quarta-feira, 28 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22147: Historiografia da presença portuguesa em África (260): Corografia cabo-verdiana das ilhas de Cabo Verde e Guiné, 1841-1843 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Abril de 2021:

Queridos amigos,
Que importância se pode atribuir às descrições do então Tenente do Corpo de Engenharia que terá percorrido com algum cuidado uma Guiné Portuguesa ainda sem fronteiras definidas no final da década de 1830? Traz-nos elementos esclarecedores de uma presença portuguesa em regiões do Litoral, na região dos rios, uma presença sem profundidade no Interior, e já não se fala de estabelecimentos para além do Tombali, veja-se o mapa de 1843. Tudo precário, com compras de negociantes, uma tropa indesejável, padres degredados, os franceses a cercar o Casamansa. Poucos anos depois da publicação desta Corografia Cabo-Verdiana é a vez de Honório Pereira Barreto vir apelar às autoridades em Lisboa para cuidarem da Guiné, uma colónia praticamente reduzida a praças e presídios, e tudo parecia que estava condenada à extinção. Atenda-se a estes documentos da época para melhor se perceber como decorreu a luta pela independência.

Um abraço do
Mário


Corografia cabo-verdiana das ilhas de Cabo Verde e Guiné, 1841-1843 (2)

Mário Beja Santos


José Conrado Carlos de Chelmicki é autor da Corografia Cabo-Verdiana ou Descrição Geográfico-Histórica da Província das Ilhas de Cabo Verde e Guiné, em dois volumes, tendo sido o primeiro publicado em 1841. Este Tenente do Corpo de Engenharia nasceu em Varsóvia, é um jovem quando vem combater pela causa liberal em Portugal, distingue-se pela sua bravura, foi Cavaleiro da Ordem de Cristo, da Torre e Espada, de Nossa Senhora da Vila Viçosa, igualmente condecorado em Espanha, distintíssimo oficial colocado em vários pontos do país, deve-se-lhe uma obra singular, uma descrição ampla e certamente documentada de uma Guiné que poucos anos depois da publicação do Tomo I é alvo de um documento que vem confirmar o que ele observara na sua digressão numa Guiné sem fronteiras, refiro-me concretamente à Memória da Senegâmbia, de Honório Pereira Barreto.

Recorde-se o que já se escreveu anteriormente. Começa por nos dizer que a Costa da Guiné que nos antigos portugueses abrangia o espaço compreendido entre o Rio de Senegal e a Serra Leoa, começou a ser descoberto depois que Gil Eanes, pelos anos de 1433, dobrou o Cabo Bojador. Dá-nos depois a dimensão do refluxo, dizendo que ainda em 1650, o distrito da Guiné, que pertencia à capitania de Cabo Verde, começava no Rio Sanaga (Senegal), estendendo-se até ao princípio do distrito da Serra Leoa. A sua descrição começa no Rio Casamansa, dizendo que na sua embocadura tem o Ilhéu dos Mosquitos, “agora segundo nos consta ocupado pelos franceses; este rio dista da foz do Gâmbia vinte léguas. No Casamansa fica situado Ziguinchor. Dali até ao Rio de Cacheu, ou de S. Domingos, toda a terra é habitada por Felupes. O Rio de Cacheu tem duas entradas, vinte léguas acima da foz do rio está a Praça de Cacheu. Do Sul, a primeira terra de frente de Bolor é a Mata de Putama, ponta cheia de arvoredo e que é terra de Felupes. Daqui para Bissau há três caminhos, o primeiro entre a terra dos Felupes e Papéis; o segundo, por fora, pelo Canal das Caravelas ou pelo Canal das Âncoras; o terceiro, partindo da Mata de Putama e correndo a terra dos Felupes”.

Fala pormenorizadamente de S. José de Bissau, de várias ilhas dos Bijagós, situa perfeitamente a embocadura do Rio Grande, dizendo que houve povoações e estabelecimentos portugueses de que só restam alguns sinais.
Continuando o percurso, fala do Rio dos Tombalis dizendo que os moradores são Beafadas e que daqui à boca do Rio Nuno são trinta léguas de costa, habitadas por Nalus. Mudando de agulha diz que a Guiné Portuguesa é dividida em dois distritos: o de Bissau e o de Cacheu. O distrito de Cacheu abrange Cacheu, Ziguinchor, Bolor e Farim; terá dois mil habitantes sujeitos ao domínio português, espalhados por todos estes pontos, incluindo 93 soldados que os guarnecem. Ziguinchor situa-se no Rio Casamansa nas terras dos Banhus e tem comunicação pelo interior com o Rio Gâmbia. “Negoceia-se aqui com os gentios Felupes, Cassangas, Banhus e Mandingas, comprando cera, arroz, marfim, couros de vários animais a troco de contas miúdas, ferro, pólvora, alambre (âmbar), cristal e cola”. E logo regista a crescente presença francesa no Casamansa, fazendo notar que no Tratado de Paz celebrado em Paris em 1814 fora reconhecido o Rio de Casamansa como propriedade da Coroa de Portugal, e sugerindo que o Governo devia tomar esta violação em consideração. Descreve Ziguinchor, adiantando que a sua guarnição em 1836 era de nove soldados, admitindo que ao tempo em que escreveu a sua corografia não fosse maior.

Falando de Cacheu, adianta que é cabeça de concelho e distrito do mesmo nome, situada na terra de Papéis e Brames. No princípio era uma feitoria, em que habitaram alguns negociantes portugueses, comprando escravos, cera e marfim dos gentios Papéis. Atualmente, “aquilo que chamam casa-forte não tem de fortaleza senão o ser de pedra e cal”. Quase sempre está Cacheu em guerra com o gentio vizinho, e diz com toda a franqueza que a guarnição é de 74 praças, tanto oficiais como soldados dos piores. O caminho por terra de Cacheu a Ziguinchor era o mais conveniente e cómodo.
Quanto a Bolor, dá a saber que os reis gentios cederam esta ponta à Coroa Portuguesa, é a ponta chamada do Baluarte de Bolor, onde então o Sr. Lopes de Lima, que fez este tratado de aquisição, principiou a formar um estabelecimento, e diz mesmo que antes de chegar a Bolor há ainda à beira-mar duas grandes aldeias, Usol e Jafunco. “Em todas estas partes se cultiva arroz, que pode ser um grande ramo de comércio a troco de ferro, pólvora, tabaco, treçados, missanga, aguardentes, panos, quinquilharias, etc.”. Identifica Farim, dizendo que dista 60 léguas de Cacheu pelo rio de S. Domingos acima, ficando em terra de Mandingas. “Até 1692, era uma simples feitoria de negociantes sujeitos a todas as insolências e maus-tratos dos gentios”. Aqui viviam dois naturais de Santiago, o padre João Cabral e Pereira Simão Vassalo, degredados então pelo bispo D. Frei Vitoriano Portuense, fortificaram a povoação e persuadindo aos cristãos que ali se achavam que pegassem em armas e se defendessem dos gentios. E observa que Honório Pereira Barreto, em 1835, aqui montou seis peças de artilharia à sua custa. “O melhor negócio é o da cola. Os naturais compram também com muita avidez prata para fazerem manilhas e apreciam este metal mais do que o ouro”. E termina esta digressão pelo distrito de Cacheu dizendo que é o único ponto na Guiné onde uma grande extensão de terreno vizinho a Farim pertence de facto e de direito aos portugueses, terreno esse que terá sido comprado por um tal senhor Pascoal e outros comerciantes ali estabelecidos. “Este ponto é muitíssimo importante por ser ponto de passagem de todos os gentios que vão levar à Gâmbia e ao Senegal os seus marfins, ouro em pó, etc., por não acharem aqui sortimento de fazendas próprias”.
Concluída que fica a descrição do distrito de Cacheu, segue-se Bissau.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 21 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22123: Historiografia da presença portuguesa em África (259): Corografia cabo-verdiana das ilhas de Cabo Verde e Guiné, 1841-1843 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22146: Tabancas da Tabanca Grande (3): Morreu a Tabanca da Lapónia, viva a Tabanca da Lapónia!... A notícia da sua morte foi manifestamente exagerada.


