terça-feira, 9 de março de 2021

Guiné 61/74 - P21985: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi ( João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte I: afinal, não consegui esquecer...


Companhia de Caçadores 1439 

(Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67)

 

Ficha de Unidade

Unidade de Mobilização: BII 19 – Funchal                                            

Cmdt: Cap Mil Inf Amândio Manuel Pires

Partida:   Embarque em 10 Agosto 1965 | Desembarque em 06 Agosto 65

Regresso:   Embarque  em 18 Abril 1967


Síntese da Actividade Operacional


(i) Após o desembarque, em 6 de agosto de 1965, seguiu imediatamente para Xime, a fim de efectuar o treino operacional com forças da CCav 678 e assumiu a responsabilidade do subsector de Xime em substituição da CCaç 508, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCaç 697, com a missão de intervenção e reserva do sector.

(ii) Em 10 de setembro 65, por troca com a CCav 678, foi deslocada para Bambadinca, onde continuou com a missão de intervenção e reserva do sector e assumiu cumulativamente a responsabilidade do respectivo subsector de Bambadinca;

(iii) Nestas funções tomou parte em diversas operações de que se salientam, pelos resultados obtidos, a operação “Bravura”, de 14 a 24 de agosto de 1965, na região de Galo Corubal e a operação ”Avante” de 29 a 30Ago65, na região do rio Burontoni.

(iv) Em 9 de outubro de 1965, por troca com a CCaç 556 assumiu a responsabilidade do subsector de Enxalé, com destacamentos em Missirá e Porto Gole, mantendo-se na dependência do BCaç 697 e depois do BCaç 1888. 

(v) No princípio efectuou várias operações nas regiões de Madina Belele, Bissá e Porto Gole em que capturou bastante armamento e material.

(vi) Em 8 de abril 1967, foi rendida no subsector de Enxalé, por troca pela CArt 1661 e recolheu seguidamente a Fá Mandinga, onde se manteve temporariamente, como subunidade de reserve do sector.

(vi) Em 17 de abril de 1967 seguiu para Bissau a fim de efectuar o embarque de regresso.

Observações : Tem História da Unidade (Caixa no 74-2ª  Div/4ª.Sec, do AHM - Arquivo Histórico Militar).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da Actividade Operacional: Tomo II - Guiné - Livro I (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2014), pp. 349


1. Texto, de 45 páginas, ilustrado,  enviado em formato pdf,  em 4 de fevereiro de 2021, pelo nosso amigo e camarada João Crisóstomo, que foi alf mil at inf, CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), e que vive em Nova Iorque desde 1975, tem dupla nacionalidade e tem sido um ativista causas como a autodeterminação de Timor Leste, as gravuras de Foz Coa ou a reabilitação da memória de Aristides de Sousa Mendes, o cônsul de Bordéus em 1940 (*):


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque)
 
Parte I

O que me proponho neste trabalho não pode na verdade  ser considerado uma “história" da  CCAÇ 1439.

 Passados  cinquenta e cinco anos do nosso regresso da Guiné,  isso é tarefa quase impossível. Durante muito tempo tentei propositadamente "esquecer” e não quis saber mais desse tempo que estive na Guiné. O ter decidido "tirar uns anos fora de Portugal para aperfeiçoar línguas" (, eu queria dedicar-me ao turismo em Portugal,) de certa maneira ajudou mesmo a esquecer esses meus tempos de serviço militar.

Houve alguns esporádicos momentos em que o assunto vinha à tona. Lembro-me, por exemplo, pouco depois de chegar a Londres, ter encontrado no "Hyde Park Corner" um indivíduo em cima dum escadote a falar sobre Portugal e o colonialismo português na Guiné… Mas eu quase nem liguei: estava farto.

Quando aconteceu o 25 de Abril (, estava eu no Brasil na altura,) fiquei curioso e esperançado, mas logo essa esperança começou a desaparecer: o pouco que ouvia fora de Portugal sobre o assunto era geralmente negativo e que em Angola, Moçambique e em quase toda a parte, Portugal só tinha deixado uma grande confusão e guerras civis. E eu de jeito nenhum queria ouvir falar desse aspecto da nossa “herança.”

A tal ponto era a minha vontade de não querer saber de nada que, mesmo quando houve o massacre em Timor, eu andava tão alheado de tudo que nem apercebi de que tinha havido uma invasão da ilha pelos indonésios e que o que se passava em Timor não era resultado de guerra civil. E quando em 1996 um estudante luso-americano que, no ano anterior, eu tinha convencido a envolver-se na defesa das gravuras de Foz Coa, veio ter comigo pedindo-me para eu me envolver no caso de Timor Leste, a minha primeira e rápida resposta foi de que eu não queria saber de nada que estivesse relacionado com as lutas nas nossas ex-colónias.

Ele ficou espantado com a minha ignorância e foi perseverante; e, passados dois dias, quando me apercebi da verdadeira situação em Timor — e de que os Estados Unidos, Inglaterra, França e quase todo o mundo, mesmo Portugal, estavam todos mais ou menos a fazer o jogo da Indonésia —, eu também não tive dúvidas em me embrenhar a fundo nessa polémica.

Em bom momento o fiz. Foi esse envolvimento que me levou a começar a prestar atenção ao que se estava a passar em outros lugares, incluindo a Guiné.

Um dia uma de minhas irmãs ao telefone contou-me que tinha encontrado numa excursão de autocarro um indivíduo que ao saber o nome dela disse que me conhecia pois ele "tinha estado comigo na Guiné". "Chamava-se Abrantes", disse. Ela disse-me e eu lembrando-me bem de quem se tratava, comecei então a lembrar os outros que que lá estiveram comigo e de quem nunca mais tinha ouvido falar. E a lembrar com um misto de revolta, mas paradoxalmente também de nostalgia e saudades esses tempos.

Passados uns tempos ao chegar a casa encontrei um papel onde a minha esposa antes de sair tinha escrito : "Um indivíduo que diz ser teu amigo, Abrantes, telefonou: que te dissesse que o capitão Pires morreu”. Mas não dizia mais nada. Respirei fundo, mas foi um respirar de tristeza, sentindo-me culpado de nunca ter sequer tentado saber dele nem de mais ninguém. Agora, pensei eu, já é tarde demais para o reencontrar.

Não sabia de ninguém mais nem de que havia encontros de antigos camaradas; vim a saber mais tarde que os havia, que tentaram mas nunca me conseguiram contactar, talvez em resultado das minhas muitas mudanças de Pilatos para Herodes. Mas eu pouco a pouco comecei a interessar-me mais, procurando algum livro, jornal ou revista que falasse da Guiné; mas sem sucesso.

Cheguei a encontrar alguns cabo-verdianos, em New Jersey, mas não guineenses. Mas se tenho um defeito grande (, alguns dizem que é virtude,) é o de ser teimoso. Ano após ano eu vasculhava livrarias, bibliotecas e nada… Eu queria saber do que se passou depois que de lá saí. E um dia de férias em Lisboa, na véspera de voltar aos Estados Unidos, na feira do livro na estação da Portela, deparei com o primeiro livro do Beja Santos "Diário da Guiné: 1968-1968, Na Terra dos Soncó.” Foi como se me tivessem dado um murro do qual acordei estremunhado. E cedo eu estava à procura do Zagalo, e logo tomei conhecimento deste blogue e comecei uma nova vida contactando os meus colegas que tinham estado comigo na Guiné.

