quarta-feira, 13 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18739: Historiografia da presença portuguesa em África (118): Uma reunião invulgar: a Conferência dos Administradores, Bissau, 1941 (3) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Fevereiro de 2018:

Queridos amigos,
Confesso que comecei a leitura deste documento na presunção de que se tratava de mais um texto de farronca e glorificação do senhor governador. Enganei-me redondamente. Primeiro, o senhor governador sabia da poda e desenhou um questionário primoroso, podia aquilatar, pelas respostas recebidas, da preparação dos seus colaboradores. Vive-se um período de guerra duríssima, as colónias francesas não obedecem ao governo de Vichy, é seguro que Salazar não queria que se levantassem ondas, dentro da sua neutralidade colaborante. O acervo informativo que o governador obteve não nos deixa aturdidos mas obriga-nos a pensar, a ver a realidade sobre vários prismas. Há administradores que falam em regeneração e ressurgimento do Império, outras há que sugerem, mesmo com punho de renda, que é necessário pôr termo à exploração desenfreada do indígena, e outros também se mostram dispostos a pôr as mãos na massa para melhorar a vida naquela parcela do Império, veja-se o que diz o administrador da circunscrição civil de Farim, recordo que estamos em 1941.

Um abraço do
Mário


Uma reunião invulgar: a Conferência dos Administradores, Bissau, 1941 (3)

Beja Santos

Do que me é dado saber, a conferência dos administradores que decorreu no início de Dezembro de 1941, por determinação do Governador, o então Capitão Ricardo Vaz Monteiro, foi a primeira iniciativa de auscultação das autoridades coloniais e altos funcionários mediante uma agenda previamente distribuída, tratou-se de um debate que permitiu ao governante tirar conclusões e publicar as memórias dos intervenientes. É surpreendente como este documento é praticamente ignorado quando encerra conhecimentos e desvela com relativa limpidez o que era a mentalidade colonial de então. A mentalidade e o nível de preparação dos quadros dessa administração.

Tenente-Coronel Ricardo Vaz Monteiro, fotografia inserta no livro “Guiné, alvorada do Império”, homenagem ao Engenheiro Raimundo Serrão, que foi Governador da Guiné depois do Comandante Sarmento Rodrigues.

Concluiu-se o apontamento anterior com referências a observações sobre a falta de conhecimentos dos nativos sobre a mancarra, reduzido a um puro objeto de negócio. Curiosamente, na sua memória o administrador da circunscrição de Cacheu também versa o assunto: “O indígena da colónia, na sua quase totalidade, encontra na cultura da mancarra o meio mais seguro de garantir a solvência do imposto político que é o mais quantioso das contribuições que os direitos de soberania lhe exigem”. E tem opinião também sobre a reformulação dos celeiros: “Os celeiros devem ser constituídos e localizados onde de facto possam melhor atender ao fim da assistência agrícola ao indígena. É preciso saber-se que para o Manjaco entregar de boa-fé uma parcela da sua colheita, carece de ganhar a certeza de que o régulo ou chefe, longe das vistas dele, não vai retirar dos celeiros comunais indígenas um bago de arroz ou um grão de mancarra. Desta sorte, os celeiros a constituir deverão sê-lo nas redes dos postos e das administrações”.

E tem também opinião sobre como melhorar a política indígena dos chegados e regulados, deixou escrito o seguinte na sua memória:
“Afigura-se-me que, fazendo afastar destas regiões os pretensos candidatos, depois de a autoridade administrativa verificar qual o indígena com direitos, de facto, à chefia ou regulado. Os régulos, nesta área administrativa, no geral, são impostos e pertencem a raça diferente: Mandingas, Fulas e Biafadas. As razões que a tal obrigam, desconheço-as.
Para mim, estas autoridades não são mais do que uns chefes de posto em miniatura, usufruindo de todos os benefícios consagrados a quaisquer régulos que tivessem ascendido aos lugares, por direito consuetudinário.
A estas ou a qualquer autoridade indígena, por desconfiança, não recorrem os Balantas, porque, delas, pouca justiça esperam e alcançam.
Para um indígena desta área administrativa, o régulo ou chefe é considerado, unicamente, como um elemento de ligação, entre ele e as autoridades.
Pouco sociáveis, com tendência para o isolamento, procuram encobrir todos os seus actos, a não ser nas festas de circuncisão ou batuques funerários, onde se reúnem em grande número. Nestas festas, fugindo ao habitual, cantam as suas proezas, principalmente o roubo, em que são peritos.
Fornecendo esses autos os elementos que conduzem Vossa Excelência a uma resolução rápida justa, creio que contribui, grandemente, para o sossego das populações. Digo assim, porque o indígena aprecia muito a resolução rápida das suas questões e a justiça da sentença, da qual tem uma intuição segura. Ele sabe apreciar e considerar a autoridade que, revestida de função julgadora, com equidade, soluciona os seus pleitos.
Afigura-se-me de manter as disposições da Reforma Administrativa Ultramarina no tocante a autoridades indígenas. Ao chefe de posto nunca deve ser atribuída tal competência nesta questão de política indígena, tão importante, que, a não ter uma orientação segura, provocaria grandes perturbações. De resto, este facto tem-se observado em determinados pontos da colónia por insuficiência de conhecimento do meio, mesmo por parte de alguns administradores”.

Da memória do administrador da circunscrição civil de Farim obtêm-se informações muitíssimo úteis. Logo sobre a cultura da mancarra, ele tece observações sobre o trabalho do cultivo e da colheita:
“A cultura da mancarra, em Farim, é feita quase exclusivamente por Mandingas e Mancanhas, que divergem, uns dos outros, na maneira de semear e até de colher aquele produto.
A maioria dos Mandingas faz as suas sementeiras em terras lisas e começa a colher a mancarra logo que cessam as chuvas para que a terra, ao secar, não lhe dificulte aquele trabalho nem o obrigue a maiores esforços.
O Mancanha prepara a terra convenientemente, faz as suas sementeiras em camalhões, o que é aconselhado pelos velhos tratadistas, e recolhe a mancarra da terra por meio de uma espécie de cava, muito depois de findas as chuvas. Este processo dá margem a que o produto se desenvolva mais racionalmente e tenha uma melhor aceitação no mercado.
Seria realmente interessante conseguir que o Mandinga extraísse a mancarra da terra na mesma ocasião em que o Mancanha o faz, e pelos mesmos processos que este adopta”.

