quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20668: Em bom português nos entendemos (25): Bicha de pirilau... Expressão da gíria militar do nosso tempo, ainda não grafada nos dicionários... Será que continua a incomodar o senhor general?



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > S/l > s/d > Progressão em coluna apeada, ou em fila indiana  (no mato, no CTIG, dizia-se: "bicha de pirilau")

Foto (e legenda): © João Sacôto (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. No Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, que é o que está mais à mão, não consta a expressão, "bicha de pirilau"... Só vêm os vocábulos "bicha" e "pirilau".  No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, onde há tudo como na farmácia, desta vez não encontrei o que pretendia...

No Dicionário aberto de calão e expressões idiomáticas, de  José João Almeida (Projeto Natura, Universidade do Minho),  idem, aspas... Também no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa ninguém teve, até agora, a  curiosidade em saber o seu significado e a sua origem... Há, no entanto, uma entrada sobre "bicha" e "fila"...

Resta o nosso blogue... A locução ou expressão "bicha de pirilau" aparece amiudadas vezes nos nossos postes... Cite-se, por  exemplo, o nosso saudoso Luís Faria (1948-2103), ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791 (Bula e Teixeira Pinto, 1970/72):

(...) "O amanhecer não tardaria muito quando deixámos a estrada e entrámos no desmatado, avançando em longa bicha de prilau para a mata e continuando numa progressão atenta, ziguezagueante e tanto quanto possível silenciosa, atendendo ao número de elementos, com o objectivo de detectar e interceptar um grupo IN presumivelmente numeroso, que por lá se movimentaria". (...) (*)

O vocábulo feminino "bicha de pirilau" já fazia parte do léxico militar, em 1964, aquando da Op Tridente, a avaliar pela descrição das peripécias na ilha do Como, aqui feita pelo nosso querido camarada  Mário Dias, 2º sargento comando (Brá, 1963/66):

(...) "Atravessado sem percalços este obstáculo natural, eis – nos na extensa bolanha que se estende até Cauane e à mata de Cachil mais a Norte. Aí, só era possível andar sobre os estreitos ouriques pelo que lá vamos nós em coluna por um (a célebre "bicha de pirilau", na gíria militar)" nada aconselhável em terrenos descobertos. (...) (**)

No Pequeno Dicionário da Tabanca Grande (***), há esta entrada:

"Bicha de pirilau - Progressão, em fila, no mato, mantendo cada homem uma distância regulamentar de segurança (gíria); o mesmo que fila indiana." 


Carlos Silvério, grã-tabanqueiro nº 783
2. Tudo isto vem a (des)propósito de um comentado inserido no poste P20655 (****), em o nosso cap inf ref José Belo anuncia, à Tabanca Grande, a reabertura da sua Tabanca da Lapónia:

Comentário de Luís Graça, com data de 16 do corrente:

Meu caro José:

Ando há tempos com um pedido do meu/nosso camarada Carlos Silvério, de Ribamar da Lourinhã, terra de lobos do mar... Para mais é meu primo, porque casou com a Zita, que pertence ao clã Maçarico, tal como eu... Além disso, o Carlos é também primo do tenente general Luís Silvério, filho ilustre da terra... Enfim, somos um país em que somos todos (ou quase todos) primos uns dos outros...

Mas adiante... O Carlos Silvério, nosso grã-tabanqueiro nº 783, ex-fur mil at cav, CCAV 3378 (Olossato e Brá, 1971/73) (...) tem uma pequena questão a pôr-te:

Quando ele passou pelo RI 5, Caldas da Rainha, como monitor de recruta do CSM (Curso de Sargentos Milicianos), entre setembro e dezembro 1970, ele ficou com a ideia de que tu estavas lá, como instrutor, eras alferes miliciano, acabado de regressar da Guiné...

Bate certo ? Um belo dia apareceu lá um senhor general que quis certificar-se da excelência da formação dada aos futuros sargentos milicianos... E terá supervisionado uma das tuas aulas práticas... Às tantas, falavas tu da tua experiência operacional no TO da Guiné, em 1968/70, quando usaste a expressão "bicha de pirilau"...

Parece que o general ficou "piurso", saltou-lhe a mola e deu-te uma valente reprimenda ("piçada"):

- Senhor alferes, no exército português não há bichas de pirilau!... Os nossos militares, no mato, na Guiné, em Angola, em Moçambique, andam em fila!... Ponha isso no seu léxico!...

O Carlos não sabe porque é que o senhor general afinou com a expressão "bicha de pirilau"... Seria uma reacção... homofóbica"?...

Bem, para o caso não interessa, o Carlos só me pediu para confirmar se o instrutor eras... tu. Se sim, a história é divertida... Se foi com outro instrutor, a história continua a ser divertida na mesma. (...)



José (ou Joseph ou Joe) Belo, um capitão de infantaria
que a Pátria / Mátria / Fátria tramou...
3. Resposta  do José Belo, que também se assina Joseph (na Suécia) e Joe (nos States):

Caro Luís

Näo recordo a história referida. "Correcöes" por parte de Senhores Oficiais Generais... tive a honra de receber algumas durante a minha vida militar, principalmente no período indicado do... pós regresso da Guiné.Daí ser muito possível que fosse eu.

Era um termo muito usado pelos instrutores "Infantes", mesmo na casa mãe em Mafra. O feliz termo "pirilau" não tinha neste contexto quaisquer associações com homossexuais. Creio ser um termo que era vulgarmente usado pelos vindimeiros no Norte, obrigados pelo terreno a caminhar em fila (!) por sinuosos carreiros.

A única correção que poderei fazer é o facto de que na data indicada já näo era Alferes Miliciano.
Parabéns ao camarada Carlos Silvério pela sua memória, muito melhor que a minha,felizmente cada vez mais "gasta" quanto a tudo (o muito!) que foi militar na minha vida. (...)


4. Comentário do nosso editor Luís Graça:

Desculpa, José, ou Joseph, ou Joe, conforme onde tu estejas (, e nunca ninguém sabes onde estás "just in time"...), mas o senhor general tinha razão... No Exército Português não há (ou não havia...) "bichas", mas "filas"... Muito menos "bichas de pirilau"...

Esta última expressão vê-se mesmo que era de gente "apanhada do clima"... "Fila" é que era linguisticamente correto: os mancebos, nuinhos, de pilau murcho ao frio, quando iam às "sortes, esperavam em "fila", não em "bicha", a vez de serem chamados, observados, apalpados, pela junta médica que depois os considerava aptos ou inaptos para a "função", que era... "morrer em fila, organizados"... na frente da batalha!...

Se calhar o senhor general nunca esteve na Guiné e não sabia o que era a "guerra de guerrilha", ou "guerra subversiva". Estudou, pois,  por outros canhenhos... Mas tu estiveste lá, no coração do mato, em Empada, em Bula, em Mampatá,  na região do Forré, sabias do que falavas aos instruendos do CSM, nas Caldas da Rainha...

E portanto eu reconheço-te autoridade para "grafar" a expressão... Só não entendo a reação (, algo destemperada, a crer na versão do Carlos Silvério...) do general que te deu a "piçada"... Mas, enfim, devia ser um daqueles generais da brigada do reumático que nunca foi à guerra e, como tal, era incapaz de imaginar uma fila de trânsito no mato, de gente apeada, 250 homens / 8 grupos de combate, de G3 em punho, a progredir em direção ao Poindom ou à Ponta do Inglês, e ao banho de sangue que os esperava... (Vd. o que eu aqui já escrevi sobre a Op Abencerragem Candente, subsetor do Xime, Setor L1, Bambadinca, 25-26 de novembro de 1970, estavas tu a dar instrução aos instruendos do CSM, nas Caldas da Rainha...).

Era, vista de cima, do PCV, da DO 27, uma "bicha" de todo o tamanho, entre mil a mil e quinhentos metros... partindo-se do princípio que entre cada combatente havia um espaço de 4/5 metros... ou às vezes mais...


5. O mais surpreendente é que os lexicógrafos desconhece-se a expressão "bicha de pirilau" !...E mesmo na Net, e à exceção do nosso blogue, é difícil apanhá-la... Ele há bicha-de-rabear, ele há bicha-de-sete-cabeças... mas "bicha de pirilau",... cá tem.