Lembro que, quando estava na Guiné, o comandante da minha companhia CCaç 1439, Capitão Amândio Manuel Pires, queria a toda a força que alguém escrevesse um “diário” da CCaç 1439. Parece que ninguém estava pelos ajustes, e cada um tentou livrar-se, empurrando o fardo para outro. No meu caso, quando ele me abordou eu disse-lhe da minha quase aversão a tudo o que era coisa de escritas. E sugeri que ele falasse com o Alferes Freitas, que era mais dotado e parecia não ter aversões a escrever. Mas parece que ninguém mesmo se deu a esse cuidado.

Há meses atrás lembrei-me de tentar fazer/escrever uma história desta Companhia, pequena e resumida que fosse. Cedo me apercebi da minha ilusão. Felizmente há algumas fontes escritas já, como são os casos do Beja Santos, Henrique Matos e outros, mas não o suficiente para um trabalho compreensivo e abrangente a que se possa chamar história. Vários contactos que tenho feito vieram-me confirmar isso, pois o tempo leva a que na maioria dos casos venham razões e desculpas como: “a minha memória já não me ajuda’; “já não me lembro bem’ e “não me recordo dos pormenores”.

Recebi, porém uma boa ajuda com um caderno (20 páginas) intitulado "Resumo descritivo dos factos e feitos mais importantes da Companhia de Caçadores 1439” que o alferes Freitas  [, natural do Funchal e a viver lá.] me mandou. A princípio pensei que tinha sido ele que o tinha escrito. Mas há pouco esclareceu-me que o autor não é ele,  mas sim é da autoria do Capitão Pires (que, a avaliar pelo texto, o deve ter ditado a alguém) e de que conseguiu dele uma cópia para si.

É sem dúvida um documento de valor, até porque pelo que sei (ou não sei!) é o único "documento oficial” abrangente sobre o assunto. Mas se eu não tivesse conhecido bem e estar certo da muita honestidade e idoneidade do Cap Pires (, o único defeito dele era não saber e não admitir perder no jogo de dados e de cartas; mas mesmo aí, salvo o perder o controle do seu temperamento, levantando-se repentinamente da mesa para nunca ter de admitir ter perdido, nunca o vi agir desonestamente), eu diria que era impossível este documento ter sido escrito por ele.

Acredito que documento deve ter sido escrito bem depois de ter voltado e daí alguns bem evidentes lapsos e lacunas. Mas como o próprio título diz e bem: ele é um “resumo”; e por vezes é tão resumido que não chega a mostrar a importância que alguns dos acontecimentos mencionados tiveram.

São vários os casos em que o relato de operações se resume a isto:

(...) "Um grupo de combate da CCaç 1439 participou na Op [...]" (um ou mais pelotões? a palavra “participou” parece indicar que haviam outros grupos: era um oficial da CCaç 1439 que comandava ou era um oficial de outro grupo que comandava essa operação? qual/quem era esse grupo e que efectivo?, operação essas que consistiu numa "acção ofensiva na mata":

(...) "As NT detectaram um acampamento IN o qual se encontrava abandonado. Foram destruídas as casas de mato e culturas. No regresso as NT foram emboscadas duas vezes " (; eram uns simples tiros ou flagelações só para chatear, ou eram “emboscadas” mesmo?).... "não tendo sofrido qualquer baixa."


Por outro lado - e ainda bem que o aviso de limitação é feito - , este documento diz respeito (apenas) aos factos e feitos "mais importantes”.

Na verdade houve casos de acontecimentos que nem estão nele mencionados, mas que pelas circunstâncias em que sucederam vieram a ser mais importantes do que muitos que aqui estão mencionados. E pelo que posso eu mesmo testemunhar e que confirmei em conversas com outros meus colegas que os mesmos acontecimentos viveram, alguns dos relatos feitos são claramente descritos duma maneira muito subjectiva, umas vezes beneficiando, outras diminuindo ou de alguma maneira alterando o seu verdadeiro valor.

De novo quero deixar bem claro que “ponho as mãos no fogo” pela idoneidade do Cap Pires; se foi ele mesmo que escreveu este documento sei bem que estes lapsos na descrição de alguns acontecimentos não foram de maneira nenhuma propositados, nem as descrições foram manipuladas consciente e propositadamente. Ou se foram manipulados, não foi pelo Capitão Pires, mas por outros que o manusearam a seguir, como parece ter sido o caso mais do que uma vez. 

Dito isto o que segue pode e deve ser considerado apenas um “contributo” para a história da CCaç 1439 e não como uma "história da Companhia CCAÇ 1439". Embora eu siga cronologicamente e me baseie neste relatório, copiando grandes partes, sem falhar qualquer dia que nele vem mencionado, este é um contributo e relatório muito pessoal em que, sempre e à medida que a minha memória me ajuda eu relato com toda a honestidade os factos como os vivi, sem querer aumentar ou diminuir nada nem ninguém. E não deixarei de mencionar os casos em que eu e o que fiz deixou muito a desejar. E faço-o porque uma enumeração e relato cronológico simples não chega. Cada ataque, cada mina, cada emboscada ou acidente têm a sua história própria que os distingue de todos dos outros. E é isso que vou tentar fazer; e, se me não é possível apresentar a descrição da realidade absoluta, vou relatar pelo menos o que sobre ela eu sei e o que vivi.


A maior parte das fotos foram tiradas por mim, mas há fotos cuja origem pode suceder não ser minha. Lembro, por exemplo, que depois do ataque a Missirá eu e o furriel Viegas,  do Pelotão de Caçadores Nativos 54, e que tem muitas fotos no blogue, estávamos por vezes juntos a fazer as mesmas fotos ao mesmo tempo. E quando estivemos juntos há anos atrás depois do nosso reencontro de quarenta e picos anos, manuseamos, trocamos e partilhamos memos e fotos.

E isso sucedeu com outros,  e mais do que uma vez. É possível que em resultado disso hajam confusões da sua origem ou autoria. Mas qualquer discrepância ou engano não será nunca resultado de má intenção da minha parte. Sempre tenho oferecido e consentido que todas as fotos da minha autoria sejam reproduzidas em qualquer altura, sem necessidade de me mencionarem sequer como o seu autor.

Reitero que este meu trabalho é um testemunho de âmbito muito limitado pois que, embora intencionado como um contributo para a historia da CCaç 1439, é em grande parte um relato muito pessoal e por isso mesmo também subjectivo e parcial, feito/escrito passados já mais de 50 anos. 

 Para uma melhor compreensão não posso deixar de deixar de ir ao princípio onde no meu caso tudo começou, pois não sendo isto uma autobiografia, sem dúvida que toda a minha experiência militar foi marcada e influenciada por estes antecedentes que foram o ingresso e logo a preparação para o serviço militar.