E não menos interessante é o que ele escreve sobre a cultura do arroz:
“Conheço a cultura do arroz feita por chineses, japoneses, javaneses e timorenses e, interessou-me, por isso mesmo, conhecer os processos adoptados pelos indígenas da Guiné.
Toda a gente sabe que o chinês é, por excelência, o mestre desta cultura, que a estuda nos mínimos detalhes para tirar dela o melhor partido, na produção e qualidade.
Adopta, invariavelmente, o sistema dos alfobres, fazendo as transplantações na época devida, e por ser este o processo de obter um enraizamento da planta mais vigoroso, uma produção mais abundante e rápida.
O trabalho feito pelos agricultores indígenas de Catió, é perfeitamente idêntico ao que adoptam os lavradores chineses, na parte relativa ao estabelecimento dos alfobres e transplantação das plantas para os locais definitivos.
Diferem, unicamente, no preparo das várzeas, talvez porque não possuem gado em quantidade suficiente e devidamente amestrado para lavrá-las.
Quanto ao aumento da produção, ele depende, unicamente, da quantidade de semente que eles possuírem, das condições climatéricas e, sobretudo, de uma intensa fiscalização no acto do preparo das terras, para que a sua área seja aumentada.
Mas, se este meu modo de ver refere-se somente às regiões produtoras do arroz, outras terras há que podiam ser aproveitadas para o mesmo fim, desde que fossem dotadas com um sistema de irrigação, embora rudimentar.
Há, nas imediações do rio de Farim, quase me linha paralela com o seu curso, alguns milhares de hectares de terras que se prestam optimamente para a cultura do arroz, mas que não são exploradas nem aproveitadas por falta de água.
O rio Farim, cuja água é doce durante todo o ano, oferece vasta matéria-prima para a irrigação dos referidos terrenos, e as despesas a fazer com a realização desta obra pode dizer-se que seriam bastante diminutas.
Eu comprometer-me-ia a executá-la desde que possuísse uma bomba centrífuga movida a vapor ou electricidade, com a capacidade de rendimento preciso.
Seria esta a única despesa efectiva a fazer porque dispensavam-se canalizações condutoras de água e outros materiais acessórios.
E as regiões que se encontram abandonadas, que para nada têm servido até aqui, passariam a ter um desenvolvimento muito importante e a marcar um lugar de destaque no desenvolvimento económico da colónia.”

Este senhor administrador de Farim ainda tem mais coisas para dizer com propriedade e falta registar os comentários dos administradores do Gabu, Bula e Bijagós. Deixemos este registo para o próximo e último texto que se dedicou a esta conferência de que não se conhece antecedentes, pela qualidade e intensidade da informação carreada.

(Continua)

Quartel Militar em Bolama, fotografia de Francisco Nogueira, inserida no livro “Bijagós Património Arquitetónico”, Edições tinta-da-china, 2016.
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Nota do editor

Último poste da série de 6 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18716: Historiografia da presença portuguesa em África (116): Uma reunião invulgar: a Conferência dos Administradores, Bissau, 1941 (2) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 12 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18738: Tabanca Grande (465): Américo da Silva Santos Russa, ex-Fur Mil Alimentação da CCS/BART 3873 (Bambadinca, 1972/74)

1. Mensagem do nosso camarada Sousa de Castro (ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, 1971/74) trazendo até nós um novo tertuliano, o Américo da Silva Santos Russa, ex-Fur Mil Alimentação da CCS/BART 3873 (Bambadinca, 1972/74):

Boa tarde, meus senhores
Em anexo um novo Tertuliano. 

Alfa Bravo, 
Sousa de Castro (SdC)


Apresento mais um camarada que tem confraternizado nestes dois últimos anos nos nossos encontros/convívios (CART 3494), nomeadamente no ano passado em Tondela e agora no que realizámos no passado dia 09 de Junho de 2018 em Seia. 

Dei-lhe conhecimento da existência da nossa tertúlia de combatentes da Guiné, convidando-o a fazer parte, o qual acedeu de imediato, com a promessa de no próximo ano participar no XIV convívio da Tabanca Grande. 

Pedi-lhe que me enviasse uma pequena estória de apresentação e as duas fotos da praxe sobre a sua passagem por terras da Guiné. Estou à espera. 

Devo dizer que para além de me parecer ser um bom amigo, é também uma pessoa de trato fácil, alegre e muito comunicativo. 

Passo apresentar:
- Américo da Silva Santos Russa, 
- ex-Fur Mil da Alimentação (vagomestre), 
- Integrou a CCS do BART 3873 em Bambadinca desde Dezembro de 1971 a Abril de 1974, 
- Nasceu a 10 de Agosto de 1950, é de Matosinhos, viveu como emigrante na cidade de Münster na Alemanha, fixou residência na cidade dos Besteiros, em Tondela. 
- Habilitações: Curso Geral do Comércio, na Escola Industrial e Comercial de Matosinhos, casado com Albina Rodrigues. 

 Américo Russa com o Carvalhido


 Bambadinca, entre 1972 e 1974

O Américo Russa enquanto elemento da Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Matosinhos-Leça

As aventuras de um vagomestre! 

Vão-me desculpar a falta, em alguns casos de memória, mas gostaria de contar um episódio hilariante, que aconteceu comigo em Bambadinca, já na parte final da minha comissão. 
Aqui vai.

No outro lado do Geba, creio ter sido Taibatá, corrijam-me se a memória me falha, houve um ataque em que as tabancas ficaram incendiadas e o fogo se via em Bambadinca. Depois do pedido de socorro, foram pedidos voluntários, e aqui o "grande operacional????", ofereceu-se logo para ir socorrer os nossos amigos. Quando dei por ela, perguntei aos meus botões, o que tinha feito, visto que nunca tinha disparado um tiro. Bom a única forma que encontrei foi escolher uns operacionais da CCAÇ 12, sendo eu o único branco no grupo. 

Então e aqui vem a parte hilariante, ao atravessar o Geba na piroga, diz-me o camarada Abibo Buaró:
- Furriel tu és branco, e de noite nota-se logo, (o ataque foi de noite). Portanto se houver tiros mete a cabeça no chão, e deixa a guerra para nós. Ah, e não dispares, pois que não percebes nada disto e ainda nos matas a todos. 

Por acaso caminhámos sem problemas até ao nosso destino, senão já viram a minha situação?
É que o meu amigo até tinha razão! 

Bem espero que vos tenha divertido com esta aventura.

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 Sousa de Castro e Américo Russa

Comentário do editor:

Caro Américo, caro ex-vizinho(?) e ex-colega de escola, sê muito bem vindo à tertúlia.
Permite-me desde já destacar um amigo comum, o José Magalhães, meu colega de trabalho durante muitos anos na APDL, e teu "colega" de Fanfarra, ele da dos Bombeiros Voluntários de Leixões.

O Sousa de Castro fez muito bem em te trazer até nós. Vê se dispões de algum tempo para nos enviar algumas fotos que tenhas do teu tempo de Bambadinca assim como uma ou outra memória escrita. Tiveste a responsabilidade de dar de comer à malta, às vezes, sabe-se lá, com ementas inventadas, adaptadas ao que havia no Depósito de Géneros, pelo que terás episódios interessantes para deixar para memória futura.

Peço desculpa por te ter roubado as fotos do teu facebook, excepção da em que estás com o SdC, mas fi-lo com intenção de melhor ilustrar a tua apresentação.

Em termos puramente estatísticos és o tertuliano 774.º.

Ficamos à espera das tuas notícias já que tens endereço de email.

Recebe, em nome dos editores e da tertúlia, um abraço e os votos de boa saúde.

Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 8 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18724: Tabanca Grande (464): Fernando Maria Neves Teixeira, ex-1.º Cabo Aux-Enfermeiro da CCAÇ 2404/BCAÇ 2852, Teixeira Pinto, Binar e Mansambo, 1968/70

Guiné 61/74 - P18737: Bombolom XX (Paulo Salgado): Guerra - Guiné e Moçambique - Aqui na Primeira Grande Guerra

Com a devida vénia a Wikipédia


1. Mensagem do nosso camarada Paulo Salgado (ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), autor do livro "Guiné - Crónicas de Guerra e Amor", com data de 30 de Abril de 2018:

Meus Caros Camaradas, 
Se vos aprouver, o meu bombolom vai tocar outra vez. 
Para já, o anexo. 

Um abraço
Paulo Salgado

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BOMBOLOM III

GUERRA - GUINÉ E MOÇAMBIQUE - AQUI NA PRIMEIRA GG

Camaradas, 
O meu bombolom tem de troar, de novo. 