Na Suécia o Estado tem o monopólio da venda de álcool, mas o luso-lapão José Belo tem o alambique de cobre mais lindo do município de Kiruna e arredores, na "colónia" sueca da Lapónia...



Suécia > Lapónia > Algures no município de Kiruna > "A minha alegre casinha", diz o Zé Belo... E o outro Belo, que  não é parente, e infelizmente já pertence ao "clube dos poetas mortos", acrescenta: "Sem casas näo haveria ruas / as ruas por onde passamos pelos outros / mas e principalmente onde passamos por nós". (Ruy Belo: Todos os poemas, Lisboa, Assírio e Alvim, 2000). [Ler aqui o poema
completo, "Oh as casas as casas as casas".]

Fotos (e legendas): © José Belo (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. É a mais insólita das Tabancas da Tabanca Grande (*). É a tabanca de um homem só, e uma das mais longínquas... Está a cerca de 5 mil quilómetros de distância da Tabanca Grande, o mesmo é dizer, da capital do Reino de Portugal e dos Algarves... Seguramente, a mais setentrional: fica no círculo polar ártico. 

Nenhum de nós, a começar pelos nossos editores, a conhece, a não ser de belas fotografias e de textos inspiradores. Mas temos convites para aparecer por lá... de preferência em junho, época em que suecos e lapões, colonizadores e colonizados, são os povos mais felizes do mundo, dizem os sociólogos da felicidade e do turismo... 

Ou melhor, diz a Vânia Romão, brasileira, a viver na Suécia (, vou para lá estudar psicologia, imaginem!), autora do blogue, criado em 2011, "Diário de um Teimosa: dicas de Estocolmo e da vida na Suécia"... (Mas será que ela alguma vez foi à Tabanca da Lapónia ? Duvido, e muito menos provado o vodca do luso-lapão Zé Belo, a 94%, depois de redestilado 4 vezes no alambique de cobre mais lindo do município de Kiruna e arredores...)

É tabanca de um homem só, mas generoso e solidário, que está aqui connosco desde que entrou pela nossa Tabanca Grande sem pedir licença a ninguém há uns 12 anos atrás, ou não fosse ele um "Maioral", ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70) e hoje cap inf ref do Exército Português...

Há dias o régulo
, que tem dupla nacionalidade, deixou-nos um  lacónico recado: 

(...) A já muito longa série "Da Suécia com Saudade" chegou ao fim da picada. Mudo-me com 'armas e bagagens' para a minha casa de Key West [, Florida, EUA], apesar de manter casa também em Estocolmo para viagens nostálgicas às...raìzes.

Espero ter de algum modo contribuído para um maior conhecimento entre Lusitanos desta realidade exótica situada no extremo de extremo norte europeu que é a Lapónia." (...)


2. A mensagem deixou alguns dos meus leitores,  mais assíduos, algo surpresos e intrigados. Houve comentários à decisão de "time out" (vê foto ao lado) e de mudança de ares, ao fim de metade de um vida passada naquelas paragens :


(i) Editor Luís Graça:

(...) Percebo que queiras estar mais próximo dos teus filhos e netos...E só posso desejar-te muita saúde e longa vida em Key West onde resto tens casa há muito...

Vamos mesmo pôr um ponto final na série "Da Suécia com saudade" ? Se sim, temos que pensar numa nova série...Porque tu vais continuar a escrever no nosso blogue... E quanto à Tabanca da Lapónia ? Para nós, continuarás a ser o régulo da Tabanca Lapónia, não de pedra e cal, mas de madeira e gelo. Por outras palavras, és insubstituível, inamovível, vitalício... Claro que vamos ter saudades das tuas saudades. 

Morreu a Tabanca da Lapónia, viva a Tabanca de Key West!

Fica bem e que lá sejas feliz, pararaseando um poema do nosso Ruy Belo. Que a felicidade é onde a gente a põe, mas a maior parte de nós nunca a põe onde está... Venho de almoçar da Tabanca do Atira-te ao Mar e de deleitar-me com as nossas musiquinhas (com cavaquinho, bandolim, viola, voz...), celebrando a vida, a saúde, o desconfinamento, a amizade, a camaradagem (*).

Se um dia voltares à Pátria / Mátria / Fátria que te foi Madrasta, seja em viagem de negócios ou simplesmente para rever as tuas raízes lusitanas, tens já uma convite para vir aqui comer uns marisquinhos do Mar do Cerro e beber uns vinhinhos brancos com aromes atlânticos da regão da tua avó (que era de Torres Vedras)...(...)


(ii) Hélder Sousa:

(...) Tudo na vida tem um fim, sabemos. Mas custa pensar nisso e, principalmente, antever isso.

Pergunto-me o que pensarão ou dirão as tuas renas. E os teus cães. E os ursos que, sabemos, te visitavam de tempos a tempos. E os passarocos, que apresentaste não faz muito tempo.

Também li que embora vás privilegiar Key West, não vais descurar Estocolmo "para viagens nostálgicas...às raízes". Direi raízes "suecas", mas também faltam as "lusitanas", verdade?
E as renas? As renas, que tanta companhia te fizeram "em tempos de solidão"! (...)


(iii) Francisco Baptista:

(...) Estejas onde estiveres nunca te esqueças do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné e continua a mandar os teus lindos Bilhetes Postais . A beleza, o exotismo , as tradições, os costumes da tua Lapónia têm-nos dado mais conhecimentos e emoção estética. Em Key West ou em Estocolmo não te irão faltar histórias para nos contares com a tua humanidade e ironia.

Sinto alguma pena de termos deixado de ter um representante português num território tão vasto , que faz sonhar os meninos e encanta os mais velhos como a Lapónia.(...)

(iv) José Teixeira:

(...) Caro comandante, mudar de poiso não implica mudar de camisola. Essa tem de continuar vestida para aconchegar o coração de português que vive dentro de ti. É uma ordem do teu "dotor" de Mampatá, dos bons tempos que ali passamos em franco convívio com a população. Tal como lá fizeste falta, também aqui no Blogue de todos nós, fazes falta. Desde sempre me habituaste a mudar de poiso e apareceres quando e onde não contávamos contigo. Ainda te lembras quando apareceste em Mampatá de helicóptero e foste recebido em festa pelos teus homens e pelas bajudas mais lindas da Guiné? (...)


3. Mas, face a tantas manifestações de "carinho", o régulo da Tabanca escreveu, inesperada e respeitosamente mas também no seu estilo muito próprio, "já muito assuecado", a seguinte mensagem em 19 do corrente:

(...) "Alto e paira o baile!"..."Auguenta" os cavalos! Ou, como a ordem de comando dos militares brasileiros quanto ao...marcar passo: "Faz qui anda má näo anda!"

A luta vai continuar também.... na Lapónia! (...)


E logo  Hélder Sousa, arguto e certeiro, pegou na deixa:

(...) É por estas (e por outras) que o J. Belo será imprescindível nestas páginas. Pelo fino humor. Pela elegante capacidade de superiormente reagir às provocações que de quando em vez lhe fazem. Pela diversidade dos elementos que nos trás, sejam apontamentos de folclore, da fauna, da flora, dos locais onde está.