(Continua)
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Nota do editor:

(*) A CCaç 1439 tem mais de 7 de dezenas de referências no nosso blogue. O João Crisóstomo, por sua vez, entrou para a Tabanca Grande, em 26 de julho de 2010, e tem mais de 130 referências. É o nº 432:

Vd. poste de 26 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6786: Tabanca Grande (233): João Crisóstomo, ex-Alf Mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole, Missirá, 1965/66), e grande português da diáspora

segunda-feira, 8 de março de 2021

Guiné 61/74 - P21984: Facebook...ando (61): Afectos com Letras: Esta ONGD portuguesa, a trabalhar na Guiné-Bissau, em prol das mulheres e crianças, merece o nosso apoio e apreço... E um justo destaque neste Dia Internacional da Mulher, celebrado ainda em plena pandemia de Covid-19.


 Guiné-Bissau > Região de Quínara > Tite > Bissássema >  6 de março de 2021 > O que serão, em 2030, quando ainda se celebrar o Dia Internacional da Mulher, estas crianças (míúdas e miúdos) que, felizmente, vão à escola ?!... Esperemos que até lá
 condição feminina melhore na Guiné, em toda a África, no resto do mundo e inclusive em Portugal e no resto da União Europeia... (LG)

Foto: cortesia da ONGD AFectos com Letras, Pombal. 


1. Da página do Facebook da Afectos Com Letras ONGD > 6 de março às 10:26 ·

Em Bissassema, Guiné-Bissau, a vida continua no seu ritmo da subsistência e do empoderamento das mulheres, mas agora com uma escola equipada pela Afectos com Letras com material didático e uma biblioteca adjacente que irá servir uma comunidade de mais de meia centena de crianças e jovens.

[Neste projeto contámos com o apoio do Grupo Sousa e da AIPES - Associação de Investigação e Promoção da Economia Social ]


2. Comentário do nosso editor LG:

Esta ONGD portuguesa, a trabalhar na Guiné-Bissau, em prol das mulheres e crianças, merece o nosso apoio e apreço... Merece as nossas palmas. E m justo destaque neste Dia Internacional da Mulher, celebrado ainda em plena pandemia de Covid-19.

E a maneira mais prática e feliz de manifestar o nosso apoio e o nosso apreço, como amtigos combatenets, é  doar 0,5% do nosso IRS de 2020  à Associação Afectos com Letras.

Pode ser pouco, uma migalha, mas muitas migalhas vãoo levar  mais esperança e educação às meninas, mais dignidade às mulheres e mais qualidade de vida às famílias, mais presente com futuro.

A ONGD, que tem sede em Pombal, já conseguiu  instalar duas máquinas descascadoras de arroz com o apoio recebido das consignações em  anos anteriores, mas novas máquinas poderão chegar às aldeias guineenses e mudar vidas das meninas e mulheres com uma simples cruz na vossa folha de IRS. Deixando de ficar "escravizadas" nas tarefas domésticas, como o descasque manual do arroz, as meninas podem frequentar a escola.  O Dia Internacional da Mulher tem de ser, da nossa parte, mais do que uma celebração simbólica.

O que esta ONGD nos pede um gesto muito simples mas concreto, camarada e/ou  amigo:

(i) Até 31 de março, basta  acederes ao Portal das Finanças e indicares a entidade à qual  pretendes consignar o IRS ou IVA, inserindo neste caso o NIF 509 301 878, que é o número fiscal da Afectos com Letras.
 
(ii) A partir de 1 de Abril, ao preencheres o quadro 11 do modelo 3, inseres o NIF da Afectos com Letras e assinalas com uma cruz no IVA ou IRS.

Guiné 61/74 - P21983: Notas de leitura (1345): "Memorial, O livro dos 172 autores", da CCAÇ 1550 (Binta e Xime, 1966/68), DG Edições, 2018 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Junho de 2018:

Queridos amigos,
 
É bem verdade que todos estes testemunhos coletivos vão ter que ser tomados em conta pelos futuros historiadores. Esta região do Xime que aqui se viveu em 1967 e inícios de 1968 se transformou radicalmente de um ano para o outro. Quando a CCaç 1550 partiu, extinguiu-se o destacamento da Ponta do Inglês, desapareceu Samba Silate, ao que se dizia a maior tabanca de todo o leste da Guiné, o PAIGC atacava com ferocidade as tabancas entre Amdalai, Demba Taco, Taibatá e Moricanhe, com o evoluir da guerra abandonou-se Moricanhe, para mim uma aberração tal medida, era um posto avançado de inegável importância para proteger tanto o Xitole como Bambadinca. E Galomaro, que os autores tratam por colónia de férias, passou a ser sede de Companhia, daqui partiu uma em fevereiro de 1969 para uma operação de retirada de Madina do Boé, teve pesadas vítimas.
 
Honra a quem escreveu este legado de memória, tão singelo e tão terno.

Um abraço do
Mário



CCAÇ 1550, todos presentes e lembrados, 50 anos depois

Beja Santos

A obra intitula-se "Memorial, O livro dos 172 autores", DG Edições, 2018. Quem coordenou foi José Marques Valente, mal soube do acontecimento telefonei-lhe e pedi-lhe o documento, é um memorial enternecedor, pelo registo onde primam testemunhos quase incógnitos, onde cada um depositou as suas imagens e as suas memórias. 

Partiram para a Guiné em 20 de abril de 1966, a 26 seguem em coluna-auto de Bissau até Farim, vão sem armas, passam pelo K3, atravessaram na jangada o Cacheu, em Farim organizaram-se para ir para Binta e Guidage. Há uma apresentação sumária do setor, recorda-se que o Corredor de Sambuiá estava encravado entre Binta e Bigene. 

Vão então para Binta e segue para Guidage um grupo de combate reforçado. Foram render a CCaç 675, a do Capitão do Quadrado, Alípio Tomé Pinto, é história para nós conhecida, JERO escreveu a vida do primeiro ano da Companhia, é um documento histórico. É uma primeira fase de comissão que não deixou péssimas memórias: 

“Nos oito meses que permanecemos em Binta não se verificaram ataques violentos ao aquartelamento. Apenas por três vezes foram disparadas granadas de morteiro e tiros de metralhadora para dentro do aquartelamento e tabanca”

A relação com as populações terá sido magnífica, havia escola a funcionar e tratamentos para guineenses e senegalenses. Fizeram patrulhas de reconhecimento e foram a Sambuiá. Nas proximidades desta área sujeita a controlo do PAIGC destruiu-se uma ponte pedonal, via de acesso às culturas de arroz. Foram sempre felizes a picar as estradas, nunca houve sinistros no contingente militar.

E um dia a Companhia muda de poiso, vai para o Xime, Ponta do Inglês, Taibatá/Demba Taco e Samba Silate. No Xime a CCaç 1550 era reforçada com o Pel Caç Nat 53 e milícias da tabanca, na Ponta do Inglês havia um grupo de combate reforçado, Taibatá/Demba Taco, milícias e população em autodefesa e em Samba Silate população em autodefesa, mais adiante um destacamento em Galomaro, uma secção e muitas espingardas Mauser. Esta Guiné e esta região, nos inícios de 1967, serão bem distintas daquela que irei conhecer a partir de agosto de 1968.

