quarta-feira, 24 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22032: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte Vi: (i) batismo de fogo... com a reza do terço; e (ii) uma patuscada... de gato por lebre!


Foto nº 1 >  - Simulando o ataque a um avião inimigo. Cada tiro cada melro... pois aviões ca tem... A tropa não deixa de me surpreender: Antiaéreas em Aldeia Formosa? Os nossos amigos, ou IN, tinham mísseis terra-ar Strela!
 
 
Foto nº 2 - Em Aldeia Formosa, com todas as comodidades embora já batizados, com a 1a comunhão marcada e o Crisma garantido > da esquerda para a direita os furriéis da companhia: Camarada que mudou de vida depois de ir de férias! Costa, Gouveia, Vieira, Albuquerque e o soldado Covas

Foto nº 3 - Aldeia Formosa -No banco da frente> O aluno do Colégio das Caldinhas e Albuquerque (o condutor). No banco de trás: Martins e Costa, armados em grandes senhores


Fig. 4 - Natal em Aldeia Formosa (1972): Gouveia, Martins, Machado, o homem do colégio das
Caldinhas, Costa, Albuquerque e Beires. Todas na bicha para o champanhe...
 
Fotos (e legendas): © Jaoquim Costa (2021). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Joaquim Costa, hoje e ontem. Natural de V. N. Famalicão,
vive em Fânzeres, Gondomar, perto da Tabanca dos Melros.
É engenheiro técnico reformado.


Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-
Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte VI

O batismo de fogo... com a reza do terço


Entramos na rotina de patrulhas no mato; fazer a proteção à coluna semanal para Buba e principalmente fazer a proteção a uma equipa de engenharia do exército na construção de uma estrada, de interesse estratégico, com o objetivo de criar as condições de segurança para a reocupação de tabancas abandonadas, no tempo do antigo governador [, gen Arnaldo Schulz?], por força da intensa atividade do IN na zona com elevadas perdas humanas.

Todos as manhãs a azáfama era grande na preparação da coluna que partia diariamente de Aldeia Formosa para a frente de trabalhos. Esta coluna transportava´,  para al
ém dos soldados, (i)  um grande grupo de homens da população empunhando grandes catanas (os chamados capinadores), que tinham a árdua tarefa de seguir à frente dos trabalhos capinando todo o tipo de vegetação para permitir a entrada das máquinas;  (ii) os manobradores das máquinas de engenharia;  bem como (iii) alguns elementos da população, sempre acompanhados pelas suas cabras, galinhas e porcos, na sua deslocação a Mampatá.

Quanto à coluna para Buba, a primeira vez que o meu pelotão foi escalado para fazer a sua proteção, fiquei impressionado com os preparativos para a mesma. Não havia Berliet que não levasse,  para além dos soldados, que faziam a proteção, grandes grupos de população local (em grande algazarra) em trânsito para as diferentes tabancas que ficavam no caminho até Buba, sempre acompanhados pelas suas cabras, galinhas e porcos; que fugiam e esvoaçavam por cima e por baixo das viaturas recusando o embarque (sim… os porcos voavam!).

Não obstante a insistência do chefe da coluna de que nem todos, por razões de segurança, podiam fazer a viagem, ninguém ficava em terra.

Fazer aquela coluna era sempre uma grande odisseia: no tempo das chuvas,  o adversário maior era a lama, o atolar de várias viaturas, bem como o remoção de árvores caídas na picada. No tempo seco o grande adversário era o pó fino vermelho da picada que se levantava em nuvem, não permitindo ver as viatura que iam na frente. Era um ar irrespirável, mesmo com o lenço tabaqueira na boca a servir de máscara. 

Chegados a Buba e no regresso a Aldeia Formosa,  ninguém reconhecia ninguém, só se viam os olhos, dada a quantidade de pó vermelho colada no rosto com o suor. Durante vários dias, do que saía da boca e nariz o pó vermelho predominava.

Não era permitido mas muitos soldados se ofereciam para fazer a viagem na arrastadeira (a dita viatura rebente-minas) na época seca na ânsia de fugir ao pó.

A famosa Cecília Supico Pinto (mais conhecida no teatro de guerra por Cilinha, destemida presidente do Movimento Nacional Feminino) (#), nas suas inúmeras visitas à frente de Guerra viajava, segundo alguns relatos, nesta arrastadeira para evitar o pó por forma a chegar sempre com aspeto aceitável junto dos soldados. Nunca assisti a uma visita sua mas de acordo com os relatos fazia questão de se deslocar às zonas mais perigosas,  vestida como fosse a uma festa nos salões do Casino do Estoril.

Entretanto, como bons cristãos, tudo começa com o batismo… com muita reza… e muita “festa”.

Poucos dias após a nossa chegada a Aldeia Formosa, estava eu a jogar com o Gouveia (O Beirão , “Alcaide de Almeida”) uma partida de damas, a fazer horas para o jantar (geralmente arroz com estilhaços), quando vejo um clarão e ouço um grande estrondo na copa de uma árvore junto de nós, seguida de rajadas de metralhadora e mais rebentamentos espalhados pelo quartel, com a resposta quase imediata das nossas antiaéreas (que faziam fogo direto para a mata) e de metralhadoras.

Mas que grande “festival” com os RPG a rebentarem por cima das nossas cabeças e o “matraquear” das metralhadoras de um lado e do outro! 

De tal maneira fiquei atrapalhado (, foi um batismo assustador, reagindo no momento, quase... como o amigo “merdalómano” de Tavira, ) que permaneci imóvel, sem saber o que fazer e completamente atarantado, com toda a gente a fugir para as valas. Saio deste torpor empurrado por um “velhinho” para a vala ainda com o tabuleiro na mão que de seguida voou com um chuto do camarada e lá nos resguardamos, eu numa vala e o Gouveia noutra.

Passado uns segundos cai em cima de mim um peso enorme – era o Sargento Redondeiro que, na queda, me prende uma perna, situação bastante dolorosa. Então na vala alguém começa a rezar:

− Ai, minha mãezinha,  reza por mim!

Ao que eu respondo:

– Ai, Redondeira,  liberta a minha perna!

E ele:

− Ai, nossa Senhora de Fátima tem piedade de nós!

E eu:
−  Ai,  Redondeiro liberta a minha perna!

E ele:

− Ai, meu bom Jesus, cuida de nós!

E eu:

− Ai,  Redondeiro, liberta a minha perna!

E a lengalenga continuou... E assim estivemos os dois a “rezar o terço” até ao fim do ataque. No final não sei se fiquei mais aliviado por o Redondeiro libertar a minha perna, se pelo fim do ataque do IN…

Recordo sempre com muita saudade e ternura este bom homem, contudo, em nome da verdade, depois de sairmos da vala, não identifiquei o homem que rezou comigo.


Gato por lebre...


Já com amizades consolidadas com os velhinho de Aldeia Formosa, juntamente com outros camaradas, fomos convidados, por um furriel africano, para uma patuscada.

O nosso amigo guineense, grande caçador, havia caçado, segundo se constava, uma cabra de mato e fazia questão de a partilhar com os periquitos acabados de chegar.

A convites destes “não se olha a dente”, é de aceitação obrigatória, particularmente vindo de um simpático amigo furriel guineense com fama de grande caçador e mais de bom cozinheiro.

Quando chegamos já se sentia o cheirinho agradável dos condimentos próprios da região na preparação da carne.

Para quem comia ao almoço ração de combate e ao jantar arroz com estilhaços, tínhamos a sensação de estar no Artur, em Carviçais (restaurante em Torre de Moncorvo especialista em carne de caça), pelo que fomos molhando a goela com umas cervejas, utilizando como lastro umas bem torradas castanhas de caju…

Enquanto esperavamos, o nosso anfitrião lá nos foi contando as suas histórias de grande caçador (na altura praticamente impossível por razões óbvias) bem como a melhor forma de preparar cada peça de caça. Para cada peça a sua arte: gazela, cabra de mato ou porco espinho cada qual o seu tempero.

A conversa era boa mas a fome já apertava, pelo que fomos ocupando os nossos lugares para o repasto. Chega o dito à mesa, com um aspeto esplêndido e um cheirinho de fugir. Ao primeiro pedaço sentiu-se um sabor divinal. Enquanto houve carne, houve um silêncio de igreja (não confundir com roubo de igreja).

