quinta-feira, 19 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18538: Recortes de imprensa (94): Herança da guerra (Sílvia Torres, "Diário de Coimbra", 23 de março de 2018)



Diário de Coimbra, sexta.feira, 23 de março de 2018, p. 9. (Cortesia da autora e do jornal)



1. Recorte enviado em formato pdf pela nossa amiga, grã-tabanqueira nº 736, Sílvia Torres. Reproduzido com a devida vénia. Fonte: Diário de Coimbra, 23 de março de 2018, p. 9. (*)

Pequena nota biográfica:

(i) Sílvia Torres nasceu em Mogofores, Anadia, em 1982;

(ii) licenciada em Jornalismo e Comunicação e mestre em Jornalismo;

(iii) começou por ser jornalista do Diário de Coimbra;

(iv) entre 2007 e 2014, como oficial da Força Aérea Portuguesa, trabalhou na Rádio Lajes (Terceira – Açores) e no Centro de Recrutamento da Força Aérea (Lisboa), cumprindo ainda uma missão de
cooperação técnico-militar em Timor-Leste;

(v) atualmente é doutoranda em Ciências da Comunicação pela Universidade NOVA de Lisboa e bolseira de investigação da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT);

(vii) a sua pesquisa centra-se na cobertura jornalística da Guerra Colonial feita pela imprensa portuguesa de Angola, da Guiné Portuguesa e de Moçambique, entre 1961 e 1974;

(viii) o facto de ser filha de um ex-combatente justifica o interesse pessoal e académico pelo conflito.

Guiné 61/74 - P18537: O Cancioneiro da Nossa Guerra (7): "Marcha de Regresso" (Recolha de Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, "Zorba", Gadamael e Ganturé, 1967/ 68)



Brasão da CART 1659, "Zorba" (Gadamael e Ganturé, 1967/68). Divisa; "Os Homens Não Morrem".




Lisboa > Belém > Forte do Bom Sucesso > Liga dos Combatentes > 22 de maio de 2014 > 17h30 > Sessão de lançamento do livro do nosso camarada Mário Gaspar, "Corredor da Morte", edição de autor, 2014 > Sessão presidida pelo gen ref Chito Rodrigues, presidente da direção da Liga dos Combatenrtes, com a participação ainda do psiquitra Afonso de Albuquerque (que prefaciou a obra), da prof Ermelinda Caetano, do presidente da APOIAR, Jorge Gouve

"Nesta foto, estou a autografar o livro do capitão [, hoje, advogado,  Manuel Francisco Fernandes de Mansilha,] que fala com o 1.º cabo cripto Mendes, o autor dos versos "Os Homens Não Morrem".1O ex-1.º cabo cripto António Luís Faria Mendes foi funcionário da Ordem dos Médicos na cidade do Porto."


Fotos (e legendas) : © Mário Gaspar (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Marcha de Regresso


Rapazes, cantai cantigas,
Alegres e animadas,
Acabaram-se as fadigas
Das patrulhas e emboscadas.

Bravos rapazes da ZORBA,
Dispostos a trabalhar,
Sejam barcos ou colunas,
É sempre, sempre, a alinhar.

Viemos para a Guiné,
Prontos a combater,
Pica, estiva e sapa até,
Tudo soubemos fazer.

Ao partirmos com saudades…
A saudade é uma mulher,
Que tenha felicidades
Quem depois de nós vier.

CORO

Cá vai a malta da ZORBA,
Toda alegre e sorridente,
Alegria não nos falta,
Que a tristeza mata a gente.
Cá a vai a malta da ZORBA...
Corações cheios de fé,
Depois da missão cumprida,
Gadamael – Ganturé,
Situadas lá no sul,
Da província da Guiné.


Ao regressarmos a casa,
Para nós a vida muda,
O cântaro perde a asa,
Nós ganhamos a peluda.

Já vai chegando o momento
De à Guiné dizer adeus,
De acabar o sofrimento,
Voltar a abraçar os meus.

Mais de vinte meses é vitória,
A ZORBA é das primeiras
E vai constar da história
Lá no RAC, em Oeiras.

A ZORBA cumpriu o seu dever
E seu nome deixou gravado,
Nunca a iremos esquecer,
Honra ser-se seu soldado.

(Recolha de Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, "Zorba", Gadamael e Ganturé, 1967/ 68)

[Revisão / fixação de texto: MG / LG]


Mensagem, de 17 do corrente, de Mário Gaspar

Luís,

Tenho imensos textos da minha autoria, escritos após o regresso, principalmente aqueles que publiquei no meu livro “O Corredor da Morte” [edição de autor, 2014]. No mesmo livro também constam versos que escrevi em Gadamael Porto para um grande amigo (nalguns casos possuo os aerogramas e cartas). Estes versos possuem a curiosidade de estarem virgens – publiquei-os sem os rever – transmitem o meu estado de espírito da altura.

Ainda existem os versos da autoria da prima da minha falecida mãe, de nome Piedade, que a mesma ofereceu, feitos numa Gráfica Tipografia,  aos convidados (amigos e familiares) no dia do meu regresso a casa, na festa que os meus pais organizaram.

Também os versos da “Marcha do Regresso” da “ZORBA”, que agora junto, Estes foram escritos por vários autores.

Os versos recolhidos no almoço, de 2015, da CART 1659, ZORBA,  “Os Homens não Morrem”, são de António Luís Faria Mendes,  ex-1.º Cabo Operador Cripto, que não esteve nessee  almoço de confraternização.(*)

Julgo não teres dúvidas. Como disse inicialmente,  escrevi muitos versos posteriormente à chegada. Alguns, nunca os publiquei, outros foram lidos em tertúlias de poesia, onde esteve a minha grande amiga Felismina Mealha, membro da nossa Tabanca Grande, tendo ela lido alguns.

Envio, talvez o principal. Como disse,  escrevi já após o regresso da Guiné alguns versos - denomino-os como "POÉSIAS". Possuem o inconveniente de serem longos. Se tiveres dúvidas diz.

Um abraço, Mário Vitorino Gaspar

PS - Lá em Gadamael, criámos  um conjunto musical denominado “Os Caveiras” cujos instrumentos tinham a particularidade de serem feitos com chapa de bidão, peles de cabra de mato, marmitas, colheres, etc. e quase sempre animou os almoços de confraternização realizados mensalmente entre todo o pessoal da Companhia.

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Guiné 61/74 - P18536: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (54): no tempo em que havia uma irmandade 'intercolonial' e um cabo-verdiano, um são-tomense ou um goês se sentia em casa num país como Angola

1. Comentário do nosso amigo e camarada  António Rosinha, a propósito da Amédia Araújo hoje uma senhora de oitenta e tal anos, que vive em Cabo Verde, que foi caaada com o dirigente do PAIGC, José Araújo, e que era conhecida, no TO da Guiné, pelas NT, como a "Maria Turra",  ou seja, era a locutora de serviço da "Rádio Libertação", que emitia a partir de Conacri (*)

[António Rosinha, foto à esquerda, 2007, Pombal, II Encontro Nacional da Tabanca Grande:

(i) beirão, tem mais de 100 referência no nosso blogue;

(ii) é um dos nossos 'mais velhos' e continua ativo, com maior ou menor regularidade, a participar no nosso blogue, como como autor e comentador;

(iii) andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado;

(iv) fez o serviço militar em Angola, sendo  fur mil, em 1961/62;

(v) diz que foi 'colon' até 1974 e continua a considerar-se um impenitente 'reacionário';

(vi) 'retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil), até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência';

(vii) o seu patrão, o dono da TECNIL, era o velho africanista Ramiro Sobral;

(viii) é colunista do nosso blogue com a série 'Caderno de notas de um mais velho'';

(ix) pelo seu bom senso, sabedoria, sensibilidade, perspicácia, cultura e memória africanistas, é merecedor do apreço e elogio de muitos camaradas nossos, é profundamente estimado e respeitado na nossa Tabanca Grande, fazendo gala de ser 'politicamente incorreto' e de 'chamar os bois pelos cornos';

(x) ao  Antº Rosinha poderá aplicar-se o provérbio africano, há tempos aqui citado pelo Cherno Baldé, o "menino e moço de Fajonquito": "Aquilo que uma criança consegue ver de longe, empoleirado em cima de um poilão, o velho já o sabia, sentado em baixo da árvore a fumar o seu cachimbo". ]


2. Caderno de notas de uma mais velho > A irmandade 'inter-colonial' (**)


Como esta senhora do PAIGC, havia muitos cabo-verdianos em Angola em que, tal como na Guiné, em todas as repartições e em todas as capitais de distrito, sobressaía a sua presença.

