quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22664: Historiografia da presença portuguesa em África (287): A história turbulenta da delimitação das fronteiras franco-portuguesas da Guiné (2): "A questão do Casamansa e a delimitação das fronteiras da Guiné", por Maria Luísa Esteves; edição conjunta do Instituto de Investigação Científica Tropical e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, Lisboa, 1988 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Janeiro de 2021:

Queridos amigos,
Este livro de Maria Luísa Esteves devia ser cuidadosamente lido por quem procura esclarecimento sobre as permanentes rebeliões no Casamansa, onde há um movimento independentista que recusa viver dependente do Senegal, é uma história que envolve a definição de uma fronteira que separou etnias, maltratou uma coesão territorial que perdurava há séculos. A autora disseca com imenso cuidado toda a questão do comércio do Casamansa e a nossa presença em Ziguinchor, relativa indiferença com que o governo de Cabo Verde e sobretudo em Lisboa apreciavam a crescente influência francesa no rio, passou a ser determinante na estratégia da presença francesa na África Ocidental. Seguiu-se um quebra-cabeças da delimitação das fronteiras e é bom que o leitor olhe para as duas cartas que acompanham este texto e atenda ao pormenores com que a autora vai tratando as sucessivas missões, as trocas de terreno e as sucessivas pressões da França para ganhar mais espaço. Os historiadores da Guiné-Bissau também devem estar atentos ao zelo e à dignidade que diferentes delegados portugueses manifestaram em manter fronteiras que separassem ao mínimo populações que viviam em comunidade há séculos. Mas a saga continua, aguardem novas surpresas.

Um abraço do
Mário



A história turbulenta da delimitação das fronteiras franco-portuguesas da Guiné (2)

Mário Beja Santos


A definição de fronteiras da colónia da Guiné, as sucessivas operações de delimitação ocupam um relevo muito significativo no importante trabalho de Maria Luísa Esteves intitulado A Questão do Casamansa e a Delimitação das Fronteiras da Guiné, Instituto de Investigação Científica Tropical, 1988. 

A autora colheu corretamente uma grande angular que permite ir aos bastidores da importância que atribui ao rio Casamansa como espaço de influência portuguesa, dá-nos conta da gradual infiltração da presença francesa e como ao longo do século XIX se foram amontoando conflitos, nunca se descurando o papel de Honório Pereira Barreto comprando e contratualizando o território. Numa posição de grande fragilidade, e numa expetativa política de obter apoio francês nas nossas pretensões na África Austral, assinou-se a Convenção de 12 de Maio de 1886, desistindo os negociadores portugueses de todos os direitos sobre o Casamansa, em troca da região de Cacine, a fronteira a Sul tirava-nos a presença no rio Nuno e a França desistia a nosso favor, no Zaire, do território de Massabi.

A investigadora releva exaustivamente o acervo das negociações, e assim chegamos ao texto da Convenção e ao importantíssimo Artigo 1.º:

Na Guiné, a fronteira que há de separar as possessões portuguesas das possessões francesas seguirá conforme o traçado indicado na carta que se mostra neste artigo: ao Norte, uma linha que, partindo do Cabo Roxo, se conservará, tanto quanto possível, seguindo as indicações do terreno, a igual distância dos rios de Casamansa e de S. Domingos de Cacheu até à interceção do meridiano de 17º e 30’ de longitude Este com o paralelo de 12º40’ de latitude Norte. Entre este ponto e o meridiano de 16º de longitude Oeste de Paris a fronteira confundir-se-á com o paralelo de 12º40’ de latitude Norte. A Leste, a fronteira seguirá o meridiano de 16º de longitude Oeste de Paris, desde o paralelo de 12º40’ de latitude Norte até ao paralelo de 11º40’ de latitude Norte. Ao Sul, a fronteira seguirá uma linha que partirá da foz do rio Cajet, situado entre a ilha Catack (que ficará para Portugal) e a ilha Tristão (que ficará para a França) e, conservando-se tanto quanto possível, segundo as indicações do terreno, a igual distância do rio Componi e do rio Cassini, depois do braço setentrional do rio Componi e do braço meridional do rio Cassini a princípio, e do rio Grande por fim, virá terminar no ponto de interseção do meridiano de 16º de longitude Oeste de Paris ou paralelo de 11º40’ de latitude Norte. Ficarão pertencendo a Portugal todas as ilhas compreendidas entre o meridiano do Cabo Roxo, a costa, e um limite meridional formado por uma linha que seguirá o talvegue do rio Cajet e se dirigirá depois para Sudoeste, seguindo o canal dos pilotos até atingir o paralelo de 10º40’ de latitude Norte com o qual se confundirá até ao meridiano do Cabo Roxo”. Outros dados relevantes do texto da Convenção era o reconhecimento que Portugal fazia do protetorado da França sobre os territórios do Futa-Djalon. 