Em todo o caso, encontrei este "delicioso apontamento" sobre a expressão "bicha de pirilau", num blogue com um título deveras original (e muito "feminista"), de Maria Brojo:   "Sem Pénis Nem Inveja":

Domingo,  5 de novembro de 2006 > Bicha-pirilau

(...) Fomos assaltados. Roubados. Espoliados do significado de termos que eram nossos até o português exportado do Brasil os ter censurado cá, por serem pejorativos lá. Bicha foi um deles. Fila passámos a dizer, não fossem os «bichas» - homossexuais, paneleiros, abafadores da palhinha na gíria portuguesa - ficarem numa espera confundidos.

Bichas eles ou as gentes em carreira esperando a vez? As novelas brasileiras tiveram o (des)mérito de obrigar ao volteio do português escorreito. Banais acrescentos como lingerie, hobby, gays ou stress? Talvez, mas por pertencerem a língua comum falada em continentes diferentes, formiga dos termos a adopção.

Bichas há muitas: gatas e cadelas, fila indiana, ficar como uma bicha (fulo, danado), ver se as bichas pegam (tentar obter o desejado), bicha-pirilau.

Esta é, de longe, a mais impressiva. Usada no mundo militar, é gritada por sargentos aos recrutas temerosos se alinhar é preciso. Um "bicha-pirilau" trovejado,  com voz de comando por arregimentado façanhudo, a uma mulher, daria vontade de rir;  aos mancebos magricelas e fardados soará como clamor dos Infernos.


Mas faz sentido:  homens formando linha direita, pirilaus erectos acompanhando o desenho. Duvido, porém, do estado hirto e firme dos atributos masculinos embrulhados nas fardas e alinhados em parada. Estivessem com bravura todos erguidos em carreira, e constituiriam, sem que prante a menor das dúvidas, espectáculo digno de ser visto. (...)

Fonte: Do blogue Sem pénis nem inveja, editado por Maria Broja > Domingo,  5 de novembro de 2006.


6. E voltando ao Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, portal que eu muito admiro... Encontrei, em todo o caso, esta deliciosa resposta do João Carreira Bom, cofundador com José Mário Costa, do Ciberdúvidas, e infelizmente já falecido... A resposta é a uma questão sobre a diferença entre "bicha" e fila"... Aqui vai, para o nosso comum enriquecimento linguístico (*****). Porque a falar é que a gente se entende, e de preferência em bom português. Vou pôr esta questão, algo melindrosa para os nossos generais,  ao meu amigo José Mário Costa, o Senhor Ciberdúvidas, coordenador editorial do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa:

(...) No «Novo Dicionário da Língua Portuguesa», de Cândido de Figueiredo, editado em 1939 (Bertrand), bicha é associada a «qualquer objecto que, pelo seu feitio ou movimento sinuoso, dá ideia de um réptil». Entre outros sentidos, Cândido de Figueiredo atribui-lhe o de «fileira de pessoas, umas atrás das outras». Fila, na mesma obra e no significado que aqui nos interessa, é uma «série de coisas (animais ou pessoas) dispostas em linha recta. Enfiada; fileira: uma fila de cadeiras.» Nos dicionários mais recentes que consultei, seguem-se, no essencial, estas indicações.

Não pude confirmar, assim, a especialização de sentido que, quanto ao movimento, o prezado consulente fez o favor de nos referir. Mas concordo consigo no aspecto mais importante: querem matar uma palavra necessária. Bicha está a ser comida à má fila nas cabecinhas, tão piedosas quão perversas, de alguma classe média.

Contrariando opiniões que recolhi e atribuem o fenómeno às telenovelas brasileiras, não cometerei grande erro se disser que já existia em certas camadas da sociedade portuguesa um preconceito sexista em relação a esta palavra. Um preconceito muito mais ténue do que no Brasil, mas lembro-me de uma «tia» me corrigir, na minha adolescência, por haver utilizado a sonora expressão «bicha do eléctrico». As telenovelas brasileiras não criaram, pois, o preconceito. Tê-lo-ão difundido um pouco mais.

Até demonstração do contrário, continuarei a dizer «fila de automóveis», «fila de soldados», «fila de cadeiras», «bicha do IRS». E, se calhar, até digo «bicha de carros», «bicha de espera». Na bicha para a compra do passe, nunca ouvi exclamar: «Olha a espertinha, está a passar à frente da fila!» Os elementos mais pretensiosos da classe média, pelo seu número e posição, podem ser muito influentes. Mas não vão para as bichas dos transportes públicos. Afigura-se-me não terem influência directa para provocar a morte de uma palavra inocente que, afinal, os perturba. Eles lá sabem porquê.

João Carreira Bom 1 de janeiro de 1997.

in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/bichas-ou-filas/219 [consultado em 18-02-2020]
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 16 de maio de  2009 > Guiné 63/74 - P4361: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (14): Um mês complicado (3): O osso

(**) 15 de dezembro de  2005 > Guiné 63/74 - P353: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): Parte I (Mário Dias)

Guiné 61/74 - P20667: Convívios (916): Almoço/Convivio do pessoal do BCav 3846 que esteve na Guiné, em Ingoré, São Domingos, Sedengal, Suzana, Varela e Antotinha de 1971 a 1973, 15 de Março de 2020, Matos da Ranha, Pombal (Delfim Rodrigues)

ALMOÇO/CONVÍVIO DO BCAV 3846

DIA 15 DE MARÇO DE 2020

MATOS DA RANHA - POMBAL


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Nota do editor

Último poste da série de 14 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20650: Convívios (915): XXXIX Encontro do Agrupamento de Transmissões da Guiné, dia 9 de Maio em Vila Nova de Famalicão (Belarmino Sardinha)

Guiné 61/74 - P20666: Agenda cultural (744): Encontro A Guerra Colonial e o 25 de Abril, dias 19 a 21 de Março de 2020 na Biblioteca Municipal de Torre de Moncorvo (Paulo Salgado)

C O N V I T E


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Nota do editor

Último poste da série de 18 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20662: Agenda cultural (743): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte V: Momento alto da tarde cultural: a moda "O meu chapéu", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa: letra e música de João Monge

Guiné 61/74 - P20665: Historiografia da presença portuguesa em África (200): “A Guiné Portuguesa, subsídios para o seu estudo”, comunicação de Carlos de Almeida Pereira, no 3.º Congresso Internacional de Agricultura Tropical, Londres 1914 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Fevereiro de 2019:

Queridos amigos,
O antigo Governador Carlos Pereira apresentou o seu trabalho num congresso de agricultura tropical, em Londres, 1914. Carlos Pereira é um republicano entusiasta, no seu livro "A Presença Portuguesa na Guiné", Caminhos Romanos, 2016, Armando Tavares da Silva revela a atividade do governador que se viu confrontado com hostilidades entre indígenas, uma epidemia de febre amarela, o nascimento da liga guineense, a chegada de Teixeira Pinto como novo Chefe de Estado-Maior, as primeiras operações no Oio e, sobretudo o seu nome fica associado à demolição da muralha de Bissau.
Esta obra tem o duplo interesse de registar na monografia, e com o maior rigor e precisão, a organização política administrativa, os dados económicos, não deixando de relevar as potencialidades da economia agrícola; além disso, é importante o seu acervo fotográfico, nenhuma obra da época lhe pode rivalizar com a qualidade das imagens, aptas para diferentes leituras.

Um abraço do
Mário


A Guiné aos olhos do antigo governador Carlos Pereira, 1914

Beja Santos

Carlos de Almeida Pereira
Carlos de Almeida Pereira, Oficial da Marinha, foi o primeiro Governador da Guiné na I República, esteve à testa dos destinos da colónia entre 1910 e 1913. Deve-se-lhe o derrube dos muros que protegiam a vila de Bissau das investidas dos Papéis, sempre hostis. Em 1914, Carlos Pereira apresenta uma comunicação no 3.º Congresso Internacional de Agricultura Tropical, em Londres, a sua comunicação intitulada “A Guiné Portuguesa, subsídios para o seu estudo” tem edição em francês em Lisboa nesse mesmo ano, existe igualmente a versão inglesa.

Destaca-se da leitura do documento o fenomenal e mesmo inusitado acervo fotográfico, de muito boa impressão, uma variedade que permite perceber a arquitetura e a vida sobretudo em Bolama, identificando diferentes etnias, postos administrativos, o estado da fortaleza de Cacheu, etc. O documento tem também a particularidade de um caráter monográfico em que se fala do território, da administração e das potencialidades para o desenvolvimento sem nunca aludir às vicissitudes das lutas da ocupação, Carlos Pereira não refere as operações do Capitão Teixeira Pinto, dele aparece uma fotografia bem curiosa investido como Chefe de Estado-Maior.