Terminado o repasto, bem regado, logo apareceu uma viola alegrando o ambiente soltando-se algumas vozes, um pouco roucas devido ao gindungo, cantando músicas africanas (a caminho do porto cais,  furriel com a carta na mão...). 

Chegada a hora da partida, enquanto agradecíamos o convite para tão fausto jantar, o anfitrião, com toda a candura diz alto e bom som: ainda bem que os meus amigos gostaram, não há ninguém melhor do que eu a preparar macaco-cão…

Com o aumento da pobreza extrema na Guiné-Bissau, nos dias de hoje, mais de 1500 macacos são vendidos anualmente como carne nos mercados urbanos da Guiné-Bissau, mas muitos mais são caçados e não chegam ao destino, temendo-se a extinção de algumas espécies .

Os cientistas constataram também que é difícil identificar as carcaças de primatas que chegam aos mercados urbanos, o que compromete os esforços de conservação.

Vendem gato por lebre. Diziam estar a vender uma determinada espécie, mas depois a grande maioria pertencia a outra espécie.

Da grande colónia de macacos com os quais convivemos diariamente na altura, e que faziam as nossas delícias, muitas vezes confundindo-os com grupos do IN, de acordo com as informações que chegam de alguns cooperantes, hoje na Guiné, com o consumo nas zonas rurais como subsistência e com o comércio organizado, já é muito raro encontrar esta espécie nas matas da Guiné.

(Continua...)
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Nota do autor:

(*) Cecília Maria de Castro Pereira de Carvalho Supico Pinto (Lisboa 30 de Maio de 1921 – Cascais 25 de Maio 2011) conhecida popularmente como “Cilinha”, foi a criadora e presidente do Movimento Nacional Feminino, uma organização de mulheres que durante a guerra colonial prestou apoio moral e material aos militares portugueses. Era esposa de Luís Supico Pinto, antigo ministro da Economia de Salazar

No cargo de criadora e presidente do Movimento Nacional Feminino, em 1961, atingiu grande popularidade e uma considerável influência política junto de Oliveira Salazar e das elites do Estado Novo. Visitou com muita frequência as tropas em África (tinha um carinho especial pela Guiné - a quem chamava a minha Guinézinha), promoveu múltiplas iniciativas mediáticas para angariação de fundos.

Granjeou um carinho muito especial dos militares da Guiné, mesmo daqueles que estavam nas antípodas (que eram quase todos) dos valores que defendia, pela sua coragem, deslocando-se aos locais mais isolados, sem quaisquer tipo de mordomias especiais, estando mesmo algumas vezes debaixo de fogo sem nunca demonstrar o mínimo de receio ou pânico.

A todos dava uma palavra de ânimo e conforto sempre com um semblante alegre e genuíno. A ela se deve a criação do mítico aerograma bem como a distribuição de livros e outros materiais em particular no Natal. Chegou a desafiar Salazar, que enfatizava o seu amor às colónias, a acompanhá-la numa das suas visitas a África, sem sucesso,  já que o homem nem a Badajoz foi comprar caramelos. Nunca saiu da sua zona de conforto.. a mesma que o acabou por matar!!!
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Nota do editor:

(...) Com a nossa chegada a Aldeia Formosa as mulheres locais acorreram em grupos à procura dos “periquitos” oferecendo os seus préstimos para a lavagem da roupa.

O dia da lavadeira era o mais esperado da semana no quartel. Vinham em rancho com os seus trajes coloridos, com a trouxa de roupa à cabeça e uma alegria contagiante nos rostos. Aguardavam impacientes junto ao sentinela a autorização para entrarem no quartel, o que geralmente acontecia ao meio da tarde, e era vê-las entrar em grande algazarra, de sorrisos rasgados, dispersando-se pelo quartel como rebanho comunitário acabado de chegar, do monte, ao povoado. (...) 

Guiné 61/74 - P22031: Historiografia da presença portuguesa em África (257): A "Expansão portuguesa na Guiné", por Maria Archer; em "O Mundo Português", revista de atualidades do Império, edição da Agência Geral das Colónias, abril de 1946 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Agosto de 2020:

Queridos amigos,
Neste número da revista Mundo Português, de abril de 1946, tendo Serpa Pinto na capa, a escritora Maria Archer, que viveu com a sua família alguns anos na Guiné, procede a um escorço da nossa presença entre os séculos XVI e XIX, procura ser rigorosa à luz dos conhecimentos da época. Nada de surpreendente encontrará aqui o leitor. No noticiário da revista ficamos a saber que o governador da Guiné determinou que se passasse a escrever conforme a ortografia e a fonética portuguesas os nomes indígenas de pessoas, coisas, acidentes geográficos e outros. Nos casos em que o nome do indivíduo não se acompanhe de apelido, dever-se-á suprir a falta com qualquer apelido português, à vontade do interessado.
Quando dois nomes designem o mesmo acidente geográfico, o nome português prevalecerá ao indígena, e, assim, a ilha de Canhabaque passou a nomear-se, simplesmente, ilha Roxa. Sambelchior passará a escrever-se Sam Belchior.

Um abraço do
Mário


A expansão portuguesa na Guiné, por Maria Archer

Mário Beja Santos

A escritora Maria Archer viveu alguns anos na Guiné Portuguesa, ao longo da sua carreira dedicar-lhe-á páginas calorosas, com elevado sentido memorial. Em "O Mundo Português", revista de atualidades do Império, edição da Agência Geral das Colónias, abril de 1946, porventura em associação com as Comemorações do V Centenário da Descoberta da Guiné, a escritora publicou um artigo intitulado “Expansão Portuguesa na Guiné”, epítome dos dados históricos conhecidos, alguns deles vieram posteriormente a ser retificados.

Abre com a referência à presença de comerciantes cabo-verdianos na Guiné, estabelecidos em Cacheu, referindo que em 1640 foi dada à povoação a categoria de Capitania, sujeita ao Governo de Cabo Verde. A situação na época é praticamente de ruína, a União Peninsular facilitara ataques de franceses, ingleses, holandeses, e os dois primeiros foram-se posicionando a Norte dos Rios da Guiné os franceses e os ingleses a Sul. “O trecho de costa que nos pertence, actualmente, é aproximadamente aquele que conseguimos manter, livre da presença de dominadores estrangeiros, até 1640”. Não foi bem assim, mas aceita-se. Refere a autora que no século XVII o tráfico negreiro era a grande fonte de comércio, exercido por gentes de várias proveniências, desde cabo-verdianos a holandeses. A autora releva a importância da ilha de Bissau, a construção de diferentes fortalezas e o início de guerras com os régulos da ilha de Bissau. “No final do século XVIII ainda não tínhamos ocupação efectiva na Guiné mas já possuíamos povoações fortificadas e várias praças-fortes, obras feitas com consentimento dos régulos. Havia a Praça de S. José de Bissau, a povoação de Geba, a Praça de Cacheu, a Praça de Ziguinchor, a povoação de Farim. Além das praças e povoações havia outros centros de povoamento de portugueses e cabo-verdianos”. Dito de outro modo, aventureiros de várias nacionalidades instalavam-se e comerciavam quando queriam, aproveitando a espúria presença portuguesa na Guiné. A Inglaterra tentou expandir-se neste território, anexou a ilha de Bolama à colónia da Serra Leoa, questão que será dirimida pelo presidente norte-americano Ulysses Grant.