Do Artigo 4º constava a promessa de o governo francês reconhecer a Portugal o direito de exercer a sua influência soberana e civilizadora nos territórios que separam as possessões portuguesas de Angola e Moçambique, sob reserva dos direitos anteriormente requeridos por outras potências".

E começou assim a saga da determinação das fronteiras da Guiné. Primeiro, a missão de 1888. Na fronteira Sul não se levantaram problemas de maior na execução do acordo. Houve resistência em abandonar a praça de Ziguinchor, os residentes retardaram até 22 de abril de 1988. E surgiram divergências no traçado da fronteira Norte, a delegação francesa insistia que, sendo o Casamansa agora um rio francês, deveriam pertencer à França todos os territórios por ele banhados e propunha-se a substituição do Cabo Roxo por Ponta Varela como ponto de partida da linha de fronteira. A delegação portuguesa recusou, o Ministro dos Negócios Estrangeiros Português, Hintze Ribeiro, não cedeu, entretanto os conflitos nas zonas fronteiriças faziam sentir que era indispensável encontrar uma solução. 

E eram conflitos que obrigaram a intervenção militar: o régulo de Firdu, no Casamansa, Mussá Maló, súbdito francês, invadiu territórios pertencentes ao distrito de Geba, ameaçou outros pontos como Farim. Em março de 1893, de novo Mussá Maló transpôs a fronteira portuguesa e pretendia atacar Geba. As populações viviam numa permanente agitação, até porque andava um oficial francês que dizia ter recebido instruções do governo do Senegal para levantar plantas nas circunscrições de Farim e Geba. 

Era inadiável concluir a delimitação, procurar reconciliar os régulos desavindos e acabar com os desentendimentos entre Mussá Maló e os comandantes de Geba e Farim. Mas surgiram igualmente problemas na Fronteira Sul, na região de Cacine, houvera um conflito em Catak, território português por se encontrar ao norte da Ponta Cagete. Havia cenas lamentáveis de arrear e hastear a bandeira francesa, igualmente o comandante francês de Kantiafara atravessara a fronteira e ameaçara alguns chefes dizendo que aqueles territórios pertenciam à França.

E assim se chegou à missão de 1900. Os obstáculos estavam detetados, fundamentalmente a Norte. Mas sabia-se também que os franceses pretendiam estabelecer um posto militar no Componi. Aceitava-se a pretensão francesa de mudar a fronteira do Cabo Roxo para o Cabo Varela. Informava-se França de que estavam a ser colocados marcos na fronteira Sul. Como aumentavam as dificuldades por parte dos franceses e a missão portuguesa não tinha diretrizes nem poderes para tomar decisões, suspenderam-se as operações de delimitação. O governo francês apresenta uma proposta surpreendente: dar autorização aos delegados para fazerem cedências recíprocas do território que seriam depois sancionadas ou não pelos governos respetivos. 

Passa-se para a missão de 1901, demarca-se a fronteira sul e sudoeste, os ministros do Ultramar e dos Negócios Estrangeiros concordam que se dê validade à demarcação da parte Sul e Sudoeste da fronteira da Guiné. Estamos já numa outra missão, que decorreu de 1902 a 1903, os franceses levantavam dificuldade ao traçado na região Leste, procurava-se negociar um sistema de compensações territoriais recíprocas. E chega-se à aprovação das fronteiras Leste e Sul. 

Tudo vai continuar na missão de 1904 e vale a pena aqui registar uma nota curiosa, Oliveira Muzanty (será mais tarde governador da Guiné) chega a Lisboa e elogia o procedimento do régulo de Gabú, fora muito atencioso com a comissão portuguesa, propõe que se cimente a amizade com o povo do Gabú e o diretor-geral do Ultramar aprova um presente constituído por um conjunto de artigos onde não faltava um talim de seda e ouro, uma espada antiga, uma caixa de guerra e baquetas, seis caixas de vinho espumoso, lenços de cor e de seda e até cobertores de algodão e de lã. O objetivo principal desta missão era a demarcação da fronteira entre o rio Cacheu e o Casamansa. Nesta fase dos trabalhos, ambas as missões concluem haver hostilidade das povoações Balantas da região do Casamansa e Cacheu, era preciso levar tropa. Sucede que o chefe Balanta não levantou qualquer obstáculo às missões e o chefe Balanta veio pedir a bandeira portuguesa que foi entregue durante uma cerimónia que causou admiração aos franceses.

Vamos ver seguidamente a missão de 1904 a 1905.