Vou dizer uma coisa que muita gente pode não acreditar e considerar tolice minha:

Quando Amílcar Cabral na fundação do PAIGC, se torna simultaneamente co-fundador do MPLA, havia um sentimento de irmandade entre todos os que foram estudantes da "Casa do Império" de todas as colónias portuguesas, que hoje já não existe mais, e hoje já não existe mais essa irmandade.

Embora apoiem todos a CPLP, e os dirigentes todos falem português, nota-se que há indiferença entre eles.

No tempo colonial, um cabo-verdiano, um  são-tomense ou um goês, que eram os que mais emigravam, iam para Angola ou Moçambique ou Guiné, co-habitavam e conviviam naturalmente como se nunca tivessem ido para terra estranha.

Daí, Amilcar Cabral ou os irmãos Pinto de Andrade por exemplo, relacionarem-se com todos os dirigentes angolanos ou guineenses como se fossem patrícios uns dos outros.

Acabou esse relacionamento, e até se nota em alguns casos, como no caso da Guiné, desentendimentos com angolanos e cabo-verdianos.

E com Moçambique há um maior  distanciamento, o que se nota perfeitamente.

Esse relacionamento "inter-colonial» era muito interessante, mas só essa gente tropical é que a poderia explicar melhor, mas não explicam.

Uns morreram, outros "matarm-se" [uns aos outros], e a maioria foi inibida de poder falar.

Cumprimentos

Antº Roxinha

2 de dezembro de 2015 às 15:42  (*)


3.  Sobre a "Maria Turra", alcunha de Amélia Sanches Araújo, dada pelos "tugas", no TO da Guiné à locutora da Rádio Libetarção , e que muitos pensavam ser a própria companheira de Amílcar Cabral, a Ana Cabral:

Amélia Sanches Araújo [tem uma dezena de referências no nosso blogue como "Maria Turra"]

(i) nasceu em Luanda, sendo de origem cabo-verdiana;

(ii) era casada com José Araújo (1933-1992), antigo dirigente do PAIGC e antigo ministro da Educação de Cabo Verde; 

(iii) fugiu, em Lisboa, em 1961,  com um grupo de cerca de 6 dezenas de "estudantes do Império", onde estavam os futuros  presidentes de Cabo Verde, Pedro Pires, e de Moçambique, Joaquim Chissano, e futuros -primeiros-ministros de Angola e Moçambique Fernando Van Dunen e Pascoal Mocumbi;

(iv) na  Guiné esteve com o marido, na "luta de libertação" daquele país e de Cabo Verde;

(v) o seu m papel de `heroína` só agora começa ser  reconhecido em Cabo Verde, onde vive com 84 anos de idade;

 (vi) em Conacri e ao serviço do PAIGC,  era locutora e a voz mais conhecida das emissões em português da Rádio Libertação, do PAICG, partido do qual o marido era dirigente e responsável pela área de informação.

(vii) em declarações à agência Lusa, em 2017,  mais de 40 anos após as independências, Amélia Araújo disse que «valeu a pena» a luta armada, apesar do seu inicial cepticismo em relação a Cabo Verde;

(vii) o casal regressari a Cabo Verde em 1980, após o golpe de Estado liderado por 'Nino' Vieira.

Fonte: Adapt de Observatório de África > 19 de janeiro de 2017 > Mulheres cabo-verdianas na luta pela independência
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Notas do editor

(...) Um dos episódios recentes deste programa da Antena Um foi justamente sobre a Rádio Libertação, o seu papel, na propaganda e contrapropaganda do PAICG. Não se pode fazer a história desta rádio sem falar da "Maria Turra", a angolana, de origem cabo-verdiana, Amélia Sanches Araújo, que lhe deu voz e alma de 1967 a 1974... Aderiu ao PAIGC em janeiro de 1964. Com mais quatro guineenses, a Amélia Arújo foi enviada por Amílcar Cabral para uma formação de nove meses na União Soviética. Em maio de 1967 a União Soviética entrega ao PAIGC, através do seu embaixador em Conacri, uma estação de rádio. (...)

(**) Último poste da série > 4 de novembro de 2017  > Guiné 61/74 - P17935: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (53): Os "comerciantes" e os "outros"... Lá, em Angola, Guiné e Moçambique, muitas vezes mais valia um ano de tarimba do que dez de Coimbra...

Guiné 61/74 - P18535: Parabéns a você (1422): Augusto Vilaça, ex-Fur Mil Art da CART 1692 (Guiné, 1967/69); Leão Varela, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1566 (Guiné, 1966/68)e Victor Barata, ex-1.º Cabo Especialista MMA - DO 27 da BA 12 (Guiné, 1971/73)



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Nota do editor

Último poste da série de 18 de Abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18532: Parabéns a você (1421): Raul Brás, ex-Soldado Condutor Auto da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18534: Historiografia da presença portuguesa em África (113): Imagens e relatórios dos actos de vandalismo praticados pelo MLG, na Praia de Varela, em Julho de 1961, encontrados no acervo documental do Banco Nacional Ultramarino (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Janeiro de 2018::

Queridos amigos,
São estes os felizes acasos que gratificam as horas a folhear inúmeros dossiês, cujo conteúdo, em tantíssimos casos, é inodoro, insípido e incolor. E assim se chegou ao vandalismo perpetrado pelo MLG - Movimento de Libertação da Guiné, capitaneado por François Mendy, seguramente figura anda simpática para Amílcar Cabral, conforme o comunicado de Novembro 1963, que também se apensa com a documentação trocada sobre estas destruições.
Atenda-se que os responsáveis do BNU na Guiné procuravam as melhores fontes, estou presentemente a analisar o desencadear das hostilidades por parte do PAIGC e as preciosas informações que o gerente de Bissau envia para Lisboa, não hesito em dizer que se trata de uma documentação de estalo.

Um abraço do
Mário


Julho de 1961: o MLG pratica vandalismo na praia de Varela

Beja Santos 

A primeira grande manifestação de práticas subversivas na Guiné teve lugar em Julho de 1961, com ações em S. Domingos, Susana e Varela, era o primeiro sinal de organizações armadas, sediadas no Senegal. O PAIGC está ainda em fase de preparativos, Cabral enviou um lote de quadros para a China, a propaganda e subversão será desencadeada no Sul, em 1962.

Foi no acervo documental do Arquivo Histórico do BNU que encontrei imagens desse vandalismo em Varela, onde o BNU era proprietário de duas casas de férias. Todo o processo da aquisição das duas moradias está perfeitamente identificado. Em Agosto de 1961, Castro Fernandes, um dos administradores do BNU e figura proeminente do Estado Novo, visita Varela e escreve que “As casas do Banco foram pilhadas de todo o seu cheio recheio, e partidos os vidros e objectos sanitários. Os edifícios nada sofreram, havendo, apenas, que limpá-los e, porventura, pintá-los. Nada deverá ser feito sem que o governo da Província possa assegurar o policiamento militar daquela estância de repouso. Logo que esta cobertura militar for feita, a gerência providenciará no sentido de reparar o que haja de ser reparado e promoverá para que fiquem mobilados como estavam. Quando a defesa e policiamento da praia for feita, autorizo que seja entregue ao governador da Província um subsídio de 100 contos destinado a contribuir para as reparações no edifício do hotel e arranjos urbanísticos”.

A situação irá normalizar-se em Março de 1962, já há cobertura militar. O gerente desloca-se a Varela depois de obter autorização no comando militar e informa Lisboa do seguinte:
“Encontra-se ali um pelotão de 30 homens comandados por um alferes. Não nos parece, na nossa rápida estadia, que reinasse ali uma grande disciplina. Deve-se isso, talvez, ao facto de estarem isolados e viverem durante largo tempo em comum, e comandados por um rapaz ainda bastante novo.
As tropas estão alojadas na antiga residência de Verão do governador da Província, e ainda no antigo hotel que ali havia pertencente a João Manuel Pireza que tudo perdeu, e, está agora em Bissau, explorando um hotel. O aspeto daquilo tudo, que antes era praia com alguma concorrência, até de franceses que vinham do território vizinho, é bastante desolador. Houve vandalismo puro. Além de terem roubado o que encontraram, espatifaram os interiores das casas que lá existiam, e ainda o que é mais grave com a conivência daquelas que lá viviam e serviam há longos anos.