Quando era um rapaz de dezassete anos, aconteceu o que muitos tiveram oportunidade de presenciar: a chegada de um corpo à aldeia ou vila, numa caixa de pinho, que era de um nosso conhecido, um pouco mais velho, que as balas trespassaram – consequência de uma guerra que fizemos e da qual nunca soubemos, profundamente, a sua razão da ser. 
Já havia sido as independências do Gana, do Senegal e de tantas outras colónias no continente africano, antes de a guerra rebentar oficialmente em Angola no dia 4 de fevereiro. 

Vem isto a propósito de me lembrar de um velho ancião, combatente no norte de Moçambique, aquando da primeira grande guerra iniciada pelos alemães. Ali, a guerra começou em 1915, quando na Europa, se iniciara em 1914. Estava ele no adro da igreja da minha aldeia – Larinho, concelho de Torre de Moncorvo – e disse-me após o fogo de uma secção em homenagem ao soldadinho falecido, seu neto, correndo-lhe as lágrimas cara abaixo: esta guerra ainda vai durar mais tempo do que a que nós sofremos lá nos confins do Rovuma! 

Como eu adorava estar à conversa com ele, contou-me diversos episódios. Tratarei de narrar alguns, se tal tanto aprouver aos dinamizadores do nosso blogue. 
As misérias foram tantas que, posso concluir, ainda sofreram mais por falta de medicamentos, equipamentos, alimentos, armamento… 

Até breve. 
Paulo Salgado
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Nota do editor

Vd. poste de 22 de novembro de 2011 Guiné 63/74 - P9075: Bombolom II (Paulo Salgado) (5): I Grande Guerra em África (1914-1918), guerra colonial (1961/74)... Relembrando os nossos mortos

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18736: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (56): Procuram-se informações sobre uma possível troca de dois pilotos portugueses, prisioneiros no Senegal, por um opositor ao governo senegalês, preso em Bissau às ordens da DGS, com intermediação de Leopold Senghor, em Junho de 1966 (Miguel Pessoa / José Nico)

1. Mensagem do nosso camarada Miguel Pessoa, Cor PilAv Ref (ex-Ten PilAv, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de hoje, 11 de Junho de 2018:

Caros camaradas
Recebi da parte do General Nico, da Força Aérea, um pedido de apoio para esclarecimento de um acontecimento ocorrido na Guiné no seu tempo (em meados de 1966) e que envolveu então uma troca de prisioneiros.
Naturalmente dado reportar-se a factos anteriores à minha comissão desconheço pormenores deste assunto, pelo que reproduzo o mail que recebi, na expectativa de que exista nos arquivos do blogue alguma informação registada, ou que algum dos leitores habituais disponha de alguns dados que permitam esclarecer este episódio:

"Caro Pessoa
Tenho feito muita pesquisa no sentido de determinar quem, do PAIGC, terá sido trocado por dois pilotos nossos que tinham sido internados em Ziguinchor, no Senegal. Como tu tens muitos contactos talvez alguém tenha ouvido falar deste assunto.
Tudo se passou durante as duas últimas semanas de Junho de 1966. Por volta do dia 21JUN66 (Não há certeza da data exacta), um DO-27 com dois pilotos perdeu-se por razões meteorológicas. Estavam a voar por cima de um manto de nuvens e acabaram por se dirigir para o mar para se tentarem orientar. Depois, não reconhecendo a costa, voaram para Norte porque pensaram que podiam estar já na Guiné-Conakri.
Sem combustível acabaram por aterrar numa pequena ilhota tendo o avião ficado destruído - mas os dois pilotos sobreviveram. Antes dessa aterragem chamaram a atenção de um navio da RDA que navegava próximo e que desceu um bote para os recolher. O navio levava um piloto da barra de Dakar porque era para lá que se dirigia. Os pilotos ficaram internados à guarda da "gendarmerie" senegalesa. A DGS entrou em acção e conseguiu acertar uma troca com um (mais provável) ou dois presos que tinha em Bissau. Essa troca foi efectuada por volta do dia 1JUL1966 na fronteira de S. Domingos.

A minha pergunta é: Quem foram os presos que a DGS entregou ao Senegal? Um deles parece que se chamava Francisco. Terá sido o "Chico Té" (Francisco Mendes, que terá sido 1º ministro no tempo do Luís Cabral)? Teria estado preso em Bissau e sido solto nessa data? Ou será(ão) outro(s) indivíduo(s)?
Vê se descobres alguém que possa saber alguma coisa ou dar algum palpite pf.
Abraço
J. Nico"

Posteriormente recebi do General Nico um segundo mail em que me é fornecida informação complementar, e que reproduzo igualmente:

"Pessoa
Mais uns elementos acabados de conseguir. Está provado que quem assumiu a detenção dos pilotos foram as autoridade senegalesas, e o próprio presidente Senghor não só estava informado como se envolveu no assunto.
Agora tudo indica que o PAIGC não foi tido nem achado sobre este problema. Isto justifica uma hipótese que me foi sugerida por quem participou no planeamento da troca, por parte da FAP, de que os pilotos foram trocados por um único indivíduo, que estava preso em Bissau à guarda da DGS, e que era um senegalês ferrenho opositor do governo do Senegal. Na altura correu até a ideia de que os senegaleses estavam muito interessados na troca, o que é verdade, e que este indivíduo poderia ser liquidado a seguir à troca.
Portanto a questão continua em aberto: quem foi o indivíduo trocado pelos dois pilotos? Já existe também mais um dado que é o da data provável da troca que terá sido por volta do dia 2JUL1966. Abraço
J. Nico"

Agradeço qualquer informação que possa ser prestada sobre esta matéria.

Um abraço.
Miguel Pessoa

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Em tempo:

2. Recebemos no dia 13 de Junho, do nosso camarada Miguel Pessoa, a seguinte mensagem: 

Caros camaradas
Mais alguma informação que acabei de receber da parte do Gen. Nico sobre a troca de prisioneiros efectuada em 1966:

Acabo de receber elementos de um dos pilotos envolvidos no episódio, que ele foi desencantar no "sótão" da casa dele. São duas notícias que apareceram no Diário Popular e ainda alguns dados da caderneta de voo. As notícias vão em anexo e a informação que me foi facultada reza assim:

"Envio-te no anexo duas notícias publicadas no Diário Popular sendo uma de 22 de Julho e a outra de 28 de Julho. Tenho dúvidas quanto à data aposta na primeira, pois nesse dia tenho dois voos registados na caderneta, em T6 ("ATAP-LOCAL" e "DESP Bissau-FARIM). Desde o dia 23 de Julho até ao dia 3 de Agosto não consta qualquer registo. No dia 4 de Agosto tenho o registo de um voo no ALIII - 9275, "DESP (Varela-ZO-Bissau) o que corresponderá ao regresso a Bissau."

Além das ilações mais óbvias parece-me que a libertação dos pilotos foi anunciada pelo Senegal no dia 28 de Julho mas depois ainda passaram alguns dias até à troca na fronteira que só terá ocorrido a 4 de Agosto. Sobre o dia do acidente estou em crer que os voos registados no dia 22JUL terão ocorrido no dia anterior e foram mal registados na caderneta. Na notícia do dia 28JUL é referido que o acidente ocorreu na última sexta-feira, que foi o dia 22JUL66. Até agora a pesquisa que tinha estado a efectuar tinha-se centrado nas duas últimas semanas de Junho mas agora está claro que tudo terá ocorrido entre 23 de Julho e 4 de Agosto. 
J. Nico"



Mas parece-me que não vai ser tarefa fácil encontrar dados novos sobre este episódio...