E as recordações dos tempos da "aventura africana"? Também bastante úteis. Na resposta que me deu indica a certo passo a propósito da "raízes", que "por outro lado não podemos esquecer que para respirar, criar, reproduzir e renovar, os campos necessitam de ser limpos de raízes velhas, certamente profundas mas....aperreadas."

Claro que concordo mas também não nos podemos esquecer que deverá existir um "processo histórico" e que, desse modo, o que somos hoje é o resultado das opções que tomámos ontem e as de hoje determinarão, em larga medida, o amanhã. Por isso é que acho que, por mais dura que seja a edificação do futuro sobre o passado, conforme referido no poema de Ruy Belo, isso acaba por muito "natural" (...)



4. Depois de "outras despedidas", mais ou menos  intermitentes, ao longo destes anos, o José Belo tinha reaparecido e decido, em plena pandemia de Covid-19, "reabrir a Tabanca da Lapónia, agora ao povo" (***). 

E, de resto, com toda a propriedade, já que estamos, é conveniente lembrá-lo, num país que tem um regime monárquico, se bem que constitucionalíssimo, ou seja, como dizia a propaganda no tempo do amado Oloff Palme (1927-1986), o melhor da monarquia, da democracia, do socialismo, do capitalismo e de outros "ismos", como feminismo, ambientalismo e... colonialismo!... 

Afinal, não é, por acaso,  que para os outros povos escandinavos..., a Suécia  é ou foi historicamente uma espécie de "Big Brother", tal como a Espanha em relação a Portugal...

Daí o comentário do nosso editor Luís Graça, na véspera do 25 de Abril de 2021 (****):

(...) Morreu a Tabanca da Lapónia, viva a Tabanca da Lapónia!... Claro que a notícia da sua morte, recebida a alguns milhares de quilómetros de distância, foi manifestamente exagerada... E depois a verdade que, na Tabanca Grande, a mãe de todas as tabancas, não recebemos em devido tempo a certidão de óbito, passada pelo competente facultativo...

Obrigado, José Belo, por continuares firme no teu posto, quer faça sol ou chuva, vento, cacimbo, neve ou granizo... Que tenhas um bom dia 25 de Abril, para o qual também deste o teu contributo...Aliás, todos nós, que na Guiné soubemos fazer, ao longo do tempo, a guerra e a paz... (*)



O José Belo tem 200 referências no nosso blogue!... E espero que ainda chegue a outro tanto, o que será bom sinal para todos/as, que queremos celebar o quarto de século do blogue, em 1929, daqui a oito anos... (Hoje estou muito otimista, cono se vê!)... 

De qualquer modo, o José Belo, régulo (vitalício) da Tabanca da Lapónia estará sempre, aqui, "em casa", bendito por amigos, amigas e camaradas (M/F)...LG

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 25 de abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22137: Tabancas da Tabanca Grande (2): Tabanca do Atira-te ao Mar - Parte II: Quem canta (e toca) seu mal espanta (ou troca...)

(**) Vd. poste de 17 de abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22111: Da Suécia com saudade (90): o fim da picada... ou um certo fim desta picada!... Morreu a Tabanca da Lapónia, viva a Tabanca de Key West, Flórida, EUA (José Belo)

(***) Vd. 16 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20655: Da Suécia com saudade (63): reabrindo a Tabanca da Lapónia, agora ao povo... (José Belo)

(****) Vd. poste de 24 de abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22135: 17.º aniversário do nosso blogue (3): Para muitos, e já lá vão décadas, [este Blogue] tornou-se um indispensável ponto de encontro (José Belo, ex-Alf Mil da CCAÇ 2391, Ingoré, Buba. Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70)

terça-feira, 27 de abril de 2021

Guiné 63/74 – P22145: Estórias avulsas (105): Pequemo almoço às 2 horas da manhã (Joaquim Ascenção, ex-Fur Mil Arm Pes Inf, CCAÇ 3460, Cacheu, 1971/73)

Tavira > Quartel da Atalaia > Antigo CISMI. Belo exemplar da nossa arquitetura militar, fica situado na Rua Isidoro Pais. Imóvel classificado como de interesse público, segundo o excelente síio da Câmara Municipald e Tavira


1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Ascenção (ex-Fur Mil de Armas Pesadas de Infantaria da CCAÇ 3460/BCAÇ 3863, Cacheu, 1971/73), com data de 21 de Abril de 2021, trazendo mais uma das suas estórias que bem caracterizam as nossas atribulações enquanto instruendos do CSM.


Pequeno almoço às 2 horas da manhã

Nos meses de janeiro, fevereiro e março de 1971, estive no CISMI em Tavira a fazer a especialidade de Armas Pesadas. Aplicação militar, marchas, crosses, muitos crosses, instrução e formação teórica e prática de regulação de tiro era intensa, o desgaste físico era directamente proporcional á intensidade do esforço despendido.

Tudo isto ia aguentando mas o que me fazia “saltar a tampa“ era:
1 - dormir ou tentar dormir ouvindo discursos de políticos da época ou ao da música “Angola é nossa”.
2 - formar na parada às 2 ou 3 da manhã para ouvir uma dissertação militar do Major-Comandante de Instrução.
3 - formar para saber as missões para o dia.


A alvorada era todos os dias às 06,30 horas da manhã e a formatura para o pequeno almoço às 7,15. Já não estou seguro deste horário. Para esta formatura todos os formandos levavam dependurado no cinto o copo do cantil no qual era servido o café com leite.
Quem passou por lá sabe os pormenores
.

Até que um dia o motivo desta história aconteceu.
Regra geral a primeira formatura era para o pequeno almoço, mas naquele dia era para uma das palestra noturnas. Eu, um homem sempre prevenido, cheio de sono e fome, vou com o copo do cantil ao cinto para a formatura preparado para o pequeno almoço.
Quando estava na formatura cumprindo as ordens de:
Firme!
Sentido!
À vontade!


Com o movimento do corpo deixei cair o copo do cantil o que provocou uma curta gargalhada geral.
Quando terminou a palestra fiquei à espera de levar nas orelhas mas nada aconteceu. Fui para a caserna meio cheio de medo esperando pelo início da instrução para saber o que me iria acontecer, mas mais uma vez nada aconteceu nem veio a acontecer.
Assim se passou uma história da minha vida de militar em formação.


Cumprimentos
Joaquim Ascenção

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Nota do editor

Último poste da série de 30 DE MARÇO DE 2021 > Guiné 63/74 – P22052: Estórias avulsas (104): O melhor brunch da minha vida, numa longa viagem de 21 horas de comboio, entre Leandro e Tavira, já lá vão 50 anos (Joaquim Ascenção, ex-fur mil arm pes inf, CCAÇ 3460, Cacheu, 1971/73)

Guiné 61/74 - P22144: Parabéns a você (1956): Belmiro Tavares, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 675 (Binta, 1964/66) e Cor Inf DFA Ref Hugo Guerra, ex-Alf Mil Inf, CMDT dos Pel Caç Nat 55 e 50 (Gandembel, Ponte Balana, Chamarra e S. Domingos, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22130: Parabéns a você (1955): David Guimarães, ex-Fur Mil Art MA da CART 2716/BART 2917 (Xitole, 1970/72)

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22143: Recortes de imprensa (117): A RTP evoca os 60 anos da guerra colonial / guerra do ultramar

1. Continuação da série Memórias da Guerra, RTP (Telejornal, 19-24 de abril de 2021) (*)


Memórias da Guerra:
[4] Emigração salvou muitos jovens do conflito

RTP, Telejornal, 22 de abril de 2021 (vídeo: 6' 03'') [Apareceu às 20:47]

Sinopse:


Aos 18 anos, Luís Rego tomou uma decisão que mudaria a sua vida para sempre. Foi para França para fugir ao recrutamento militar e à guerra em África. Emigrar, muitas vezes a salto, foi uma estratégia seguida por milhares de jovens portugueses para escapar a guerra colonial.

https://www.rtp.pt/noticias/pais/memorias-da-guerra-emigracao-salvou-muitos-jovens-do-conflito_v1314773

Memórias da Guerra:
[5]  O drama dos combatentes africanos

RTP, Telejornal, 23 de abril de 2021 (vídeo: 7' 32'') [Apareceu às 20:41]

Sinopse:

Quatrocentos e quarenta mil africanos combateram nas forças armadas portuguesas durante a guerra colonial. Muitos desses homens vieram depois para Portugal tentar obter reconhecimento e compensação, em processo longos que demoraram anos.