Todas as dificuldades sentidas em Portugal, desde a presença napoleónica, ao constitucionalismo monárquico viverá toda a agitação da Guerra Civil e as profundas tensões que irão desembocar no fontismo, refletir-se-ão na presença portuguesa na Guiné. “Depois de 1834, pode-se dizer que a colónia viveu num permanente estado de revolta. Apesar disso, continuava mal guarnecida de efectivos militares, mal armada e municiada. De quando em quando as tropas portuguesas revoltavam-se, ou por falta de pagamento ou por reacção contra certos aspectos da política local, chegando a prender os seus capitães e governadores”. Maria Archer refere a política de Honório Pereira Barreto e termina o seu artigo com referência a um relatório oficial de 1841:
“Bissau tem 70 soldados, 22 peças, um quartel para 300 soldados e uma capela. Na povoação há só 5 casas telhadas. Todas as outras têm cobertura de colmo. A população está indisciplinada e só as principais pessoas obedecem ao governo. O gentio insulta os habitantes portugueses e exige-lhes tributos. Os pagamentos do governo são feitos em géneros, o que descontenta toda a gente. Geba, a 60 léguas de Bissau, tem um comandante nominal. É região rica e farta. O posto militar de Fá tem uma peça, um sargento, três soldados. Bolama só tem a feitoria de Caetano Nozolini e as povoações indígenas. Cacheu tem um quartel coberto de palha. A guarnição é de 40 soldados, há duas peças”. E Maria Archer termina apologeticamente dizendo que os portugueses do século XX receberam a Guiné empobrecida, desorganizada e rebelde.
Casuarinas na Praia de Varela
Cacine - Manipanso Nalu
Ilustração alusiva à Guiné publicada em O Mundo Português, abril de 1946
Maria Archer
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22013: Historiografia da presença portuguesa em África (256): Libelo de António de Saldanha da Gama contra a abolição da escravatura em "Memória sobre as colónias de Portugal situadas na Costa Ocidental de África"; 1814 (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22030: O nosso livro de visitas (209): Jean Soares, filho do antigo comerciante Mário Soares, de Pirada: fez o serviço militar em Portugal, em 1972/75, esteve na Trafaria e em Maquela do Zombo, Angola, foi para Paris, onde casou e teve filhos... Gostava de recuperar a nacionalidade portuguesa que perdeu e encontrar-se em Lisboa, em setembro/outubro de 2021, com conhecidos e amigos do seu pai

Foto nº 1 > Capa da revista do "Expresso", edição de 22 de janeiro de 1996. Tem quase a idade do Presidente [Mário Soares] mas uma vida ainda mais aventurosa. E um enigma.



Foto nº 2 > Cópia do nosso poste P20994 (*) 

Imagens enviadas pro Jean Soares (2021)

1. Mensagem de Jean Soares, que reside em França:

Date: segunda, 22/03/2021 à(s) 17:18
Subject: O comerciante Mário Soares de Pirada, Guiné-Bissau

Foi com grande emoção que li os artigos e testemunhas no seu blog sobre o meu Pai, Mário Rodrigues Soares, comerciante em Pirada.

Isto provocou em mim muitas recordações da minha infância (a criança na fotografia da visita do governador Sarmento Rodrigues, sou eu com 4 anos) (*); também me lembro o ataque a Pirada em junho de 1965, tinha 14 anos e assisti a tudo.

Obrigado às testemunhas.

Hoje estou a bater-me para recuperar a minha nacionalidade portuguesa que perdi, sem saber, devido ao decreto-lei nº 308-A/75 de 24 de Junho 1975 (Nasci numa província ultramarina antes da revolução.)

Fiz o serviço militar de 1972 a 1975 no BRT [ Batalhão do Reconhecimento das Transmissões], Trafaria [, Almada] e depois em Angola, em Maquela do Zombo

Passei à disponibilidade em Maio 1975 e fui logo para Paris onde fiz os meus estudos, casei e obtive a nacionalidade francesa.

Hoje o meu maior desejo é recuperar a nacionalidade portuguesa e a cédula militar que não consigo recuperar, para um dia poder mostrar aos meus netos as minhas raízes portuguesas.

Estarei em Lisboa em Setembro e Outubro [de 2021], ficarei muito contente em encontrar alguém para trocar impressões.

Os meus respeitosos cumprimentos
Jean Soares

P.S. - Junto envio também a capa da revista "Expresso", de  22 de Janeiro de 1994,   com a foto do meu Pai com a história dele um ano antes da sua morte.


2. Comentário do editor Luís Graça:

Obrigado, Jean Soares, pelo seu contacto. Graças à Internet hoje é mais fácil haver felizes reencontros com o passado, como este.  Como nós costumamos dizer aqui, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!

Ainda bem que nos encontrou e quer "matar saudades" da terra onde você (e a sua família) viveu e foi feliz. Imagino que tenha nascido na antiga província portuguesa da Guiné, hoje Guiné-Bissau)  aplicando-se ao seu caso o disposto no supracitado diploma legal (que estabeleceu normas sobre a conservação da nacionalidade portuguesa pelos portugueses domiciliados em território ultramarino tornado independente). 

Pode ser, entretanto,  que alguns dos nossos camaradas, com formação jurídica, o possam ajudar a recuperar o que perdeu, e que tanto estima; a cidadania portuguesa. 

No que diz respeito à sua caderneta militar, talvez não seja difícil obter uma certidão com o historial da vida militar do Jean Soares [ou João Soares ?], no Arquivo Histórico Ultramarino ou no Arquivo Geral do Exército. Vou encaminhar o seu mail para um dos nossos especialistas nesta área.

Quanto ao seu pai, o conhecido comerciante Mário Soares, de Pirada, vou-lhe mandar também uma lista dos postes com referências a ele... São cerca de um dezena e meia: poderá consultá-los livremente, são públicos.

2. Deixa-me entretanto fazer-lhe uma observação e uma pergunta (se nos quiser e puder responder ):

(i) a observação: o miúdo que aparece na foto n.º 2, acima, não pode ser o Jean Soares, com 4 anos, já que, pelas minha contas, terá nascido no princípio da década de 1950: ora a visita do Governador Sarmento Rodrigues a Pirada foi em maio de 1945;

(ii) a pergunta: o que se passou exatamente com o seu pai (e a sua família) logo a seguir ao 25 de Abril e à independência da Guiné-Bissau? O seu pai terá morrido em 1997, segundo o "Expresso", e relativamente novo (com cerca de 70 anos)... E já agora, com que idade se fixou na Guiné? 

Sobre estas e outras questões da história de vida do seu pai, há versões contraditórias (e algumas por certo fantasiosas) sobre o seu percurso e o seu destino: veja aqui, entre outros, este poste P20949 (**).

Já não me lembro se li ou não  o dossiê do semanário "Expresso", edição de 22 de janeiro de 1996,  sobre o seu pai (, e que penso terá sido trabalho do jornalista José Pedro Castanheira), "O outro Mário Soares", mas vou procurar obter uma cópia.

Se o Jean Soares sempre vier a Lisboa em setembro / outubro de 2021, e se houver condições para nos encontrarmo-nos, avise-nos com antecedência: o seu pai tem na Tabanca Grande pessoas que beneficiaram da sua hospitalidade e até sua sua amizade e que, decerto, irão desejar  poder estar  consigo.  

Eu pessoalmente não o conheci,  ao seu pai, mas muito ouvi falar dele, já no meu tempo (1969/71), nos sítios do Leste da Guiné por onde andei: Contuboel, Bafatá, Bambadinca... Mas até lá podemos trocar emails. (***)

Mantenhas (, como dizíamos em crioulo)... Luís Graça
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(***) Último poste da série >  3 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21846: O nosso livro de visitas (208): Afonso de Melo, ex-fur mil cav, EREC 2641 (Bula, 1970/72)

terça-feira, 23 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22029: (In)citações (182): Viúvas e viúvos da minha aldeia (em números) (António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo CAR)


1. Mensagem do nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga e Bissau, 1972/74) com data de 18 de Março de 2021 com uma curiosa estatística de viúvas e viúvos na sua aldeia:



VIÚVAS E VIÚVOS DA MINHA ALDEIA (em números)

Há já algum tempo, que dou comigo a pensar!... Quais terão sido as causas que tem levado a que tenham existido sempre muitas viúvas na aldeia de Molianos, em que os homens tem sido poucos os que tem ficado viúvos, o que ainda hoje acontece. O que me levou a tentar perceber o porquê, de tal diferença. Para isso, procurei, dentro do possível… fazer uma observação daquilo que tem acontecido desde meados da década de 1960 do século passado até aos dias de hoje.

Pelo que fui constatando durante essa viagem… a maior resistência das mulheres a certas doenças… ou não terem sido confrontadas com elas parece ter sido a principal razão para a sua longevidade. Num tempo ainda não muito distante, a esmagadora maioria dos homens na minha aldeia, quando casavam, tinham mais idade que as esposas, o que em alguns casos pode ter ajudado a contribuir para essa diferença. No entanto, aconteceram outras situações que levaram a que esse número se acentuasse ainda mais, que tem a ver com acidentes de viação e de trabalho. Durante a época acima referida, no que diz respeito ao século passado... aconteceram nove vítimas mortais, todos homens, em consequência de acidentes de viação e mais dois em acidentes de trabalho.