Aborda o território e os seus habitantes, dá-nos um quadro bem curioso das missões de demarcação de fronteiras entre 1888 e 1905, os nomes de quem participou logo na primeira demarcação, do lado português e francês e posteriormente. É categórico na superfície da colónia depois da última demarcação: cerca de 36 mil quilómetros quadrados. Descreve os recursos hidrográficos, a meteorologia e o clima. No estado atual da higiene diz sem rebuço que a colónia não se prestava à adaptação da raça branca. Quanto à fauna, recorda-nos que havia poucos elefantes e de pequena estatura, os paquidermes encontravam-se principalmente na circunscrição de Buba, Geba e Cacine. Fala também em antílopes de diferentes variedades, búfalos, leopardos (?), hienas, raposas e lobos. Lembra também a existência de hipopótamos, alude às numerosas variedades de primatas, pássaros, répteis e insetos. A população era estimada em 400 mil habitantes.

O antigo governador confessa não possuir elementos para fazer um estudo etnográfico dos povos da Guiné, sem prejuízo de elencar um número de grupos étnicos, bem próximo da realidade: Felupes, Baiotes, Banhuns, Cassangas, Brames ou Mancanhas, Balantas, Fulas-Forros e Fulas-Pretos, Mandingas, Beafadas, Nalus, Sossos, Papéis, Manjacos, Bijagós e Oincas, esboçando uma caraterização destas etnias. Há aqui um ponto curioso que é a referência a “indeterminados”, situando-os no regulado do Cuor, na margem direita do Geba, frente a Bambadinca, dizendo que viviam até 1908 os Beafadas chefiados por Infali Soncó, que foi destituído depois da sua rebelião, o Cuor foi entregue a Abdul Indjai, os Beafadas deixaram o regulado, uns dirigiram-se para o Oio e outros para Quínara, Abdul Indjai conseguiu atrair indígenas pertencentes a diferentes grupos étnicos exteriores (Turancas, Seruá, Saracolés, etc.). Dado que o território é pobre, Abdul não se interessou muito por ele, foi ocupado pelos Oincas. Este é o exemplo de indeterminados dado por Carlos Pereira.

Uma família Papel

Mulher Grumete -Papel

 Tecelões Grumetes

Mulheres Grumetes - Manjacas

OBS: - Todas estas fotografias pertencem à monografia que Carlos Pereira apresentou em Londres, em 1914.

Os brancos eram computados nalgumas centenas, funcionários, comerciantes, empregados de comércio e agricultores. É minucioso no enquadramento que faz da organização política e administrativa, elenca os respetivos órgãos. Na orgânica especifica os concelhos e postos militares: Bissau, Mansoa, Cacheu, Arame, Bissorã, Mansabá, Churo, Gole, Caranquecunda, Bambadinca, Buruntuma, Xitole, Boduco e Ilha Formosa.

Inevitavelmente, dá a sua leitura da economia agrícola, e começa por dizer que na Guiné o europeu não pode dedicar-se diretamente aos trabalhos da agricultura, a mão-de-obra deve ser indígena. Exprime o seu otimismo, a colónia é um imenso reservatório de produtos naturais de exportação, o único produtor é o indígena que trabalha por conta própria e em condições tais que não permitem a concorrência do europeu em empregar indígenas assalariados. Mas também observa que a mão-de-obra se obtém com facilidade para os trabalhos públicos, para as tripulações das embarcações, para trabalho doméstico, empregados das casas comerciais e particulares, para o trabalho de carga e descarga dos navios, etc., desde que o indígena seja bem tratado, pago com justeza e que lhe seja dada a garantia de poder abandonar o trabalho em certas épocas para se dedicar às suas atividades no seu chão.

Refere igualmente as obrigações do Banco Nacional Ultramarino com o Estado, em contrapartida dos seus privilégios, o banco exerce gratuitamente as funções de Tesoureiro do Estado, recebe os rendimentos públicos, os depósitos judiciais, emite dinheiro, pode fazer operações de crédito agrícola, empréstimos hipotecários, transferências, câmbios, etc.

Muito curiosas são as conclusões do trabalho de Carlos Pereira apresentado em Londres, dizendo que em 1909 o eminente colonial Mr. Messimy escrevia no relatório referente ao orçamento geral do Ministério das Colónias da França que a Guiné Portuguesa, inteiramente encravada nos territórios franceses, economicamente pouco desenvolvida, desprovida de todo o hinterland, não tem mais que interesse histórico para o reino lusitano.
E diz, com certa ufania:  
“Este meu trabalho mostra que não somente Mr. Messimy mas também outros homens de Estado portugueses do regime monárquico se enganaram nas suas previsões. A Guiné Portuguesa, depois da Implantação da República entrou numa fase decisiva de prosperidade, completamente assegurada pela riqueza do seu solo, pela situação geográfica e pelas aptidões dos seus habitantes”.
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20641: Historiografia da presença portuguesa em África (199): Relatório da Província da Guiné Portuguesa, 1888-1889, pelo Governador Interino Joaquim da Graça Correia e Lança (2) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20664: Tabanca da Diáspora Lusófona (6): Alô, Alô, Luiz Farinha, Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco, Brasil!!!... Daqui, João Crisóstomo, Nova Iorque, USA...

João Crisóstomo
1. Mensagem do régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona,  o luso-americano João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67):  vive desde 1975 em Nova Iorque, é um conhecido ativista social (de causas como as Gravuras de Foz Coa, Timor Leste ou Aristides Sousa Mendes); é casado, desde 2013,  com a nossa amiga eslovena, Vilma Kracun:


Date: quinta, 13/02/2020 à(s) 12:19
Subject: Luiz Farinha

Meu caro camarada, compatriota Luiz Frainha:

Li o teu post no Blogue (*)…  Junto-me  ao nosso comandante Luís Graca  e a todos aqueles que se sentam nesta Tabanca para te dar um abraço de boas vindas. Creio que cedo te vais aperceber da boa decisão que tomaste.

Como o Luís Graça ( que além de ser o meu comandante,  é para mim um irmão, e até somos vizinhos) falou no meu nome, eu, como bom soldado,  tomei   a sugestão  como uma  ordem…  e peguei no telefone ( eu sou dos velhos tempos… ) mas não consegui contactar-te. Ficará para uma próxima vez. Eu também uso o WattssApp 1.917 257 1501, para o caso de quereres tentar.

Luiz Farinha
Eu passei pelo Brasil, Rio, três anos, 1972 a 75. E voltei (mas só por um mês) em Abril de 2014 no 1º aniversário do meu casamento.  Mas não me faças jovem, que já vou nos 76. Este foi o meu 2º casamento!... Fui até à Bahia  duas semanas. Com muito pesar meu, nunca viajei pelo interior, como eu queria… mas sei que o Brasil  é terra de quase infinitos… de qualquer maneira ou vertente que seja encarado.

Creio que daqui dos USA não te poderei ajudar muito sobre a publicação do teu livro; eu não sou escritor mas há dois anos  "obrigaram-me" a pôr "em jeito de livro" ( que não pus sequer à venda, oferecendo-o antes aos meus amigos)  um dossiê que eu tinha organizado para que a minha papelada (sobre o envolvimento dos luso-americanos daqui à minha volta na causa de Timor)    não fosse um dia parar ao  cesto dos papéis.  É a única experiência que tenho.

Mas todos aqueles com quem falei são de opinião que em Portugal ou Brasil  ( ou em qualquer outro lado, excepto  Japão etc) a publicação fica por menos de metade do preço daqui… Mas,  se quiseres ,podemos falar mais ao telefone, pois podemos trocar idéias instantâneas, sem esperas de voltas de correio…

Um grande abraço dum camarada da Guiné (1965-67: Xime, Bambadinca, Enxalé, Missirá, Porto Gole…).  Podemos falar mais sobre estas coisas pelo telefone ou podes ver o blogue, que  "virou" enciclopédia sobre o assunto.