Abraço.
Miguel Pessoa
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18590: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (55): Explicar a guerra colonial e o 25 de Abril aos alunos do 12º ano, da escola secundária Miguel Torga, Massamá (Jorge Araújo)

Guiné 61/74 - P18735: Agenda cultural (641): Lançamento da nova edição de "Nó Cego", de Carlos Vale Ferraz, dia 19 de Junho de 2018, pelas 18h30, na Livraria Ferin, em Lisboa



No dia 19 de junho, pelas 18 horas, a Porto Editora promove uma apresentação da reedição do romance "No Cego" na Livraria Ferin (ao Chiado) com uma tertúlia em que participam o escritor João de Melo, que além de ter escrito um dos primeiros romances sobre a guerra foi o organizador da primeira coletânea de textos sobre ela, e também com o realizador António-Pedro de Vasconcelos que tentou filmar o Nó Cego e realizou Os Imortais.

O Nó Cego foi editado em 1983 e entretanto, a força do tempo, fez com que se tenham alterado - ou não - as visões do tempo que ele relata.

Enquanto autor teria o maior prazer em contar com a sua participação nesta abordagem dos efeitos do tempo na nossa memória.

Com os meus melhores cumprimentos
Carlos Matos Gomes

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SINOPSE

Nó Cego é hoje um clássico da literatura portuguesa.

Objeto de estudo e de atenção nos meios universitários, é sobretudo um grande e poderoso romance dos nossos dias, essencial para as atuais gerações de portugueses viverem esse período crucial da nossa História que foram os anos da guerra colonial e o fim do regime de ditadura, bem como para conhecer os dramas, as angústias, as alegrias e as tristezas da geração que fez a guerra e que a terminou, abrindo Portugal à modernidade.

Mantendo a estrutura da obra tal como originalmente publicada, Carlos Vale Ferraz intensificou a narrativa, dotando o texto de uma linguagem mais depurada, com as situações mais definidas na sua complexidade, por forma a que o leitor se sinta mais bem situado dentro da ação. E é assim que Nó Cego participa simultaneamente do documento e do monumento, do poderoso testemunho e da excelente literatura.

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DETALHES DO PRODUTO

Nó Cego de Carlos Vale Ferraz 
ISBN:978-972-0-03088-7 
Edição/reimpressão:04-2018 
Editor: Porto Editora 
Código: 03088 
Idioma: Português 
Dimensões: 152 x 235 x 26 mm 
Encadernação: Capa mole 
Páginas: 384 
Tipo de Produto: Livro 
Classificação Temática: Livros em Português > Literatura > Romance

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SOBRE O AUTOR:

Carlos Vale Ferraz, pseudónimo literário de Carlos de Matos Gomes, nasceu a 24 de julho de 1946, em Vila Nova da Barquinha. 
Foi oficial do Exército, tendo cumprido comissões em Angola, Moçambique e Guiné. 
Algumas das suas obras foram adaptadas ao cinema e à televisão, e colaborou com Maria de Medeiros no argumento do filme Capitães de Abril
É investigador de História Contemporânea de Portugal. 
Publicou, como Carlos de Matos Gomes e em coautoria com Aniceto Afonso, os livros Guerra Colonial, Os Anos da Guerra Colonial e Portugal e a Grande Guerra
No catálogo da Porto Editora figuram os seus romances A Última Viúva de África (2017) e Nó Cego (1.ª ed. 1982), agora reeditado, uma obra de referência obrigatória na ficção portuguesa sobre a guerra colonial.

(Com a devida vénia a Porto Editora)
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Notas do editor:

Vd. postes de:

5 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7724: Notas de leitura (199): Nó Cego, de Carlos Vale Ferraz (1) (Mário Beja Santos)
e
9 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7751: Notas de leitura (200): Nó Cego, de Carlos Vale Ferraz (2) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 7 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18720: Agenda cultural (640): Lançamento do volume n.º 16 dos Cadernos de Estudos Leirienses, com textos de José Eduardo Oliveira e José Marcelino Martins, dia 9 de Junho, pelas 15 horas, na sede do Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes

Guiné 61/74 - P18734: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXV: Como se faz um alferes milicinao do Serviço de Administração Militar (III)


Foto nº 1 > Em Mafra,  EPI,  uma das primeiras fotos, Jan 67


Foto nº 2 > - Mafra, EPI; uma das  primeiras fotos, Jan-fev 67


Foto nº 3 > Mafra,  exercícios de aplicação militar, Fevereiro 67.


Foto nº 4 > Mafra, Malveira, Exercícios Finais,  Março 67.


Foto nº 5 >  - Mafra, EPI: o meu Pelotão, do Ten Peixeiro, Março 67.


Foto nº 5 A


Foto nº 5 B


Foto nº 6 > Mafra, EPI: Juramento Bandeira, frente ao Convento de Mafra, Março 67.


Foto nº 7 > EPAN, Lisboa > Exercícios finais na Carregueira, Junho 67.


Foto nº 8 > Lisboa, EPAM: o meu pelotão, Junho 67.


Foto nº 9 > Lisboa, EPAM: o último dia de cadete, Junho 67.


Foto nº 10 > Foto para o BI militar, Porto, Junho 67


Foto nº 11 > BI Militar: frente


Foto nº 12 > Caderneta Militar (pormenor)

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem já cerca de 6 dezenas de referências no nosso blogue.
GUINÉ 1967 /69 1967/69 > ÁLBUM DE TEMAS > T001 – SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO > CURSO DE OFICIAIS MILICIANOS (COM) > EPI | MAFRA; EPAM | LUMIAR, LISBOA - Parte III (e última)

(ii) O meu percurso no COM até final

EPI – MAFRA:

Assentei praça em 3 de Janeiro de 1967, passando a ter o meu novo número de identificação – Soldado Cadete nº 10, do 1º pelotão da 3ª Companhia. Fico instalado na caserna nº 13, no 3º piso, e são muitas escadas até lá chegar.

O nosso pelotão tem como instrutor um Tenente de Infantaria, Inácio Pólvora Peixeiro, não era nenhum garoto acabado de sair da Academia Militar.

O nosso pelotão era segundo parece, constituído pelos cadetes mais velhos, de 22 anos até 26 anos, por isso fomos tratados como gente mais decente.

Fiz os exercícios finais – vulgo semana de campo – lá para os lados da Malveira e outros locais. Terminado isso foi o juramento de bandeira na última semana de Março de 67.

Daqui recebo Guia de Marcha para Lisboa, EPAM.

EPAM – LUMIAR, LISBOA:

Apresento-me nos primeiros dias de Abril de 67, na Escola Prática de Administração Militar – EPAM, e dou início ao curso da especialidade de administração.

O nosso Comandante de Companhia – o Capitão NOGA – era assim chamado, era muito duro para toda a companhia, e tivemos pior tratamento do que em Mafra.

Fiz os exercícios finais na Carregueira, uma semana de campo, e em finais de Junho de 67 acabo a especialidade e sou promovido a Aspirante Miliciano.

Fico mais um mês para fazer o Estágio junto do CA da EPAM, mas não concluo nada porque não há meios para continuar, e acabo por sair em meados de Julho de 67.


BC10 – CHAVES:

Sou enviado para Chaves a fim de iniciar um estágio naquela unidade, mas também não é sequer iniciado, estava tudo de férias e acabo por ficar sem nada fazer. Permaneço ali durante um mês, entre Julho e Agosto de 67.