As casas do banco conservam as paredes exteriores e interiores em razoável estado. Os armários interiores, vidros, instalações elétricas, tudo está partido e estragado. Os quadros elétricos também desapareceram. Os lavatórios foram roubados, alguns dos outros artigos sanitários estão partidos. Faz pena tanta desolação.
Também nos surpreendeu não haver lá qualquer vedeta ou lancha, como parece ter havido anteriormente e intercepte os barcos que navegam afoitamente nas nossas águas muito perto à praia. Alguns militares com quem falámos sobre isso disseram-nos desconfiar levarem armamentos que descarregam perto em Catão. Esta nossa observação foi posta numa conversa que tivemos com o chefe dos serviços secretos militares com quem quase todos os dias nos encontramos. Ficou pensativo mas nada nos disse. Não nos admirou o silêncio. Faz parte da sua missão.
Para V. Exas. poderem melhor apreciar os actos de malvadez e vandalismo que sofreram as casas do banco, cuja construção presidiu a óptima ideia de proporcionar ao pessoal umas férias confortáveis e repousantes depois de um ano de labuta, junto remetemos 11 fotografias tiradas pelo gerente da Filial".




As 11 fotografias que encontrei no arquivo não estão em bom estado, reproduzem-se aqui talvez as três melhores e que permitem visualizar a pilhagem e destruição que por ali andou.




Num outro dossiê encontrei referência a François Mendy, o dirigente do MLG que andou envolvido nessas façanhas. Trata-se de um comunicado do PAIGC com data de 15 de Novembro de 1963 em que Amílcar Cabral adverte que fora criado em França uma organização destinada a angariar fundos junto dos africanos O fundador do PAIGC alerta para a ladroeira a que estavam a ser vítimas por parte de François Mendy, um vigarista encartado. E assim termina: “Cuidado com os ladrões e traidores que aproveitando a vossa boa-fé vos rouba, assim como ao nosso Partido. Fora com os ladrões da espécie do François Mendy".

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Nota do editor

Último poste da série de 7 DE MARÇO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18388: Historiografia da presença portuguesa em África (111): Um estudo desconhecido sobre a etnia Manjaca em O Mundo Português, por Edmundo Correia Lopes (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18533: (D)outro lado do combate (27): A mobilidade das populações por efeito da guerra: o caso de Quitafine, com 41 tabancas que foram riscadas do mapa (ou cuja população foi deslocada), segundo relatório de cabo-verdiano, comissário político, José Araújo (1933-1992), casado com a Amélia Araújo, a nossa "Maria Turra" (Jorge Araújo)


Citação: Mikko Pyhälä (1970-1971), "José Araújo e Nino Vieira" [dois cérebros da guerra, sendo o primeiro, cabo-verdiano, com formação universitária portuguesa], CasaComum.org, Disponível HTTP: http://www.casacomum.org/cc/ visualizador?pasta=11025.008.026 (2018-4-13) [ Fonte:  Fundação Mário Soares > Casa Comum >Arquivo Amilcar Cabral...com a devida vénia]



O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494  
(Xime-Mansambo, 1972/1974).


Mensagem do nosso editor, Jorge Araújo, com data de 13 do corrente:

Caro Luís, boa tarde.

Perdi a cabeça... numa 6.ª feira, treze.

Fiz mais um texto... deixando para trás outros mais antigos... é a vida!

No final do documento coloquei mais três fotos para, caso entendas escolher alguma, ou todas, as poderes utilizar.

Até breve. Bom fim-de-semana.


Ab. Jorge Araújo.

GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE > A FISIONOMIA HUMANA NO SECTOR DE QUITAFINE [FRENTE SUL] APRESENTADA POR JOSÉ ARAÚJO À DIRECÇÃO DO PAIGC EM RELATÓRIO DATADO DE 16OUT1971: A MOBILIDADE DAS POPULAÇÕES POR EFEITO DA GUERRA 


1.  INTRODUÇÃO



Porque tudo na vida é processo e projecto, conceitos que se reformulam na dialética "ordem / desordem" para dar lugar a uma nova "ordem", apresento hoje no fórum mais um tema novo, se a memória e a investigação não me atraiçoam, este relacionado com a "mobilidade das populações da Guiné, do nosso tempo, por efeito da guerra". (*)

É que, de facto, o comportamento psicossocial das populações no início do conflito ficou marcado, ou foi influenciado, inexoravelmente, pela sucessão de acontecimentos, que deram lugar a uma inevitável "desordem" social e étnica, alguns ainda antes do 23 de janeiro de 1963, com o ataque ao quartel de Tite, localizado na região de Quínara, e que depois se alargaram cumulativamente a todo o território.

A oportunidade desta apresentação, a meu ver, enquadra-se nas imagens que o nosso camarada tertuliano, o ex-alf mil inf Luís Mourato Oliveira,  tem vindo a partilhar neste espaço colectivo que é a «Tabanca Grande», e que estiveram guardadas durante mais de quatro décadas no seu baú de memórias. (**)

Por isso é justo e oportuno agradecer-lhe essa disponibilidade e atenção, ele que ficou também na história da guerra por ter sido, em função dos acontecimentos do "25 de Abril", o último cmdt do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74) antes da proclamação da independência da Guiné, declarada em 23 de Setembro de 1974.

Por outro lado, as últimas imagens postadas nos P18504 e P18517, tendo por pano de fundo a delegação do PAIGC que visitou Missirá em julho de 1974 no âmbito dos acordos de cessar-fogo, e com as quais se fecharia o ciclo temporal deste conflito armado, que uns chama(ra)m «guerra do ultramar», outros "guerra de África", outros "guerra colonial"  e outros  ainda  «guerra de libertação», conforme a sua posição no cosmo, continuam a suscitar novas reflexões, sinal que se mantêm bem vivas, em cada um de nós, algumas das memórias gravadas ao longo das múltiplas vivências desses tempos ultramarinos, independentemente do lugar, época e contexto.

Porque nos postes acima se referem as imagens de alguns dos actos finais ocorridos na mata do interior do território (Missirá, sector L1, região de Bafatá. zona leste, "chão fula"...), proponho voltar ao início do conflito, apresentando um pedaço da "geografia social e étnica" dessa época, em particular da região da Frente Sul [, segundo o dispositivo do PAIGC], especificamente do Sector de Quitafine, por onde tenho "circulado" nos últimos tempos (entenda-se, em termos de investigado), de modo a fazer-se a ponte temporal de mais de uma década.

Em função do exposto, é difícil não concordar que a mobilidade das populações, por efeito da guerra, foi uma realidade, obrigando-as a tomar opções concretas no imediato, cujas decisões só tinham três hipóteses principais: a primeira, ficando sob o controlo da "ordem instalada" (a administração portuguesa); a segunda, transitando para além das fronteiras (exterior); e a última, aceitar fazer parte do universo da guerrilha nacionalista.

Para a elaboração deste trabalho socorri-me, uma vez mais, de um documento existente nos arquivos de Amílcar Cabral (1924-1973), disponível na Casa Comum – Fundação Mário Soares, intitulado «Relatório sobre o Sector de Kitáfine», assinado por José Araújo, Comissário Político e Produção para a Frente Sul, datado de 16 de Outubro de 1971, com trinta e nove páginas (sitio: hdl.handle.net/11002/fms_dc_40058).





Folha de rosto e introdução do relatório do José Araújo, "O Sector de Kétafinme" (sic), datilografado, 39 páginas, datado de 16 de outubro de 1971, e feito na base de Kandiafara (Guiné-Conacri). Fomte: Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral (com a devida vénia...)


Quanto ao perfil de José Araújo, de seu nome completo José Eduardo de Figueiredo Araújo (1933-1992), à data do relatório, ele era também membro do Conselho Superior da Luta e do Comité Executivo da Luta. 

À laia de resenha biográfica, acrescente-se que este dirigente do PAIGC nasceu em 1933 na cidade da Praia, ilha de Santiago, em Cabo Verde, foi aí que fez os seus estudos primários. Em 1942, com apenas 9 anos, seguiu com a família para Angola, uma vez que o seu pai era funcionário da Fazenda (Finanças). Com uma bolsa de estudos atribuída pelos Correios de Angola, José Araújo desloca-se para Lisboa com o objectivo de realizar os seus estudos universitários na Faculdade de Direito de Lisboa, onde, em 1961, concluiu a sua licenciatura em Direito. 

Porém, no ano anterior tinha-se tornado militante do MPLA na clandestinidade, depois de ter-se envolvido numa intensa actividade associativa universitária. Em 1961 faz parte do grupo de africanos,  universitários, que decidem fugir para França. Seguiu-se depois o Gana. Após ter militado no MPLA, associa-se ao PAIGC, vindo a instalar-se em Conacri, com a sua família, dois anos depois, em 1963.