(continua)

Carta da delimitação franco-portuguesa da Guiné, 1886, por E. Desbuissons, Paris
Carta da Colónia da Guiné, 1933
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Nota do editor

Último poste da série de 20 DE OUTUBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22647: Historiografia da presença portuguesa em África (286): A história turbulenta da delimitação das fronteiras franco-portuguesas da Guiné (1): "A questão do Casamansa e a delimitação das fronteiras da Guiné", por Maria Luísa Esteves; edição conjunta do Instituto de Investigação Científica Tropical e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, Lisboa, 1988 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22663: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - XI (e última) Parte: Leiria, 27/1/1970: "Faz hoje exactamente três anos que cheguei da guerra e o relógio psíquico interior acusou a efeméride e quis condignamente celebrá-la".


LIsboa > Benfica > Biblioteca-Museu República e Resistência – Espaço Grandella  > 27 de novembro de 2008 > O Cristóvão de Aguiar,  à esquerda, na  na apresentação da nova edição do seu livro Braço Tatuado (2008). Foto:  cortesia de Alberto Branquinho (2008)



Capa do romance "Braço Tatuado - Retalhos da Guerra Colonial, 2ª ed Editora: Dom Quixote, Lisboa Colecção: Autores de Língua Portuguesa Ano de edição: 2008- Preço com IVA: 12,00 €

 
1. Continuação da (re)publicação do "Diário de Guerra", do nosso camarada açoriano e escritor Cristóvão de Aguiar (1940-2021), que faleceu na passada dia 5, aos 81 anos (*).  

Organização: José Martins; revisão e fixação de texto (para efeitos de publicação no nosso blogue): Virgínio Briote (,a partir da parte VI, Carlos Vinhal).

Estes excertos, que o autor selecionou e cedeu amavalmente ao José Martins, para divulgação no blogue, fazem parte do seu livro "Relação de Bordo (1964-1988)" (Porto, Campo das Letras, 1999, 425 pp). (**). São onze ao todo os postes publicados no blogue, este será o último. 



Cristóvão de Aguiar.
Foto: Wook (com a devida vénia...)



Diário de Guerra

por Cristóvão de Aguiar


Coimbra, 18 de Maio de 1968

Não merecia tanto. Há mais de um ano que regressei da guerra e não há maneira de me sentir inteiro. Ando por aí, caindo aos bocados, vomitando pelas ruas, agarrado às grades de ferro de certos muros, cheio de pânico no futuro, que o presente, estou-o desperdiçando, por isso me agarro doentiamente ao passado, que bem sei que nunca foi um paraíso e a prova visível sou eu próprio. 

As dores de cabeça são por vezes terríveis e prolongam-se por mais de um dia. Dizem-me os médicos que tenho de ajudar-me, caso contrário a vida deixa de me ter sentido. Já deixou. Pelo menos em certas ocasiões, que se estão multiplicando e tornando cada vez mais frequentes. 

Tenho feito exames e passado com classificações muito razoáveis, até fiz mais do que eu próprio esperava, talvez por pressentir que ninguém acreditava nas minhas possibilidades. Faltam-me apenas quatro cadeiras, três das quais de envergadura, para concluir o plano de estudos do meu curso. Por este andar ainda me formo em menos de um ano. Bem entendido que pago alto preço por cada disciplina que arrecado. Sempre que faço um exame, fico uns dias acrescentados de cama, desfalecido, pele e osso, o cérebro vazio, tentando reconstruir-me para enfrentar outro [...].

Tomar, 17 de Dezembro de 1968

Vim esperar meu irmão Artur. Chegou hoje de Moçambique. Quando me abraçou, disse-me à queima-roupa que eu parecia um esqueleto ambulante. Respondi-lhe que era do estudo intenso a que me tinha submetido, já que me estava preparando para concluir o curso dentro de pouco tempo. Menti-lhe. Nunca o meu estudo teve uma intensidade por aí além. E nunca a teve, não porque não desejasse, mas porque nunca tive tempo. O que me sobra, depois das preocupações que tenho comigo, pouco ou nada representa. 

De oficial de dia ao Regimento de Infantaria 15 estava o capitão da minha Companhia da Guiné, o que não veio connosco por ainda lhe faltar algum tempo para terminar a comissão de serviço. Enquanto meu irmão foi tratar da sua desmobilização, fui para o gabinete do oficial de dia, onde também eu já estivera algumas vezes de serviço, conversar um pouco com o velho capitão. Parecia que estávamos os dois na tropa. Quando o cabo de transmissões lhe veio trazer uma mensagem confidencial vinda do QG, leu e depois passou-ma, para que a lesse também. Tal qual como na Guiné. 

Valeu meu irmão, já desmobilizado, ter vindo buscar-me, caso contrário ainda me metia de novo na pele de alferes. Magreza quase igual à que trazia quando desembarquei, tenho-a também agora. De forma que só me faltava a farda. Meu irmão vem tão ansioso por embarcar para a América que me disse que vai já começar quanto antes a tratar dos papéis.