Zeferino Andrade, angolano, é um desses homens... com a vida repartida entre tempos e continentes.

https://www.rtp.pt/noticias/pais/memorias-da-guerra-o-drama-dos-combatentes-africanos_v1314921

Memórias da Guerra:
[6] Os últimos contingentes antes da independência

RTP, Telejornal, 24 de abril de 2021 (vídeo: 5' 58'') [Apareceu às 21:03]

Sinopse:

Olhamos hoje para Luis Vicente que foi mobilizado para Moçambique em Março de 1974, nas vésperas do 25 de Abril. Esteve em Mueda, onde os ataques ao quartel se intensificaram, mesmo depois do golpe dos capitães.

A comissão deste soldado em África foi mais curta, regressou mais cedo numa época de muita incerteza em Portugal e nos territórios africanos.

https://www.rtp.pt/noticias/pais/memorias-da-guerra-os-ultimos-contingentes-antes-da-independencia_v1315091

Fonte: RTP > Memórias da guerra (com a devida vénia...)


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Guiné 61/74 - P22142: Fotos à procura de... uma legenda (149): Mas eu conheço esta mesa em U, do antigo Palácio do Governador, na cidade da Praia, Cabo Verde!... A foto (do poste P19232) nunca poderia ter sido tirada em Conacri! (Carlos Filipe Gonçalves, Mindelo)



Foto nº 1 > República da Guiné > Conacri > c. 1963-1973 > Reunião de responsáveis do PAIGC [Comité Executivo da Luta]. Da esquerda para a direita: (i) Lourenço Gomes, (ii) Honório Chantre, (iii) Victor Saúde Maria, (iv) Abílio Duarte, (v) Pedro Pires, (vi) Luís Cabral e (vii) Aristides Pereira.

Foto (e legenda): Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral > Pasta: 05247.000.074 (adapt por Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2018, com a devida vénia...)


Comentário de Carlos Filipe Gonçalves: "Sala de reuniões do Palácio da Presidência da Republica, antigo Palácio do Governador na cidade da Praia, nos anos de 1970/80. (...) Naquela mesa assentei-me imensas vezes… Eu era na época o repórter de serviço, estava sempre na Presidência… Bem, não acredito que houvesse em Conacri uma mesa idêntica… mas tudo é possível, posso estar errado. Mas, na minha opinião, a foto é de uma reunião na Praia, quando da visita de Luis Cabral em 1976".


Foto nº 2 > Cabo Verde > Praia > Palácio da Presidência da Republica > 1976 > "Conferência de imprensa, na mesma sala.  quando da única visita de Luís Cabral a Praia, se não estou em erro em 1976, teve encontro com a imprensa o Secretário Geral do PAIGC, Aristides Pereira, para dar conta do que se passou na tal reunião do CEL – Comité Executivo da Luta(...) Estou de frente, à direita, vê-se na parede ao fundo os tais quadros que aparecem na foto publicada no blogue, a Foto nº 1".


Foto nº 3 > Foto nº 2 > Cabo Verde > Praia > Palácio da Presidência da Republica > 1976 > "Conferência de imprensa: sentado na mesa o Aristides Pereira, Secretário Geral do PAIGC.  Estou à esquerda de costas."

Fotos (e legendas): © Carlos Filioe Gonçalves (2021). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Santa Luzia, Bissau, 1973/74 [, foto à esquerda], natural de Cabo Verde (n. São Vicente, Mindelo, 1950), radialista, jornalista, músico, escritor, estudioso da morna e de outras formas da música de Cabo Verde, membro da Tabanca Grande, nº 790

Data - domingo, 25/04, 19:30 (há 21 horas)
Assunto . Foto do poste P19232 (*)



Olá,  Luis:

Antes de mais muita saúde! Vejo que o Blog continua activo sempre com publicações novas. Olha, tenho estado estes dias à procura de fotos, para ilustrar o meu tal livro, de modo que, todas as buscas me enviam sempre para teu nosso Blog, e de cada vez faço novas descobertas e sou surpreendido por novas revelações. E justamente acabo de ver uma foto constante do poste P19232, de 25 de novembro de 2018 (*)

Porquê a minha surpresa? A mesa que está na foto!!!  [Foto nº 1, acima]. Conheço-a e muito bem, é uma mesa em «U» que estava na sala de reuniões do Palácio da Presidência da Republica, antigo Palácio do Governador na cidade da Praia, nos anos de 1970/80. Conheço, porque estava numa sala onde eram dadas as conferências de imprensa de personalidades, logo em 1975/76…

E naquela mesa assentei-me imensas vezes… Eu era na época o repórter de serviço, estava sempre na Presidência… Bem, não acredito que houvesse em Conacri uma mesa idêntica… mas tudo é possível, posso estar errado. Mas, na minha opinião, a foto é de uma reunião na Praia, quando da visita de Luis Cabr al em 1976…. 

 Aqui vão duas fotos de uma conferência de imprensa, na mesma sala quando da única visita de Luís Cabral a Praia, se não estou em erro em 1976, teve encontro com a imprensa o Secretário Geral dp G do PAIGC, Aristides Pereira, para dar conta do que se passou na tal reunião do CEL – Comité Executivo da Luta. 

Na foto nº 2 [acima]  estou de frente, vê-se na parede ao fundo os tais quadros que aparecem na foto publicada no teu blog [Foto nº 1]. Presentes jornalistas nacionais de Cabo Verde, eu, da Guiné o Tony Tcheka, ele veio com Luis Cabral, e jornalistas estrangeiros. Na foto nº 3 [acima) estou à esquerda de costas.

Logo acho que não está certa a indicação da Foto nº 1 [acima]:  "República da Guiné > Conacri > c. 1963-1973".

Espero ter contribuído para a «exactidão» da informação. (**)

Um Forte Abraço e Muita Saúde

Carlos Filipe Gonçalves [, foto atual à direita]
Jornalista Aposentado


2. Comentário do editor LG:

Meu caro Carlos Gonçalves, deves ter toda a razão. A legenda da foto é da responsabilidade da Fundação Mário Soares que, como sabes, salvou e tratou, e com grande profissionalismo, o valioso arquivo Amílcar Cabral... Em milhares de documentos (e nomeadamente fotos) é perfeitamente natural que surjam erros destes. Já temos detetado outros. Obrigado pela tua oportuna e preciosa intervenção. Ficamos à espera desse novo livro que tens em mãos. Vai dando notícias.