João Crisóstomo (**)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 4 de fevereiro de  2020 > Guiné 61/74 - P20622: Tabanca Grande (490): Luiz Farinha, ex-alf mil, STM Auto, CCS/BCAÇ 3832 (Mansoa, dez 1970 / fev 1973), psicólogo clínico aposentado, escritor: senta-se à sombra do nosso mágico e fraterno poilão, no lugar nº 803

Guiné 61/74 - P20663: (In)citações (144): um Oscar Bravo (OBrigado) a todos/as, família, conterrâneos/as, amigos/as e camaradas que fizeram da sessão de lançamento do meu último livro, em 8 de fevereiro último, na Casa do Alentejo, uma tarde memorável que tão depressa não vou esquecer (José Saúde)



Lisboa > Casa do Alentejo > 8 de fevereiro de 2020 > Sessão de lançamento do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial: Guiné-Bissau, 1973-1974: memórias de Gabu" (Lisboa, Edições Colibri, 2019, 220 pp., coleção "Memórias de Guerra e Revolução", 20) >

Da esquerda para a direita, na mesa, o  maj gen Raul Cunha, a dra. Rosa Calado (, que presidiu à sessão, na qualidade de responsável do pelouro da cultura da Casa do Alentejo),  o José Saúde (autor), Luís Graça, e Fernando Mão de Ferro (editor). O livro foi apresentado por Luís Graça e o "ranger" Raul Cunha, maj gen ref, autor de "Kosovo – A Incoerência de uma Independência" (nº 19, da coleção " Memórias de Guerra e Revolução",  ed lit: Carlos de Almada Contreiras, capitão de mar e guerra ref.)

Foto (e legenda): © José Saúde (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de José Saúde, jornalista, escritor, nosso amigo e camarada,  ex-fur mil op esp / ranger, CCS/ BART 6523, Nova Lamego, 1973/74); natural de Aldeia Nova de São Bento, Serpa, vive em Beja; tem 185 referências no nosso blogue):



Data: domingo, 16/02/2020 à(s) 09:06
Assunto: "Um ranger na guerra colonial, Guiné-Bissau, 1973/74"

Luís,

Reenvio-te o meu agradecimento público a um "mar" de pessoas que estiveram no lançamento do meu último livro "Um ranger na guerra colonial, Guiné-Bissau, 1973/74", na Casa do Alentejo, em Lisboa, no pretérito 8 de fevereiro de 2020, onde registei a presença de muitos camaradas que pisaram o solo guineense. 

Abraço, José Saúde.

OBRIGADO!

À Casa do Alentejo em Lisboa, na pessoa da dr.ª Rosa Calado, ao Fernando Mão de Ferro, editor da Colibri, ao major-general Raul Cunha, meu camarada ranger, ao dr. Luís Graça, nosso amigo e também camarada, ao comandante Almeida Contreiras, um militar do 25 de Abril,  pela amabilidade em colocar o meu livro na sua enciclopédia "Memórias de Guerra e Revolução", à União de Juntas de Freguesia de Vila Nova de São Bento e Vale de Vargo, à Câmara Municipal de Serpa, pelas suas afáveis disponibilidades nos transportes, ao Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, ao Grupo Musical "Os Alentejanos" de Serpa, às minhas filhas e netos que persistem em aturar as hilariantes aventuras deste já velho condiscípulo, aos camaradas de guerra, aos amigos, conhecidos e ao público em geral que marcaram presença numa esplêndida Tarde Cultural, e a tantos outros que dignamente me lisonjearam, deixo o meu profundo OBRIGADO. (*)

 "Um ranger na guerra colonial, Guiné-Bissau, 1973/74" é tão só o testemunho real de um jovem militar que assentou praça em Tavira a 10 de outubro de 1972 e que a 4 de janeiro de 1973 foi enviado para Lamego, onde o quartel se localizava, e localiza, em Penude.

A dureza da especialidade – Operações Especiais/Ranger – foi marcada pela eficaz aprendizagem militar, física e psicológica, tendo como prioridade final o saber lidar com os conflitos em pleno palco de guerra.

Em Penude fomos submetidos a diversas operações de risco. A largada, na noite da chegada e quando já dormíamos em pleno repouso, as 24 horas de Lamego, o calvário, a dureza 11, o cemitério, o percorrer os esgotos da cidade, o atirar da ponte para o rio, quer ou não o candidato a ranger soubesse nadar, as emboscadas, as noites sem descanso, a luta corpo a corpo com um outro camarada, a pista ranger, a piscina ranger, que na altura tinha uma placa à tona da água face às baixas temperaturas então sentidas, as operações em helicóptero na Serra das Meadas, a nossa bíblia sagrada, a precisão do tiro, a permanente ação psicológica a que éramos submetidos, a imprevisibilidade do instante seguinte, o dizer quase diariamente "bom dia, Lamego" em t-shart ou em tronco nu às sete da manhã, mesmo que estivesse a nevar, a imprevisibilidade do momento seguinte, enfim, uma série de circunstâncias que fizeram de mim um homem não só preparado para a guerra, mas também para a vida futura.

Sim, uma vida que na madrugada de 27 de julho de 2006 me fustigou com um AVC, valendo-me o meu espírito ranger, onde interiorizei que o impossível não existe,  tal como dizia Morris West no seu livro "Sandálias do Pescador". Os obstáculos são para superar e não considerá-los inexequíveis. O transpor as dificuldades estão nas nossas mentes.

O meu destino foi a Guiné. Em território guineense deparei-me com as mais vil ocorrências. Conheci a guerra e a paz. Proteções a colunas, patrulhamentos, proteções avançadas, segurança noturna ao quartel, proteção à pista de aviação, saídas para o mato, emboscadas, visitas a tabancas onde fazíamos a chamada "psicó", assim como tantas outras situações que o conflito impunha, foram matéria tratada com firmeza e sobretudo com disciplina.

É óbvio que tive, tal como todos os camaradas, momentos de ócio. As "futeboladas", os copos, o lazer pleno no momento em que colocávamos em descanso a G3, os petiscos, a morte de um camarada, as evacuações, a dor que se impunha àqueles que naquele instante viam partir mais um amigo para a tal famigerada viagem sem regresso, outros estropiados, outros já cacimbados com as agruras que as trincheiras da morte aplicavam, ouvir os ataques noturnos a quartéis próximos, enfim, um rol de recordações que ainda hoje bate com o meu já frágil ego.

Não vou, obviamente, alargar-me em considerandos guerreiros, vou sim propor a todos os camaradas que comprem e leiam os conteúdos escritos nesta obra que literalmente são, aliás, transversais a todos que passaram pela Guiné em comissões militares.

Fomos, é verdade, a chamada "carne para canhão", mas felizes daqueles que por cá continuam ao cimo deste imenso cosmos terrestre.

Finalizo com o meu muito obrigado a todos aqueles que marcaram presença num evento que levou a Lisboa, Casa do Alentejo, Portas de Santo Antão, as memórias deste velho camarada. (**)

Abraços, camaradas.

José Saúde
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

18 de fevereiro de  2020 > Guiné 61/74 - P20662: Agenda cultural (743): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte V: Momento alto da tarde cultural: a moda "O meu chapéu", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa: letra e música de João Monge
11 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20640: Agenda cultural (740): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte III: Mais um momento memorável com o grupo "Os Alentejanos", de Serpa... Manga de ronco, Zé!

16 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20658: Agenda cultural (741): "Bá D'al na Rádio: memórias da Rádio Barlavento", livro do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, nº 790, mindelense, jornalista e radialista, a viver na Praia, Santiago, Cabo Verde

9 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20636: Agenda cultural (729): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte II: "Lá vai uma embarcação" (, moda alusiva ao embarque de tropas para a guerra colonial, interpretada pelo grupo musical "Os Alentejanos", de Serpa)

9 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20635: Agenda cultural (728): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte I: as primeiras fotos

Guiné 61/74 - P20662: Agenda cultural (743): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte V: Momento alto da tarde cultural: a moda "O meu chapéu", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa: letra e música de João Monge


Vídeo (3' 42''). Alojado em You Tube > Luís Graça


Lisboa > Casa do Alentejo > 8 de fevereiro de 2020 > Sessão de lançamento do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial: Guiné-Bissau, 1973-1974: memórias de Gabu" (Lisboa, Edições Colibri, 2019, 220 pp.).

Momento musical... de se lhe tirar o chapéu : atuação do Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa. Moda: O meu chapéu. Letra e música: João Monge.

Vídeo: Luís Graça (Com a devida vénia, ao grupo e ao autor...). (*)



Capa do álbum (2016) 


A MODA DO MEU CHAPÉU

Letra e múscia: João Monge


Aldeia Nova de S. Bento,
Plantada no meio do trigo.
Teu cantar é um lamento,
Gosto de cantar contigo.