A CCaç 1550 viera render a CCav 678, nessa altura havia flagelações praticamente todos os dias na Ponta do Inglês e picava-se o itinerário entre Xime e Bambadinca com muitos cuidados, não só as minas mas as emboscadas num local conhecido por Ponta Coli, sobretudo. Deixara de se fazer a ligação por terra entre o Xime e a Ponta do Inglês, aquele itinerário foi um sorvedouro de vidas e de viaturas. Explica-se a constituição da população do Xime, a organização do aquartelamento, a construção de uma paliçada. A vivência na Ponta do Inglês é mais do que inóspita:

“Formado por uns abrigos, onde se comia e dormia, rodeados por arame farpado e postos de vigia, estavam ali cerca de 40 homens, armados com G3, Morteiro 60 e bazuca. Os abastecimentos e correio eram entregues pela Marinha, que passava regularmente no Xime. A água era recolhida, diariamente, num poço a uns 500 metros do arame farpado, com a ajuda da única viatura disponível. Diariamente, sob o mesmo ritual, picava-se o percurso do arame farpado ao poço e avançava-se com o Unimog e os bidões. Uma parte do pessoal ficava de arma aperrada, enquanto os outros com balde e corda puxavam a água, até encher os reservatórios. O poço onde se ia buscar água era comum às nossas tropas e às populações do outro lado da bolanha (controlada pelo IN), pelo que o teste antiveneno para verificar se a água estava envenenada era praticamente desnecessário”.

Fala-se da vida em Taibatá e de Samba Silate, na margem esquerda do Geba, local de cambança de grupos IN, e há referência de que do outro lado do rio estava a zona de Mato de Cão onde acima havia bastantes casas de mato do IN. E recorda-se as matas onde o IN se instalava: Galo Corubal, Bissari, Fiofioli, Ponta Luís Dias, Buruntoni e Poindom. Galomaro, ao tempo, era uma paz de alma, em pleno Cossé, zona de Futa-Fulas, encruzilhada comercial entre o Senegal e a Guiné Conacri.

O aquartelamento do Xime é passado a pente fino e as imagens que o livro publica foram-me imediatamente familiares, incluindo a capelinha, a messe de oficiais, as caravanas ali instaladas, até os arruamentos dentro da tabanca. Detalha-se o que cada um fazia, desde a carpintaria, aos eletricistas, à mecânica auto.

E segue-se o lado emocionante do memorial, as fotos destes 172 autores, os seus nomes, posto e alcunha. E lembra-se que 45 já tinham partido deste mundo. Temos os testemunhos das doenças, dos medos, faz-se o elogio dos bravos, como se constituíam pés-de-meia, como se comia mal e se procurava comer bem, são testemunhos genuínos como o de um 1.º Cabo que em maio de 1977 foi a Demba Taco que tinha sido atacada, saqueada e incendiada durante a noite:

“Ficou um rasto de destruição, com civis mortos e outros raptados. Quando lá chegámos, do pouco que ficou, tudo fumegava.

Depois de feito o levantamento da situação, foi escalada a 1.ª Secção composta por sete militares, para ali ficarem a manter a segurança e ordem na reconstrução da tabanca. Não tínhamos qualquer tipo de abrigo. Ali ficámos com alguns alimentos, numa temperatura superior a 40º até que chegou a hora de preparar a primeira refeição. Foi necessário escolher, entre os sete camaradas, quem tivesse aptidão para cozinhar.

Destacado o soldado A. F. que logo improvisou com duas pedras e uma fogueira os meios para preparar a nossa refeição de batatas cozidas e atum de conserva. Mas quando nos preparávamos para distribuir as batatas e o atum, deparámo-nos com imensas crianças, olhando famintas. Jamais poderei esquecer este cenário. De entre as crianças destaquei uma, de nome Umaru Baldé, de 12 anos, que nessa noite tinha perdido o pai e a mãe.

Criei um sentimento de amizade e ternura que quando acabei a missão, em Demba Taco, me custou a separação desta criança. Com o tempo e as circunstâncias, perdi-lhe o contacto, mas nunca esquecerei este miúdo que me marcou profundamente nos quase três meses que estive em Demba Taco, em que dia a dia as minhas refeições eram repartidas com ele”
.

Obra tocante na composição e pelo recurso ao anonimato, vejam as imagens do livro, leiam a folha solta sobre o Victor, feita pelo organizador do livro, o José Marques Valente, a quem já comuniquei que este belíssimo testemunho seria publicado num blogue onde teremos o orgulho em o acolher, bem como aos seus camaradas da CCaç 1550.

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Nota do editor

Último poste da série de 1 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P21959: Notas de leitura (1344): “Um Mergulho no Muxito”, por Jorge Paulino; Chiado Editora, 2017 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P21982: Agenda cultural (767): Novo livro de José Matos (coautor: Mário Matos e Lemos): "Ataque a Conacry: História de um Golpe Falhado" (Lisboa, Fronteira do Caos, 2021, 170 pp., il.)


Capa do novo livro do José Matos, em coautoria com Mário Matos e Lemos. 


1. Mensagem de José Matos, membro da nossa Tabanca Grande, com cerca de 40 referências no nosso blogue:

Data - 7 de março de 2021, 4h18
Assunto - Op Mar Verde

Caro amigo

Espero que te encontres de boa saúde e em grande forma. Estou a escrever-te para anunciar a saída domeu novo livro sobre a Operação Mar Verde na Guiné em 1970. É mais um livro de História, sempre bem documentado e com algumas novidades. Espero que gostes e aqui ficam os links para uma possível compra:


Envio-te também um artigo que escrevi em francês e algum material de divulgação para que possas meter no blogue. [José Matos: "Il y a 50 ans: Opération Mar Verte: l'invasition secrète de Conacry". Marines & Forces Navales, 190,  novembre, 2020, pp. 10-13. Vd, página no Facebook; a revista em papel, é editada pelas Éditions Ouest - France.]

PS - Sobre o livro pedia-te para salientar que se trata de uma abordagem histórica à operação, ou seja, não é um livro de opiniões sobre isto ou aquilo. É que tenho visto no facebook que as pessoas falam sem saber do que estão a falar ou sem sequer terem visto o livro. O livro tem 170 páginas e está muito bem documentado, eu diria que é mesmo o melhor livro que se podia escrever sobre a Mar Verde. Fala também do antes e do depois da operação. Estou muito satisfeito com o resultado final e quando comprares vais ver que é realmente um livro de grande qualidade. (*)
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Ficha técnica:

Título: Ataque a Conakry: História de um Golpe Falhado
Autores: José Matos e Mário Matos e Lemos

ISBN: 9789895489268  | Ano de edição: 03-2021 | Editor: Fronteira do Caos | Idioma: Português | Dimensões: 160 x 235 x 9 mm | Encadernação: Capa mole | Páginas: 170 | Tipo de Produto: Livro | Classificação Temática: História Militar | Preço de capa: 14,75 €

 Sinopse:

Na madrugada do dia 22 de novembro de 1970, seis navios de guerra portugueses cercaram Conakry, a capital da República da Guiné, na costa ocidental africana. Aproveitando a escuridão da noite, uma força militar desembarcou nas costas norte e sul da cidade adormecida.

À frente destes homens estava um jovem oficial português, Alpoim Calvão, que tinha sido nomeado para comandar esta operação secreta, com o nome de código Mar Verde. O objectivo principal da invasão era promover um golpe de Estado na antiga colónia francesa e derrubar o regime do presidente Sékou Touré, que apoiava os guerrilheiros do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), que lutavam pela independência da Guiné portuguesa. 