(**) Último poste da série > 23 de abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22126: Fotos à procura de... uma legenda (141): acidente com a jangada do Cheche, no passado dia 21... (Patrício Ribeiro, Impar Lda, Bissau)

Guiné 61/74 - P22141: Notas de leitura (1353): "Nos Meandros da Guerra, O Estado Novo e África do Sul na defesa da Guiné", por José Matos e Luís Barroso; Caleidoscópio, 2020 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Abril de 2021:

Queridos amigos,

Um grande ensaio historiográfico, amassado com factos documentais que estavam encerrados nos arquivos, parecia que ninguém dava por eles. O Exercício ALCORA estendeu-se à Guiné, inopinadamente, Pretória conhecedora do que se estava a passar na Guiné emprestou ao governo português cerca de 6 milhões de contos. É um tempo de contradições e paradoxos. Há conversações secretas para cessar-fogo e autodeterminação da Guiné, e para independências dirigidas por brancos em Angola e Moçambique, diligências de que existem provas irrefutáveis; em simultâneo, anda-se numa correria para reapetrechar a Guiné com equipamento anti-míssel, aviões que pudessem enfrentar os MIG, compras de morteiros 120 mm, uma enormidade de minas anticarro, e muito mais.
 
Faltam investigações para saber da genuinidade de todos estes contactos secretos ou se de facto o regime atingira o mais alto grau de esquizofrenia. O trabalho de José Matos e Luís Barroso responde cabalmente à satisfação de quem procura compreender o frenesim deste fim de Regime, se se tratava exclusivamente de um compasso de espera a supor que o poder negocial aumentava e que os movimentos de libertação viriam sujeitos a cedências para haver negociações que salvassem a face a Marcello Caetano, isto no exato momento em que Spínola escrevera um livro que dera propulsão ao movimento dos capitães. O mínimo que se pode dizer é que a História por vezes se faz de derrisão.

Um abraço do
Mário



O Estado Novo e a África do Sul na defesa da Guiné (1)

Mário Beja Santos

José Matos

"Nos Meandros da Guerra, O Estado Novo e África do Sul na defesa da Guiné", por José Matos e Luís Barroso, Caleidoscópio, 2020, é uma das obras historiográficas mais importantes para a compreensão da guerra da Guiné de publicação recente, diria mesmo de leitura obrigatória. Basta atender ao que os autores propõem na contracapa: 

“O objetivo deste livro é estabelecer a ligação entre o esforço de guerra de Portugal na Guiné e o apoio financeiro que a África do Sul disponibilizou a Portugal no início de 1974, no âmbito do estabelecimento de uma aliança militar entre Portugal, Rodésia e África do Sul, com o nome de código ‘Exercício ALCORA’. O apoio da África do Sul no esforço militar português em Angola inicia-se em meados de 1967, através da execução da Operação Bombaím para garantir apoio aéreo às operações conduzidas no leste e sudeste de Angola. O resultado da Operação foi mais modesto do que o esperado, originando a apresentação do plano de defesa para a África Austral, sob a direção estratégica de Pretória, viria a originar o Exercício ALCORA, em outubro de 1970. O objetivo de Pretória era garantir a sua primazia na condução da estratégia de contrassubversão na África Austral, em que Angola, Rodésia e Moçambique desempenhavam a sua defesa avançada. Embora estabelecido para a manutenção do ‘reduto Branco’, na África Austral, o apoio financeiro resultante do Exercício ALCORA e acordado no início de 1974 entre os governos de Portugal e da África do Sul, seria principalmente para reforçar a capacidade militar das forças portuguesas na Guiné”.

Luís Barroso

Trata-se de uma investigação que traz dados novos, praticamente desconhecidos nos trabalhos de investigação sobre a guerra da Guiné: as incidências do Exercício ALCORA para adquirir armamento e equipamento suscetível de reequilibrar o que se estava a passar no teatro de operações guineense. Obra bem enquadrada, passando em revista: o contexto internacional, caraterização da guerra da Guiné, o imperativo da modernização da nossa Força Aérea, a problemática dos aviões soviéticos MIG, o reequilíbrio que exigia o míssil Crotale, radares de defesa antiaérea, mísseis terra-ar portáteis e novas armas para o Exército, as cedências da administração Nixon e, por fim, os contatos secretos no fim do Estado Novo.

Uma das aparentes contradições neste fim do Estado Novo é em simultâneo o estabelecimento de contatos conducentes ao fim da guerra da Guiné e a processos de autodeterminação em Angola e Moçambique e a febril e secretíssima operação de rearmar a Guiné com armas antimíssil e morteiros 120 mm. Rui Patrício, Ministro dos Negócios Estrangeiros de Marcello Caetano, enviara o cônsul português em Milão, em março de 1974, a Londres, para contatos preliminares com uma delegação do PAIGC, pretendia-se o cessar-fogo e abrir caminho para a independência; enquanto decorre este contato secreto, o mesmo Rui Patrício está envolvido nas negociações para a compra de Caças Mirage, dados como fundamentais para a defesa da Guiné, Washington também estava a ser pressionada para vender mísseis terra-ar portáteis, os Redeye. 

Como lembram os autores, todas estas compras seriam financiadas por um avultado empréstimo concedido pela África do Sul em março de 1964, 6 milhões de contos. As fontes documentais usadas pelos investigadores foram sobretudo o Arquivo de Defesa Nacional, o Arquivo Histórico da Presidência da República e o National Archives of South Africa.

Representação de um Mirage IIIEPL, com uma camuflagem especial contra mísseis guiados por calor
F-86 Sabre

Enceta-se a obra com o enquadramento da ideologia imperial portuguesa e a evolução dos modelos coloniais finda a II Guerra Mundial. Até meados da década de 1950, Salazar estava confiante que o Regime não seria estilhaçado pela emergente vaga anticolonial, quando esta se manifestou, a diplomacia portuguesa teve que rever a estratégia de alianças e assim se chega à aproximação à África do Sul. 

“O ano de 1961 marca uma mudança clara na predisposição do governo português em encarar a África do Sul como um apoio de futuro importante para a manutenção do esforço de guerra. É uma mudança substantiva em relação às desconfianças dos anos 1950, em parte devido aos receios de subalternização da importância do país na defesa de África. Mas também em relação à recusa de Salazar em enveredar por uma aliança militar formal, abordada em 1960 pelo comandante das Forças Armadas sul-africanas, general Stephen Melville, depois dos acontecimentos do Congo”

E assim se vai gradualmente encenando uma aproximação, Salazar mantinha reservas em estabelecer uma aliança formal com os sul-africanos, o Estado Novo irá apoiar a independência da Rodésia e os autores desvelam como passo a passo se caminhou para o Exercício ALCORA. A guerra de guerrilhas alastrara para outras colónias, não se podia manter uma guerra barata, as despesas militares incrementavam-se e no final da década de 1960, na maior das confidencialidades, já se pediam empréstimos à África do Sul, de quem se aceitou diverso material de guerra. E os autores também revelam os dados essenciais da mudança na política externa norte-americana em que as bases das Lajes tiveram um papel fulcral. Houve também aliados europeus, notoriamente Bona e Paris, com altos e baixos, mas sempre com vendas de armas e apoios diferenciados.

Como a situação na Guiné se alterara radicalmente em 1973, enquanto o discurso de Spínola roça o catastrofismo na documentação enviada para Lisboa e nas suas declarações no Conselho Superior de Defesa Nacional, em junho, durante a visita de Costa Gomes, chega-se a um consenso quanto às medidas a adotar. 