No século em que estamos a viver, apesar da intensidade de transito que se faz sentir, nada ter a ver com aquilo que acontecia no passado… registaram-se apenas cinco acidentes de viação com vítimas mortais, quatro homens e uma mulher, e mais um homem vítima em acidente de trabalho. No entanto, a grande diferença de óbitos, entre homens e mulheres, continua a ter como principal causa, problemas de saúde que se tem vindo a acentuar desde o inicio do século… com a agravante da maioria ter acontecido com pessoas com idades entre os sessenta e setenta anos. Não contando com mais alguns óbitos que aconteceram em que a idade avançada das pessoas leva a aceitar terem acontecido de forma natural. Desde o início do século em que estamos, aconteceram entre os homens na nossa aldeia, 26 óbitos, dos quais, 13 vítimas de doença oncológica, tendo os restantes sido consequência de várias patologias.

Com problemas de saúde no mesmo espaço de tempo, com idades não muito elevadas, ocorreram entre as mulheres quatro óbitos, três das quais vítimas de doença oncológica!… Atualmente, existem na aldeia de Molianos sessenta e quatro viúvas e cinco viúvos!...

Para a existência de um tão grande número de viúvas, os ex-combatentes têm dado um contributo importante.

Foram trinta e sete os jovens da nossa aldeia que passaram pelas guerras nas ex-províncias ultramarinas… dos quais treze tiveram a Guiné como destino, quatro deles já nos deixaram, três, vítimas de doença oncológica e um com problemas do foro cardíaco.

Em Angola estiveram dezassete, dez dos quais já não estão connosco, quatro foram vítimas de doença oncológica e os restantes com outras patologias.

Em Moçambique, foram cinco os que lá estiveram, três já cá não estão…

Em Timor esteve apenas um. Assim como em São Tomé e Príncipe o qual já nos deixou… Contas feitas, dos trinta e sete que andaram pelas ex-províncias ultramarinas, dezoito já partiram…

O mais idoso dos ex-combatentes que ainda por cá vai andando, foi também o primeiro da nossa aldeia a embarcar para a Guiné, é o Silva que fez parte da CCAÇ 618, era um dos apontadores da bazuca… (a daquele tempo), esteve em S. Domingos, Varela e Binar.

Estes são dados referentes à minha aldeia, o que pode não ter muito a ver com outras regiões.

António Eduardo Ferreira

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Nota do editor

Último poste da série de 7 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21864: (In)citações (181): Em memória de José Eduardo Reis Oliveira (1940-2021) (Belmiro Tavares, ex-alf mil, CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66)

Vd. poste de 3 DE AGOSTO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13458: Blogues da nossa blogosfera (67): Jovens da Aldeia de Molianos na Guerra da Guiné, no Blogue Molianos, viajando no tempo (António Eduardo Ferreira)

Guiné 61/74 - P22028: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte V: As nossas lavadeiras... e o furriel 'Pequenina'


 Guiné > Região de Quínara >Fulacunda 1972/74 >  Fonte velha

Foto (e legenda): © Jorge Pinto (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné], com a devida vénia



Guiné > Região de Cacheu > Teixeira Pinto > Março de 1973 > As lavadeiras no lavadouro público

Foto (e legenda): © Francisco Gamelas (2016). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte V (*)


Joaquim Costa, hoje e ontem. Natural de V. N. Famalicão,
vive em Fânzeres, Gondomar, perto da Tabanca dos Melros. 
É engenheiro técnico reformado.


As nossas lavadeiras… e o Furriel 'Pequenina'

 Com a nossa chegada a Aldeia Formosa as mulheres locais acorreram em grupos à procura dos “periquitos” oferecendo os seus préstimos para a lavagem da roupa.

O dia da lavadeira era o mais esperado da semana no quartel. Vinham em rancho com os seus trajes coloridos, com a trouxa de roupa à cabeça e uma alegria contagiante nos rostos. Aguardavam impacientes junto ao sentinela a autorização para entrarem no quartel, o que geralmente acontecia ao meio da tarde, e era vê-las entrar em grande algazarra, de sorrisos rasgados, dispersando-se pelo quartel como rebanho comunitário acabado de chegar, do monte, ao povoado.

Quem não viveu e/ou participou na guerra colonial, ouvindo falar das lavadeiras dos militares logo associa a alguém que lavava a roupa e não só. Nada de mais errado e injusto para a maioria destas mulheres: dignas, afáveis, competentes e que compreendiam melhor do que ninguém o sofrimento e angústias destes jovens, ansiosos por regressarem à terra e ao seio da família, desculpando-os de um ou outro pequeno devaneio, sabendo que nelas projetavam alguém bem longe para além do oceano. 

Não sou ingénuo ao ponto de não admitir situações em que, para além da roupa algo mais acontecia (mas sempre, voluntário e consentido), como aconteceria em qualquer outro ponto do mundo, mas que, seguramente na Guiné, eram a exceção que confirmava a regra.

Nada de muito diferente, salvaguardadas as devidas diferenças e contextos, dos supostos casamentos na parada em Tavira, das noites “quentes” no Forte de S. Francisco em Chaves bem como as juras de amor para sempre... até que o fim da instrução nos separe... em todos os quartéis de mobilização.

Não deixava de ser comovente ver camaradas que, numa ida a Bissau ou de férias a Portugal, faziam questão de levar uma lembrança para os amigos mais chegados e para a sua lavadeira. Arrisco a dizer que o faziam sempre de uma forma despretensiosa.

Do General ao soldado todos vibravam com o momento, quebrando a pasmaceira dos dias enfadonhos, rodeando a sua lavadeira, que a todos dava “troco” com os seus gestos e olhares, brincando e rindo com as tiradas brejeiras dos mais atrevidos mas nunca permitindo aproximações mais ousadas.

Era visível que estas simpáticas lavadeiras também vibravam com estes momentos, sendo estes, por ventura, dos poucos da sua vida em que se sentiam o centro das atenções e não apenas uma “mercadoria”, que a força das ancestrais tradições lhes impunham (análise demasiado simplista mas que não cabe aqui aprofundar).

Este serviço da lavagem da roupa era uma importante fonte de rendimento dando alguma qualidade de vida e dignidade a estas mulheres e à sua família. Contudo, as lavadeiras eram muito mais do que alguém que lavava as nossas roupas, eram uma autentica instituição, inorgânica, fazendo visitas semanais, quase de “terapia de grupo”, restaurando as nossas defesas ao proporcionar-nos alguns minutos de vida em sociedade, quase de normalidade, em contraponto à vida de “embrutecimento” da caserna e da guerra.

Algumas destas lavadeiras eram mulheres e familiares de muitos dos militares, milícias e guias africanos que trabalhavam connosco.

Infelizmente, a maior parte da nossa comissão como companhia de intervenção (sempre de casa às costas), privou-nos não só destes momentos de descompressão como do contacto com as populações, fundamentais para a nossa saúde mental.

Cada lavadeira lavava a roupa de vários militares mas nunca trocava uma única peça que fosse. Achava extraordinário como fixavam o nome de todos os militares e suas patentes. Mais extraordinário porque de 2 em 2 anos estes eram substituídos por outros, e assim sucessivamente ao longo dos anos.

A roupa do Furriel pequenina

Certo dia, a minha lavadeira chegou com uma grande trouxa de roupa à cabeça lavada e já separada pelos diferentes donos. Colocou-a junta à porta da caserna dos furriéis e ficou à espera que aparecesse alguém para a entregar. Como não apareceu ninguém foi à procura. Entretanto, chega um colega que pega na trouxe e começa à procura, na tentativa de encontra as suas peças. Deixou tudo numa grande desordem e não encontrou nada seu, nem podia já que esta não era a sua lavadeira.

Quando esta chega, quase ao mesmo tempo que nós (eu e mais dois camaradas - sem certezas julgo que o Carlos Machado e o António Gouveia) a rapariga fica muito preocupada e, ao mesmo tempo, indignada com o que fizeram à sua trouxa de roupa, desfazendo-se em desculpas com receio de ser despedida por desleixo. Começamos a separar as nossas peças tentando acalmar a simpática e eficiente lavadeira. Ela, um pouco mais calma e já com um sorriso nos olhos, tira as nossas mãos de cima da roupa e começa ela a distribuir: esta é do Carlos, esta é do António, esta é do furriel 'Pequenina'... esta é do Carlos, esta é do António, esta é do furriel 'Pequenina'….