Os invasores pretendiam também destruir os meios navais que os guerrilheiros e a Marinha guineana tinham no porto de Conakry, capturar o líder do partido, Amílcar Cabral, e resgatar um grupo de militares portugueses encarcerados numa prisão às ordens do PAIGC. 

A incursão acabaria por não ter o sucesso esperado relativamente ao golpe de Estado e Portugal seria condenado nas instâncias internacionais pela invasão de um estado soberano, mas esta operação ficaria na memória de muitos como a mais ousada levada a cabo durante a guerra colonial em África, embora o regime português nunca reconhecesse o seu envolvimento.

Fonte: Bertrand Livreiros (com a devida vénia)

Os Autores

José Matos - Investigador em História Militar tem feito investigação sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial portuguesa, principalmente na Guiné. É colaborador regular da Revista Militar e de revistas europeias de aviação militar e de temas navais. Colaborou nos livros A Força Aérea no Fim do Império (2018); A Guerra e as Guerras Coloniais na África Subsariana (2019). É co-autor dos seguintes livros: Nos Meandros da Guerra - O Estado Novo e a África do Sul na Defesa da Guiné (2020); War of Intervention in Angola, Volume 3: Angolan and Cuban Air Forces, 1975-1989 (2020).

[Do José Matos ver,  no nosso blogue, um poste anterior sobre a Op Mar Verde (**)]

Mário Matos e Lemos - Licenciado em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, foi jornalista da Agência de Notícias e Informações (ANI), do Diário  de Notícias e do Diário do Norte (1956-1972). Entre 1972 e 1998 desempenhou funções de conselheiro cultural e de imprensa em diversas embaixadas portuguesas. Foi diretor do Centro Cultural Português de Bissau e, fugazmente, diretor do CENJOR. Atualmente é investigador do CEIS 20, da Universidade de Coimbra. É autor de obras como Liberdade de Imprensa e Outros Ensaios (1964); Um Vespertino do Porto (1972); O 25 de Abril, Uma Síntese, Uma Perspectiva (1986); Política Cultural Portuguesa em África – O Caso da Guiné-Bissau (1999); Dicionário de História Universal (2001); Jornais Diários Portugueses do Século XX. Um Dicionário (2006); José de Melo, o Primeiro Fotógrafo de Guerra Português (2008); Oposição e Eleições no Estado Novo  (2012); 1945 – Estado Novo e Oposição – O  MUD e o Inquérito às suas Listas (2018).

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Notas do editor: 

(*) Último poste da série > 9 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21874: Agenda cultural (766): "A Descolonização", série da RTP com emissões nos dias 2; 10 e 16 de Fevereiro de 2021 na RTP2


(...) Finalmente sobre a [Op] Mar Verde, a decisão do [cmdt Alpoim] Calvão em retirar foi a mais acertada a partir do momento que percebe que não conseguiu eliminar a componente aérea. Fez bem em sair, agora vamos imaginar que a malta tinha apanhado os MiG em Conakry, aí o resultado tinha sido outro…

Se não fosse a incerteza dos MiG nós tínhamos dominado a capital, a cidade já estava de pantanas ao fim da madrugada e o golpe teria tido outra evolução. Foi mesmo falha nas informações… A PIDE devia ter mandado alguém para capital uns dias antes para ver o que se passava, para ver se os MiG estavam lá ou não e recolher informações…não fizeram nada disso e deu no que deu… (...) 

Guiné 61/74 - P21981: Parabéns a você (1940): Cor Art Ref DFA António Marques Lopes, ex-Alf Mil Art da CART 1690/BART 1914 (Geba, Banjara e Cantacunda, 1967/69)

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Nota do editor

Último poste da série de 5 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P21970: Parabéns a você (1939): Gil Moutinho, ex-Fur Mil Piloto DO e T6 da FAP (BA 12, Bissau, 1972/73)

domingo, 7 de março de 2021

Guiné 61/74 - P21980: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte V

Foto nº 1 > Guiné > Região de Gabu > Boé >  Assistência a feridos na sequência da deflagração de uma mina A/C, durante a «Operação Mabecos Bravios», realizada em 6 de Fevereiro de 1969, a propósito da retirada de Madina do Boé. Foto do álbum do Cor Inf Hélio Esteves Felgas (1920-2008), Cmdt da Operação – P15719 e In: Camões - Revista de Letras e Culturas Lusófonas, n.º 5, abril-junho 1969, p 12, com a devida vénia.


Foto nº 2 > Guiné >  Região de Cacheu > Ingoré > CCAÇ 2381 (1968/70) > Antotinha > Recordando os tempos de enfermagem na tabanca em construção de Antotinha. Foto do álbum de José Teixeira – P11881, com a devida vénia.



Foto nº 3 > Guiné >  Região de Gabu > Boé > 12 de Setembro de 1969 > Evacuação de feridos provocados pelo rebentamento de uma mina anticarro ocorrida entre Canjadude e Nova Lamego. Foto do álbum de José Corceiro, 1.º Cabo Trms, CCAÇ 5, Canjadude (1969/71) – P6117, com a devida vénia.





O nosso coeditor Jorge [Alves] Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494
(Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior, ainda no ativo. 



MEMÓRIAS CRUZADAS

NAS "MATAS" DA GUINÉ (1963-1974):

RELEMBRANDO OS QUE, POR MISSÃO, TINHAM DE CUIDAR DAS FERIDAS CORPOREAS PROVOCADAS PELA METRALHA DA GUERRA COLONIAL: «OS ENFERMEIROS» 

OS CONTEXTOS DOS "FACTOS E FEITOS" EM CAMPANHA DOS VINTE E QUATRO CONDECORADOS DO EXÉRCITO COM "CRUZ DE GUERRA", DA ESPECIALIDADE "ENFERMAGEM"

PARTE V

 

► Continuação do P21616 (IV) (06.12.20) (*)


1.   - INTRODUÇÃO


Visando contribuir para a reconstrução do puzzle da memória colectiva da «Guerra Colonial» ou «Guerra do Ultramar», em particular a do TO da Guiné, continuamos a partilhar no Fórum os resultados obtidos na investigação acima titulada. Procura-se valorizar, também, através deste estudo, o importante papel desempenhado pelos nossos camaradas da "saúde militar" (e igualmente no apoio a civis e população local) – médicos e enfermeiros/as – na nobre missão de socorrer todos os que deles necessitassem, quer em situação de combate, quer noutras ocasiões de menor risco de vida, mas sempre a merecerem atenção e cuidados especiais.


Considerando a dimensão global da presente investigação, esta teve de ser dividida em fragmentos, onde procuramos descrever cada um dos contextos da "missão", analisando "factos e feitos" (os encontrados na literatura) dos seus actores directos "especialistas de enfermagem", que viram ser-lhes atribuída uma condecoração com «Cruz de Guerra», maioritariamente de 3.ª e 4.ª Classe. Para esse efeito, a principal fonte de informação/ consulta utilizada foi a documentação oficial do Estado-Maior do Exército, elaborada pela Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974).


2.   - OS "CASOS" DO ESTUDO


De acordo com a coleta de dados da pesquisa, os "casos do estudo" totalizaram vinte e quatro militares condecorados, no CTIG (1963/1974), com a «Cruz de Guerra» pertencentes aos «Serviços de Saúde Militar», três dos quais a «Título Póstumo», distinção justificada por "actos em combate", conforme consta no quadro nominal elaborado por ordem cronológica e divulgado no primeiro fragmento – P21404.