“Os militares defendem que é necessária uma alteração no dispositivo militar para uma linha que evite a aniquilação de guarnições de fronteira, o que implicava uma contração do dispositivo com a concentração de meios na zona mais interior da Guiné de forma a ganhar tempo e consolidar um reduto final que in extremis ainda possa permitir uma solução política do conflito. A manobra pretendia também dar tempo a Lisboa para futuras negociações com o PAIGC. Spínola concorda com a remodelação do dispositivo militar visando a economia de forças e salienta a carência de meios no teatro de operações, o que exige a atribuição urgente de novos meios de combate, apresentando uma lista de equipamento militar que pretende para a Guiné. Costa Gomes concorda com a manobra delineada, mas refere que não é possível a breve prazo reforçar o teatro de operações com os meios pedidos por Spínola”.

Ciente da gravidade da situação, chega-se ao empréstimo de cerca de 6 milhões de contos, está confirmada a vontade de Caetano em reforçar o poder militar português para evitar o colapso na Guiné com a aquisição de novos equipamentos militares. Spínola dá por finda a sua comissão na Guiné, é nomeado novo governador e comandante-chefe, Bettencourt Rodrigues, chega a Bissau dias depois de ter sido proclamada unilateralmente a independência da Guiné-Bissau. 

Os autores também trazem um dado novo acerca de operações encobertas e de contatos com o PAIGC ou com as autoridades senegalesas. No final do capítulo, faz uma chamada de atenção para o uso de viaturas blindadas pelos guerrilheiros e a evolução do potencial de combate do PAIGC. O próprio Costa Gomes contatara o Chefe do Estado-Maior do Exército espanhol para o fornecimento de minas anticarro. Bettencourt Rodrigues reúne em março de 1974 com o ministro Silva Cunha, é por este informado que se anda à procura de compras urgentes para o fornecimento de meios de defesa antiaérea às tropas na Guiné e também em Cabinda, mais fica a saber sobre o reapetrechamento da Força Aérea, fala-se igualmente em compra de morteiros 120 mm. 

“O financiamento seria garantido por Pretória e o material seria fornecido pelos EUA, França, Espanha e Israel, embora as negociações com os americanos fossem as mais difíceis e obrigassem Kissinger a fornecer de forma encoberta os mísseis que Portugal queria”

Enquanto tudo isto se está a passar, a 22 de fevereiro Spínola publica "Portugal e o Futuro", obra que terá um enorme impacto junto dos militares que conspiravam contra o Regime. Em Pretória ninguém previa que o Estado Novo fosse derrubado sem resistência e que se caminhava a passos largos para o fim do império colonial português.

(continua)
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Notas do editor

Vd. poste de 1 DE SETEMBRO DE 2020 > Guiné 61/74 - P21310: Agenda cultural (751): "Nos meandros da guerra: o Estado Novo e a África do Sul na defesa da Guiné", de José Matos e Luís Barroso, Lisboa, Editora Caleidoscópio, 2020, 146 pp.

Último poste da série de 19 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22117: Notas de leitura (1352): Uma importante carta enviada ao General Schulz em agosto de 1966 (Mário Beja Santos / José Matos)

domingo, 25 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22140: Blogpoesia (732): "A elegância do condor"; A dor e a alegria"; "Cantando melodicamente" e "Calças de ganga", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Publicação semanal de poesia da autoria do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, CachilCatió e Bissau, 1964/66):


A elegância do condor

Um desfiladeiro imenso. Medonho para nós mortais.
O condor, parece indiferente.
Sem medo de cair.
Sabe que tem dois anjos, suas asas longas e firmes.
Sempre prontas a acudir.
De repente, se abrem e ele vai planando como uma nuvem,
Mirando a imponência daquele abismo.
De fugir.
Se despede dos seus cuidadores
E vai em voo largo e leve.
Para seu reino.
A liberdade...


Ouvindo "condor dos Andes" em gaitas pelos andinos

Berlim, 18 de Abril de 2021m
10h 20m
Jlmg


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A dor e a alegria

A dor e alegria são as manifestações da alma.
Por elas, ela chora ela ri.
Linguagem do bem e da dor.
Pedidos e brados.
Sofrer e sorrir são momentos da vida.
A compõem e tecem.
Dão-lhe o verdadeiro sabor.
Subir e descer.
Descansar e sofrer com suor
É a lei impressa por quem a criou e a dá para que nosso viver
Tenha sabor e valor...


Berlim, 21 de Abril de 2021
17h54m
Jlmg


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Cantando melodicamente

Cantando melodicamente,
Esqueço as mágoas que a vida me traz.
Alivio minha dor na saudade da minha infância.
Quando a vida sorria no dealbar das emoções.
Tantas agruras estavam à espera.
Na juventude. O tempo doloroso das incertezas.
Só a esperança em melhores dias
Aliviavam e calavam a negritude.
O fim ainda virá longe.
Daí a fé que tudo mude para melhor...


Berlim, 24 de Abril de 2021
21h43m
Jlmg


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Calças de ganga

Durante muito tempo não havia ganga.
O que havia era o cotim e a fazenda.
Vestir bem era a ânsia de toda a gente.
Os ricos podíam-no sem qualquer custo.
Os pobres gastavam os cobres que poupavam a muito custo
E mandavam fazer as calças e os fatos por encomenda ao alfaiate.
Belos tempos em que havia esmero e muita vaidade sã.
O meu primeiro fato foi o da comunhão solene.
Quem o fez foi o meu pai.
Era cinzento...


Berlim, 23 de Abril de 2021
21h12m
Jlmg

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Notas do editor

Poste anterior de J. L. Mendes Gomes de 18 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22113: Blogpoesia (729): "Arroz doce"; O brilho dos brasões"; "Gradeadas as portas e janelas" e "Bom rasto", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Último poste da série de 25 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22138: Blogpoesia (731): Neste dia 25 de Abril, as inquietações de sempre, "Esquecimento", poema de Juvenal Amado (Ex-1.º Cabo CAR da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74)

Guiné 61/74 - P22139: Blogues da nossa blogosfera (158): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (67): Palavras e poesia


Do Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.


25 DE ABRIL, O GRANDE VENCEDOR

ADÃO CRUZ

O 25 de Abril foi o mais importante fenómeno político-social da nossa história moderna. O mais fascinante fenómeno político-social da vida de todos aqueles que tinham dentro de si a terra preparada para nascerem cravos.

Foi uma rajada de vento estilhaçando as janelas do tempo e deixando entrar o futuro e os sonhos pela mão dos pequenos gestos de cada um de nós. Uma generosa pincelada de cor e de vida nas paredes gastas da existência, nas palavras desencantadas e nos rostos mortos da esperança. O abrir da madrugada que há tanto tempo se recusava a ser dia.

Sensação única e irrepetível. A praça do entusiasmo era demasiado grande e a alegria brotava em cada esquina, entoando canções que ardiam no ventre da arte e da poesia. Eram muitas as certezas, ainda mais as incertezas e uma cândida ingenuidade brilhava em todos os olhos. Acreditava-se que neste pérfido mundo ainda havia almas grandes, as únicas capazes de ultrapassar a fronteira para além da qual o homem adquire a dimensão da cidadania, da honra e da dignidade.

Ao calor do 25 de Abril se deve o germinar da revolucionária ideia de que é na relação com os outros que nós percebemos quem somos e que o sentido da nossa existência é o sentido da nossa coexistência. A maior conquista do 25 de Abril foi, de facto, o nascimento de uma necessidade crescente de sentir a beleza, o autêntico, a verdade, o gosto da vida para cada um e para todos, a solidariedade, a sede de saber e a consciência da soberania da liberdade e da justiça.

Comemoramos hoje os quarenta anos do nascimento de uma vida por que tanto lutámos. Mas é com tristeza que penduramos o cravo na lapela e uma lágrima nos olhos. Hoje já não sabemos se é dor ou alegria o que sonhamos quando abrimos ao sol as portas de Abril. Não sabemos se é dor, tristeza oualegria, aquilo que sentimos quando a revolução faz tantos anos de saudade e nostalgia.