RC4 – SANTA MARGARIDA:

Recebo uma Guia de Marcha para me apresentar no CIM de Santa Margarida e juntei-me ao Batalhão já formado o Batalhão de Caçadores 1933, e acabo por também participar no IAO levado a efeito naquele Campo Militar. Chego ali em 11 de Agosto de 67, e em 10 de Setembro vou gozar os 10 dias de licença militar, partindo para a Base Aérea de Figo Maduro em 19 de Setembro, acabando por embarcar de avião, um DC6, em 20 de Setembro chegando a Bissau em 21 de Setembro de 1967.

... E ASSIM SE FORMOU UM OFICIAL MILICIANO DO SAM.

Virgílio Teixeira

Em, 16-05-2018


2. Notas e legendas das fotos da tropa (COM, EPI Mafra, e EPAM, Lisboa)

Foto 1 – Esta seguramente será a primeira foto que tenho com farda. É em Mafra, talvez na Tapada, e será de Janeiro de 67.  Pelas roupas mal-amanhadas, apercebo-me que nem sequer foram à costureira para arranjar, estão largas parece uma foto de palhaço, e com aquele penico em cima da cabeça, tem o seu ar de ridículo.

Foto 2 – Também esta é uma das primeiras fotos, continuo a dizer que pode ser na Tapada de Mafra, na Escola Prática de Infantaria, em Janeiro/Fevereiro de 1967.  A farda já está mais ao jeito do meu corpo, já tenho botas pretas, a arma Mauser, o Quico na cabeça, já começa a desenhar-se um futuro militar.

Foto 3 – Numa aula de aplicação militar, o celebre ‘salto ao galho’ que era o terror de tantos candidatos a militares, é uma foto de Fevereiro de 1967.

Este salto que para muitos era impraticável, já eu o fazia em menino quando brincava aos Índios nas bouças dos lavradores e em tantas brincadeiras de crianças. Nunca deixei de fazer qualquer tipo de exercício, apenas um me recusei, o túnel, pois era tapado no final e eu tinha horror à claustrofobia.

Aqui reconheço alguns dos meus camaradas de pelotão, mas não me lembro quase de nome de nenhum. Pode ver-se uma das excepções, no chão a olhar com riso, o meu futuro amigo Faria, já homem de posses, vinha do Porto de Volvo, namorava e mais tarde veio a casar-se com a filha do dono da Auto Sueco no Porto. Casou bem. Cheguei a fazer a viagem de ida e volta Mafra-Porto, uma ou duas vezes, pois a maioria vinha nas Camionetas, em excursões do Barraqueiro.

O Faria voltaria a encontra-lo mais tarde em 1969, quando após chegar da Guiné, comecei a trabalhar numa fábrica para os lados de Vila do Conde, de origem Sueca, o agora sogro dele, era além de dono da Auto Sueco, também era o procurador da empresa sueca para onde fui trabalhar e tive muitos contactos com eles e reencontrei o Faria na Volvo – Auto Sueco.

Depois mais tarde veio a convencer-me para entrar na ‘Família Volvo’ e entrei, já nos anos de 1985. Comprei lá 9 carros da marca Volvo, 3 da série 340, 3 da série 440, 3 da série 460 e um da série 740. Disse que comprei, mas não é bem assim. Fui trocando uns pelos outros, apenas cheguei a ter 2 Volvos ao mesmo tempo. Os outros eram para substituir os sinistrados, pode dizer-se que foram uns atrás dos outros até 1991. Nunca era da nossa responsabilidade os acidentes, e assim com o seguro contra todos os riscos, trocava logo de carro com qualquer acidente, por pequeno que fosse, não pagava nada, era troca por troca. Com excepção do 740 que nunca tive acidente nenhum. Nem era eu, eram os 3 filhos, a minha mulher, e os outros que batiam contra nós. Os carros eram trocados quase novos com pouquíssimos quilómetros. Quem ganhava com isto tudo era a Auto Sueco, na venda de novo carro, e nas reparações dos outros, foram uns anos loucos, chegamos a pensar que era bruxedo e acabar com a Volvo. Mas não era assim, porque os filhos também tiveram vários acidentes com outros carros de várias marcas. Uma curiosidade, como andava sempre com carros novos, naquela parvalheira para onde fui morar – Vila do Conde – as pessoas durante décadas associaram-me como sendo um dos donos da Volvo, soube isso muito tempo depois, ninguém acreditava.

Foto 4 – Esta foto representa como todos bem sabem, a última semana da recruta, ia tudo fazer a semana de campo, ou seja os exercícios finais, por isso se vê as marmitas, e os montes, nós fizemos na Malveira, e saímos de Mafra do quartel, debaixo de uma chuva torrencial. Ainda pensamos que iria ficar sem efeito, mas lá foi tudo estrada fora para os montes a dezenas de quilómetros do quartel. Não era nada que eu ficasse traumatizado, eu gostava mesmo era destas aventuras, parecia uma criança. Foto da última semana de Março de 67.

Estes colegas de pelotão lembro-me das caras deles, não sei os nomes nem de onde vinham, era gente mais ou menos da minha idade, e a maioria ia nos seus carros particulares. Nenhum deles do meu pelotão era conhecido de antes, só no depois ainda falei com alguns, a maioria perdi-lhes o rasto.

Foto 5 – A foto de família, com todo o pessoal do 1º Pelotão da 3ª Companhia, encabeçada pelo nosso instrutor, Tenente de Infantaria, Inácio Pólvora Peixeiro, um nome difícil. Pode ver-se o Tenente Peixeiro pela farda e pela idade. Está na segunda fila a farda é mais clara e não tem os arreios que todos temos. Eu estou nessa fila, o 3º a contar da esquerda. Também não é difícil, pelo ‘porte’ de 43 kg de gente. Talvez até já tivesse mais.

Pode ver-se além do Faria que reconheço, o Rendeiro que viria a ser famoso, por ser irmão do nosso jogador de Hóquei, viria a encontra-lo no Porto várias vezes e nos Bancos onde ele trabalhou. O irmão chegou a estar em minha casa, eles viviam em Lisboa, a filha dele foi muito amiga da minha filha mais velha, ainda em solteira, e do seu actual marido, eram visitas muito frequentes, ela ficava por vezes em nossa casa e vice-versa. Quando a minha filha casou, visitaram-se muitas vezes, ainda hoje mantêm uma certa amizade à distância, claro.

Se analisarmos a foto, pode ver-se que a maioria é malta com mais de 22 anos, alguns com 23,24,25 ou mais, muitos eram já formados, e gente de posses. Muitos eram de Lisboa e arredores e até iam comer e dormir a casa, tinha carros e facilidades diversas, não se via o mesmo nos outros pelotões, por isso a nossa instrução foi sempre muito serena.

Tirando meia dúzia que cheguei a vê-los mais tarde, a maioria nunca mais os vi, nem sei por onde andaram, nem sequer se estão todos vivos.

Foto 6 – No juramento de Bandeira. Esta era a turma dos ‘aleijadinhos’. Os dois da ponta ainda têm as canadianas, no meio aparecem outros com fardas diferentes, deviam ser da aviação, na ala esquerda estou eu, o mais baixo e mais magro. Existe uma foto geral, mas não sei dela, um dia talvez a encontre, pois estas não estavam juntas às da Guiné, fui encontrando uma a uma junto com as da família. Foto em frente ao mosteiro de Mafra, na última semana de Março 67.