No gráfico abaixo, já publicado anteriormente, está representada a população do estudo agrupada pela variável "posto" (n-24).

 




Gráfico 1 – Representação gráfica da população do estudo agrupada na variável "posto".


Neste quinto fragmento analisaremos mais dois "casos", o segundo e terceiro de 1966, onde se recuperam mais algumas memórias, sempre dramáticas quando estamos perante situações irreversíveis, como é a da morte.


3.   - OS CONTEXTOS DOS "FEITOS" EM CAMPANHA DOS MILITARES DO EXÉRCITO CONDECORADOS COM "CRUZ DE GUERRA", NO CTIG (1963-1974), DA ESPECIALIDADE DE "ENFERMAGEM" - (n=24)

 

3.9     - AMADEU IVO DA SILVA CORREIA, 1.º CABO AUXILIAR DE ENFERMEIRO, DA CCAÇ 798, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE 4.ª CLASSE 


A nona ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 4.ª Classe - a segunda das distinções contabilizadas durante o ano de 1966 - teve origem no desempenho tido pelo militar em título, durante a «Operação Rebenta», realizada em 12 de Maio de 1966, 5.ª feira, ao socorrer, debaixo de fogo IN, vários feridos de outras unidades que haviam participado no ataque à base de Cambeque/Cabonepo, situada na região de Quitafine (infografia abaixo).


► Histórico

 


◙ Fundamentos relevantes para a atribuição da Condecoração


▬ O.S. n.º 02, de 12 Janeiro de 1967, do QG/CTIG:


"Agraciado com a Cruz de Guerra de 4.ª Classe, nos termos do artigo 12.º do Regulamento da Medalha Militar, promulgado pelo Decreto n.º 35667, de 28 de Maio de 1946, por despacho do Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, de 28 de Março de 1967: O 1.º Cabo auxiliar de enfermeiro, n.º 4139364, Amadeu Ivo da Silva Correia, da Companhia de Caçadores 798 [CCAÇ 798] – Batalhão de Caçadores 1861, Regimento de Infantaria 1."


● Transcrição do louvor que originou a condecoração:


"Por seu despacho de 09Jan67, considerou como sendo dado por si, o louvor constante do n.º 2 da alínea B) do artigo 2.º da OS n.º 300, de 26Dez66, do BCAÇ 1861, conferido ao 1.º Cabo auxiliar de enfermeiro, n.º 4139364, Amadeu Ivo da Silva Correia, da CCAÇ 798, porque fazendo parte dum grupo de combate em operações, ter sempre demonstrado ser cumpridor e muito esforçado no desempenho das suas funções, em especial na «Operação Rebenta», onde revelou sangue-frio e arrojo, ao ter ido buscar debaixo de fogo IN, vários feridos, dando um belo exemplo de dedicação e coragem, o que muito me apraz distinguir, como exemplo a seguir." (CECA; 5.º Vol.; p. 270).

 

CONTEXTUALIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA


Para contextualização da ocorrência que esteve na base da condecoração do 1.º Cabo enfermeiro, Amadeu Ivo da Silva Correia, socorremo-nos das informações publicadas no P9047 – "Memórias da CCAÇ 798: uma perspectiva a partir de Gadamael Porto; Parte II; Actividade militar" – da autoria de Manuel Vaz (ex-Alf Mil da mesma unidade, Gadamael Porto, 1965/67), referindo que «Operação Rebenta» a concretizar na região de Quitafine, teve lugar em 12 de Maio de 1966, 5.ª feira. Para além da CCAÇ 798, mobilizou outras forças, cuja missão visava o ataque às povoações de Cambeque e Cabonepo. O objectivo particular da CCAÇ 798 era proteger a rectaguarda das restantes forças em acção. 

Entretanto, por engano, a FAP fez quatro mortos e uma dezena de feridos das NT. A CCAÇ 798 teve de socorrer e evacuar os feridos para uma zona de segurança, tendo-se distinguido o 1.º Cabo Amadeu Ivo da Silva Correia e o Soldado Agonia [Carlos Gomes Caieiro, CECA, 5.º Vol; Tomo IV; p 272], que foram agraciados com a Cruz de Guerra.


3.9.1    - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAÇADORES 798

= GANTURÉ - GADAMAEL - MEJO


Mobilizada pelo Regimento de Infantaria 1 [RI 1], da Amadora, para cumprir a sua missão ultramarina no CTIG, a Companhia de Caçadores 798 [CCAÇ 798], embarcou em Lisboa em 23 de Abril de 1965, 6.ª feira, a bordo do N/M «UÍGE», sob o comando do Capitão de Infantaria Rui Artur Vieira dos Santos, tendo desembarcado em Bissau em 28 do mesmo mês.


3.9.2    - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CCAÇ 798


Após a sua chegada, a CCAÇ 798 ficou colocada em Bissau na dependência do BCAÇ 600 [18Out63-20Ago65; do TCor Inf Manuel Maria Castel Branco Vieira], rendendo a CCAÇ 526 [08Mai63-29Abr65; do Cap Inf Hélder José François Sarmento], onde efectuou uma instrução de adaptação operacional e colaborou na realização de patrulhamentos e na segurança das instalações e das populações até 25Mai65.


Após um Gr Comb ter seguido em 08Mai65 para o destacamento de Ganturé, assumiu em 28Mai65, por troca com a CART 494 [22Jul63-24Ago65; do Cap Art Alexandre da Costa Coutinho e Lima], a responsabilidade do subsector de Gadamael, mantendo um Gr Comb destacado desde 11Mai65 e integrando-se no dispositivo e manobra do BCAÇ 600 e depois do BCAÇ 1861 [23Ago65-17Abr67; do TCor Alfredo Henriques Baeta (1917-2011)].


Destacou ainda um Gr Comb para Mejo, de 03Ago66 a 24Out66 em reforço da guarnição local, tendo tomado parte em operações realizadas na região de Salancaur, onde obteve excelentes resultados. Em 19Jan67, foi rendida no subsector de Gadamael pela CART 1659 [17Jan67-30Out68; do Cap Mil Art Manuel Francisco Fernandes de Mansilha], recolhendo a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso à metrópole, o qual ocorreu em 08 de Fevereiro de 1967, a bordo do N/M «VERA CRUZ». (CECA; 7.º Vol.; p. 340).

 

3.10    - ALBERTO DO ROSÁRIO PEREIRA, FURRIEL MILICIANO DO SERVIÇO DE SAÚDE, DA CCAÇ 1487, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE 4.ª CLASSE 


A décima ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 4.ª Classe - a terceira das distinções contabilizadas durante o ano de 1966 - teve origem no desempenho tido pelo militar em título ao longo da sua comissão, com particular relevância para a «Operação Naja», em 18 de Junho de 1966 (sábado) e «Operação Nortada I», em 06 de Dezembro de 1966, 3.ª feira, ambas na zona de Jufá, situada na região de Quinara (infografia abaixo).


