesa desde o ano de 1670!

Família essencialmemte de médicos e militares mas também de alguns homens de direito que, por junto, maravcaram aqui e ali a vida de portuguieses e até mesmo de Portugal.

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