Pela minha parte eu estou fora da Companhia, porque estava ainda a usar de vez em quando as canadianas. Tive um acidente de viação, nos fins de Fevereiro, quando vinha para o Porto no carro de um colega, ele aí na zona de Águeda numa ultrapassagem mal calculada, bateu de frente e à bruta com um Mercedes, nós íamos num Austin. Como eu ia atrás a dormir e com os pés debaixo do assento, quando batemos em cheio, fui projectado para a frente e fiquei com os dedos entalados no banco da frente, tendo-se partido os dois polegares, um de cada pé. Andei com gesso uma ou duas semanas, estava ameaçado de perder esta recruta e isso não me interessava, por isso deitei de lado o gesso e andarilhos, e comecei a fazer todos os exercícios normalmente, tive o custo de nunca ficar bom, os dedos continuam sem dobrar, ficaram assim calcinados, e só fui fazer Fisioterapia em finais de Junho. Hoje não sinto nada, mas não posso jogar futebol é claro.

Mais uma curiosidade mórbida, esse companheiro do Porto, que está na foto de família mas não consigo identifica-lo, tinha os dias contados, infelizmente. No final do curso foi para Vendas Novas para a Escola Prática de Artilharia, e na instrução uma granada rebentou ao sair do tubo, morreu esfacelado, soube isso mais tarde, ainda estava eu em Lisboa.

Foto 7 – Agora é pessoal da EPAM – Escola Prática de Administração Militar. Esta cena faz parte dos exercícios finais da semana de campo, que foi para os lados da Carregueira, na zona da carreira de tiro. Aqui já está calor, é Junho, tempo bem quente, aliás pode ver-se, eu estou de cerveja na mão, como sempre. Esta malta é toda do Porto, mas havia mais alguns que não estão aqui. Foto na última semana de Junho 67.

Pode ver-se ao meu lado esquerdo, esse peitudo, era o Artolas nº 1, chama-se Policarpo, o pai tinha um tasco e restaurante mesmo ao lado da Estação de São Bento no Porto, na Rua da Madeira. Encontrei-o mais tarde na Guiné, em Bissau, ele aparece em algumas fotografias do meu tema de Bissau I. Outro atrás a fumar depois encontrei-o uns anos mais tarde na Faculdade de Economia, onde penso ter acabado o curso. Os outros raramente os via, eu tinha mudado de cidade, e muito raro encontrei alguém.

Também não haviam grandes amizades, nunca consegui cimentar uma amizade verdadeira com ninguém. Não acredito muito em verdadeiros amigos. Há colegas, vizinhos, conhecidos, interessados,
oportunistas, mas amigos do coração não creio.

Foto 8 – A foto de família do meu pelotão da EPAM. É no fim do curso, após as marchas finais. Pertencíamos a uma Companhia comandada pelo Capitão ´NOGÁ´, não sei o nome dele, era assim conhecido, tinha uns pulmões e uma voz de trovão. Fez a vida negra a todos, na parte de instrução física, ginástica e aplicação militar não dava tréguas, foi muito mais dura do que a recruta em Mafra. Foto da última semana de Junho de 67.

Eu estou na segunda fila, o 3º., pode ver-se pela estatura, e ao meu lado direito está um quase amigo, fomos depois colegas em Economia, do outro lado o Policarpo – o Artolas - agarrado ao pescoço de outro. Lembro-me de algumas caras, mas os nomes muito poucos.

Foto 9 – Nas instalações da EPAM no Lumiar, o último dia de Cadete, no dia seguinte somos promovidos a Aspirantes Milicianos. com divisas na diagonal, e direito a continência. Estava vestido com a farda nº 1 daquela época. Fins de Junho de 67.

F10 – A minha foto tirada para o Bilhete de Identidade Militar, já como Alferes Miliciano, uns dias antes de embarcar para a Guiné. Porto, Setembro de 1967.

O Boné foi-me oferecido pela minha namorada, que também me ofereceu os primeiros galões de alferes, comprados numa casa da especialidade do Porto, na Rua de Santo António. Não é o Casão Militar que ficava na Rua da Boavista, aí era tudo mais fraco e comprei lá os fardamentos de 2ª, os camuflados e outras coisas.

Ali na Rua de Santo António, mais abaixo desta loja, e já com a farda de gala, isto é, o Casaco, possivelmente do meu irmão mais velho, ou até do meu pai, tirei esta foto num fotógrafo profissional, pois nunca andei vestido com esta Farda de Gala, aliás não tinha sequer as calças.

Ao ver esta foto, penso porque não estou de óculos, pois desde os 18 anos que já os usava sempre, já eram 6 anos com esse acessório indesejável. Talvez porque ficava melhor, ou porque os óculos eram demasiado feios e antiquados? Nunca saberei a razão. O Boné, utilizado uma única vez, nunca mais soube dele, quando cheguei a casa em 1969, não encontrei nada e hoje gostaria de o ter comigo como recordação, mas não tenho.

Em, 16-05-2018

Virgílio Teixeira

«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BATCAÇ1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».
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Nota do editor:

(*) Vd. postes antreiores:

6 de junho de  2018 > Guiné 61/74 - P18715: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXIV: Como se faz um alferes miliciano do Serviço de Administração Militar (II)

2 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18704: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXIII: Como se faz um alferes miliciano do Serviço de Administração Militar (I)

Guiné 61/74 - P18733: Notas de leitura (1074): História das Missões Católicas na Guiné, por Henrique Pinto Rema; Editorial Franciscana, Braga, 1982 (4) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Julho de 2016:

Queridos amigos,
O apanhado de notas que se segue tem a ver com um período de definhamento da missionação na costa da Guiné. No essencial, nos reinados de D. João V e de D. José I a história missionário-portuguesa teve o seu ponto alto não em África mas no Brasil. As obras aqui citadas dão conta, e sem nenhum sofisma, que os missionários eram de muito má qualidade e tentados pelo comércio. Como se pagava mal aos militares, ninguém queria ir para estas praças, fora buscar cadastrados. Quando lemos o documento extraordinário de Honório Pereira Barreto com a sua memória da Senegâmbia, num outro período atribulado do século XIX, compreendemos o seu pesar quando refere a péssima qualidade da gente que arriba à costa da Guiné para administrar, praticar justiça, comandar tropas e até falar das coisas de Deus.

Um abraço do
Mário


História das Missões Católicas na Guiné, por Henrique Pinto Rema (4)

Beja Santos

Na sequência de recensões que se tem vindo a apresentar sobre uma obra incontornável da missionação na Guiné, História das Missões Católicas na Guiné, por Henrique Pinto Rema, Editorial Franciscana, Braga, 1982, procura-se uma síntese do período que compreende o absolutismo até ao liberalismo.

Recorde-se que no reinado de D. João V e depois da figura determinante de D. Frei Vitoriano Portuense foi nomeado bispo de Cabo Verde D. Frei José de Santa Maria de Jesus, sagrado bispo de Cabo Verde em 1721. Veio acompanhado de dois clérigos, o Dr. Manuel Leitão e António Henriques Leitão, ambos estiveram na Guiné como “visitadores”. O bispo foi à Guiné em 1732, em Farim sobreveio-lhe grave enfermidade nos olhos que o deixou cego.

O autor descreve o martirológico dos franciscanos na Guiné, do século XVII para o século XVIII bem como enumera as baixas devidas ao clima pestífero. Em comentário à ação dos missionários franciscanos desta época, o historiador José Christiano de Senna Barcelos, em Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, Volume I, escreve: “Estabelecidas as sedes das missões em Cacheu e em Bissau, delas (os prelados de Cabo Verde) destacavam arrojados padres missionários para o Norte e para o Sul, penetrando pelo sertão até às tribos mais indomáveis; com a cruz ao peito, esse símbolo da paz, avançavam tranquilos”. E escreve mais adiante: “Foi com a cruz que conquistámos toda a Guiné, e fio à sombra dela que edificámos igrejas em Ziguinchor, Farim, Geba, Rio Nuno, Pongo, Gâmbia e Serra Leoa; que se construíram fortalezas e que se permitiu a navegação fluvial. Com a cruz edificámos e avançámos a passos gigantes para o sertão; Com a espada temos demolido e retirado, com os mesmos passos, para a beira-mar. É a diferença”.