Se passares à minha aldeia,
Não vás de cabeça ao léu,
Quando o sol mais almareia
Podes pôr o meu chapéu.

Podes pôr o meu chapéu,
A mais valiosa herança,
Já foi de quem está no céu
E não me sai da lembrança.


Quando nos faltar a voz,
Há-de haver uma mão-cheia
A cantar por todos nós,
Tenho cá na minha ideia

Tenho cá na minha ideia
Que o cante se ouve no céu,
Se passares à minha aldeia
Não vás de cabeça ao léu.

Quando eu ouço bem cantar,
Paro e tiro o meu chapéu.
Não se me dava morrer,
Se houvesse cante no céu.
______________

Nota do editor:

Último poste da série > 17 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20661: Agenda cultural (742): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte IV: Momento alto da tarde cultural: a moda "Fui ao jardim passear", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20661: Agenda cultural (742): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte IV: Momento alto da tarde cultural: a moda "Fui ao jardim passear", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa


Vídeo (3' 20'') Alojado em You Tube > Luís Graça


Lisboa > Casa do Alentejo >  8 de fevereiro de 2020>  Sessão de lançamento do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial: Guiné-Bissau, 1973-1974: memórias de Gabu" (Lisboa, Edições Colibri, 2019, 220 pp.)

Momento cultural: atuação do Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa. Moda: Fui ao jardim passear. Letra e música: tradicional. (Com a devida vénia...). (*)

Vídeo: Luís Graça



Capa do álbum (2016) 


FUI AO JARDIM PASSEAR

Lera e música: tradicional, Alentejo


Das flores que há no campo,
Qual é a mais estimada,
É a flor do rosmaninho
Que entra na casa sagrada.
Fui ao jardim passear,
Trouxe um ramo de alecrim
Para dar ao meu amor,
Que não se esqueça de mim.

Que não se esqueça de mim,
Para sempre se alembrar,
Trouxe um ramo de alecrim,
Fui ao campo passear.

Levantei-me um dia cedo
E fui passear ao campo,
Encontrei o teu retrato
Na folha dum lírio branco.

Fui ao jardim passear,
Trouxe um ramo de alecrim
Para dar ao meu amor,
Que não se esqueça de mim.

Que não se esqueça de mim,
Para sempre se alembrar,
Trouxe um ramo de alecrim
Fui ao campo passear.



Recorde-se que esta e outras modas (como O Meu Chapéu), que se tornaram "virais",  fazem parte do
CD Álbum  que o "Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento" (ensaiador: Pedro Mestre) lançou em 25 de novembro de 2016.

Sinopse: Passados dois anos desde que o Alentejo e Portugal se ergueram de orgulho por o Cante ser considerado pela UNESCO Património Mundial e Imaterial da Humanidade, é editado, em 2016, o álbum de um dos mais tradicionais e antigos ranchos de cante alentejano: Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, que conta com vários convidados especiais, nomeadamente Luísa Sobral, António Zambujo, Miguel Araújo, Jorge Benvinda e Pedro Mestre. (**)

O grupo tem página no Facebook. E tem três concertos agendados para o CCB, Lisboa, no Grande Auditório (c. 1500 lugares) para os próximos dias 20 de março de 2020, às 21h00, e 21 de março 2020, às 16h00 e às 21h00.
_______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 11 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20640: Agenda cultural (740): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte III: Mais um momento memorável com o grupo "Os Alentejanos", de Serpa... Manga de ronco, Zé!

Último poste da série > 16 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20658: Agenda cultural (741): "Bá D'al na Rádio: memórias da Rádio Barlavento", livro do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, nº 790, mindelense, jornalista e radialista, a viver na Praia, Santiago, Cabo Verde

(**) Vd. poste de 3 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16911: Agenda cultural (534): Um grande álbum do cante alentejano (agora, do mundo), "Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento" (2016), com a participação especial de António Zambujo, Luísa Sobral, Pedro Mestre e outros...

Guiné 61/74 - P20660: Notas de leitura (1265): Dicionário de Paixões, por João de Melo; Dom Quixote, 1994 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Fevereiro de 2017:

Queridos amigos,
João de Melo não precisa de apresentações, basta pensar nesse livro memorável que é "Autópsia de um Mar de Ruínas", em Fevereiro de 2017 apareceu a 9.ª edição reescrita pelo autor, é romance marcadamente autobiográfico da sua experiência como furriel enfermeiro algures no Norte de Angola.
Peguei neste "Dicionário de Paixões" à procura da alma açoriana, que ele tão bem exprime e dei com estas páginas a que nenhum velho combatente pode voltar a cara. Alguém que sabe confessar-se assim: "Trata-se de uma paixão inquieta, povoada, um pouco depressiva talvez. Mas trago-a desde a minha infância numa ilha dos Açores - desde o tempo em que me era preciso ser amado por todos; justamente porque tinha já uma imensa e universal paixão por toda a gente".

Um abraço do
Mário


A guerra de África em páginas soltas de João de Melo

Beja Santos

O escritor João de Melo é a figura cimeira tanto no estudo da literatura da guerra colonial como operário dessa escrita. Devemos-lhe “Os Anos da Guerra”, organizou em 1988 uma antologia de escrito representativos das três frentes da guerra e que ainda hoje é de consulta obrigatória. Em 1984, publicou “Autópsia de um Mar de Ruínas”, em 9.ª edição, reescrita em 2017, está na lista das obras-primas da literatura de guerra. Em “Dicionário de Paixões”, que apareceu em 1994 nas Publicações Dom Quixote, João de Melo deu à estampa crónicas que são textos que falam de sentimentos, visões, desejos, estranhezas, aproximações, experiências dos sentidos. Chamou-lhes crónicas sentimentais e ensaios de sonhos, fragmentos de uma autobiografia apócrifa.

Respigo das suas lembranças de África, combateu na região de S. Salvador, no Norte de Angola:  
“Continuo a vê-las, as crianças de África, chegaram à porta de armas, obedecerem à ordem do soldado louro que está de plantão e as manda pôr em formatura. Trazem velhas latas cheias de ferrugem, os rostos sujos, os pés descalços, as roupas inacreditavelmente rotas: ainda assim, há nelas uma muito extraordinária dignidade, uma alegria que só é possível no rosto e na inocência das crianças. Vêm pelos restos e comida, pelo rancho que sobra sempre do fastio da tropa. Entram em fila, quartel dentro, marchando ao som dos dedos que tamborilam o fundo das latas. Vejo-as e oiço-as. São as crianças de África, e vão-se lentamente acercando do refeitório da tropa. Param alguns metros, suspendem o clamor do batuque. Faz-se um silêncio trágico, feito de uma paciência triste, árida, longamente vexada. Penso: não é o justo o mundo tão grande e a grandeza humana tão pequena (…) Vejo-as, ontem e hoje, com os olhos da memória, nos livros que li e na prosa que em mim regressa. Continuam as sôfregas mãos, trémulas de febre, a mergulhar no lixo, no riso e nas vozes trocistas da tropa. Com os dedos em concha, pescam escamas, espinhas trucidadas de peixe, bagos encaroçados de arroz, ossos esburgados, batatas por descascar. Comem clandestinamente, devorando, rilhando o dente, ardendo em febre fria, escondendo-se do soldado que varre agora do lado de lá do refeitório. Disputam aos cães os restos de comida, com a avidez canina e a maldade de se empurrarem umas às outras, numa rixa surda. Enchem as latas com lixo e comida, deitam a correr parada fora, papá, mamã e os cambutas vão ter enfim o jantar assegurado”.