Nem de propósito, este foi o dia em recebemos, pela primeira vez, a visita do “grande chefe” (General Spínola) a quem prestei honras militares com o meu pelotão com a farda bem lavada e engomada e o que fez Spínola retardar o gesto da continência dado o cheiro agradável a roupa lavada!..

Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > Visita do General Spínola – Eu (o primeiro do grupo à esquerda a seguir ao sentinela) e o meu pelotão prestando honras militares ao General (ao centro) com o seu bengalim e à direita o comandante do quartel, na altura, mais conhecido pelo “Baga Baga”  [, seria o ten cor Barata ou o seu sucessor,  Barros Basto, ten cor, cmdt do BCAÇ 3852 (Aldeia Formosa, 1971/73,]... percebe-se porquê! 

(...) Por estranho que pareça tenho muita pouca memória do dia do embarque (como eu compreendo o Zeinal Baba !).

Lembro-me de alguns familiares a despedirem-se dos filhos, maridos e namorados, todos chorosos e tristes, mas longe das cenas que conhecia pela televisão, do cais de Lisboa (Gare Marítima da Rocha Conde de Óbidos), com desmaios, gritos, muito “ranho” no nariz e muitos lenços acenar.

Nunca tinha andado de avião pelo que a expectativa era grande. Ouvia falar das hospedeiras... e do tratamento VIP que todos recebiam nas viagens de avião...(...)

segunda-feira, 22 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22027: In Memoriam (387): José Augusto Miranda Ribeiro (1939-2020) - Parte II: Foi professor primário e autarca em Condeixa-A-Nova... Em Cabo Verde, apaixonou-se pela fotografia



José Augusto Miranda Ribeiro (Lousã, 1939 - Condeixa, 2020): até sempre, camarada!


Cabo Verde > Ilha do Sal > CART 566 > c.out 1963 / julho 1964 > A paixão pela fotografia


1. Continuação do In Memoriam  respeitante ao nosso camarada José Augusto Miranda Ribeiro,  que nos deixou há três meses, a  20 de dezembro de 2020 (*)
 
Nasceu na Lousã em 1939. Lembra-se de quando a guerra acabou, em 1945, tinha seis anos, e o pai, que era professor e tinha seis filhos,  foi fazer exames à Figueira da Foz. Foi a primeira vez que a criançada viu o mar. (**)

Estudou em Coimbra, no liceu e depois no Magistério Primário.  Depois da tropa e da comissão de serviço em Cabo Verde e na Guiné, passou também dez anos da sua vida em  Angola (1965/1975, em Sá da Bandeira  e em Luanda. Fixou-se em Condeixa-A-Nova, depois do regresso da família (**), onde exerceu a profissão de professor do ensino básico. Foi também autarca, Reformou-sem como professor, em 1999.


2. No sítio da Câmara Municipal de Condeixa pode ler-se, com data de 21/12/2020, a seguinte  "Nota de pesar pelal morte do antigo vereador José Ribeiro
 
(...) A Câmara Municipal de Condeixa-a-Nova expressa as mais sentidas condolências pelo falecimento do antigo vereador e vice-presidente desta autarquia, José Augusto Miranda Ribeiro.

José Ribeiro exerceu funções de vereador da Câmara Municipal de Condeixa entre março e outubro de 1984, em substituição de outro vereador, para em 1986 assumir dois mandatos consecutivos na vereação municipal, até final de 1993.

José Augusto Miranda Ribeiro era reconhecido como um ser humano excecional, homem de causas e um lutador pela liberdade e que muito contribuiu para o desenvolvimento de Condeixa, enquanto vereador e vice-presidente da Câmara Municipal nos anos 80 e 90 do século passado. (...)

 
3. Foi fur mil, CART 566 (Ilha do Sal, Cabo Verde, outubro de 1963 a julho de 1964 / Olossato, Guiné, julho de 1964 a outubro de 1965) 

Entrou para a Tabanca Grande em 2013, tendo mais de 3 de dezenas de referências no nosso blogue.  E foi a dois nossos encontros nacionais, em 2013 e 2015.

Em Cabo Verde,  apaixonou-se pela fotografia (***).

(...) Em Cabo Verde comprei uma Yashyica Electro 35, a um primeiro sargento que se dedicava ao contrabando. Paguei 1750 escudos, equivalente ao meu ordenado mensal, como professor, no ano anterior em Portugal. Entrei na Guiné com a máquina (em punho) numa mão e a G3 na outra.

Na Ilha do Sal um soldado tinha encontrado à beira mar uma boía de vidro. Fiz-lhe um pequeno orifício, no local onde terá partido uma espécie de argola.Enchi-a de água para fazer de condensador. Claro, sem ferramenta nem material adequado foi difícil fazer um ampliador. Mas fiz. Com as tábuas de um caixote de sabão e o serrote e o martelo que fui pedir emprestado ao nosso pescador, lá ajeitei o dito ampliador. 

Pedi à minha irmã mais nova para comprar, em Coimbra, e me mandar um dispositivo para revelar as películas e o pó que misturei com água para fazer o líquido revelador de películas. Pedi também duas tinas uma para revelar o papel que teria de mergulhar por breves segundos no líquido revelados de fotografias e logo em seguida, na outra tina, teria de mergulhar por mais tempo as fotografias no líquido fixador. Dentro do ampliador tinha um espelho e uma luz branca que projectava raios difusos, um condensador (feito com a boia já referida) que transformava os raios difusos em raios paralelos. Em seguida ficava a película (negativo do filme).

Mais à frente um tubo que tinha a objectiva da velha máquina de fotografar e por fim o papel de fotografia que segurava na parede.A focagem era feita andando com o tubo para dentro ou para fora do caixote, só com a luz vermelha. Quanto mais longe estivesse da parede maior era a fotografia, mas mais imperfeita ficava. Depois apagava a luz vermelha e acendia a branca, por breves segundos, que iria marcar o preto da fotografia.

Fiz centenas que vendi barato, porque também não eram muito perfeitas. (...)


4. Deixou-nos, nomeadamente,  oito postes com memórias fotográficas de Bissorã e do Olossato (***). Fomos recuperar e reeditar algumas das suas fotos de Cabo Verde e da Guiné, publicadas quer no nosso blogue quer na sua página do  Facebook.




Cabo Verde > Ilha do Sal > CART 566 (1963/64>  Um dia de serviço




Cabo Verde  > Ilha do Sal > CART 566 (1963/64) > Uma brincadeira própria dos 20 anos



 Cabo Verde > CART 566 (1963/65) > Viagem de Cabo Verde para Bissau num velho navio, o NPR   Lima, que logo a seguir foi para a sucata.




Guiné > Região do Oio > Bissorã > CART 566 (1963/65) >  O José Augusto Ribeiro. com a mascote Tróia, falecida em combate.


Gyuiné > Região do Oio > CART 566 (1963/65> Olossato > Furriel Ribeiro e 1ºs Cabos de uma Secção do 1.º Gr Comb




Foto (e legenda): © José Augusto Miranda Ribeiro  (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

(Continua)
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Notas do editor:
 


(***) Vd. poste de 9 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13995: A minha máquina fotográfica(4): (i) Comprei em Cabo Verde uma Yashica Electro 35 a um primeiro srgt que se dedicava ao contrabando; e (ii) improvisei um estúdio de fotografia (José Augusto Ribeiro, ex-fur mil da CART 566, Cabo Verde, Ilha do Sal, outubro de 1963 a julho de 1964, e Guiné, Olossato, julho de 1964 a outubro de 1965)

(****) Vd. postes de:

14 de janeiro de  2013 > Guiné 63/74 - P10939: Memória dos lugares (205): Olossato, anos 60, no princípio era assim (1) (José Augusto Ribeiro)

19 de janeiro de  2013 > Guiné 63/74 - P10964: Memória dos lugares (206): Olossato, anos 60, no princípio era assim (2) (José Augusto Ribeiro)

24 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11147: Memória dos lugares (218): Olossato, anos 60, no princípio era assim (4) (José Augusto Ribeiro)

26 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11157: Memória dos lugares (219): Olossato, anos 60, no princípio era assim (5) (José Augusto Ribeiro)

28 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11171: Memória dos lugares (219): Olossato, anos 60, no princípio era assim (6) (José Augusto Ribeiro)

Guiné 61/74 - P22026: In Memoriam (386): José Augusto Miranda Ribeiro (1939-2020) - Parte I: Era professor primário aposentado, natural da Lousã, viveu dez anos em Angola (1965-75), antes de se fixar em Condeixa... Conhecemo-nos em Monte Real, em 2013.