Com a independência da Guiné-Bissau, as suas novas funções políticas foram desenvolvidas como ministro do Secretariado. Entre 1975 e 1980, foi ministro sem pasta. Após essa data transferiu-se para Cabo Verde, onde desempenhou as mais elevadas responsabilidades políticas no novo contexto, em particular o cargo de ministro da Educação. Viria a falecer na sua terra natal, exactamente dezanove anos depois do assassinato de Amílcar Cabral, em 20 de Janeiro de 1992 (Fonte: adapt. de pascal.iseg.utl.pt/~cesa/images/files/ diaspora2016_texto4.pdf).

À data da sua morte era casado com Amélia Araújo, a locutora da "Rádio Libertação", conhecida entre nós como "Maria Turra"  (vidé P15434).


2. A MOBILIDADE DAS POPULAÇÕES NO SECTOR DE QUITAFINE POR EFEITO DA GUERRA – 41 TABANCAS DESAPARECIDAS


A propósito do conteúdo do "relatório" elaborado por José Araújo, este refere que ele tem por base a sua missão ao Sector de Quitafine [, Kétafine, sic, como vem grafado no relatório], realizada entre 14 de setembro e 8 de outubro de 1971. Aí teve a oportunidade de contactar com todos os responsáveis desse sector, incluindo a visita a duas bases do Exército (em Comissorã e em Cabonelo), ao Hospital (em Campo, ou Campum, no relatório) e ao Posto Civil (em Cassacá), local histórico para o PAIGC, pois foi aí que realizou o seu 1.º Congresso, que decorreu entre 13 e 16 de fevereiro de 1964.

Acrescenta que o Sector de Quitafine foi dos primeiros em que se fez a mobilização e se instalou a luta armada. Foi aí, no mato de Campo, que, dizem os pioneiros, nasceu a primeira "barraca" [acampamento] do partido no Sul, ainda antes da guerra.



Guiné > Região de Tombali > Carta de Cacine (1960) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Cassacá, a 15 km a sul de Cacine, região também como conhecida como Quitafine (falta-nos  a carta de Cassumba, com a ponta sul de Quitafine, que não está "on line"... Ver também carta de Cacoca.)

Fonte: Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)

"A situação criada à aviação inimiga [NT] com a instalação de antiaéreas em Quitafine e as pesadas derrotas que sofreu na sua tentativa de recuperação dessas armas, talvez expliquem a sanha com que se dedicou à destruição de tudo quanto via mexer em Quitafine, nos anos 68 e 69. A partir de 69 (fins), Quitafine começou a "arrefecer". […]

"É preciso ter-se em conta este passado para se compreender muito da actual fisionomia de Quitafine e os seus problemas. Quitafine, que era das áreas mais povoadas do Sul, só tem hoje [1971] 12 tabancas, organizadas em 9 comités. Repare-se que aquilo a que hoje se chama Tabancas e a que se dão nomes antigos, pouco tem a ver com as antigas tabancas. As populações, que conservaram os nomes das suas antigas tabancas, estão dispersas nos tarrafos e num ou noutro mato mais favorável. 

Além disso, grande parte (se não a maioria) da população das tabancas antigas ainda "presentes" dispersou-se pelas tabancas fronteiriças da República da Guiné, quando não foi juntar-se aos tugas. Penso também que alguns erros cometidos no trabalho político inicial devem explicar a actual fisionomia humana de Quitafine" (op. cit., pp 2/3).


No Relatório estão identificados os nomes de quarenta e uma Tabancas que deixaram de existir na região de Quitafine, e que serão referidas abaixo.

A organização da sua apresentação contém alterações em relação à original. Como metodologia seleccionada, optámos pela ordenação alfabética para melhor localização da ordem estabelecida. Quanto ao conteúdo textual, existem algumas (pequenas) correcções, particularmente no que concerne à construção semântica e unificação da descrição, mas que não alteram o sentido apresentado.

Eis, então, os nomes da Tabancas desaparecidas por efeito da guerra no Sector de Quitafine (n=41)

● BANERE –> Tabanca de Fulas. Retiraram-se para CAMABANGA e SATENIA, na República da Guiné. O chefe – Mamassalu – encontra-se na segunda destas tabancas.

● BIRCAMA –> Tabanca de Beafadas. Foram todos para os tugas.

● CABOBAR –> Tabanca de Nalús, pequena. Uma morança só. Toda a gente retirou-se para GÃ BIT FONE, CARAQUE e BISSAMAIA, na República da Guiné.

● CABOXANQUE –> Tabanca de Fulas. Foram todos para a República da Guiné, tendo-se instalado em várias tabancas, em especial na de CUN-HA e CAMABANGA. [Não confundir eventualmente com Caboxanque, no Cantanhez, na oputra margem do Rio Cacine]

● CABOXANQUEZINHO –> Tabanca de Fulas e Tandas. Os tandas espalharam-se na República da Guiné, longe da fronteira. Os Fulas foram para os tugas, à excepção de duas pessoas (Beila  Baldé e a irmã), que foram para CALAFIMETE, na República da Guiné.

● CABOMA –> Tabanca de Sossos. Só duas pessoas foram para os tugas. O resto juntou-se à população de CAMISSORÃ.

● CABONEPO –> Tabanca de Sossos e Beafadas. Havia também um cabo-verdiano de nome Leão Gabriel. O caboverdiano foi para Dacar (ao que parece). O resto foi para CARATCHE, GAFARANDE e CABACO, na República da Guiné. Só ficou um Homem Grande, de nome Idrissa Keita, que se instalou no mato, em CASSACÁ.

● CACAFAL –> Tabanca de Nalús. Toda a gente foi para os tugas, à excepção do camarada Ansumane Djassi, do Exército, que está em FULA MORI.

CACOCA –> Tabanca de Sosso, Nalús, Bagas, Fulas e Lândumas. Só se retirou uma família (Canforseco Keita), que está em CAPOQUENE. O resto ficou com os tugas.

● CADUCÓ –> Tabanca essencialmente de Nalús. Foram para a fronteira, tendo-se instalado em CAN-HOR, uma parte, e a outra em CATCHIQUE.

● CAIANQUE –> Tabanca de Nalús. Refugiaram-se em CAMAÇO e CATCHIQUE, na República da Guiné,

● CAIÂNTICO –> Tabanca de Beafadas. Foi gente para os tugas e o resto para HAMDALAYE e CABUM-ANE, na República da Guiné.

● CALAQUE –> Tabanca de Sossos, Fulas, Manjacos e Lândumas. À excepção de duas moranças de Manjacos, toda a gente retirou-se para tabancas fronteiriças da República da Guiné. As duas moranças de Manjacos instalaram-se no mato de CALAQUE.

● CAMBAQUE –> Tabanca de Nalús. A maioria da população foi para os tugas. Alguns elementos foram para CASSAMA e CARAQUE, na República da Guiné. 

● CAMBEQUE –> Tabanca de Nalús. Retirou para BAKILONTON E IAMAN, na República da Guiné. Alguns foram depois daí para os tugas.

● CAMBRAZ –> Tabanca de Mandingas. Toda a população juntou-se aos tugas.

CAMECONDE –> Tabanca de Nalús. Só retiraram duas famílias (Almani Keita e Braima XCamaré), que estão em CASSANSSANE, na República da Guiné. O resto ficou com os tugas.

● CAMISSORÃ –> Tabanca de Sossos, Nalús, Mandingas, Beafadas e Fulas. Os Fulas foram todos para a República da Guiné. Houve também gente de outras tribos que se refugiou. Ficou pouca gente, que se refugiou nos tarrafos de CAMPUM [ou Campo], e que tem o seu comité.

● CAMPEANE –> Tabanca de Nalús e Sossos, essencialmente. Refugiaram-se igualmente em CAIETCHE e CATCHIQUE.

● CAMPEREMO –> Tabanca de Nalús e Beafadas. Uma morança de beafadas está em Hamdalaye. Uma outra (Mamadu Dabo) está para os lados de CANELAS. Duas famílias estão em CARATCHE (Ansumane Dabo e Tomás Dabo). O resto foi para os tugas.

● CAMPO –> Tabanca de Fulas. Retiraram-se para CASSEMAQUE, BAGADAYE, e outras, na República da Guiné.

● CANDEMPANE –> Tabanca de Nalús. Só ficou o camarada Ansumane Dabo, que é actualmente instrutor das FAL no sector. O resto foi para os tugas.

● CANFEFE –> Tabanca de Sossos e Nalús. Retiraram-se todos para tabancas da República da Guiné.

● CANTEDE –> Tabanca de Nalús. Toda a população juntou-se aos tugas.

● CANTOMBOM –> Tabanca de Nalús. Foram todos para os tugas.