Quanto à decadência da missão franciscana, escreveu Francisco Roque Sotomaior, em 1753, um documento endereçado ao governo de Lisboa:
“Ultimamente, não posso deixar em silêncio ser também causa de muitas perturbações nesta ilha a licenciosa vida de alguns padres missionários, que, fiados no hábito de S. Francisco, fazem dele escudo para continuar o exercício de mercadores tratantes, sem cuidar na sua obrigação, além de buscar motivos para amotinar o gentio”.

António Vaz de Araújo assina em 2 de Novembro de 1778 na “Relação das Praças que Sua Majestade tem na Costa da Guiné” as de Cacheu, Farim, Ziguinchor, Bissau e Geba, não há qualquer referência à Serra Leoa e à Gâmbia. É que se a Senegâmbia Portuguesa avançasse para as fronteiras que foram negociadas com os franceses. A fiarmo-nos nos dados, em 1819, povoavam os estabelecimentos portugueses da costa da Guiné um total de 4419 pessoas, e entre elas havia três eclesiásticos em Cacheu e um em Ziguinchor.

Dir-se-á que houve uma tentativa de ressurgimentos das missões na Guiné no final da década de 1820, mas sem sequência. As Ordens Religiosas em Portugal estavam moribundas. Aguardavam o golpe de misericórdia que lhes deu o liberalismo em 1834.

Apreciando a decadência das missões no final do século XVIII, o franciscano padre António Joaquim Dinis escreve: “As ordens religiosas em Portugal que, durante séculos deram provas de grande fervor, de trabalho heroico na construção do nosso Império, de dedicação a Deus e à pátria, cansaram, entraram em decadência franca nos finais do século XVIII. Primeiro, reduzidos, depois totalmente suspendidos, foi golpe mortal, vibrado na assistência religiosa e na missionação das nossas possessões ultramarinas. Direi mais: fizeram falta à manutenção da vida social e política do Ultramar".

Estamos agora no liberalismo e escreve Henrique Pinto Rema:
“Enquanto na metrópole os conventos regurgitavam de pessoal, as desmanteladas casas que os franciscanos mantinha, por exemplo, na diocese de Cabo Verde, eram ocupadas por uns tantos, poucos, indesejáveis e aventureiros, propensos à bebedeira e à violência, mais dedicados ao comércio do que ao doutrinamento do povo. Mutatis mutandis, idêntico fenómeno se passava com os civis europeus chegados a essas bandas: ou eram negreiros, com o seu vil e lucrativo comércio, ou eram cadastrados, como aqueles que em 1805 o comandante da capitania de Bissau, Manuel Pinto de Gouveia, trouxe do limoeiro e das cadeias de Cabo Verde com o fim de guarnecer a praça. O pernicioso clima e o pagamento atrasado dos soldos, que sempre foram mais baixos que em outras províncias, não convidam homens honestos e trabalhadores”.

Por esta altura, a ação missionária na Guiné estava reduzida a três freguesias: Bissau, Cacheu e o presídio de Farim. Confiados a três sacerdotes de cor. Na terra firme da Costa da Guiné possuíamos as praças de Bissau e Cacheu, sedes de conselho, compreendendo o primeiro o presídio de Geba, o Ponto de Fá e a Ilha de Bolama; O de Cacheu estendia a sua influência pelos presídios de Farim, Ziguinchor e Bolor. Pertenciam ainda à Coroa Portuguesa comprados por Honório Pereira Barreto o Ilhéu do Rei, chamado Nova Peniche, mesmo em frente de Bissau, e o porto de Gonzo, no interior do rio Casamansa. Estas praças, presídios, pontas e ilhas teriam de três a quatro mil habitantes entre brancos, pretos livres e escravos, segundo Christiano Senna Barcelos.

Com a Convenção Luso-francesa de 15 de Maio de 1886 perdemos Ziguinchor mas a província da Guiné terá crescido de 11 mil para 36 mil quilómetros quadrados. Estava lançado o desafio da ocupação do território, como prescrevia a Conferência de Berlim. Em 1891, só tínhamos seis pontos definitivamente ocupados: a Ilha de Bolama, as praças de Bissau, Cacheu e Buba e os presídios de Farim e de Geba. Tudo vai mudar radicalmente no final do século, mas será necessário esperar que o Capitão Teixeira Pinto para que se registe formalmente a aceitação da soberania portuguesa. É neste contexto que a missionação vai conhecer avanços e recuos e que o seu estatuto ficará mais aclarado com o Estado Novo.

(Continua)
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Notas do editor

Poste anterior de 4 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18707: Notas de leitura (1072): História das Missões Católicas na Guiné, por Henrique Pinto Rema; Editorial Franciscana, Braga, 1982 (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 8 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18722: Notas de leitura (1073): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (38) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18732: Parabéns a você (1453): Fernando Tananez Ribeiro, ex-2.º Tenente da Reserva Naval (Guiné, 1972/73)

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18728: Parabéns a você (1452): Alcides Silva, ex-1.º Cabo Estofador do BART 2913 (Guiné, 1967/69) e António Joaquim Alves, ex-Soldado At Cav do COMBIS (Guiné, 1972/74)

domingo, 10 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18731: (In)citações (119): Coisas e Loisas acerca da nossa Guerra de África, das nossas Forças Armadas e da Descolonização e dos seus Destroços (1) (Manuel Luís Lomba)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66) com data de 31 de Maio de 2018, trazendo-nos uma reflexão intitulada Coisas e Loisas acerca da nossa Guerra de África, das nossas Forças Armadas e da Descolonização e dos seus Destroços.


Coisas e Loisas acerca da nossa Guerra de África, das nossas Forças Armadas 
e da Descolonização e dos seus Destroços

I 

Pertencemos à geração, ora grisalha, que “FOI ATÉ ONDE A PÁTRIA FOI”, que fez o 25A74 e o 25N75, a destituir governos que não gostava e que reconstruiu Portugal dos destroços da Descolonização e do PREC.

Somos uma fonte da nossa história, depomos na primeira pessoa, como actores vivos dos seus factos acontecimentais. Ninguém é obrigado a condescender com o branqueamento da que vem sendo escrita “sob o manto diáfano da fantasia” ideológica, nem com a sua perversão por parte dos complexados “cientistas sociais” emergentes.

De facto, tudo o que nos séculos XV e XVI os Portugueses descobriram já existia – mas estava encoberto. A gesta dos Descobrimentos, em primeiro; a saga e a diáspora da Expansão, depois. E sempre. A guerra africana dos Portugueses tem designação matricial: do Ultramar para nós e de Libertação para quem combatíamos. A terceira designação de Guerra Colonial pertence a terceiros, é semântica, mesquinha, redutora, com carga depreciativa sobre o nosso país e a nossa própria cidadania. Aos discordantes: ao menos aceitem essa realidade como aceitam o Novo Acordo Ortográfico…

Os mesmos que montavam emboscadas e faziam cercos, assaltos, etc a grupos armados, portadores do armamento mais evoluído, que manobravam segundo as mais avançadas tácticas de guerra, arriscavam as vidas e integridade física a proteger as populações indefesas, as sementeiras e as colheitas da subsistência das suas comunidades, garantiam-lhe a mobilidade por terra, ar e água, construíam-lhes casas, infra-estruturas urbanas, postos médicos de serviços universais, escolas, estrada e em escoltas para salvar doentes e parturientes. Jamais os países da CPLP beneficiaram de cooperação tão eficiente, extensa, profunda e inclusiva – e a custo zero. Existia um Estado e obrigámo-nos a fazê-lo funcionar. Essa realidade era uma guerra colonial?