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > 8 de junho de 2013 > VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande > Três "velhinhos" da guerra da Guiné: José Augusto Ribeiro (Condeixa), Rui Silva ( Santa Maria da Feira) e Carlos Paulo (Coimbra). (*)

O Paulo e o Ribeiro eram, naquele sítio e momento, se não me engano, os "velhinhos" dos mais "velhinhos", em termos de antiguidade na tropa... Pertenceram à CART 566 (que veio de Cabo Verde, 1963/64. para reforçar o TO da Guiné, no início da guerra, 1964/65)... Por seu turno, o Rui Silva pertenceu à CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67). Conversa puxa conversa. andaram nos mesmos sítios e na mesma guerra. Daí esta "foto histórica"...

Foto (e legenda): © José Augusto Ribeiro (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Bogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Do lado esquerdo, dois dos homens que "abriram" a guerra: o José Augusto Miranda Ribeiro (Condeixa) e o Joaquim Luís Mendes Gomes (Mafra / Berlim), o nosso poeta das "Baladas de Berlim"... Ambos são do tempo do caqui amarelo... Recorde-se que o José Augusto [Miranda] Ribeiro foi fur mil da CART 566, Cabo Verde (Ilha do Sal, Outubro de 1963 a Julho de 1964) e Guiné (Olossato, Julho de 1964 a Outubro de 1965)... O nosso poeta, J. L. Mendes Gomes, esse, foi alf mil da CCAÇ 728 (Cachil, Catió e Bissau, 1964/66), O Ribeiro estava a falar com o Jorge Rosales,  infelizmente também já falecido, o primeiro régulo da Magnífica Tabanca da Linha (, à sua direita, o  Zé Manuel Dinis). (ªª)


Foto (e legenda): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
  


José Augusto Ribeiro 
(Lousã, 1939 - Condeixa, 2020)
 
1. Quando o Carlos Vinhal preparava o poste de aniversário do nosso camarada José Augusto Miranda Ribeiro, nascido a 8 de abril de 1939, foi à procura de elementos para a sua "prova de vida" e, ao consultar a sua página do Facebook foi surpreendido pela notícia da sua morte, ocorrida já há 3 meses, em 20 de dezembro de 2020.

Foram várias as manifestações de pesar dos seus familiares, amigos e antigos alunos, de que selecionamos três excertos:

JJ FalcãoRibeiro > 20 de dezembro de 2020 ·

(...) O meu Pai faleceu hoje, José Augusto Miranda Ribeiro,  parte o meu herói, o melhor Pai, o melhor marido, o melhor avó e o melhor sogro...

Tantas guerras enfrentaste, a ditadura, a perseguição política, a guerra colonial, a guerra civil em Angola, sempre te levantaste, só mesmo o Inimigo invisível te podia fazer tombar.

Para sempre meu Pai! Um beijo para ti ! (...)

Elisabete Silva > 20 de dezembro de 2020 ·

(...) Ainda tinha tanto para ensinar. É com muita pena mesmo que recebi a notícia. Grande professor que foi, para mim, na escola primária de Alcabideque, e sempre me acompanhou no meu percurso escolar depois. Grande Homem em todo o seu ser. Muita força à família. Um abraço sincero. (...)

Carolina Ribeiro > 22 de dezembro de 2020 ·

(...) Sobre um avô que sempre foi mais que um avô! Sobre um avô que nos ensinou o verdadeiro significado de bondade, amor, felicidade e justiça. Sobre um avô que vivia para as netas e nunca hesitou em fazê-las felizes. Sobre um avô que partiu mas que deixa a maior saudade, mas também as melhores memórias por tudo o que fez por nós. Sobre ti e para ti, meu avô Zé. (...)

2. O José Augusto Miranda Ribeiro foi fur mil, CART 566 (Ilha do Sal, Cabo Verde, outubro de 1963 a julho de 1964 / Olossato, Guiné, julho de 1964 a outubro de 1965), estava aposentado como professor do ensino básico; era natural da Lousã e vivia em Condeixa, depois de 10 anos em Angola (1965/1975, em Benguela e em Luanda).(***)

Entrou para a Tabanca Grande, em 9 de janeiro de 2013 (****). Conhecemo-nos nesse ano, em Monte Real. O José Augusto Ribeiro era um pessoa amável, sociável, bem humorada,  e compareceu ainda no nosso X Encontro Nacional, em 2015.

Vamos recordá-lo aqui em dois postes, começando pela sua história de vida (***)

(i) regressei da Guiné no dia 1 de novembro de 1965;

(ii) foi colocado como professor na Escola do Magistério de Coimbra. 

(iii) casou-se  nove meses depois, do regresso da Guiné, no dia 31 de Julho de 1966;

(iv) o casal partiu  para Angola 15 dias depois do casamento, no paquete Império...


Angola > Lunda > c. 1973 >
Uma família feliz: José Augusto,
a esposa Adriana. o filho João
e a filha Helga


Mas vejamos o que deixou escrito em 2015 (***):

(...) "Fui trabalhar como professor em Sá da Bandeira, onde nasceu o filho João, que tem agora 48 anos, casado há já 20 anos, mas não tem descendentes.

"Em 1968, saí de Sá da Bandeira e fui para Luanda, a 1100 Km,  trabalhar no Banco de Angola, para dar oportunidade à minha mulher de tirar o curso do Magistério. Teve a nota de 17 valores, que nunca ninguém ultrapassou. 

"Regressei de Angola em 1975 e voltei a trabalhar como professor em Condeixa, até à aposentação em 1999. 

"Em Luanda nasceu a filha Helga que tem agora 43 anos e 3 filhas. A Carolina tem 17 anos e está no 12.º ano e pretende ser arquiteta, a Matilde tem 13 anos e frequenta o 8.º ano e, por fim a Filipa faz dois anos no próximo domingo. Sou um "avô babado"  e, com muito gosto, sou também o taxista delas todas, e da avó Adriana, que nunca teve nenhum acidente, mas deixou de conduzir desde que lhe foi aplicada, há 4 anos, uma prótese, na anca direita". (...) 

Para a esposa Adriana, os filhos João e Helga e para as netas, Carolina, Matilde e Filipa, e demais família e amigos íntimos, vão as nossas sentidas manifestações de pesar e de solidariedade na dor pela perda do seu querido esposo, pai e avô e nosso amigo e camarada José Augusto Miranda Ribeiro. (****)
 
(***) Vd. poste de 2 de outubro de  2015 > Guiné 63/74 - P15190: História de vida (40): Casei-me, em 31/7/1966, nove meses depois do regresso da guerra; quinze dias depois, embarquei no paquete Império, a caminho de Angola onde trabalhei como professor primário e quadro bancário (José Augusto Miranda Ribeiro, ex-fur mil, CART 566, 1963/65)

Guiné 61/74 - P22025: Notas de leitura (1348): "A Batalha do Quitafine", por José Francisco Nico; edição de autor, 2020 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Março de 2021:

Queridos amigos,

O contributo do General José Francisco Nico dá descrição do que foram as operações que conduziram à completa neutralização da artilharia antiaérea do PAIGC no Quitafine tem grande significado, tanto quanto se sabe é o primeiro relato que vem a público com tal minúcia, acompanhado de inúmeros elementos visuais correspondentes das sucessivas operações. 

Sabia-se pelos relatos do general Diogo Neto da resiliência quanto à resposta aérea no período conturbado de 1973, mas aqui também o autor traz importantes aportes. Do princípio ao fim no seu relato o autor não ilude a fragilidade da posição portuguesa no espectro das oposições ao colonialismo e deplora não se ter encontrado uma matriz de identidade multirracial, que foi muito apoiada pelas teses federalistas que chegaram tarde e a más horas. Não se pode pôr a História em tribunal, mas tivesse havido uma entidade política dialogante com os movimentos de libertação, a tempo e horas, é bem provável que se tivessem evitado os excessos que hoje é muito fácil criticar, sobretudo quando não se pôs as mãos na poda de uma solução.