● CARIMPIM –> Tabanca de Nalús. Toda a população refugiou-se em CARATCHE.

● CASSENTEM –> Tabanca de Nalús e Balantas. Os Nalús foram para CALAFIMET e CAMAÇO, na República da Guiné. Os Balantas mantiveram-se no interior, tendo-se instalado nos tarrafos de TAFORE e CASSEBETCHE.

● CASSOME –> Tabanca de Nalús. Instalaram-se em CARAQUE, na República da Guiné.

● CATONAIE –> Tabanca de Nalús. Foram todos para os tugas.

● CATRIFO –> Tabanca de Nalus. Toda a população foi para os tugas, à excepção da família Ali Keita, que retirou-se para MAMADIA, na República da Guiné.

● CATUNAIE –> Tabanca de Nalús. Ficou uma família (Abdu Camará) nos tarrafos de CASSEBETCHE. O resto refugiou-se em CASSEMAQUE, na República da Guiné.

● CATUNGO –> Tabanca de Nalús. Foram todos para os tugas, à excepção de uma mulher, Mama Camará que está em CARATCHE, na República da Guiné.

● CAULACA –> Tabanca de Sossos e Nalús. Dessa tabanca, que se tinha retirado para a fronteira com a República da Guiné, toda a gente voltou para dentro. Estão instalados nos matos de CASSACÁ.

● CUGUMA –> Tabanca de Nalús. Foram todos para CACINE.

● CUNFA –> Tabanca de Nalús. Toda a tabanca foi para os tugas, à excepção de uma família (Amadu Dabo), que retirou-se para IAMANE, na República da Guiné.

● DÉBIA –> Tabanca de Nalús. Alguns elementos refugiaram-se em TANENE e IAMANE, outros foram para os tugas.

● MANSABATÚ –> Tabanca de Nalús. Foram todos para os tugas, só tendo ficado uma pessoa – um camarada, o enfermeiro do bigrupo em missão na área, de nome Mamadu Keita, mais conhecido por Tam Atna. [Este bigrupo tinha como Cmdt Cinur N'Tchir, natural de Cafine, onde nasceu em 1943. Actuava na Frente «Buba – Quitafine»[

SANCONHÁ –> Tabanca de Beafadas. Foram poucos para os tugas, os outros estão para os lados de SANSALÉ, na República da Guiné.

● TADI –> Tabanca de Nalús. Toda a população refugiou-se em CARATCHE.

● TARCURÉ –> Tabanca de Nalús. Foram todos para os tugas.

● TUBANDI –> Tabanca de Djacancas [um subgrupo da etnia Mandinga]. Retirou para CAPOQUENE e N'DJAILÁ, na República da Guiné.

Será que alguém ouviu falar ou esteve em alguma destas tabancas? [Há referências no nosso blogue a algumas destas tabancas, não fiz unma pesquisa exaustiva.]

Aguardo. Obrigado pela atenção.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
13ABR2018.



Citação: (s.d.), "Tabanca no interior da Guiné, ao fundo distinguem-se mulheres cozinhando", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_ dc_43022 (2018-4-13) (com a devida vénia).



Citação: (1963-1973), "Guerrilheiros do PAIGC numa tabanca", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43109 (2018-4-13) (com a devida vénia).

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Notas do editor:


(**) Vd. poste de 12 de abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18517: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, ago 73 /ago 74) (27): Visita de uma delegação do PAIGC a Missirá, em julho de 1974, no âmbito dos acordos de cessar-fogo - Parte II: Dando uma oportunidade à paz, depois de oito anos de guerra: os últimos dias dos bravos do pelotão

Guiné 61/74 - P18532: Parabéns a você (1421): Raul Brás, ex-Soldado Condutor Auto da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 15 de Abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18523: Parabéns a você (1420): António Pimentel, ex-Alf Mil Rec Inf do BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70)

terça-feira, 17 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18531: Agenda cultural (635): Convite para a inauguração da exposição "A Biblioteca de Samuel Schwarz, espelho de uma vida", amanhã, dia 18, 4ª feira, às 17h30, na Assembela da República (João Schwarz)


Cinquenta e cinco anos depois da nossa muito querida e saudosa amiga Clara Schwarz (1915-2016) ter chegado a um acordo com o Estado Português para a preservação e conservação da preciosa biblioteca do seu pai, Samuel Schwarz, Portugal homenageia a este homem, avô do Pepito e do João, que nos deixou um importante legado cultural.

Já o seu pai, Isucher Szwarc, nascido em Zgierz, na Polónia,  era detentor de uma um das  maiores bibliotecas  privada do país e a sua casa era o ponto de encontro de intelectuais de primeiro plano da Haskalá (movimento do iluminismo judaico, surgido na Alemanha no séc. XVIII).

Samuel veio para Portugal em 1914, e aqui prosseguiu os estudos sobre a história dos judeus portugueses, a par da sua atividade profissional como engenheiro de minas e homem de negócios. A biblioteca do pai, Isaque., foi pilhada   pelos nazis, desconhecendo-se o seu paradeiro.

A biblioteca do filho, Samuel  (e em especial a "biblioteca hebraica")  foi transferida para os arquivos históricos do Ministério das Finanças em 1953, em condições muito deficientes de transporte e depois de conservação, arquivo e salvaguarda. ...

Só em 1986 (!), a  biblioteca de Samuel Schwarz (ou que restava dela) foi finalmente parar a "boas mãos", a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa...  Foi preciso mais de meio século para, na casa da democracia, se dar a conhecer aos portugueses algumas das raridades da biblioteca de Samuel Schwarz (que em vida reuniu mais de 10 mil livros)...De qualquer modo, o ncleoo importante da biblioteca é chamada "biblioteca hebraica" (c. de mil livros e incunábulos).

Eu lá estarei amanhã para homenagear este homem, a quem se deve, entre muitas outras coisas, a descoberta da antiga sinagoga de Tomar (, edifício que ele próprio comprou, com dinheiro do seu bolso, e de que fez doação ao Estado Português), a par da descoberta da comunidade cripto-judaica de Belmonte. Nunca esquecerei o amor filial e a admiração intelectual que por ele tinha a sua filha Clara Schwarz. Esse trabalho de culto da memória tem sido continuado pelo seu filho João, irmão do Pepito. (LG)


1. Mensagem que nos foi enviada pelo nosso grã-tabanqueiro João Schwarz da Silva, hoje, às 11h38:

Caro Luís

Junto envio um convite para a exposição que terá lugar a partir de amanhã na Assembleia da Republica.

Abraços, João,


2.  Trata-se de um convite da Assembleia da República e da Faculdade de Ciências e Humanas (FCSH) da Universidade NOVA de Lisboa (UNL) para a inauguração da exposição "A Biblioteca de Samuel Schwarz, espelho de uma vida", no edifício da Assembleia da República, amanhã, 4ª feira, dia 18 de abril,  às 17h30 (no final da sessão plenária).

O engº Samuel Schwarz (Zgierz, Polónia, 1880 - Lisboa, 1953) tem meia dúzia de referências no nosso blogue. Foi pai da nossa grã-tabanqueira Clara Schwarz (Lisboa, 1915-Lisboa, 2016), e avô (materno) do Carlos Schwarz da Silva, 'Pepito' (Bissau, 1949-Lisboa, 2014) e do João Schwarz da Silva, ambos membros da nossa Tabanca Grande, bem como bisavô (paterno) da nossa jovem amiga e grã-tabanqueira Catarina Schwarz que vive em Bissau.


3. Excerto da notícia relativa à à Biblioteca de Samuel Schwarz, que vai  ser exposta na Assembleia da República 

(...)  Samuel Schwarz juntou, ao longo de 73 anos de vida, uma extensa biblioteca, principalmente dedicada a temáticas judaicas. Depois de dezenas de anos no Arquivo Histórico do Ministério das Finanças, esta coleção está hoje a cargo da Biblioteca Mário Sottomayor Cardia, da NOVA FCSH. A partir de 18 de abril e até 22 de maio, fica em exposição na Assembleia da República.

Esta mostra biobibliográfica, que fará igualmente parte das comemorações do Parlamento de Portas Abertas, a 25 de abril, estará dividida em três núcleos: um dedicado ao percurso de vida de Samuel Schwarz, com vários objetos pessoais e fotografias, outro com uma seleção de livros da sua biblioteca pessoal (alguns bastante raros, do século XVI e seguintes) e o terceiro com obra do próprio.

Samuel Schwarz, com formação em engenharia de minas, naturalizou-se português em 1939 e distinguiu-se como investigador e historiador, tendo publicado obras de referência acerca da presença dos cripto-judeus, também chamados marranos, em Portugal. O seu trabalho foi fundamental no processo de desocultação dos cripto-judeus portugueses.