Gerês, 21 de Julho de 1969

Vim para as termas em cata de alívio. Perguntei ao Louzã Henriques se fazia bem em vir. Disse-me que sim, que mal não me faria. Vai sempre ao meu jeito e não sei se isso me faz bem. Estou aqui há mais de uma semana. Saiu o Doutor Quintela e vim eu para o seu lugar. Ficou combinado em Coimbra. Ele costuma dizer que vem limpar a isca. Não me queixo do fígado, mas a função que exerce está alterada. Deve ser dos nervos. 

Estou todo alterado. Enquanto aqui esteve o Doutor Paulo Quintela, enviei-lhe todos os comunicados da crise académica produzidos durante a sua ausência. Sem remetente, que nunca se sabe. Rebentou em 17 de Abril, dia em que se inaugurou o edifício das Matemáticas. Houve greve geral aos exames, que foi um êxito, o que abalou o regime primaveril de Marcelo. 

Cumpro à risca a dieta prescrita. Bebo as águas com fé, como a comida sem sal, tomo banho de agulheta. Ao princípio tomava apenas um. Dois dias mais tarde, queixei-me ao médico de que não dormia. Receitou-me mais um banho de agulheta, à tarde. Um de manhã e outro ao fim da tarde. De tal maneira me desceu a tensão arterial, que ando aos tombos e nem sequer consigo ler.

 O resto do tempo, que é quase todo, ouço as asneiras dos africanistas em férias. Vieram tratar da figadeira e encontram-se aqui na Pensão da Ponte. E entro em ebulição, porque não posso ficar calado. Suspiram por Salazar e ainda têm esperança num milagre que o reponha no poder. Quem há meses lhe sucedeu na Presidência do Conselho é ainda demasiado liberal para tal gente habituada a lidar com pretos, como se fossem animais de estimação. Bem lhes conheço a crónica. 

Mas hoje houve tréguas. O homem poisou na Lua. Vi tudo pela televisão com o coração nas mãos. E à noite fui passear para a ver com outros olhos boiando no mar do céu .

Leiria, 27 de Janeiro de 1970

Fui hoje a mais um consultório médico. Já tenho percorrido vários. O costume. Sou um doente crónico. Tenho bem a quem sair, isto é, a mim mesmo ou ao outro que coabita em mim. Mas, hoje, sentia-me terrivelmente angustiado. Tinha comprado ontem um livro intitulado Viva sem Medo. Li-o de uma assentada, mas fiquei na mesma ou com mais medo ainda. 

E há pouco resolvi ir a um médico para ver como se comportava comigo. Escolhi-o pela tabuleta. E gostei. Fez-me perguntas e mais perguntas sobre o meu passado. Até que eu próprio cheguei à raiz e à razão da minha redobrada angústia neste dia sentida - faz hoje exactamente três anos que cheguei da guerra e o relógio psíquico interior acusou a efeméride e quis condignamente celebrá-la.


[ Revisão / fixação de textos / imagem e legenda / links / notas entre parêntesis rectos / subtítulo, paar efeitos de publicação deste poste: LG ]
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Postes anteriores:

22 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22651: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte IX: Bissau e Contuboel. Consulta de psiquiatria. Poema "O Menino de Sua Mãe". Nascimento do primeiro filho. Exame em Bafatá de militares sem a instrução primária. Sedução da senhora professora, cabo-verdiana... (Set - dez 1966)

20 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22646: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte VIII: Contuboel , Fajonquito e Sonaco. Gravidez da Otília (Jan - ago 1966)

16 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22634: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte VII: Contuboel e Dunane (entre Piche e Canquelifá) (Out - dez 1965)

14 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22628: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte VI: Contuboel (mai-set 1965), com gozo licença de férias nos Açores (de 24/8 a 25/9/1965) onde se foi casar...

13 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22626: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte V: Do Tejo ao Geba (17 de Abril de 1965/25 de Maio de 1965)

10 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22617: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte IV: Mafra e Tomar (Julho 1964/Abril 1965)

9 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22612: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte III: Mafra, maio-junho de 1964

8 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22611: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte II: Mafra, fevereiro-março de 1964

8 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22609: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte I: Mafra, janeiro de 1964

terça-feira, 26 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22662: Fichas de unidades (21): CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 (Bolama, Contuboel, Cuntima, Farim, Binta, Jumbembem, Canjambari, Saliquinhedim / K3, 1969/71)



Companhia de Caçadores nº  2592

Identificação: CCaç 2592

Unidade Mob: RI 16 - Évora

Crndt: Cap Inf José Luís de Sousa Ferreira

Divisa: -

Partida: Embarque em 24Mai69; desembarque em 30Mai69 | Extinção em 18Jan70

Síntese da Actividade Operacional

A subunidade foi constituída com quadros e especialistas metropolitanos e enquadrou pessoal natural das etnias Mandinga e Manjaca e ainda um pelotão da etnia Felupe, tendo efectuado a 2ª fase da instrução de formação no CIM, em Bolama [e em Contuboel, o pelotão de mandingas] e sido seguidamente utilizada em patrulhamentos, reconhecimentos e contactos com as populações da região.