Um abraço do
Mário



Memórias da destruição da artilharia antiaérea do PAIGC, na península do Quitafine (2)

Mário Beja Santos

Trata-se de uma edição de autor, a segunda, com data de novembro de 2020. Esta obra do Tenente-General Piloto-Aviador José Francisco Fernandes Nico encerra abundantes e por vezes considerações sobre estratégia político-militar de guerrilha e contraguerrilha, tece considerações altamente críticas sobre os acontecimentos do 25 de Abril e o processo da descolonização e dá-nos um quadro das diferentes operações que decorreram entre outubro de 1967 e janeiro de 1970 que levaram à eliminação sistemática da artilharia antiaérea do PAIGC pela Esquadra 121 do Grupo Operacional 1201. 

Chegou agora o momento de acompanhar o seu relato das operações que se iniciaram em 7 de março de 1968. Era patente que o PAIGC se convencera que a disseminação de metralhadoras antiaéreas na península do Quitafine seria suficiente para garantir o estatuto de zona libertada. Tinham chegado recentemente os G-91, bem capazes de enfrentar a ameaça dessas armas. A máxima era a de, logo que detetadas estas posições antiaéreas, atacá-las de imediato. Permanece o mistério de como a cúspide do PAIGC sonhou com a possibilidade de garantir um território inexpugnável face à Força Aérea Portuguesa.

O autor dá-nos conta das particularidades operativas do avião Fiat G-91 que é tida como uma máquina excecional, era um recém-chegado ao teatro de operações da Guiné. E o autor discreteia sobre o erro catastrófico de o PAIGC acreditar no estabelecimento de posições fixas, construindo mesmo linhas de defesa com trincheiras, a Força Aérea Portuguesa conhecia as posições e dispunha de meios para as volatizar, como se comprovou. 

Inicia-se, pois, um combate que se prolongou até janeiro de 1970. É uma narrativa cheia de peripécias, há aviões atingidos e pilotos milagrosamente não atingidos. Num ponto do Quitafine, Cassebeche, dentro de uma área conhecida pelos pilotos-aviadores como o Bacalhau, o PAIGC começou a construir espaldões para esta artilharia, a reação foi a operação Regar o Prestígio, teve resultados favoráveis. Logo a seguir ao primeiro ataque houve a repetição com quatro aviões à carga máxima, foram largadas no local 24 bombas, os pilotos tinham aprendido a lição que não deviam cair na armadilha de tiro ao alvo. Seguiu-se um período de acalmia até que em março voltaram a detetar movimentações do PAIGC com novos espaldões e detetou-se uma ZPU-4, seria a primeira destas armas na Guiné. 

Seguiu-se a Operação Martelada III, logo no dia 7 desse mês, teve resultados importantes, os aviões tinham sido rearmados com bombas de fragmentação, foram lançadas nas matas circundantes, no reconhecimento detetou-se que havia uma ZPU e cinco posições periféricas que podiam ter metralhadoras. Nasceu depois a ideia de nova operação, veio a ser denominada Tempestade Betelgueuse, consistiu num heliassalto que colocou no terreno 190 homens, paraquedistas e fuzileiros. A operação não foi particularmente feliz, houve erros de sincronização. 

Na sequência de uma operação durante os trabalhos do asfaltamento da estrada Buba-Aldeia Formosa encontrou-se uma pequena pasta preta transportada por guerrilheiros, que se revelou de grande importância, o PAIGC insistia em manter a sua artilharia antiaérea, o General Spínola decretou que iria haver um heliassalto, e assim ocorreu a Operação Vulcano, o inimigo resistia bem e mantinha a capacidade antiaérea. É nesse contexto que se lança um ataque à posição após a Operação Vulcano, as coisas correm mal ao PAIGC.

Logo a seguir o autor dá-nos pormenores sobre as derradeiras ações de contraguerrilha antiaérea, o seu pico foi a Operação Cravo Azul, 20 de janeiro de 1970, acabou-se a artilharia antiaérea do PAIGC no Quitafine. 

A caminhar para o termo da sua narrativa, o General José Francisco Nico disserta sobre outras ações antiaéreas do PAIGC e há para ali trechos emocionantes como o avião atingido pelo Tenente-Coronel Costa Gomes que se ejetou a centenas de metros do aquartelamento de Gandembel, teve a sorte do seu lado, ao fim da tarde pôde reunir como normalmente fazia com o Governador e Comandante-Chefe, na Amura. 

Há igualmente a descrição do abate por míssil Strela na área de Madina do Boé do Tenente-Coronel Almeida Brito, em 28 de março de 1973. 

Depois de uma reflexão acerca da ajuda humanitária sueca seguem-se os estranhos acontecimentos da presença de um farto dispositivo antiaéreo perto do antigo quartel abandonado de Sangonhá, algo de incompreensível, mas veio-se a apurar que se trataria de uma filmagem para simular a tomada de um quartel, foi um revés completo. O último suspiro desta artilharia antiaérea do PAIGC ocorreu no corredor de Guilege durante a Operação Pérola Azul.

Nas conclusões, o autor reflete sobre os conceitos de defesa antiaérea e antiaérea ofensiva.

“Inicialmente, o armamento antiaéreo do PAIGC procurava limitar a capacidade de intervenção da aviação quer isoladamente em acções autónomas, quer no apoio às forças de superfície. Tratou-se de um requisito objectivo para eliminar o único factor de assimetria favorável às nossas forças, a componente aérea. O emprego desse armamento teve uma função visivelmente ofensiva e destinava-se a provocar atrição. Foram os tempos das emboscadas antiaéreas, em que as armas eram colocadas em posições dissimuladas na orla das matas ou mesmo razoavelmente encobertas pela vegetação”

Houve episódios de alvejamento, as emboscadas antiaéreas foram retomadas a partir de março de 1973 com os mísseis Strela-2. E o autor insiste no erro crasso que se praticou de teimar numa guerrilha com posições fixas. Fica-se igualmente a saber que a partir de junho de 1970 a artilharia antiaérea do PAIGC nunca mais foi utilizada para tentar interditar qualquer área.

Num apontamento à parte o autor fala sobre os apoios intermédios do PAIGC tanto no Senegal como na Guiné Conacri, dissertando depois sobre os acontecimentos das ofensivas do PAIGC a partir de março de 1973 e a resposta da Força Aérea para conter o adversário, efetuando ataques na área fronteiriça.

Chegou a hora de contabilizar os resultados do conjunto de operações levadas a efeito na península do Quitafine e termina o seu trabalho deplorando a falta de benefícios advindos da chamada guerra de libertação, falhou o objetivo da constituição de uma comunidade multirracial e pluricontinental: 

“A história dos últimos 46 anos da Guiné-Bissau permite concluir que, em vez de o desastre incentivado pelo Sistema adversário que nos atacou, sob a direcção da ONU, podíamos ter continuado a ser a mesma entidade política, certamente com características compagináveis e até mesmo impostas pelos avanços sociais inerentes à cultura ocidental onde estamos inseridos, - à época era essa a vocação da grande maioria do povo português como era da maioria dos guineenses, e hoje estaríamos certamente muito melhor. Especialmente o povo guineense. É esta a minha convicção”.

Como se teria parturejado tal entidade política, depois de tão sangrentos anos de luta, o autor não nos dá explicação ou oportunidade de ajuizar como se teria processado tal via de reconciliação.
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22009: Notas de leitura (1347): "A Batalha do Quitafine", por José Francisco Nico; edição de autor, 2020 (1) (Mário Beja Santos)

domingo, 21 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22024: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (25): Curso, gratuito, "online", sobre "Iniciação à Prova de Vinhos": promovido pelo Turismo de Portugal, com a duração de 2,5 horas ... mas tem de ser feito até ao fim deste mês


Guiné-Bissau > Região de Gabu  > Ponte Caium > Ao lado de um memorial aos mortos do 3º Gr Comb da CCAÇ 3546 (1972/74) ,  ainda existia em 2010, no tabuleiro da ponte, esta base de um nicho com a inscrição "Nem só de pão vive o homem. [Guiné] 72-74".