Chegou ao nosso país em 1914, para trabalhar na extração de volfrâmio. No entanto, ainda no início dos anos 20, iniciou uma atividade paralela como arqueólogo e etnógrafo, o que lhe permitiu identificar a sinagoga de Tomar, que adquiriu e ofereceu ao Estado português em 1939. Algumas das fotografias que o próprio tirou nessa época farão parte do primeiro núcleo da exposição no Parlamento português, em formato físico ou digital.

Será também exposta uma seleção do seu acervo bibliográfico, que constituirá o segundo núcleo da exposição. Marcel Paiva do Monte, da Divisão de Bibliotecas e Documentação da NOVA FCSH, refere uma biblioteca “de grande coerência”, cujas obras estão maioritariamente relacionadas “com o povo judeu, a sua história, religião, língua e cultura”.

Da sua carreira como investigador serão também expostos alguns exemplares das suas publicações, entre artigos, livros e ensaios, que constituirão o terceiro núcleo desta exposição. Estas obras estão presentes nas suas versões originais, datilografadas ou manuscritas, mas também em versões e edições mais recentes, atualmente disponíveis na Biblioteca Mário Sottomayor Cardia.

Esta exposição teve origem num projeto de estudo e preservação do fundo de Samuel Schwarz, financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian com o apoio da Direcção-Geral do Livro dos Arquivos e das Bibliotecas.(...)

(Fonte: FCSH / UNL,  14 abr 2018. Adapt. , com a devida vénia)

4. Sobre a biblioteca de Samuel Schwarz, ver ainda aqui, no síto do seu neto, João Schwarz:

Des Gents Interessants > Samuel Schwarz >  La bibliothéque de Samuel Schwarz [2012, em francês]

Vd. também o artigo a “Les bibliothèques de Isucher et Samuel Schwarz” [, em formato pdf, 9 pp., em francês].


Página do nosso amigo e grã-tabanqueiro João Schwarz > Des Gens Intéressants > "Eis aqui um mundo de outrora e de gentes que tiveram uma vida interessante. O que vai de Odessa a Lisboa, passando por Lisboa, Paris, Rio de Janeiro, Dacar, Montreal, Tel-Avive. Bissau e Zgierz. Todos têm por único atributo comum fazer parte da mesma família e ter conhecido sob uma forma ou outra as agruras da gierra ou da perseguição". [tradução do francês, LG]

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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P18530: Os nossos seres, saberes e lazeres (262): 1.º Encontro de Teatro Sénior, Organização Actis Sintra, dia 21 de Abril de 2018, Casa da Juventude das Mercês (António J. Pereira da Costa)



1. Em mensagem de hoje 17 de Abril de 2018, o nosso camarada António José Pereira da Costa, Coronel de Art.ª Ref (ex-Alferes de Art.ª da CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74), enviou-nos para publicação o Programa do 1.º Encontro de Teatro Sénior, organização ACTIS SINTRA:

Estarei em cena a partir das 16H00. 
Muita m***a para mim! 

Um Ab. 

TZ



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Nota do editor

Último poste da série de 14 DE ABRIL DE 2018 > Guiné 61/74 - P18521: Os nossos seres, saberes e lazeres (261): Uma visita à casa museu de um grande génio: Leal da Câmara (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18529: Inquérito 'on line' (129): "Este ano vou a Monte Real, ao XIII Encontro Nacional"... Resultados finais: em 39 respostas, 46% dizem que "sim", 10% estão "indecisos" e os restantes (44%) não vão, por razões de conflito de agenda, de saúde, económicas ou outras... Até à data já se inscreveram 90 (45% da lotação máxima)... Quem é grã-tabanqueiro, tem que ir pelo menos uma vez na vida a Monte Real... E quem não é, também pode vir... e só lhe faz bem!







Monte Real > Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande >
Imagens de arquivo do VI Encontro Nacional da Tabanca Gande, Monte Real, o segundo que se realizou no Palace Hotel Monte Real, em 4 de junho de 2011.

Recorde.se que o I Encontro Nacional foi na Ameira, Montemor-o-Novo, em 2006: o II em Pombal; o III e o IV, na Ortigosa, Monte Real, Leiria... Desde 2010, a 5.ª edição, mudámos para o Palace Hotel Monte Real. Até hoje... O XIII será de novo no mesmo sítio, no dia 5 de maio de 2018.

Estão a decorrer as inscrições. Lotação máxima: 200 lugares (Sala Dom Dinis, Palace Hotel Monte Real)

Fotos de Manuel Resende /: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


1. Inquérito 'on line':

"Este ano a vou a Monte Real, ao XIII Encontro Nacional" (Resposta única)

Resultados finais (n=39)


Sim, vou > 18 (46,0%) 

Talvez, ainda não decidi > 4 (10,0%)


Não vou > 17 (44,0%) 


Total > 39  (100,0%)


2. Os que respondem  "Não" (n=17), é por razões:

(i) de conflito de agenda  > 4 (10,0%)
(ii) de saúde  > 2 (5,0%)
(iii)  económicas > 2 (5,0%)
(iv) outras > 9 (24,0%)


3. O prazo para responder ao inquérito terminou ontem dia 16, segunda-feira, às 22h32.


Quanto à inscrição, no XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande, camaradas e amigos/as, podem fazê-lo até pelo menos ao fim do mês de abril (ou até ao limite dos 200 lugares).

Até ontem à noite estavam  inscritos 90 amigos e camaradas da Guiné, 45% da lotação máxima.

Mas, por favor, aproveitem esta oportunidade... histórica. É que a Tabanca Grande é terna... mas não eterna.
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segunda-feira, 16 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18528: O Cancioneiro da Nossa Guerra (6): "Os Homens não Morrem" (Recolha de Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, "Zorba", Gadamael e Ganturé, 1967/ 68)


Batalha > Fetal > 26 de setembro de 2015 > Convívio da CART 1659 (Gadamael e Ganturé, 1967/69) >  Em primeiro plano, à esquerda, o ex-cap mil inf, hoje advogado, Manuel Francisco Fernandes de Mansilha... No final do almoço, leu as quadras que abaixo se reproduzem, e que lhe foram enviadas por um "Zorba", em 2011 pelo Natal. Segundo o Mário Gaspar, o autor dos versos é António Luís Faria Mendes, ex-1.º Cabo Operador Cripto.


Brasão da CART 1659, "Zorba" (Gadamael e Ganturé, 1967/68). Lema: "Os Homens Não Morrem".

Fotos (e legendas) : © Mário Gaspar (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Os Homens Não Morrem

por António Luís Faria Mendes,
ex-1.º Cabo Operador Cripto

Bem certo que o tempo passa,
Já nos vai pesando o pé, 
Mas não há nada que faça
Esquecermos a Guiné!

Alguns em Gadamael,
Os outros em Ganturé.
Fulas, mandingas, papel,
Sobe o rio com a maré.

Tempos difíceis, claro.
Sei que se foi cimentando
A amizade, um dom raro,
Que estamos comemorando.

Caro Mendes, Cabo Cripto,
Que que decifravas a mensagem,
Magro como um eucalipto,
Sempre com fé e coragem.

Vale a pena acreditar
Que há mar e os rios correm.
O que nos fez regressar?
Foi porque “Os Homens Não Morrem”!

Versos da autoria de António Luís Faria Mendes ex-1.º Cabo Operador Cripto. Data: c. 2011. Recolha de Mário Gaspar (ex-fur mil at art, minas e armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) (*). Transcrição, revisão e fixação de texto: MG / LG (**)
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Vd,. postes anteriores:

27 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18261: O cancioneiro da nossa guerra (4): "o tango dos periquitos" ou o hino da revolta da CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) (Silvino Oliveira / José Colaço)

27 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18259: O cancioneiro da nossa guerra (3): mais quatro letras, ao gosto popular alentejano, do Edmundo Santos, ex-fur mil, CART 2519, Os Morcegos de Mampatá (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá, 1969/71)

8 de novembro de 2017> Guiné 61/74 - P17944: O cancioneiro da nossa guerra (2): três letras do Edmundo Santos, ex-fur mil, CART 2519, Os Morcegos de Mampatá (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá, 1969/71): (i) Os Morcegos; (ii) Estou farto deles, tirem-me daqui; (iii) Fado da Metralha

30 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17811: O cancioneiro da nossa guerra (1): "Asssim fui tendo fé, pedindo a Deus que me ajude"... 4 dezenas de quadras populares, do açoriano Eduardo Manuel Simas, ex-sold at inf, CCAÇ 4740, Cufar, 1972/74

Guiné 61/74 - P18527: Notas de leitura (1058): “Memórias da minha guerra colonial”, de João Matos Lourenço Rosa; edição de autor de 2009 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Maio de 2016:

Queridos amigos,
Pela mão do Mário Vitorino Gaspar cheguei a este livro escrito por um auxiliar de serviço religioso.
Já tínhamos relatos de capelães, de combatentes a desnudarem as suas profissões de fé, sempre achei que fazia falta estas escavações junto daqueles que não eram formalmente combatentes, mas que acabaram por o ser pela força das circunstâncias ou resolvendo a quem vivia em destacamento no mato os problemas das transmissões, das viaturas e até os cortes de cabelo.
Li o relato do primeiro-cabo Lourenço Rosa e lembrei-me do Costa de quem o David Payne Pereira dizia ser o seu lugar tenente. Do Costa, que já se apresentou no blogue, tenho justificadas saudades e gratidão: pelos frascos de vitaminas, pelos cortes de cabelo, pela população do Cuor que lhe passou pelas mãos, pela sua presença na capela de Bambadinca.