O 25 de Abril sempre teve e tem alma de esquerda. Nunca poderia ser o gene da nova ditadura que aí está desde há muito, cada dia mais tecnologicamente evoluída e sofisticada. Não demorou muito depois de Abril a incubação do ovo da serpente. Como fazem os micróbios quando aprendem a utilizar o antibiótico como alimento, os saudosos do antigo regime apoderaram-se da palavra democracia, usando-a como rótulo do veneno que lentamente foram injectandonas consciências e nas inconsciências do nosso povo.

O seu caldo de cultura é não só o domínio da comunicação, onde ferreamente institucionalizou a desinformação e a mentira com máscaras de informação, mas também a eterna manutenção da ignorância, da estupidificação, da pobreza e do obscurantismo. Tudo em nome da competitividade e da convergência, da globalização, da modernidade, da religiosidade, da flexibilização, da privatização, palavras inquestionáveis das estratégias de dominação por parte daqueles que sabem quem tudo ganha à custa de quem tudo perde.

São estes responsáveis pelo abrir de portas e pelo estender de tapetes às chancelarias do crime que provocaram ou facilitaram esta barbárie dos tempos modernos, a corrupção, os roubos ao país, os cortes de salários e o esbulho das pensões, a degradação social, a fome ao lado da loucura do consumismo, o monetarismo e o ultraliberalismo cujo útero reside nos tecnocratas da rapina e na cabeça do patrão planetário que os condecora por cavarem cada vez mais fundo o fosso entre ricos e pobres.

De cravo ao peito ou sem ele, comemoram com toda a desfaçatez a honrosa revolução que sempre odiaram, numa tentativa de a desnaturar e de neutralizar o genuíno espírito de Abril. O que se passa na Assembleia da República é paradigmático. A hipocrisia é maior do que o monte de cravos ali aprisionados nesse dia. Dia que muitos suportarão com dificuldade, conhecidos que são osseus claros sinais de alergia.

Nos dias que correm, a luta tem de ser redobrada dentro de cada um de nós. Não é o grau de facilidade ou dificuldade ou a carga pragmática ou utópica que ditam o que deve ser feito ou obstam àquilo que deve ser feito, mas é, sobretudo, a resistência e a força da verdade da nossa consciência perante a submissão.

A identificação com os autênticos valores de liberdade em todo um processo de valorização pessoal e colectiva, exprime uma inquestionável adesão ao Bem e à Justiça, uma interioridade e uma nobreza de carácter só reconhecidas às almas grandes. É por tudo isto que ABRIL é e será sempre o GRANDE VENCEDOR.
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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22068: Blogues da nossa blogosfera (157): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (66): Palavras e poesia

Guiné 61/74 - P22138: Blogpoesia (731): Neste dia 25 de Abril, as inquietações de sempre, "Esquecimento", poema de Juvenal Amado (Ex-1.º Cabo CAR da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74)


1. Em mensagem do dia 16 de Abril de 2021, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos este poema alusivo ao dia que hoje se comemora:


ESQUECIMENTO

Olho para este cravo rubro
Imagino o sangue derramado
O som de pés descalços
O trabalho infantil
As Lágrimas das despedidas
O luto
O som do silêncio.
Não aceito o esquecimento
Nele ainda vejo a oportunidade
Pra mudança necessária.
A liberdade não tem preço
Somos devedores dos ignorados
Mergulhados na noite sem fim
Fomos salvos do pesadelo por um clarão.
Ainda sonho com a madrugada libertadora
Sem revolta não há transformação
Sem desobediência não há mudança
Nem há esperança que se renove.


Juvenal Amado
25 de Abril 2021

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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22133: Blogpoesia (730): "Os ex-Combatentes são fixes" de Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto, 1968/70)

Guiné 61/74 - P22137: Tabancas da Tabanca Grande (2): Tabanca do Atira-te ao Mar - Parte II: Quem canta (e toca) seu mal espanta (ou troca...)

 


Vídeo (1' 56'') > Alojado em Luís Graça / You Tube

Lourinhã, Porto das Barcas, Tabanca do Atira-te ao Mar  > Abril de 2021

Interpretação: Jaime Silva (voz e cavaquinho) e Joaquim Pinto Carvalho (voz e viola)  (Ensaio)


Oh rama, oh que linda rama 

(Música tradicional portuguesa) 
Letra:

Oh rama, oh que linda rama,
Oh rama da oliveira!
O meu par é o mais lindo
Que anda aqui na roda inteira.

Que anda aqui na roda inteira,
Aqui e em qualquer lugar.
Oh rama, oh que linda rama,
Oh rama do olival! 

Eu gosto muito de ouvir
Cantar a quem aprendeu.
Se houvera quem m'ensinara,
Quem aprendia era eu!

Não m'invejo de quem tem
Parelhas, éguas e montes;
Só m'invejo de quem bebe
A água em todas as fontes.

Fui à fonte beber água,
Encontrei um ramo verde;
Quem o perdeu tinha amores,
Quem o achou tinha sede.

Debaixo da oliveira
Não se pode namorar;
A folha é miudinha,
Deixa passar o luar.



Vídeo  (2' 47'') > Alojado em Luís Graça / You Tube


Lourinhã, Porto das Barcas, Tabanca do Atira-te Ao Mar > Abril de 2021

Interpretação: Jaime Silva (voz e cavaquinho) e Joaquim Pinto Carvalho (voz e bandolim) (Ensaio) 

Maria, teu lindo nome 
(Canção tradicional de Coimbra)


Letra: 

Maria, teu lindo nome, 
Ai, para as bocas sequiosas! 
Maria, teu lindo nome, 
Ai, para as bocas sequiosas! 

Maria, disse e ficou-me 
A boca a saber a rosas, 
Maria, disse e ficou-me 
A boca a saber a rosas. 

Maria, quero-te tanto, 
Ai, que só te peço que um dia, 
Maria, quero-te tanto, 
Ai, que só te peço que um dia 

Quando tu souberes o quanto 
Me queiras tanto, Maria. 
Quando tu souberes o quanto 
Me queiras tanto, Maria.


1. Na "jovem" Tabanca do Atira-te Ao Mar (...e Não Tenhas Medo!) (*), também se canta e toca... E quem canta e toca, seu mal espanta e troca... 

Os artistas, numa sessão de ensaio, deixaram-me gravar estas duas musiquinhas... que divulgamos só para partilhar a sua (deles) e nossa alegria por estarmos vivos (... e já vacinados contra a Covid-19, 1º dose...) e a esperança de que em breve todas as tabancas da Tabanca Grande possam abrir as portas, de par em par, para recebecer todos os amigos e camaradas da Guiné (e não só)...

Para já o grupo de músicos da Tabanca do Atira-te ao Mar é restrito (é apenas um duo... ), devido às circunstâncias atuais. Mas, recorde-se, que os dois fazem parte também da Tabanca Grande e da Tabanca da Linha...E o Joaquim Pinto Carvalho também já tem ido ao convívio da Tabanca do Centro... Portanto, senhores régulos, é convidá-los para uma próxima... quando a gente sair desta "anormalidade" (e já vamos no segundo ano da comissão de serviço na guerra contra a Covid-19). (LG)

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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P22136: Tabancas da Tabanca Grande (1): Tabanca do Atira-te ao Mar, Porto das Barcas, Lourinhã - Parte I: Nascida em plena pandemia de Covid-19...

 





 Lourinhã > Porto das Barcas > Tabanca do Atira-te ao Mar > 17 de abril de 2021 >  Peças de cerâmica da Maria do Céu Pinteus, a mulher grande da Tabanca, que faz anos a 12 de dezembro, e que ainda é do clube dos Sexas.