Estamos agora em plena guerra colonial, chegou uma mensagem ao aquartelamento, o operador de transmissões, qual alquimista, decifra códigos ultrassecretos, e a mensagem decifrada é entregue ao superior. “Lendo-a, o capitão estremeceu, pálido, quase estarrecido, como se nele viesse a notícia do seu próprio funeral. Ao entrar no gabinete, vinha aéreo, poroso, levitante. Chamando os alferes à sua presença, trancou a porta por dentro, abriu perante eles grandes gestos nervosos, antes de partilhar o insuportável conteúdo daquele segredo. Nela se garantia (e a PIDE nesse tempo, tal como Deus, nunca se enganava, que cerca de 300 elementos inimigos e respetivas famílias haviam atravessado a fronteira, a fim de se entregarem às tropas portuguesas. Impunha-se, por isso, que os quartéis do Norte ficassem em estado de máxima prevenção”. Começava assim a operação para intercetar e recolher os tais desertores. Marcara-se um lugar previsto e saíram pelotões a cumprir a sua missão.
E temos o desfecho:
“Um quarto para a meia-noite, e nós no mato, abrindo trilhos no capim, em progressão para o objetivo. 200 metros à frente, desarmados e em pânico, o alferes e os furriéis repetiam o santo e a senha. De duas uma: ou o guia dos desertores inimigos já lá estava à espera, de braços erguidos e pronto a entregar-se, ou então seriam eles a cair, abatidos como tordos, trespassados por uma rajada de metralhadora (…) Longas horas à espera desses corvos noturnos – espiando o capim, ouvindo a ilusão dos pequenos ruídos da noite, vendo o que por força sempre fora invisível. Até que o dia clareou e pelo rádio veio a ordem de suspender a operação. No regresso, com alma embrulhada nos logros frios do desencanto e da derrota, vivêramos não um pesadelo, mas a crueldade de mais uma mentira de guerra… Ao fim desse mesmo dia, uma segunda mensagem veio repor a outra, a segunda verdade da nossa tragédia: afinal, tratara-se de um simples exercício militar; nunca estivera prevista a entrega voluntária de quaisquer desertores. Mas, em contrapartida, os sublimes comandos portugueses mandavam dizer que as nossas tropas tinha estado perfeitamente à altura das circunstâncias”.

E fala também dos heróis da guerra, operacionais que nunca se separavam da sua faca de mato, nem das granadas presas ao cinturão. “Muitas virtudes assistiam aos heróis da minha guerra. Era o caso de dormirem apenas o essencial. Sem sono nem fadiga, passavam as noites à bebida, temperando-as com latinhas de anchovas, atum, sardinha de conserva, pasta de fígado. Ao terceiro dia de permanência no quartel, entre uma operação e a seguinte, urravam como bois pela parada, clamando contra o tédio, desesperados com os formigueiros do cio, fartos de tudo, implorando que os deixassem voltar depressa para a mata (leia-se guerra) e lhes dessem turra a matar (…) Os heróis da minha guerra espumavam de raiva contra as ideias dos traidores de Portugal, e largavam bojardas, partiam garrafas de cerveja contra o pavimento da messe dos sargentos. Mas eu sabia que eles, todos eles, absolutamente todos, um dia, quando as coisas mudassem e outra fosse a linguagem (e outros os donos e servos dela), seriam impolutos, sérios, democratas. E havia de ouvi-los garantir que nunca tinham dado um tiro ou maltratado um prisioneiro de guerra, que também eles eram vítimas do fascismo, que em Angola, em Moçambique e na Guiné se tinham empenhado não em fazer a guerra, mas em sabotar as operações, numa espécie possível de desobediência ao regime colonialista de então”.

Falando do seu autorretrato, volta a falar da guerra:
“Dizem que por ter feito a guerra colonial em Angola (1971-1974), perfilhou dela uma visão sensível, determinante, porventura radical, nos romances, novelas, contos e antologias que sobre ela publicou. Nada disso é certo nem falso”.

Não esqueçamos que o título da obra é Dicionário de Paixões, onde o autor explicita:
“A paixão existe. Não é um sentimento perdido. Ela tem a idade, a sombra, a explicação e o destino da literatura. A sua honra, também. Nunca o esquecimento foi necessário à literatura. O prazer e o sofrimento sim. Os seus excessos, também. E as suas perdições”.
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20649: Notas de leitura (1264): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (45) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20659: Parabéns a você (1758): António Carvalho, ex-Fur Mil Enfermeiro da CART 6250 (Guiné, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)


____________

Nota do editor

Último poste da série de 16 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20654: Parabéns a você (1757): António Eduardo Carvalho, ex-Cap Mil da CCAÇ 3 e CCAÇ 19 (Guiné, 1974) e José Maria Pinela, ex-1.º Cabo TRMS do BCAV 3846 (Guiné, 1971/73)

domingo, 16 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20658: Agenda cultural (741): "Bá D'al na Rádio: memórias da Rádio Barlavento", livro do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, nº 790, mindelense, jornalista e radialista, a viver na Praia, Santiago, Cabo Verde



Cartaz do evento. Cortesia de Carlos Filipe Gonçalves




1. Mensagem, de ontem,  do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/FTIG,  Santa Luzia, Bissau, 1973/74, radialista, jornalista, escritor, estudioso da morna e de outras formas da música de Cabo Verde, membro da Tabanca Grande, nº 790 
(*):

Luís:

Desculpa, esta falha, pois tenho estado muito activo… foi o lançamento do livro sobre a Rádio Barlavento, em 31 de janeior, agora estou a braços com o próximo livro para abril ou maio, "Capitulos da Morna", este devia sair em dezembro por altura da consagração, mas atrasou-se… E claro, o livro sobre a Guiné está parado… mas brevemente te darei noticias deste outro trabalho…

Aqui vão o dados, que me pediste, sobre o livro que lancei recentemente na cidade da Praia. Se precisares de mais algum dado pede, se tiveres perguntas estou ao dispor. Segue também o cartaz, uma sinopse do livro e uma pequena nota biográfica sobre mim, bem como algumas opiniões sobre a obra.

Um forte abraço

Carlos Gonçalves

Jornalista aposentado

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Título: Bá D’al na Rádio – Memórias da Rádio Barlavento

Autor: Carlos Filipe Gonçalves

Editora : Livraria Pedro Cardoso – Bairro da Fazenda, Cidade da Praia, Cabo Verde.


O titulo é em crioulo, significa literalmente: Vai dar isso na rádio. Ou seja, vai difundir isso na rádio.

Trata-se uma frase jocos que surgiu depois da invasão / ssalto da Rádio Barlavento, na Ilha de S. Vicente, em Dezembro de 1974, em pleno período «revolucionário» após o 25 de Abril. É que o assalto ou «tomada da rádio», foi justificada, por uma «soit disant» democratização/pluralismo de acesso, o que na verdade não se verifica, porque todos os elementos contrários à «Unidade entre a Guiné e Cabo-Verde» foram presos poucos dias depois...


Teve início então uma avalanche de «comunicados revolucionários» depois das reuniões do comités do PAIGC, que eram enviados à rádio! Surgiu então esta frase jocosa, a criticar esta situação… Começou deste modo o «regime de Partido Único»…


Resumo: Carlos Filipe Gonçalves, que começou a trabalhar na Rádio Barlavento aos 16 anos, conta as recordações dele, de colegas e amigos que lá trabalharam, descreve o contexto social da época e traça o percurso histórico que culmina no assalto e encerramento daquela rádio e do Grémio Recreativo Mindelo em 1974: um acerto de contas numa luta de classes latente desde inícios do século XX que terminou com a nacionalização dos órgãos de comunicação social e um monopólio/situação dominante do Estado que vigora até ao presente.


2. Sobre o autor:

Carlos Filipe Fernandes da Silva Gonçalves, jornalista, músico:

(i) nasceu em Mindelo, S. Vicente em 12 de Outubro de 1950;

(ii) começa aos 16 anos a trabalhar na Rádio Barlavento, como discotecário, na realidade esteve a seu cargo por cerca de quatro anos a programação musical daquela estação emissora;

(iii) em 1971 deixa S. Vicente para cumprir o serviço militar em Portugal; foi mobilizado em 1973 para a Guiné, colocado em Bissau;

(iv) depois do 25 de Abril de 1974 toma contacto com amigos cabo-verdianos do PAIGC recém-chegados a Bissau, disponibiliza-se para dar o seu «contributo» como se dizia na época;

(v) trabalha como chefe da programação na Radio Libertação (entretanto deslocada para Bissau) transformada pouco depois em Radiodifusão Nacional da Guiné Bissau;

(vi) depois da Independência regressa a Cabo Verde, onde trabalha como chefe da programação na Radio Voz di Povo na Praia, também transformada logo depois em Emissora Oficial de Cabo Verde.;

(vii) a partir de 1980 estudou em Paris, no Instituto Nacional do Audiovisual;

(viii)  chefe de programação (1984/86) e director da Radio Nacional de Cabo Verde (1986/91); concebeu e criou a Rádio Comercial, que começou a emitir em 1999 e da qual foi director até 2013.