Onde quer que tu estejas, Costa, um abraço muito afetuoso deste teu confrade,
Mário


O que era um auxiliar do serviço religioso nas nossas guerras africanas

Beja Santos

Uma das preocupações constantes no respigo de textos e no espírito das recensões é desvelar a natureza das especialidades de cada um, operações especiais, atiradores, capelães, médicos, enfermeiros, a todos se procura dar guarida. Tenho para mim que continuamos sem testemunhos que abarquem os soldados básicos, os maqueiros e aqueles que nas CCS auxiliavam nas transmissões, na manutenção das viaturas, nas cozinhas, etc. Neste entendimento, julgo que terá interesse dar atenção às “Memórias da minha guerra colonial”, de João Matos Lourenço Rosa, edição de autor de 2009. Esclareça-se que ele cumpriu a sua missão em Moçambique entre 1971 e 1974, integrado no BCAÇ 3866, destacado em Furancungo, no Tete. É um homem com itinerário curioso. Veio aos 12 anos da Portela do Fojo (Pampilhosa da Serra) para Lisboa, trabalhou numa fábrica de calçado, em feiras, num restaurante, em carrosséis de diversão, foi resineiro, teve uma passagem fugaz pelo Seminário dos Missionários Comboianos e até cumprir o serviço militar obrigatório tirou cursos profissionais nas áreas de eletrónica e da carpintaria mecânica. Vindo da guerra, trabalhou na Brisa, foi dirigente sindical, e ficamos por aqui.

Foi à inspeção, assentou praça em Aveiro, onde jurou bandeira. Colocado no RI 6 do Porto, onde se preparou a sério para ser auxiliar do serviço religioso, daqui seguiu para Espinho, já mobilizado para ir para Moçambique, houve viagem com peripécias, incluindo um pequeno incêndio no Niassa que obrigou a uma reparação em Bissau. Em Outubro de 1971 chegaram a Lourenço Marques, não gostou da chacota dos Moçambicanos brancos que os alcunhavam de “pior que pretos”, pessoas de baixo nível. Da capital seguem para a Beira. Diz abertamente que o capelão não lhe é uma pessoa cara:
“Era um homem que não tinha carisma, não tinha o dom da palavra. Mas eu haveria de encontrar bem piores em Nampula. Aí alguns não tinham mesmo qualquer feitio ou mesmo vocação para o sacerdócio. O padre de Nampula namorava com uma mulher da metrópole e casaria com ela quando chegou da sua guerra. Quanto ao padre Emílio, o do meu Batalhão, também ele pediu ao Papa a sua resignação e casou com uma senhora professora lá da terra”.

Da Beira rumam com destino a Moatize, são depois transportados de Berliet para a base aérea de Tete e depois Furancungo. O auxiliar do serviço religioso é cabo escriturário, faz rondas, é escalado para vigilâncias, dá catequese na Missão Nazareno e no Baué, quando necessário guarda urnas, os reforços de noite tornam-se um tormento, passa a ter graves problemas de sono, o médico receitou-lhe Fenobarbital, Diazepan e Bialzepan, mas nunca mais teve sono normal. É enviado a Nampula, ao serviço de psiquiatria, dois meses depois teve alta, o médico considerou que ele estava bem de saúde e que era um manhoso. Volta a Furancungo, no meio disto tudo houve uma punição, foi despromovido e depois promovido. Volta a Nampula, tem um desentendimento com a Polícia Militar, apanha 10 dias de detenção. Passa as férias com a família em Moçambique. Já vai no terceiro Natal passado na guerra. E em Dezembro de 1973, Furancungo é alvo do primeiro ataque com morteiros de 122 mm. Formou-se um grupo de combate, uma história patética. Os problemas com o sono não param. Nisto vem o fim da comissão, faz-se a viagem em sentido inverso, Furancungo-Tete, comboio a Moatize até à Beira, embarca de avião com escala em Luanda, Lisboa, acolhimento familiar, em 1974 casa-se com a menina que namora há muito.

O João Lourenço Rosa é despretensioso e não se ufana de quaisquer atos heróicos, no caso de uma mina anticarro com emboscada diz abertamente que se atirou para debaixo da viatura.

Fiquei a pensar neste relato e a procurar nos escaninhos da memória quem era o auxiliar do serviço religioso em Bambadinca. E recordei-me do Costa, que até já se apresentou no blogue. Extremamente gentil e prestimoso, era barbeiro, creio que escriturava, viu-o ajudar no posto de enfermagem e acolitava na celebração da missa na capela de Bambadinca. Era portanto uma especialidade com diferentes usos, um pouco como vem no relato de João Lourenço Rosa. Oxalá o Costa me leia e decida contar a sua comissão pluriprofissional, desde que se preparou para auxiliar de serviço religioso. E bom seria que chovessem mais depoimentos, a começar pelos maqueiros, os que comigo trabalharam eram incansáveis e forçosamente pluriprofissionais, faziam reforços, acompanhavam os patrulhamentos e nas horas difíceis faziam trabalho de trolha e outros místeres delicados. “Os do mato” não escondiam um relativo desdém pela malta da CCS, os que cozinhavam, reparavam viaturas, os cabo-cripto, a malta da manutenção. E como eles foram tão importantes, tão importantes para a nossa vida de combatentes!
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Nota do editor

Último poste da série de 13 DE ABRIL DE 2018 > Guiné 61/74 - P18519: Notas de leitura (1057): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (30) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18526: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulos 39 e 40: Atenção, inimigo, não se metem connosco!... "Embora tu não ligues nada à guerra, eu quero informar-te de uma coisa: nós aqui lutamos contra as forças do PAIGC e comandante desse partido, que era o Amílcar Cabral, foi morto esta manhã no Senegal... Não sabemos se a guerra vai piorar ou melhorar, esperemos uns dias e depois digo-te algo"


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BART 6520/72 (1972/74) > 1973 > Um dos postais que o José Claudino da Silva passou a mandar à namorada (e futura esposa), todos os meses, depois da notícia da morte de Amílcar Cabral (que foi morto na Guiné-Conacri e não no Senegal, em 20 de janeiro de 1973).

Foto: © José Claudino da Silva (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça]



1. Continuação da pré-publicação do próximo livro (na versão manuscrita, "Em Nome da Pátria") do nosso camarada José Claudino Silva [foto atual à esquerda] (*)

(i) nasceu em Penafiel, em 1950, de pai incógnito" (como se dizia na época e infelizmente se continua a dizer, nos dias de hoje);

(ii) foi criado pela avó materna;

(iii) trabalahou e viveu em Amaranete, residindo hoje naLixa, Felgueiras;

(iv) é vizinho do nosso grã-tabanqueiro, o padre Mário da Lixa, ex-capelão em Mansoa (1967/68), com quem, de resto, tem colaborado em iniciativas culturais, no Barracão da Cultura;

(v) tem orgulho na sua profissão: bate-chapas, agora reformado;

(vi) completou o 12.º ano de escolaridade;

(vii) foi um "homem que se fez a si próprio", sendo já autor de dois livros, publicados (um de poesia e outro de ficção);

(viii) tem página no Facebook; é avô e está a animar o projeto "Bosque dos Avós", na Serra do Marão, em Amarante;

(ix) é membro n.º 756 da nossa Tabanca Grande.