Em 6Nov69, foi colocada em Cuntima [região do Oio, sector de Farim], a fim de substituir a CCaç 2529 como força de intervenção e reserva do BCaç 2879, tendo sido empregada em várias acções, patrulhamentos e emboscadas na linha de infiltração de Sitató.

Em 18Jan70, a subunidade passou a designar-se CCaç 14, sendo considerada subunidade da guarnição normal a partir daquela data.

Observações - Não tem História da Unidade.


Companhia de Caçadores nº 14


Identificação: CCaç 14

Cmdts: 

Cap Inf José Luís de Sousa Ferreira | Cap Inf José Augusto da Costa Abreu Dias | Cap QEO Humberto Trigo de Bordalo Xavier | Cap Inf José Clementino Pais | Cap Inf Mário José Fernandes Jorge Rodrigues | Cap Inf Vítor da Silva e Sousa | Alf Mil Inf Silvino Octávio Rosa Santos |  Cap Art Vítor Manuel Barata

Início: 18Jan70 (por alteração da anterior designação de CCaç 2592) | Extinção: 2Set74


Síntese da Actividade Operacional

Em 18Jan70, foi criada por alteração da sua designação anterior, integrando quadros e especialistas metropolitanos, e pessoal da Guiné, das etnias Mandinga e Manjaca e ainda um pelotão da etnia Felupe, que constituíam anteriormente a CCaç 2592.

Continuou instalada em Cuntima, nas funções de subunidade de intervenção e reserva do sector de Farim, com vista à actuação prioritária sobre a linha de infiltração de Sitató.

Após ter deslocado um pelotão para Farim, a partir de finais de Dez70, foi transferida para Farim em 20Fev71, depois de ter sido substituída, por troca, pela CArt 3331. 

Rendeu, na função de intervenção e reserva do sector, a CCaç 2533, com vista a realizar acções de contrapenetração no corredor de  Lamel. 

Destacou ainda pelotões para reforço temporário de outras guarnições, nomeadamente de Binta, de 25Abr71 a 12Jun71, Jumbembém e Canjambari.

A partir de 10Fev73, mantendo no entanto a sede em Farim e continuando orientada para a sua anterior missão assumiu, cumulativamente, a responsabilidade do subsector de Saliquinhedim, para onde deslocou um pelotão.

Em 2Set74, foi desactivada e extinta.

Observações - Tem História da Unidade a partir de Jan72 (Caixa n." 117 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné - 1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pp. 382 e 634
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Nota do editor: 

Último poste da série > 7 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22607: Fichas de unidades (20): Batalhão de Comandos da Guiné (Brá, 1972/74), incluindo 1ª CCmdsAfr (1969/74), 2ª CCmdsAfr (1971/74) e 3ª CCmds (1972/74)

segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22661: Tabanca Grande (527): António G. Carvalho, a viver em Ponta Delgada, ex-fur mil op esp, CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 (Bolama e Cuntima, 1969/70). É Deficiente das Forças Armadas. Senta-se no lugar nº 853, à sombra do nosso poilão



Foto nº 1 > Guiné > Bolama >  Centro de Instrução Militar > CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 > 1969 > Da esquerda para a direita, os furriéis milicianos Eduardo Estrela, o Manuel Ramos Marques Cruz (, de Vila Real de Santo António, já falecido) e o  António G. Carvalho.


Foto nº 2 > Guiné > Região do Oio > Sector de Farim > Cuntima  > CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 > 1969 > "Eu e dois soldados da etnia Felupe (esta etnia era canibal, mas estes diziam que já tinham deixado de ser), que faziam parte da nossa companhia. No mês de Novembro de 1969 (penso), fizeram queixa ao gen Spinola, dizendo que tinham ido para o exército, para aprender armas de branco para defender as suas famílias que estavam em S. Domingos, por isso não queriam ficar em Cuntima e realmente foram logo transferidos.