3. Sobre a obra (**):

Memórias muito interessantes e inclusivas pois que se estendem a nós, outros que também, vivenciámos esse tempo... Bem documentada a história de uma instituição (R+adio Barlavento) muito importante na vida destas ilhas de partidas de emigrantes, de separação inter-ilhas, da condição de ilhéu, em suma o que foi a Rádio. 

Tem um excelente capítulo sobre o nascimento e as condições vividas pela Radio Barlavento. Sobre o Grémio, fundamentos da instituição e o ambiente social à época, está muito interessante e bem conseguido. E ainda, excelentes contribuições, para a história da música da grande cidade musical que foi Mindelo! O autor tem um estilo coloquial, de leitura aprazível e que prende o leitor.

Ondina Ferreira

Leitura simplesmente deliciosa. As ideias estão muito claras e bem enquadradas.

Luís Guimarães Santos

Globalmente Carlos Gonçalves,  é a tua história, tua vivência da Rádio, sobretudo Rádio Barlavento, pelo que, o que posso dizer é que está bem contada e fiquei a conhecer sobretudo o teu percurso.

João Matos

Muitas memórias e escrita fluída.

Manuel Brito Semedo

(…) Pertinente o trabalho de investigação que estás a fazer para o livro sobre a Rádio Barlavento! (…) É bom reviver os bons momentos que vêm desse tempo, em que sobressaía a autêntica amizade!

Jorge Guimarães Santos

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de dezembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20416: O que é feito de ti, camarada (8): Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, com o nº 790; jornalista aposentado, vive na Praia, ilha de Santiago, Cabo Verde... Está a escrever dois livros, um sobre a história da morna; outro sobre as suas memórias dos anos de 1973/75... E precisa de duas fotos: uma do QG em Santa Luzia, e outra da messe de sargentos no QG...

Guiné 61/74 - P20657: Blogues da nossa blogosfera (122): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (37): Palavras e poesia


Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.

NO CORAÇÃO DA MANHÃ

ADÃO CRUZ

© ADÃO CRUZ


Abro a janela de par em par
para entrar o rio
e o cio do amanhecer.
O sol desnuda as telas
e as cores que fizeram a noite
mergulham no frio
das águas fundas do rio.
Pelos tectos de penumbra
das vidas que vivem na sombra
às escondidas da madrugada
voam pedaços de nevoeiro
e gaivotas bailando.
Sobem no ar gemidos e dores
Vapores, desejos e cores
das gargantas secas da noite acabada.
Retomo os pincéis
e a tortura das tintas sem cor
e a dor de não conceber a textura
onde pintei o amor.
Nada mais quero além do sol e do rio
e a fecunda sensação de não ter frio.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 9 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20634: Blogues da nossa blogosfera (120): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (36): Palavras e poesia

Guiné 61/74 - P20656: Blogpoesia (660): "Rondo meu eu...", "Transparências mágicas..." e "A pente fino...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante a semana, que continuamos a publicar com prazer:


Rondo, meu eu…

Meu eu é redondo.
Me abraça e envolve por dentro e por fora.
Sente fugazes os passos do tempo.
Louva e lamenta o que sabe e ignora.
Foge da dor e corre para a esperança.
Abre ao sol as janelas que tem.
Sabe de si.
Arremessa para longe o ócio e a dor,
Cultiva na sombra o bom e o bem.
Guarda para si segredos e não conta a ninguém.
Respeita os deveres e
sabe de cor os direitos que tem.
Aprecia o louvor.
Aceita sofrer por amor com os males de alguém.
Acredita que o bem é maior que o mal.
Se não fosse assim o mundo já teria acabado…

Ouvindo H. Grimaud 2/3 Rachmaninov piano concerto No.2 in C minor, op.18 [Adagio sostenuto]
Berlim, 14 de Fevereiro de 2020
9h53m
Jlmg

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Transparências mágicas...

Devasso as sombras mentais e me lanço no encalço das résteas de luz.
Projecto na mente minhas tendências vitais.
Alcanço auroras que iluminam a vida e fazem viver.
Arquétipos astrais dum mundo perdido.
Sonhos de sonho que despertam saudades.
Anseios ocultos que reflectem outros matizes que renascem das sombras.
Só a mente capta e entende...

Ouvindo Tchaikovsky: El lago de los cisnes - Swan Lake - Rizzo - Orquesta Joven de la OSG en María Pita
Berlim, 9 de Fevereiro de 2020
8h51m
Jlmg

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A pente fino…

Estrelas cadentes, me passam à frente.
Ideias luzentes. Brilhantes na cor.
Se esfumam depressa.
Não dá para apanhar.
Boto uma rede de malha bem fina.
Aflitas, parecem sereias.
Redemoinhando aflitas.
Se mostram contritas.
As junto em feixes como se fossem sardinhas.
Alindo-lhe as formas.
Alinho-lhe as linhas.
Afito-lhe arestas.
Tapo-lhe as frestas.
Ateio-lhe a luz.
Chego-lhe o fogo.
As mando para os céus.
Como se fossem balões.
Não sei onde caem.
Oxalá, num dia de sol.
Num dia de festa…

Berlim, 12 de Fevereiro de 2020
18h19m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20633: Blogpoesia (659): "A voz da consciência", "Por entre matas e florestas" e "Como borboleta livre...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P20655: Da Suécia com saudade (63): reabrindo a Tabanca da Lapónia, agora ao povo... (José Belo)



A minha alegre casinha.. Tabanca da Lapónia: ela continua a lá estar, em Abisko, Kiruna... O endereço, na Net,  é que mudou.


"O valor das coisas näo está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem.
Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis" (Fernando Pessoa)


"Sem casas näo haveria ruas / as ruas por onde passamos pelos outros / mas e principalmente onde passamos por nós". (Ruy Belo: Todos os poemas, Lisboa, Assírio e Alvim, 2000)



Os fiéis amigos...


Visitas nem sempre  bem  vindas...


Para onde é que fica Empada ?... 

"Partir! / Nunca voltarei,/ Nunca voltarei porque nunca se volta. / 
O lugar a que se volta é sempre outro, / A gare a que se volta é outra. /
Já não está a mesma gente, nem a mesma luz, nem a mesma filosofia."

Álvaro de Campos / Fernando Pessoa 




"Lourinhac" ?.....Cá tem!... Mas o meu vodka caseiro (94%,  depois de 4 passagens pelo alambique) aí vendía-se certamente na... farmácia! Para mais é medicinal com casca de limäo e pau de canela, ou casca de limäo e rosmaninho. SKÅL !!! (Leia-se: Saúde!).


Fotos (e legendas): © José Belo  (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do José Belo: 

Data - 13/02/2020, 22:02
Assunto - Tabanca da Lapónia


Entretive-me umas horas a reconstruir a Tabanca da Lapónia numa versão evocativa de 40 anos de literais... congelamentos vários!

Algumas fotos e vídeos repescados das 4 versões anteriores a somarem-se a alguns novos.
Por faltas de paciência, várias das fotos contêm,de momento,pouco "paleio", oferecendo unicamente uma brisa fresca (!) desde bem dentro do Círculo Polar Árctico..

José Belo

A quereres dar uma saltada "nostálgica" até à última zona verdadeiramente selvagem da Europa...Sê bem vindo!

A morada é tabancalaponialusitano.blogspot.com
O título do blog é :

Lusitano...40 Anos na Lapónia

Um abraço, José Belo


2. Dois dias depois, oui seja ontem,  às 11h07, recebemos nova mensageem, com o seguinte teor:

Assunto - Convívio de... génios

Depois da "reinauguracäo" da Histórica (!) Tabanca da Lapónia,  acabei por lá colocar , a título de "apifamento", alguns pensamentos de um ramalhete de de génios do tipo Ruy Belo, Fernando Pessoa e...J. Belo!

Escrita agora em *português de lei*, vamos ver se alguns Lusitanos ciberturistas acabam por surgir neste blogue.

As antigas Tabancas da Lapónia, escritas em inglës e sueco, conseguiram estabelecer contactos com amigos da Escandinávia e dos States mas, muito poucos em Portugal. (*)

É mais uma tentativa de "vender" o ar fresco do Círculo Polar Árctico.
Bem-vindo!

Um abraço.

(E a propósito de "portuguës de lei",  acabei de aprender depois destas muitas décadas que a maneira correcta de escrever-se Lapónia na língua de Camöes é...LAPÔNIA!...LAPÔNIA??!?!