Sinopse:

(i) foi à inspeção em 27 de junho de 1970, e começou a fazer a recruta, no dia 3 de janeiro de 1972, no CICA 1 [Centro de Instrução de Condutores Auto-rodas], no Porto, junto ao palácio de Cristal;

(ii) escreveu a sua primeira carta em 4 de janeiro de 1972, na recruta, no Porto; foi guia ocasional, para os camaradas que vinham de fora e queriam conhecer a cidade, da Via Norte à Rua Escura.

(iii) passou pelo Regimento de Cavalaria 6, depois da recruta; promovido a 1.º cabo condutor autorrodas, será colocado em Penafiel, e daqui é mobilizado para a Guiné, fazendo parte da 3.ª CART / BART 6250 (Fulacunda, 1972/74);

(iv) chegada à Bissalanca, em 26/6/1972, a bordo de um Boeing dos TAM - Transportes Aéreos Militares; faz a IAO no quartel do Cumeré;

(v) no dia 2 de julho de 1972, domingo, tem licença para ir visitar Bissau,

(vi) fica mais uns tempos em Bissau para um tirar um curso de especialista em Berliet;

(vii) um mês depois, parte para Bolama onde se junta aos seus camaradas companhia; partida em duas LDM parea Fulacunda; são "praxados" pelos 'velhinhos', os 'Capicuas", da CART 2772;

(viii) faz a primeira coluna auto até à foz do Rio Fulacunda, onde de 15 em 15 dias a companhia era abastecida por LDM ou LDP; escreve e lê as cartas e os aerogramas de muitos dos seus camaradas analfabetos;

(ix) é "promovido" pelo 1.º sargento a cabo dos reabastecimentos, o que lhe dá alguns pequenos privilégio como o de aprender a datilografar... e a "ter jipe";

(x) a 'herança' dos 'velhinhos' da CART 2772, "Os Capicuas", que deixam Fulacunda; o Dino partilha um quarto de 3 x 2 m, com mais 3 camaradas, "Os Mórmones de Fulacunda";

(xi) Dino, o "cabo de reabastecimentos", o "dono da loja", tem que aprender a lidar com as "diferenças de estatuto", resultantes da hierarquia militar: todos eram clientes da "loja", e todos eram iguais, mas uns mais iguais do que outros, por causa das "divisas"... e dos "galões"...

(xii) faz contas à vida e ao "patacão", de modo a poder casar-se logo que passe à peluda;

(xiii) ao fim de três meses, está a escrever 30/40 cartas e aerogram as por mês; inicialmente eram 80/100; e descobre o sentido (e a importância) da camaradagem em tempo de guerra.

(xiv) como "responsável" pelo reabastecimento não quer que falte a cerveja ao pessoal: em outubro de 1972, o consumo (quinzenal) era já de 6 mil garrafas; ouve dizer, pela primeira vez, na rádio clandestina, que éramos todos colonialistas e que o governo português era fascista; sente-se chocado;

(xv) fica revoltado por o seu camarada responsável pela cantina, e como ele 1º cabo condutor auto, ter apanhado 10 dias de detenção por uma questão de "lana caprina": é o primeiro castigo no mato...; por outro lado, apanha o paludismo, perde 7 quilos, tem 41 graus de febre, conhece a solidariedade dos camaradas e está grato à competência e desvelo do pessoal de saúde da companhia.

(xvi) em 8/11/1972 festejava-se o Ramadão em Fulacunda e no resto do mundo muçulmano; entretanto, a companhia apanha a primeira arma ao IN, uma PPSH, a famosa "costureirinha" (, o seu matraquear fazia lembrar uma máquina de costura);

(xvii) começa a colaborar no jornal da unidade, e é incentivado a prosseguir os seus estudos; surgem as primeiras sobre o amor da sua Mely [Maria Amélia], com quem faz, no entanto, s pazes antes do Natal; confidencia-nos, através das cartas à Mely as pequenas besteiras que ele e os seus amigos (como o Zé Leal de Vila das Aves) vão fazendo...

(xviii) chega ao fim o ano de 1972; mas antes disso houve a festa do Natal (vd. capº 34º, já publicado noutro poste);

(xix) como responsável pelos reebastecimentos, a sua preocupção é ter bebidas frescas, em quantidade, para a malta que regressa do mato, mas o "patacão", ontem como hoje, era sempre pouco;

(xx) dá a notícia à namorada da morte de Amílcar Cabral (que foi em 20 de janeiro de 1973 na Guiné-Conacri e não no Senegal); passa a haver cinema em Fulacaunda: manda uma encomenda postal de 6,5 kg à namorada.


2. Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 39  e 40

[O autor faz questão de não corrigir os excertos que transcreve, das cartas e aerogramas que começou a escrever na tropa e depois no CTIG à sua futura esposa. E muito menos fazer autocensura 'a posterior', de acordo com o 'politicamente correto'...  Esses excertos vêm a negrito. O livro, que tinha originalmente como título "Em Nome da Pátria", passa a chamar-se "Ai, Dino, o que te fizeram!", frase dita pela avó materna do autor, quando o viu fardado pela primeira vez. Foi ela, de resto, quem o criou. ]


39º Capítulo   > AMÍLCAR CABRAL

Ena, pá! Que ousadia!

“Atenção inimigo! Não se metam connosco. Estamos de olho vivo. Sabes meu amorzinho? Estes negros nojentos não querem nada com “Os Serrotes” as nossas laminas estão bem afiadas e eles sabem que podem cortar-se.”

Dizia isto em mais uma noite de prevenção. Seria mais uma noite, mas não foi. Aquela noite foi de 20 para 21 de Janeiro de 1973. O meu comentário no dia 21:

“Embora tu não ligues nada à guerra eu quero informar-te uma coisa. Nós aqui na Guiné lutamos contra as forças do P.A.I.G.C. (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo-Verde) e o comandante desse partido que era o Amílcar Cabral foi morto esta manhã no Senegal, país que faz fronteira com a Guiné e de onde entram os terroristas, por isso nós não sabemos se a guerra vai piorar ou melhorar, esperemos uns dias e depois digo algo”

Um facto histórico tão relevante foi passado por nós duma forma completamente superficial. Até o comandante foi de férias, no dia 25.

Que guerra aquela!

No mesmo aerograma falo de Camilo Castelo Branco e digo uma frase que ainda hoje sei de cor. (A dor que proporcionamos às outras pessoas devia ser equivalente à que sentimos.) Nos dias seguintes, apenas falei de amor.

Era domingo, decidi começar a mandar um postal por mês.


40º Capítulo  > DEPOIS DAS MORTES.  O CINEMA

26 de Janeiro de 1973

Estive tentado, como em muitas outras vezes, a não falar de guerra, mas neste dia na última página da carta do mês não resisti.

“Como sabes pertenço a um batalhão que tem quatro companhias. C.C.S. 1ª; 2ª e 3ª que é a minha. A C.C.S. está em Tite e já sofreram um ataque sem feridos. A 1ª está em Jabadá, também sofreram um ataque sem feridos. A 2ª está em Nova Sintra, sofreram um ataque tiveram quatro feridos e dois mortos. Nós ao quartel ainda não tivemos nenhum e decerto não teremos, agora toda a companhia está de prevenção das seis horas da tarde às quatro da manhã e dormimos de dia.

Hoje 85 colegas estão para o mato em operação. Acho que as coisas estão a piorar. Para tornar tudo mais difícil o gerador avariou e a vigilância é muito menos eficaz. Estamos sujeitos a só detectar o inimigo quando estiverem mesmo em cima de nós. Neste momento lá fora a escuridão é total, estou a escrever-te à luz da vela”


Não me levem a mal por, nos dias seguintes, só escrever sobre bigamia e gravadores de cassetes, futebol e bebidas, sobre o Zé Leal que tinha ido a Bissau, as contas de Janeiro que bateram certas e o reabastecimento que seria dia dois. Correu tudo tão bem que até recebi dois cabelos que a namorada mandou. Eram grandes. Ela ia cortar o cabelo à moda.

Guerra? Grave foi ter-me magoado num pé a jogar voleibol.

“Na próxima semana vamos ter cinema em Fulacunda. Fixe há muitos meses que não vejo um filme.

Quero dizer-te que a nossa companhia agora faz parte operacionalmente de uma outra que é a C.O.P. 7 e está cá um capitão dessa C.O.P. 7 que é um tipo porreiro, até se come melhor”


Foi em Fevereiro que mandei uma encomenda para a minha namorada. A cantina, em miniatura, uma faca de mato, um livro com duas comédias. (“Monsieur de Pourceaugnac" e “O Avarento” de Moliére), uma garrafa de whisky e mais umas latas de Coca-Cola para misturar. Pesava 6,5Kg.

Uma parvoíce, não? Quem era tão parvo que mandasse essas coisas para a metrópole? Eu, é claro!
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