► Histórico

 


◙ Fundamentos relevantes para a atribuição da Condecoração

▬ O.S. n.º 15, de 30 de Maio de 1967, do QG/CTIG:


"Agraciado com a Cruz de Guerra de 4.ª Classe, nos termos do artigo 12.º do Regulamento da Medalha Militar, promulgado pelo Decreto n.º 35667, de 28 de Maio de 1946, por despacho do Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, de 07 de Julho de 1967: O Furriel Miliciano, Alberto do Rosário Pereira, da Companhia de Caçadores 1487 [CCAÇ 1487] – Batalhão de Artilharia 1904, Regimento de Infantaria 15."


● Transcrição do louvor que originou a condecoração:


"Louvo o Furriel Miliciano enfermeiro, Alberto do Rosário Pereira, da CCAÇ 1487, pela maneira abnegada, eficiente e profundamente dedicada como sempre tem desempenhado as suas funções, não só no que respeita a tratamento de pessoal militar, como também no que se refere à população civil.

Muito correcto, sempre pronto a atender quem dele necessita, revelou perfeita compreensão dos seus deveres, quaisquer que fossem as circunstâncias em que os seus serviços se tornassem necessários, designadamente debaixo de fogo em que por diversas vezes se expôs, completamente indiferente ao risco que corria, para prestar socorros a feridos em combate.

Ferido ele próprio, gravemente, em 18Jun66, durante a «Operação Naja», na região de Jufá, dirigiu o tratamento de outros feridos enquanto não foi evacuado e, em 06Dez66, durante a «Operação Nortada I», no decorrer de um violento contacto com o IN na mesma região e muito próximo do local onde havia sido ferido anteriormente, não hesitou em se dirigir para junto de pessoal atingido e, debaixo de fogo, lhe prestar a assistência necessária.

Em todas as situações, demonstrou o Furriel enfermeiro Rosário Pereira, abnegação, eficiência, dedicação, coragem, sangue-frio e total desprezo pelo perigo, quando se tornou necessário enfrentá-lo para cumprimento da sua missão." (CECA, 5.º Vol.; p. 387).


CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRIMEIRA OCORRÊNCIA – «OPERAÇÃO NAJA»


Referente à contextualização da primeira ocorrência, que suporta a fundamentação da condecoração do Furriel enfermeiro Alberto do Rosário Pereira, da CCAÇ 1487, socorremo-nos das fontes oficiais indicadas no ponto 1, citando: 


"Em 18Jun66 – «Operação Naja» – Consistiu numa batida na península de Jabadá, com acções sobre os acampamentos de Jufá, S. José, Bissilão, Flaque Cibe e Gã Pedro. Foi executada por forças da CCAÇ 1487, CCAÇ 1549, CCAÇ 1566, PMort 1039, GCmds "Os Vampiros" e 1 GC do Destacamento de Jabadá. Destruídos os acampamentos de Jufá e S. José, causados ao lN 10 mortos, todos fardados, e capturado material diverso, munições, 4 espingardas e 1 pistola. Posteriormente, na reacção das NT a uma emboscada lN, causaram-lhe 2 mortos e outras baixas prováveis e obrigaram-no a debandar. Capturaram, além de material diverso, 1 pistola-metralhadora e destruíram um acampamento em Bissilão e outro em Flaque Cibe. As NT montaram uma emboscada, onde foi morto 1 elemento lN portador de 1 lança-granadas foguete, que foi capturado. Foi ainda destruído um acampamento em Gã Pedro." (CECA; 6.º Vol.; pp 402/403).

 

3.10.1 - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAÇADORES 1487

          = BISSAU - FULACUNDA - NHACRA - SAFIM - PONTE DE ENSALMÁ - JOÃO LANDIM E DUGAL


Mobilizada pelo Regimento de Infantaria 15 [RI 15], de Tomar, para cumprir a sua missão ultramarina no CTIG, a Companhia de Caçadores 1487 [CCAÇ 1487], embarcou em Lisboa em 20 de Outubro de 1965, 4.ª feira, a bordo do N/M «NIASSA», sob o comando do Capitão de Infantaria Alberto Fernão de Magalhães Osório, tendo desembarcado em Bissau em 26 do mesmo mês.

 

3.10.2 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CCAÇ 1487


Inicialmente, a CCAÇ 1487 ficou instalada em Bissau, na dependência do BCAÇ 1857 [06Ago55-03Mai67; do TCor Inf José Manuel Ferreira de Lemos], tendo substituído a CCAÇ 557 [03Dez63-29Out65; do Cap Inf João Luís da Costa Martins Ares] no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área. De 10 a 18Nov65, efectuou instrução de adaptação operacional na região de Mansoa, sob orientação do BART 645 [10Mar64-09Fev66; do TCor Art António Braamcamp Sobral], tendo tomado parte numa operação realizada na zona de Sabá.


Em 08Jan66, rendendo a CCAÇ 1420 [06Ago65-03Mai67; do Cap Inf Manuel dos Santos Caria], assumiu a responsabilidade do subsector de Fulacunda, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 1860 [23Ago65-15Abr67; TCor Inf Francisco Manuel da Costa Almeida] e efectuando várias operações nas regiões de Naja (Braia), Jufá e Gã Formoso, entre outras, de que se destaca, pelos resultados obtidos, a «Operação Negaça», em 18Mai66.


Em 15Jan67, foi substituída pela CCAÇ 1624 [18Nov66-18Ago68; do Cap Mil Art Fernando Augusto dos Santos Pereira] e foi colocada no subsector de Nhacra, com destacamentos em Safim, Ponte de Ensalmá, João Landim e Dugal, a fim de render a CCAÇ 797 [28Abr65-19Jan67; Cap Inf Carlos Alberto Idães Soares Fabião (1930-2006)], ficando integrada no dispositivo e manobra do BART 1904 [18Jan67-31Out68; do TCor Art Fernando da Silva Branco], com vista à segurança e protecção das instalações e das populações. 

Em 31Jul67, foi rendida no subsector de Nhacra pela CART 1646 [18Jan67-31Out68; do Cap Mil Art Manuel José Meirinhos], a fim de efectuar o embarque de regresso, o qual ocorreu em 01 de Agosto de 1967. (CECA; 7.º Vol,; p. 351).

Continua…

► Fontes consultadas:

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 5.º Volume; Condecorações Militares Atribuídas; Tomo II; Cruz de Guerra, 1962-1965; Lisboa (1991).

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014)

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição; Lisboa (2002).

Ø Outras: as referidas em cada caso.

Termino, agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

25FEV2021

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Nota do editor:


(*) Último poste da série > 6 DE DEZEMBRO D2020

Guiné 61/74 - P21616: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte IV


Postes anteriores:


1 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21504: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte III

6 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21421: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte II

30 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21404: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte I

Guiné 61/74 - P21979: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (21): O "velhinho, fanfarrão" que levou uma abada de 2-12, do "pira" que era bom no jogo das damas e tinha "fair play"


Guiné  Região de Quínara > Nova Sintra > CART 2711, "Os Duros de Nova Sintar, 1970/72 > Pista de aviação, heliporto e aquartelamento.