Foto nº 3 > Guiné > 
Região do Oio > Sector de Farim > Cuntima  > CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 > Em Cuntima. Eu e o vagomestre Germano (do Porto). A inscrição que está no pedestal é de uma das  companhias que  esteve  aqui, a  CCAÇ 1789, do BCAÇ 1932 (1967/69), mobilizado pelo RI 15 (Tomar). A CCaç 2592 (futura CCAÇ 13) foi colocada  em 6 de novembro de 1969, em Cuntima, a fim de substituir a madeirense CCaç 2529 como força de intervenção e reserva do BCaç 2879,

Este vagomestre mandava fazer muitas vezes bife com batatas fritas, e sempre servia uísque, quando estavámos em Portalegre, no IAO. Grande Germano.

Fotos (e legendas): © António G. Carvalho (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de António Manuel Gaspar de Carvalho, novo membro da Tabanca Grande, nº 753:


Data - domingo, 24/10, 21:10 (há 16 horas)
Assunto - Blogue 


Olá, boa noite,  Camaradas.

Terei muito gosto em pertencer como elemento activo na tertúlia.

Pertencia à CCAÇ 2592, ao que depois se veio a formar a CCAÇ 14, não foi rendição individual

Como diz o Estrela (eu já não me lembrava), pertencia ao 3.º pelotão, cujo alferes era o Azevedo.

Para não ficar pesado irei enviando fotos com algumas legendas. A foto n.º 1  foi tirada em Bolama, alguns dias antes de termos sido atacados (com mísseis) a partir de S. João, cujo comandante do IN (soube-se depois) era o 'Nino' Vieira, que certamente sabem, tinha sido cabo do exército Português.

Sou António Manuel Gaspar de Carvalho. (agora escolham o nome que pretendem usar). Actualmente sou 2.º Sarg. DFA

Na altura do embarque no navio Niassa, penso que a 24 de Maio de 1969,  era Furriel Miliciano com a especialidade de Operações Especiais (Ranger), 1.º Classificado do 3.º turno de 1968, o 2.º Classificado foi o Humberto Reis, penso que da CCAÇ 2590 / CCAÇ12

No dia 2 de Março de 1970, por volta das 9 da manhã, em Cabele Uale caí numa mina antipessoal, com amputação abaixo do joelho), depois contarei a história.

Regressei a 11 de Abril de 1970, por evacuação, com destino ao HMP, após 38 dias de férias no HM 241, em Bissau

Abraço
AC

PS - Seguem também as fotos n.ºs 2 e 3


António Manuel Gaspar Carvalho (foto gentilmente cedida pelo seu amigo e camarada da CCAÇ 2592 / CCAÇ 14,  Edurado Estrela, ex-fur mil at inf (que esteve em Bolama e Cuntima, 1969/71) 


2. Através do Formulário de Contacto do Blogger,  o nosso camarada António G. Carvalho tinha-nos mandado a seguinte mensagem, sucinta, com data de sábado, 23/10, 17:23


"Estive na CCaç 14, furrriel, ferido em combate, tenho algumas fotos, como faço?
Cumprimentos,
António G. Carvalho"

3. Resposta do nosso editor LG, na mesma data, às 17h23:


António: Sê bem vindo. Gostaria de te ter aqui ao lado do teu camarada Eduardo Estrela, que é do meu tempo (eu sou da CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71). Manda duas fotos tipo passe, uma atual e outra do tempo da Guiné. Diz mais qualquer sobre ti. Terei muito gosto em apresentar-te à Tabanca Grande: somos já dois batalhões...

As fotos têm que vir digitalizadas (passas-as pelo scan), com legendas (data, local, etc.). E com boa resolução... Mantenhas. Um alfabravo. Luis Graça

4. Logo a seguir o Carlos Esteves Vinhal escreveu-lhe (e ele respondeu logo, na volta do correiro, vd. ponte 1, acima):

Data - Sábado, 23/10, 20:03
Assunto - Contacto com o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Caro camarada António Carvalho: Uma vez que já temos na tertúlia um camarada António Carvalho, por favor diz-nos o teu nome do meio. 

Entretanto, muito obrigado pelo teu contacto. Se aceitares a nossa proposta, teríamos muito gosto em receber-te como elemento activo da tertúlia do nosso Blogue.

Para o efeito, manda-nos uma foto actual e outra do tempo de Guiné (fardado), diz-nos o teu nome, posto, especialidade, data de ida e de regresso. Poderás ter ido integrado na CCAÇ 2592 que mais tarde passou a designar-se CCAÇ 14, ou mais tarde em rendição individual, depois confirma.

E finalmente diz-nos os locais onde usufruiste das férias que o governo de então te proporcionou nos melhores "resorts" da Guiné. Terás andado pelo Norte (Farim), não muito longe de Mansabá, onde estive entre 1970 e 1972.

Podes começar a mandar-nos as tuas fotos, com as respectivas legendas (à parte) que indicarão, se te lembrares, o local, a data, a situação e quem está retratado.

Também nos podes mandar memórias escritas, em forma de estórias, com acontecimentos que ainda retenhas.