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2021). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Foi, a partir de março de 2020, com a eclosão da pandemia de Covid-19 e o primeiro confinamento, que a Tabanca do Atira-te ao Mar se tornou numa espécie de "porto de abrigo" para alguns amigos e camaradas da Guiné, da região da Estremadura, Oeste, Lourinhã... Dentro das regras sanitárias impostas pela Direcção Geral de Saúde, obviamente.

A Tabanca do Atira-te Ao Mar fica em Porto das Barcas, Lourinhã... Tem o Mar do Cerro em frente. A logística é fornecida pelos "Duques do Cadaval, Maria do Céu Pinteus e Joaquim Pinto Carvalho (, advogado, músico e poeta, natural do Cadaval, membro da Tabanca Grande desde 7/12/2013, ex-alf mil da CCAÇ 3398 (Buba) e da CCAÇ 6 (Bedanda), 1971/73).  (A casa, de férias, agora residência permanente do casal,  tem 3 pisos com 3 frentes de mar,  os de baixo é para os "tabanqueiros".)

Tem sido um bom sítio para, em pleno confinamento imposto pela pandemia de Covid-19, revermos, ao ralenti, os fotogramas dos filmes que de vez em quando passam (e repassam) na tela da nossa memória, ajudando porventura a exorcizar os nossos fantasmas da guerra... 

Convirá dizer que é, por enquanto, uma minitabanca, com lotação máxima de seis lugares  (de acordo com as normas da DGS),  sentados à mesa comprimida, perpendicular ao oceano Atlântico. Está assente na falésia jurássica, a menos de 100 metros da linha de água...

A Tabanca do Atira-te Ao Mar já tinha, até esta data, 7 referências no nosso blogue. Como já  explicámos em postes anteriores (*), esta nova Tabanca  tem desempenhado um papel importante na quarentena e no confinamento, resultantes da pandemia de Covid-19, passando a ser um digno sucedâneo da Tabanca de Porto Dinheiro, e  mantendo a "chama viva" das nossas melhores memórias e vivências e da esperança e melhores dias. 

Recorde-se que, com a morte do Eduardo Jorge Ferreira ( 1952-2019). a Tabanca de Porto Dinheiro ficou órfã do seu insubstituível e carismático régulo. 

Dos membros da Tabanca Grande, tem aparecido por lá, com maior ou menor regularidade,  o Jaime Bonifácio Marques da Silva (, ou simplesmente Jaime Silva, também conhecido  como "marquês do Seixal"), natural de (e agora residente em) Seixal, Lourinhã, ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72, e ex-autarca em Fafe, bem como o nosso editor, Luis Graça e a Alice Carneiro (, residentes na Lourinhã).  

Estávamos à espera do João Crisóstomo e da Vilma, vindos de Nova Iorque, mas a festa da família Crisóstomo & Crispim, marcada para o Varatojo (a par da homenagem ao Eduardo Jorge Ferreira, em Ribamar, em outubro de 2020) teve de ser cancelada pelas razões imperiosas que todos nós conhecemos.

Tanto o Jaime Silva como o Pinto Carvalho têm queda para a música, e tocam alguns instrumentos (cavaquinho, o Jaime,  bandolim, viola e cavaquinho, o Joaquim), além de fazerem (ou terem feito) parte de coros ou grupos musicais, Os convívios na Tabanca do Atira-te Ao Mar metem sempre umas musiquinhas e às vezes poesia. (Em próximos postes, divulgaremos algumas dessas atuações que, no fundo, não passam de "ensaios"...)

À volta de um comprimida mesa, que pode meter à vontade mais de uma dúzia de convivas, no 1º piso (, agora com lotação máxima de  seis), temos usufruído também de magníficas refeições (, em geral a cargo das "chefs" Alice Carneiro e Maria do Céu Pintéus, mas também do régulo Pinto de Carvalho, mestre do grelhador) e dos mais belos espectáculos de pôr-do-sol (*).



Lourinhã > Porto das Barcas > Tabanca do Atira-te ao Mar > 8 de maio de 2020 >  2º piso:  vista privilegiada sobre o mar do Cerro.

Foto: © Alice Carneiro (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Lourinhã > Porto das Barcas > Tabanca do Atira-te Ao Mar > 2 de junho de 2020 > 1º piso: a magia do pôr-do-sol sobre o mar do Cerro.



Lourinhã > Porto das Barcas >  Atira-te ao Mar e... Não Tenhas Medo > 1º piso > 4 de outubro de 2020 > Os donos,  Maria do Céu Pinteus e Joaquim Pinto de Carvalho (que  antes da pandemia viviam habitualmente em Carnaxide, Oeiras).

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2020). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. No princípio de outubro do "annus horribilis" de  2020, despedimo-nos do verão do nosso descontentamento, com um poema do Luís Graça que dizia:

(...) À volta de um prato de sardinhas
e de um pedaço de pão de trigo barbela,
com o azeite puro da nossa oliveira,
despedimo-nos do verão,
mas não da vida, ou do que resta dela,
do puro prazer de estar vivo, e de pé,
de dedilhar uma viola,
de beber um copo em grupo,
ou de lembrar os tempos de Guiné, (...)

E em dezembro cantámos  os parabéns à dona da casa e mulher grande da Tabanca, que é também ela uma artista plástica e sobretudo ceramista talentosa como se pode ver das fotos que acima publicamos. Na ocasião ela recebeu o seguinte soneto de parabéns:

Para a Maria do Céu Pinteus,
A nossa Duquesa do Cadaval,
No dia dos anos que ela nunca mais esquecerá!

No seu palácio do Atira-te ao Mar,
Ela é hoje, e por um dia, Rainha,
Mimos deem-lhe, mas não a tratem por Céusinha,
Nem como Santa, muda e quieta, no altar.

Faz aninhos, a Duquesa do Cadaval,
Mulher d’armas que “en su situ” tem Pinteus,
Capaz de, daqui da terra, bradar aos céus
P’ra que Deus ponha à Covid ponto final.

Nove meses, confinada, tantos castigos,
Tem à frente o mar e atrás o Montejunto,
O que lhe vale é o Duque e os seus amigos.

Bem queria dar uma festa d’ aniversário,
Mesa farta, lagosta, champanhe, presunto!...
Mas, olhem, tem de ficar para o… centenário!



Lourinhã, 12 de dezembro de 2020,
2* vaga da pandemia de Covid-19…

Muita saúde e longa vida,
Que tu mereces tudo!...
Dos bons amigos, também confinados,
Companheiros de mesa do teu Atira-te ao Mar
E espetadores dos mais belos pôr do sol de 2020,

Os Viscondes da Lourinhã,
Alice & Luís

PS - Hoje, dia 25 de Abril de 2021, os tabanqueiros Joaquim, Luís e Jaime homenageiam também as suas companheiras de uma vida, e mães dos seus filhos, a Céu, a Alice e a Dina (, esta, infelizmente, já internada num lar, com incapacidade permanente; pertencia também à Tabanca de Porto Dinheiro)... 

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Nota do editor:

(*) Vd. entre outros os postes:

5 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21418: Tabanca do Atira-te ao Mar, Porto das Barcas, Lourinhã (2): A despedida do verão ou a vida que segue dentro de momentos (texto e fotos: Luís Graça)

3 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21037: Manuscrito(s) (Luís Graça) (184): a magia do pôr do sol no Mar do Cerro, Porto das Barcas, Lourinhã, na casa "Atira-te ao Mar!", dos "Duques do Cadaval"