3. Para quem chegou ontem à Tabanca Grande... recorde-se que  o José Belo:

(i) é o régulo da Tabanca da Lapónia, nas suas várias "versões";

(ii) é membro da Tabanca Grande, para onde entrou "de jure e de facto"  em 8 de março de 2009;

(iii) tem cerca de 140 referências no nosso blogue, ou seja, é um "contribuinte líquido", dá mais do que o que recebe;

(iv)  formado em direito, foi jurista na América e na Suécia;

(v) a guerra, a paz e o amor levaram-no até à Suécia onde vive há mais de 4 décadas, e onde constituiu família;

(vi) continua a ter uma pontinha de orgulho nas suas velhas raízes portuguesas: de vez em quando escreve, no nosso blogue, uma crónica para a sua série "Da Suécia com saudade"; 

(vii) no século passado,  nioutra reincarnação, foi alf mil inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, e manteve-se no ativo, no exército português, durante uma década; 

(viii) está reformado como cap inf do exército português;

(ix) não sei se, como ao Camões, lhe pagam o mísero soldo, sendo um "autoexilado" (não cinfundir com... "desertor"): os amigos queixam-se de que a Pátria lhe foi Madrasta;

(x) reparte os dias do ano entre a Suécia (Estocolomo), o círculo polar ártico, na Lapónia (Abisko, Kiruna), e  Key West, na Flórida, EUA, onde a família (os filhos)  tem negócios e onde vivem os seus netos;

(xi) as vicissitudes da vida (, as suas "partidas"...) tornaram-no um "resistente" (ou diria: "resiliente"):

"Os meus 10 anos de vida militar, muito rica em 'acontecimentos' hoje incríveis, a somar-se a toda uma "tarimba" jurídica nos States, seguida de voluntariamente ter escolhido viver com o vizinho mais próximo a 297 km da minha porta, tornaram-me no que hoje sou....extremamente resistente. Quase como escreveu o poeta :"Deixei de ser aquele que esperava...isto é...deixei de ser aquele que nunca fui".

(xii) considera-se um exemplar de uma espécie em vias de extinção (**)

PS - Ah!, e não é primo do Ruy Belo... Belos há muitos, belos, bravos e bons é que... não!


4.  Comentário do editor Luís Graça:

José: acho que te faz bem… a ti e a nós, sentir esse frio polar ártico a entrar pelos poros da pele, pelas narinas, pelos meurónios, pela "alma" (para quem ainda tem "alma")... mas não pelas frinchas das portas e janelas, que a tua Tabanca é climatizada! 

 Acho que te faz bem reabrir a Tabanca da Lapónia"… e assumir a tua “idiossincrasia” de lusitano das 7 partidas, “perdido” na Lapónia há 40 anos…

É, ademais,  um gesto de grande hospitalidade, camaradagem e lhaneza, próprias de um puro lusitano como tu, abirr a tua casa ao "povo", depois de aí  receberes  a nobreza vikiNg e a burguesia ianque.

Como prometido, e com a devida vénia,  fiz uma visita ao teu blogue e uma seleção das tuas imagens. (Os vídeos, esses, deixo-os para exploração dos mais "voyeuristas")… 

Não sei a quem atribuir os créditos fotográficos. Mas, por defeito, pertencem ao régulo...A dificuldade é escolher, dada a magia de cada uma das fotos e sobretudo das legendas poéticas!... Sei que és um leitor de longa data de poetas portugueses como o Ruy Belo, o J. Belo  (, que por acaso não são  primos) e do Fernando Pessoa (ou dos Fernandos Pessoas)... 

É uma boa terapia, a escrita, a blogoterapia, , a poesia.. E eu perguntei-te (e tu não me respondestes, estás nesse direito...)  se tu não tinhas (ou nunca tiveste) um… diário.

Enfim, imagina que me lembrei  de te lançar um desafio: fazeres um check-list das 24 horas do dia na vida de um lusitano na Lapónia… Os "lapões" da Tabanca Grande, uma vez reaberta, ao "povo" a tua Tabanca da Lapónia, vão querer saber mais coisas sobre a vida do régulo no seu dia-a-dia:

(i) a  que horas é que  te levantas ? 
(ii) a que horas é que te deitas ?  Aqui é os séniores deitam-se  com as galinhas, aí será com as renas;
(iii) como é que tu te deslocas quando vais às compras ? 
(iv) também vais à caça e à pesca ? ou és agora conservacionista ?
(v) e como é que te desenrascas quando as renas e os cães precisam de veterinário ?
(vi) enfim, o que é que se come e bebe aí na tasca da Tabanca da Lapónia  ? 
(vii) será que o régulo é mais peixeiro do que carneiro ?
(viii) o campismo é "tax free" ?

e coisas idiotas do género. O problema é que a Tabanca da Lapónia, apesar de toda esta recente publicidade, ainda não vem nos roteiros turísticos da Lusitânia. Vou pedir ao PInto Loes (agência do Porto) para te pô no mapa... Ou é melhor não ?!

Sabemos que, se o régulo quiser tomar um chá na casa da/o vizinha/o  mais próxima/o,  tem que fazer uns 300 quilómetros (, o equivalente à distância de Lisboa ao Porto)... Em trenó puxado a renas, deve demorar umas horas valentes...Aindapor cima à luz dos archotes... 

Deve acrescentar-se que o termo "lapão" (feminino: "lapoa") pode ser considerado ofensivo e até racista...À cautela, vamos de futuro procurar evitá-lo... De resto, ele há coisas que,  quem um dia for lá, à Tabanca da Lapónia, deve saber, para não fazer... "merda": Lapónia para os lapões é... Sápmi.
Lapöes é... Samer. Um Lapão é... Same.  Uma Lapoa (mulher da Lapónia) é... Samisk kvinna. (**)

Meu caro régulo: a Lapónia (, sim, os brasileiros dizem Lapônia), por causa do sol da meia noite, das auroras boreais e do Pai Natal, tende a ser vista de maneira muito redutora e estereotipada... Por isso, se calhar é muito “voyeurismo", da parte dos nossos leitores, perguntarem-te estas coisas todas... Por razões até de segurança, não deves responder a nenhum delas...Quem quiser saber mais, que vá aí e te bata à porta: será por certo bem recebido, se for por bem, e com uma credencial da Tabanca Grande...  Ah!, e não se esqueçam: levem também uma garrafinha da Aguardente Vínica DOC Lourinhã... (Na minha terra, quem a bebia, escapou à gripe espanhola, à "pneumónica", a pandemia de 1918/19, que matou mais de 60 mil portugueses...).

Zé, não leves a mal... Há camaradas da Tabanca Grande que, nem por um canudo, conseguem ver Braga, quanto mais a Lapónia… Mas Braga tinha obrigação de ter uma tabanca, e não tem. Tem uma arcebispo, tem uma sé, tem um clube de futebol... mas não tem uma tabanca!...As tabancas mais próximas são a dos Melros (Gomdomar, Fânzres), da Maia, a de Matosinhos...

A Lapónia, colónia sueca, que não tinha obrigação nenhuma, até tem uma tabanca!...E já "histórica", sim, senhor!... 

Há 40 anos, é obra!...Grande lusitano!... Enfim, se estivesses mais perto, a gente  até ia ter contigo um dia destes… Em abril vou aos países bálticos num daqueles  esquemas de “turista estúpido”… mas não vai dar para beber um vodca contigo!... Como eu bem gostaria!... (****)

(***) Vd. postes de:

20 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15270: Da Suécia com saudade (55): Despedida do blogue, dos editores e de todos os de mais camaradas... Afinal, também há 4 décadas saí do nosso querido Portugal sem bilhete de ida e volta... Os amigos terão sempre uma "casa portuguesa" ao dispor, na Lapónia sueca, em Estocolmo, ou em Key West, Flórida, EUA (José Belo)

(****) Último poste da série > 8 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20427: Da Suécia com saudade (62)... E agora também dos States, Florida, Key West... A catarse do Império... O lugar do Portugal de hoje, tanto na Europa como no mundo, é que deveria ser assunto de discussões acaloradas (José Belo)

Guiné 61/74 - P20654: Parabéns a você (1757): António Eduardo Carvalho, ex-Cap Mil da CCAÇ 3 e CCAÇ 19 (Guiné, 1974) e José Maria Pinela, ex-1.º Cabo TRMS do BCAV 3846 (Guiné, 1971/73)


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Nota do editor

Último poste da série de 13 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20645: Parabéns a você (1756): Miguel Rocha, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2367 (Guiné, 1968/70)