Foto (e legenda): © Carlos Barros (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mais uma pequena história do Carlos Barros:


(i) ex-fur mil, 2ª C/BART 6520/72 (Bolama, Bissau, Tite, Nova Sintra, Gampará, 1972/74), "Os Mais de Nova Sintra", os últimos a ocupar o aquartelamento de Nova Sintra antes da sua transferência para o PAIGC em 17/7/1974; (ii) membro da Tabanca Grande nº 815, tem mais de 2 dezenas e meia de referências


O Jogo das damas: 
campeões e fanfarrões


A 2ª Cart , “Os Mais de Nova Sintra“, após a IAO em Bolama, chegou, em 1972 numa LGD a Nova Sintra e, depois de apanharem um “baile militar”, a praxe, todos os militares se instalaram nas diversas casernas do aquartelamento.

O 3º grupo de combate ficou na sede do Batalhão, em Tite e, passados alguns meses, “navegaram” para Gampará, uma zona onde a ação dos guerrilheiros do PAIGC era persistente, com constantes emboscadas, minas e flagelações ao destacamento.

“Os Mais de Nova Sintra” substituiram “Os Duros”, em 1972, precisamente em Nova Sintra, setor do Quínra, um destacamento desterrado do” mundo civilizado” , como mostra a imagem com a sua poeirenta pista de aviação e um quadradinho irregular, que servia de campo de futebol, onde descarregávamos as nossas mágoas e sofrimentos, na bola ou nas canelas dos nossos companheiros!

Em Tite, alguns militares bebiam as suas “bazucas” ou "fantas" e conversavam sobre as suas "madrinhas de guerra”. O furriel Barros mostrava o seu orgulho já que a sua “madrinha de Guerra”, a Isabelinha de Guimarães, escrevia-lhe muito, com uma caligrafia perfeita, que fazia inveja a muita gente…

No meio de um pequeno grupo, em pleno convívio, soou uma voz a gritar

− Quem é o corajoso que quer jogar às damas comigo, é à grade de cerveja?!...Há algum periquito para me defrontar?

O furriel Barros era um daqueles jovens que jogava bem às damas, porque teve inúmeros treinos, durante anos, no salão dos Bombeiros de Esposende, jogando contra grandes mestres locais como o sr. José Praia, Carvalho, Edgar, Mário, estes os mais credenciados e outros de menor valia , como Tarrio, João Carlos, Miquelinos, isto como mera curiosidade-

Passados minutos e de uma forma insistente, veio novo desafio provocador:

− Quem quer levar no pêlo às damas, é à grade de cerveja ?!

O Barros, farto de ouvir aquele “galifão damístico”, abeirou-se dele e aceitou o desafio. Sentou-se e começou a jogar às damas com o “gabarolas”, num partida onde se juntaram muitos militares a assistir ao prélio.

Em 8 jogos, o Barros ganhou 6-2 perante o desespero do seu opositor que estava um pouco cabisbaixo, com a crista abaixada…

−  Furriel, teve sorte, amanhã vamos à desforra e vai levar poucas…

No dia seguinte, outro desafio, com maior assistência ainda , e começaram os dois a jogar. Em 6 partidas, o “galifão” perdeu 6-0 e, completamente rendido à evidência, levantou-se, foi pagar as cervejas prometidas, embora o Barros tivesse perdoado muitas…

Alguns amigos do pelotão do Barros beberam umas “bazucas”, marca” pato-galifão” e, a partir desse momento, nunca mais o Barros foi desafiado, limitava-se apenas a jogar, desportivamente, com o Santos, o "Paços Ferreira”, condutor de Nova Sintra, um bom companheiro e com elevado espírito de “fair play”…

A tradição do jogo de damas manteve-se em Tite e Nova Sintra, durante toda a Comissão com o furriel Barros, sempre no ativo, jogando, sem as “fanfarronices” do outro pavão…

Na vida , a humildade normalmente vence sempre, perante a vaidade e a arrogância que, neste caso, foram as duas copiosamente derrotadas e despromovidas para a divisão inferior…

Tite, 26 de outubro de 1972

Carlos Barros
Esposende, 18 de Fevereiro de 2021
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Nota do editor:

Último poste da série > 2 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P21962: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (20): a entrega do nosso destacamento aos guerrilheiros do PAIGC, em 17 de julho de 1974

Guiné 61/74 - P21978: Blogues da nossa blogosfera (153): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (62): Palavras e poesia


Do Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.


NÃO HÁ POETA

ADÃO CRUZ
© ADÃO CRUZ

Não há poeta para a réstia de sol
de um rosto engelhado de luz.
Não há poeta para o poema de um momento
entre a singeleza do pensamento
feito suspiro de terra seca
e um estuário de rugas
cavadas de longas madrugadas.
Não há poeta para a liberdade de criar sem algemas
a majestade de um só verso
feito sorriso de cristal.
Não há poeta para tão serena harmonia
da assilabada amargura do peso do tempo.
Não há poeta para a nudez da vida
perdida para lá de um rosto apagado de ilusões.
Não há poeta para uma flor aberta
nos olhos do silêncio entre a vida e a morte.

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Nota do editor

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Último poste da série de 5 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P21973: Blogues da nossa blogosfera (152): "Sempre renas", de JB [, José Belo]: o melhor blogue de fotopoesia da Lapónia sueca

Guiné 61/74 - P21977: Blogpoesia (723): "Atalhos da vida"; "Miam os gatos pelas ruelas"; "Melodias do Mondego" e "Lampiões das madrugadas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. A habitual colaboração semanal do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) com estes belíssimos poemas, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante esta semana:


Atalhos da vida

Encurtam distâncias.
Tornam mais perto anseios e sonhos.
Acrescentam à vida o tempo que poupam.
Poder estudar. Crescer na sabedoria.
Chegar a mestre na arte ou profissão.
Desenvolver seus talentos.
Fazem subir. Ver de mais alto a riqueza da vida.
A variedade dá cor.
O progresso é a soma e combinação das capacidades de cada membro.
Sua falta torna o mundo apático e pobre.
Todos os atalhos convergem para o largo dos progressos

Como os rios para o mar.


Berlim, 11h15m de 2021
Jlmg


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Miam os gatos pelas ruelas

É fevereiro. Miam os gatos pelas ruelas.
É o cio da paixão.
Aquele rio de águas quentes.
Só descansa no mar.
Bairros negros de Lisboa,
Batidos de sol e vento.
Vagueiam neles os marujos.
Sedentos de paixão.
É a hora prenhe da madrugada,
Quando acende a paixão.


Ouvindo Camané "sei dum rio"
Berlim, 3 e Fevereiro de 2021
15h7m
Jlmg


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Melodias do Mondego

Passam serenas as águas límpidas do Mondego.
Fluem nelas as mágoas das saudades.
Gerações de estudantinas
Pisaram suas pedras.
Latadas desde a tarde à madruga.
A vadiagem obstinada da estudantada.
Se recusa a descansar.
Têm de viver a vida inteira num só dia.
Gerações sem fim do passado,
Vivem suas mágoas de saudade.
O tempo não voltará,
Por mais que cantem ou chorem.


Berlim, 5 de Fevereiro de 2021
9h58m
Jlmg


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Lampiões das madrugadas

Acesas, desde a tardinha, ao amanhecer.
Sol e lua das madrugadas.
Verões da liberdade.
Que reacendem as paixões.
Sois o guia da vadiagem.
Quando o sonho é o rei.
Sois a luz sobre o passado.
Como o sol é do futuro.
Enquanto a vida dura.
Já que a morte tudo esquece.


Berlim, 6 de Fevereiro de 2021m
16h47m
Jlmg

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Nota do editor

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