Para contactares connosco, utiliza este meu endereço (carlos.vinhal@gmail.com) e o do editor Luís Graça: luis.graca.prof@gmail.com

Ficamos na espectativa da tua resposta.

Em nome da tertúlia e dos editores segue um abraço e os votos de boa saúde.
Carlos Vinhal

Ex-Fur Mil da CART 2732
Mansabá/Guiné/1970-72

Co-Editor dos Blogues:
Luís Graça & Camaradas da Guiné
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt

CART 2732
https://cart2732.blogspot.pt

 5. Entretanto, o Eduardo Estrela, nosso amigo e camarada, da CCAÇ 14, deu-nos mais informação sobre o António G. Carvalho, em mensagem de sábado, dia 23, às 2oh33:

Boa noite Luís!

O António Carvalho era o outro furriel do meu grupo de combate da CCAÇ 14. (3.º  Pelotão). Era um grupo só com 2 furriéis, eu atirador de infantaria e ele de operações especiais. Grande companheiro e amigo com o qual temos mantido, não obstante ele viver há muitos anos em Ponta Delgada, um relacionamento que se traduz nalgumas presenças físicas em almoços onde o António faz questão de participar.

Ainda hoje estivemos a falar ao telefone e voltei a falar-lhe do blogue.

Lamentavelmente no dia 2 de Março de 1970 por volta das 9 da manhã, em Cabele Uale, a caminho do corredor de Sitató, foi vítima duma mina A/P e perdeu um pé.

Ele tem coisas e histórias para contar e fá-lo-á tenho a certeza. É mais um a engrossar as tropas desmobilizadas mas activas.

Grande abraço
Eduardo


6. Nova mensagem do Eduardo Estrela:

Data - 24/10/2021, 23:11

Olá Luís,  boa noite!

Na fotografia que o Carvalho mandou (Foto n.º 1), o da esquerda sou eu, ainda sem o bigode que me tem acompanhado até hoje.

Ao centro está o saudoso Manuel Ramos Marques Cruz, bom amigo que nos deixou há vários anos. Era natural de Vila Real de Santo António. À direita, está o António Carvalho.

Julgo não estar enganado se disser que a fotografia foi tirada no dia do juramento de bandeira e do desfile a seguir, das CCaç 13 e 14. Em Bolama.

Abraço, 
Estrela


7. Comentário final do editor LG:

António, és recebido de braços abertos. Tens aqui um lugar, o n.º 853, para te abrigares à sombra do nosso polião, árvore sagrada para os nossos amigos guineenses, guarmecendo e protegendo as suas tabancas. Para nós tem um grande simbolismo.

Há mais de um mês que não entrava, pelo seu prório pé, nenhum novo membro da Tabanca Grande. O último foi o Manuel Oliveira (n.º 850) (*). Os dois últimos entraram, infelizmente, a título póstumo: o  Celestino Bandeira (1946-2021) e Manuel Dias Sequeira (1944-2008), respetivamente os n.ºs 851 e 852.

Temos então mais um "ranger" na Tabanca Grande, um bravo "ranger" que felizmente sobreviveu à explosão de uma mina A/P, que lhe custou a amputação de uma perna (abaixo do joelho). É uma recordação dolorosa da Guiné que carregas toda a vida. 

Mas deixa-me confirmar que fostes connosco para o CTIG (CCAÇ 2590, CCAÇ 2591, CCAÇ 2592, etc. incluindo o hoje secretário geral do PCP, Jerónimo Sousa, soldado condutor auto da da CPM 2537, além de  outras unidades...) no Niassa, a 24 de maio de 1969, conforme podes verificar aqui, nesta ordem de transporte, constante do poste P19839.

Estás devidamente apresentado ao resto da malta. Conheces as nossas regras de convívio, que deves reler. Só espero que fiques connosco ainda por muitos e bons anos. 

A tua entrada ajuda-nos a mitigar a dor da perda recente de vários camaradas que faziam (e fazem) parte da história deste blogue. Como sabes, aqui partilhamos memórias (boas e más), mas também afectos. 

Ficamos  então a aguardar que nos envies  mais fotos e histórias da tua CCAÇ 14. Da Tabanca Grande também faz parte outro camarada da CCAÇ 2592 / CCAÇ 14, do teu/nosso  tempo, o António Bartolomeu: vê aqui. (O Bartolomeu esteve comigo em Contuboel,  a dar instrução de especialidade a um pelotão de mandingas, na mesma altura, em junho e Julho de 1969, em que eu, o Humbero Reis e outros estávamos a formar a CCAÇ 12, oriunda da CCAÇ 2590). 