Foto (e legenda): © Eduardo Campos (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Cacheu > São Domingos > CCS/BCAÇ 1933 > Novembro de 1968 > O alf mil SAM Virgílio Teixeira (o segundo a contar da esquerda), a ajudar a descarregar garrafões de vinho, alguns dos quais têm o rótulo do Cartaxo (presumivelmente, da Adega Cooperativa do Cartaxo).

Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Nem só de pão vive o homem... Também precisa de poesia para viver (e hoje, 21 de março, até é o Dia Mundial da Poesia, um dia que   foi criado, em 1999, na 30.ª Conferência Geral da UNESCO; também é Dia Internacional das Florestas...). 

Mas não vamos falar de poesia, mas de vinho, se bem que um bom vinho seja "poesia engarrafada":  "wine is bottled poetry" [a autoria da metáfora é a tribuída a um poeta, que não era francês nem português, mas  da terra do "Scotch", Robert Louis Stevenson (1850-1894), o  conhecido autor de "A Ilha do Tesouro":  quem não o leu na adolescência ? É uma obra da literatura universal que faz parte do plano nacional de leitura, 7º ano].

Hoje o que vos "oferecenos" não é nenhum prato "especial, anti-covid", é a oportunidade de fazer, de borla, um curso de "Iniciação à prova de vinhos", disponível aqui na  plataforma Nau.


2. O que é a NAU? ...

“NAU – Ensino e Formação Online para Grandes Audiências” é um projeto online, pioneiro a nível nacional, de suporte ao ensino e formação, dirigido a grandes audiências.

(...) "É um serviço desenvolvido e gerido pela Unidade FCCN da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) que permite a criação de cursos em formato MOOC (Massive Open Online Course), ou seja, cursos abertos e acessíveis a todos, produzidos por entidades reconhecidas e relevantes na sociedade, que contam com a participação de milhares de pessoas."

Integra-se na missão (nacional) de promover: (i) o desenvolvimento digital, (ii) a inclusão e a literacia digitais, (iii) a educação e (iv) qualificação da população ativa.


3. Mas vamos ao curso, que o tempo escasseia:

(i) promovido pelo Turismo de Portugal; 
(ii) é gratuito; 
(iii) tem uma carga horária de duas horas e meia; 
(iv) termina no fim deste mês; 
(v) tem avaliação e certificado de aproveitamento (respostas certas a mais de 50% do teste final); e
 (vi) é um dos cursos da plataforma NAU com maior número de matriculados (já cerca de seis mil).

Público-Alvo

Iniciação à Prova dos Vinhos é um curso promovido pelo Turismo de Portugal direcionado para profissionais do setor, estudantes e o público em geral que tenham interesse em conhecer mais sobre esta área.

Objetivos de Aprendizagem

Após a realização deste curso o formando deve ser capaz de:

1 - Descrever as etapas metodológicas do exercício de degustação;
2 - Selecionar o copo ideal e organizar a sala de prova;
3 - Explicar os principais fatores que contribuem para a correta avaliação da cor do vinho;
4 - Descrever o que são vinhos cristalinos, límpidos e turvos, estabilidade biológica;
5 - Executar os principais métodos no exame olfativo e gustativo;
6 - Descrever Potencial de persistência aromática, adstringência, causticidade e efervescência;
7 - Descrever e explicar a consistência do vinho;
8 - Aplicar a correta adequação do vinho à iguaria.

Atividades

Neste curso, o promotor pretende ir muito mais além do "gosto ou não gosto", ou do
“sou como o Jacinto, tanto faz branco como tinto”, 
conseguindo dar resposta a perguntas como:

  • Que estilo de vinho?
  • Apresenta a tipicidade do seu terroir e da sua casta?
  • Estará no momento ótimo para ser servido?
  • Como devo servi-lo?
  • A que temperatura?
  • Decantar?
  • Com que copo?
  • Será adequado ao gosto das pessoas a quem se destina?
  • Será adequado à iguaria ou ao momento?
 Fonte: Excertos de: Nau - Sempre a Aprender > Curso de Iniciação à Prova de Vinhos (com  a devida vénia...)

Para saber tudo sobre o curso, clicar aqui:

Guiné 61/74 - P22023: Blogues da nossa blogosfera (155): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (64): Palavras e poesia


Do Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.


REFLEXÃO SOBRE A LIBERDADE

ADÃO CRUZ

(Auguste Rodin, O pensador)

A Liberdade é um conceito que não é fácil de entender. A Liberdade é um conceito multifacetado que nos obriga a uma reflexão profunda mas clara, uma reflexão que possa constituir uma espécie de calibração para todos nós.

Na minha maneira de ver, a Liberdade, nas suas inúmeras vertentes, não pode existir fora de nós se não existir dentro de nós. E para que ela exista dentro de nós tem de ser racional, tem de assentar em três grandes pilares, o Pensamento, a Razão e o Amor à Verdade, as grandes riquezas do ser humano. O Pensamento como coração e cérebro do discernimento filosófico, a Razão como validação desse pensamento, tendo por base o conhecimento científico, único caminho da Verdade, ainda que muitas vezes difícil e sinuoso. E o Amor à Verdade, como sangue ou seiva que o percorre e alimenta.

Só tendo consciência plena dessa Liberdade individual, da nossa Liberdade interior, só tendo consciência de que não nos enganamos a nós mesmos, seremos livres para poder entender e ser capazes de defender a Liberdade ou as liberdades fora de nós, sejam elas de que natureza forem, existenciais, laborais, sociais e políticas. Não falo, propositadamente, em liberdade religiosa ou em liberdade de crenças. Qualquer pessoa tem o pleno direito de acreditar no que quer que seja, no entanto, na minha maneira de ver, não podemos compreender que o faça livremente, dado que qualquer crença ou religião assenta em premissas não racionais, isto é, premissas que tornam impossível a conquista da Liberdade Interior.

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Nota do editor

Último poste da série de 14 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22005: Blogues da nossa blogosfera (154): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (63): Palavras e poesia

Guiné 61/74 - P22022: Blogpoesia (725): "Cacho de uvas"; Quando não há pão..."; "Chove nas vielas" e "Suavemente", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. A habitual colaboração semanal do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) com estes belíssimos poemas, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante esta semana:


Cacho de uvas

Família numerosa de filhos.
Cada um o mais saboroso.
Brilham ao sol e chuva.
Sabem a mel no calor de Agosto.
Cada ramada é um altar de prendas.
Enchem o lagar numa noite de canseira.
A fermentação do mosto, um milagre ali mesmo à vista.
Sua transformação em vinho.
Algum dele tem mesmo honra de ir ao altar,
Para ser o sangue do Criador.
Fruta abundante entre todas abençoada.


Berlim, 15 de Março de 2021
8h53m
Jlmg


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Quando não há pão...

O pão é escasso para a fome geral.
Sua mãe é a injustiça.
Há quem se aproveite com o que é de todos.
A lei que tudo rege quem a ditou
Foi o Criador.
Sem discriminar.
A ganância gera este clima de guerras geral
Que avassala o mundo.
Depois não se queixem das pandemias
Que arrasa tudo.
Não há fortes nem fracos.
Ficam todos esmagados e humilhados.


Berlim, 16 de Março de 2021
1051m
Jlmg


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Chove nas vielas

Estão molhadas as vielas dos bairros de Lisboa.
Chovem sonhos enamorados.
Uma fonte inesgotável.
Os tempos que passaram.
As saudades nunca secam.
São estrelas nas noites negras.
São vida da alma dorida.
Se foram e não voltam.
Quem nos dera.
É a lei que Deus ditou...


Berlim, 17 de Março de 2021
21h9m
Jlmg


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Suavemente

Melodia suave deleita e consola.
Fruto saboroso dum talento do som.
Partilhado e oferecido gratuito.
Fonte de sonho.
Fica feliz quem a ouve e saboreia.
O talento é dado.
Retê-lo para si, seria ingratidão.
Cada um tem seus talentos e dotes,
Para servir à mesa da amizade.
É assim que foi escrito na lei,
O seu Autor final.


Berlim, 19 de Março de 2021
18h00m
Jlmg

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Nota do editor

Último poste da série de 14 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22004: Blogpoesia (724): "Pelas esquinas das vielas"; "Sacadas de flores"; "Mar das imperfeições" e "Os lampiões das vielas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728