De personalidade complexa, Salazar (e a sua circunstância), para além de ditador suave (comparável a De Varela, da Irlanda, a grande distância da de Franco, da Espanha, Mussolini da Itália, Hitler, da Alemanha, Estaline da URSS ou da de Fidel Castro, de Cuba) foi um grande patriota. Pegou num Estado em falência total, consequência da nossa guerra na África e participação na Europa – a nossa derrota em La Lys aconteceu há 100 anos - e da irresponsabilidade dos “progressistas” da I República, lidou com a Guerra Civil da Espanha e com II Guerra Mundial.

Levantou o Estado Português “orgulhosamente só”, começando por mandar regressar de Genebra os diplomatas, que penosamente negociavam um empréstimo emperrado na Sociedade das Nações, obviamente à “custa dos mesmos” do costume; entrou da nossa história como estadista de primeira água, até mais até pela sua seriedade – não se apropriou do que pertencia a todos; o invés dos políticos poltrões e corruptos desta era “Pós Verdade”, desde deputado a presidente da câmara, (salvo muitas e honrosas excepções), que além de conduziram o país à falência, em época de paz e prosperidade, colocaram o Estado Português sob o protectorado do FMI, do BCE e da Comissão Europeia, com a tarefa de levantarem de novo o Estado Português, também às “custas dos mesmos” do costume, obviamente.

Não me esqueço ter sentido arrepios ao ver do General Garcia Leandro, grande capitão da Guiné, do 25A74 e do 25N75, a dizer na televisão, ainda comovido, ter chorado na madrugada da chegada desse dia da chegada da “troika”!

Sem lhe desculpar o modo esdrúxulo como se auto-impôs Presidente do Conselho, no contexto do tufão Humberto Delgado, um dos seus ex-capitães, Salazar terá lidado com o caso da Índia e com o desencadear da guerra africana num estádio de acentuada senilidade.

(Lembremo-nos o desempenho político do notável Mário Soares, nos seus últimos tempos de vida).

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18442: (In)citações (118): sociocoreografia de um batuque (Cherno Baldé / Valdemar Queiroz)

Guiné 61/74 - P18730: Blogpoesia (570): "É como um rio a nossa vida...", "Forças invisíveis..." e "Visita do Sol...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


É como um rio a nossa vida…

Fio de água, flor em botão, grão em semente,
Cresce do chão. Se eleva ao alto. Em correria louca.
Se dispõe a tudo. A viver sem fim.
Se espraia ao sol. Gemendo ao vento,
Aqui, avança, ali se espraia.
Alegria louca.
Tudo querendo. Sulcando fundo.
Cataratas. Escarpas rochosas.
Remoinhos. Num catavento.
Tem um destino a descobrir.
Marcha veloz. Cheia de riscos.
Umas vezes, vencendo. Outras, perdendo.
Belos encontros. Festas felizes.
Apetece ficar. Remanso de sonho.
Mas cá por dentro, há um apelo.
Há que seguir. Sem retorno.
É o dia a dia.
Gemendo e chorando.
Cantando e rindo.
Horas bravias, as melhores são doces.
Deixam saudade. Fazem sonhar.
Grande mistério.
Para quê viver?...

Ouvindo dois violoncelos em “moon river”
Dia chuvoso
Mafra, 6 de Junho de 2018
7h11m
Jlmg

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Forças invisíveis…

O mundo é um mar imenso, de ondas convulsas que se digladiam incessantemente.
Numa propulsão contraditória de elementos cuja origem ultrapassa o imaginário.
Uma rede de malha fina e consistente
Sustenta a existência onde habita a humanidade.
Há mistérios insondáveis que permanecem em segredo.
Qual o rumo e o fim do futuro.
Temos consciência de que somos.
Mas não do fim para que existimos.
Há apelos íntimos que nos acompanham a cada momento.
Qual é a sua origem e finalidade.
Uma insatisfação constante e insaciável nos estigmatiza a vida.
Caminhamos no cume do abismo e da sede de glória.
Oscilamos entre a terra e os céus com vontade inelutável de aqui ficar.
Até o mundo gira frenético numa busca ingente, desde a terra, o sol e as galáxias
Que nos deixa perplexos…

Mafra, 3 de Junho de 2018
7h44m
Ouvindo Fauré - Requiem aeternum
Jlmg

********************

Visita do sol…

Abençoado seja este sol que me visita neste amanhecer.
Oxalá não fosse uma furtiva amostra
Mas ficasse o dia todo acompanhando nossa existência.
Faz-nos falta sua luz e seu calor.
É a base da nossa existência, viva e iluminada.
Quando não vem, avança a tristeza crescente embora velada.
Não nascemos para viver na sombra.
Nem com frio.
A chuva venha em doses certas.
Não empape nossos caminhos.
Precisamos de nos mover na secura das estradas.
Queremos banhar nossos olhos nas cores que encantam os campos e valados.
Rejubilem os pássaros com seus voos endiabrados e o canto que lhes brota sem ensaios.
Beba o sol das ondas salsas e bailarinas o sal da força que puxa este mundo.
Suas visitas respeitem o calendário das estações da natureza.
Nunca confunda o inverno com o verão
Para que o outono seja fecundo.
Fica aí reinando nesse trono, de paz e de abundância…

Ouvindo o concerto n.º 1 de Tchaikowsky por Martha Argerich
Mafra, 5 de Junho de 2018
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 3 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18706: Blogpoesia (569): "Como os tempos mudaram...", "Tivesse voz a borboleta..." e "Os sinais da vida", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P18729: Efemérides (282): O último "Dia da Raça" comemorado em Bissau, 10 de Junho de 1973 (Ramiro Jesus, ex-Fur Mil Comando da 35.ª CComandos)

1. Mensagem do nosso camarada Ramiro Jesus (ex-Fur Mil Comando da 35.ª CComandos, Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73), com data de 9 de Junho de 2018:

Bom-dia, caros ex-"camaradas d'armas".
Na véspera de mais um aniversário, lembrei-me de enviar-vos, para análise e, depois de ajuizadas, possível publicação, algumas fotos do último dia "da Raça", comemorado em Bissau, isto é, no dia 10 de Junho de 1973.
Não sei quantas suportará cada mensagem, por isso talvez recebam algumas sem texto, que é para não ter muito trabalho.
Com esta idade, convém poupar alguma energia, necessária para a corrida de amanhã, de manhã.

Bom fim-de-semana!
Ramiro Jesus










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Nota do editor

Último poste da série de 5 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18712: Efemérides (281): O 10 de Junho em Ponte de Lima: convite e programa. Lançamento do livro do nosso grã-tabanqueiro Mário Leitão, "Heróis Limianos da Guerra do Ultramar", às 11h30, no auditório da Câmara Municipal

Guiné 61/74 - P18728: Parabéns a você (1452): Alcides Silva, ex-1.º Cabo Estofador do BART 2913 (Guiné, 1967/69) e António Joaquim Alves, ex-Soldado At Cav do COMBIS (Guiné, 1972/74)


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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18726: Parabéns a você (1451): Ernesto Duarte, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 1421 (Guiné, 1965/67)