Sei que tu e o Estrela estiveram no CIM de Bolama. Sobre Cuntima temos cerca de 60 referências. Sobre a vossa CCAÇ 14 só temos três dezenas de referências, enquanto sobre a CCAÇ 12 há 425. Espero que nos ajudes a encurtar as distâncias...

Ficas registado na Lista Alfabética da Tabanca Grande (vd. coluna estática do lado esquerdo) como António G. Carvalho, para te distinguir do António Carvalho, que chegou primeiro que tu, e que é de Medas, Gondomar.

Espero um dia destes poder conhecer-te pessoalmente. Um grande alfabravo para ti e para o Eduardo Estrela (que tem 18 referências no blogue). 
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Guiné 61/74 - P22660: In Memoriam (416): Victor Barata (1951-2021), ex-1.º Cabo da FAP, Especialista de Instrumentos de Bordo, BA 12, Bissalanca, 1971/73; membro da Tabanca da Grande desde maio de 2006 e fundador, em junho de 2007, do blogue Especialistas da BA 12... Era um "Zé Especial", tratado com muito carinho por "Vitinho"... Velório: hoje, a partir das 16h00 em Campia; Vouzela; missa de corpo presente às 15h00 de amanhã, seguindo depois o féretro para a Casa Crematória de Viseu


Victor Barata (1951-2021). Foto odo blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74 (com a devida vénia...)



Victor Barata, camarada da FAP:

(i) foi especialista de Instrumentos de Bordo, 
esteve na BA 12, Bissalanca (1971/73), na linha da frente das DO 27
(ii) terrou em tudo o que era bocado de pista;  

(iii) membro da Tabanca Grande desde maio de 2006;




1. Acabámos de saber, por telefonema de há uma hora e picos, do Jorge Narciso (ex-1.º Cabo MMA, FAP, BA 12, Bissalanca, 1969/70), de mais uma funesta notícia, a morte do nosso histórico membro da Tabanca Grande, e fundador do Blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74), Victor Barata. (*)

A dolorosa notícia é também confirmada por poste, de hoje, às 10h02, no blogue que ele criou e tanto acarinhou. Eis um excerto:

Blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/4 > segunda-feira, 25 de outubro de 2021 > Voo 3600 - Victor Manuel Barata - O Nosso Comandante "Vitinho"




VICTOR MANUEL GONÇALVES BARATA
Nasceu em Lisboa a 19 de Abril de 1951


O nosso Comandante "Vitinho" partiu hoje 25 de Outubro de 2021

Em nome dos ajudantes do nosso Comandante, Companheiro e Amigo, apresentamos aos familiares, filho, irmão e restante família o nosso sentido pesar.

O corpo vai para a capela de Campia, Vouzela,  às 16h00, de hoje, 25 de Outubro. O funeral realiza-se amanhã, dia 26 de Outubro, com missa de corpo presente às 15h00, segundo depois o corpo para a Casa Crematória de Viseu.


2. O Victor Barata tem 35 referências no nosso blogue. Entrou para a nossa tertúlia em 10 de maio de 2006, quando o blogue ainda era conhecido  simplesmente como o Blogue Fora Nada e Vão Três... 

Ao seu pedido de entrada, respondi-lhe nestes termos (**):

Victor: A pista pode ser curta mas é toda tua... Na nossa caserna cabem todos os camaradas, sejam eles terrestres, voadores ou ambífios. A FAP, tão dignamente representada por ti, é bem especialmente bem vinda à nossa tertúlia e ao nosso blogue... 

Por mim, sempre tive uma especial admiração pelos 'malucos' dessas máquinas voadoras que eram os DO 27 e que nos traziam notícias do mundo, do outro do mundo... Já não gostava tanto quando eles, em vez do carteiro, transportavam o senhor major de operações ou do senhor comandante de qualquer coisa... Ou sejam, quando de frágil caranguejola eram promovidas a um coisa que pomposamente se chamava o PCV (Posto de Comando Volante).

Um reparo: o blogue chama-se Luís Graça & Camaradas da Guiné > Blogue-fora-nada. Eu sou apenas o editor. A partir de hoje o blogue também é teu, de pleno direito. Vou publicar o texto adicional que me mandaste, e que é um bonito testemunho de solidariedade em tempo de guerra, ou seja, de camaradgem. Se tiveres fotos desses tempos que já lá vão, manda, que os tertulianos têm ainda a ilusão de que recordar é viver...

Depois tivemos oportunidade de nos conhecermos pessoalmente (no I Enconro Nacional da Tabanca Grande, na Ameira, Montemor-O-Novo, em outubro de 2006), mas a vida não nos proporcionou muitas ocasiões de convívio, tirando um ou outro 10 de Junho. Guardo dele a imagem de um homem sensível, afável e solidário, que tinha pela FAP (e pela Guiné) uma grande paixão.

 Infelzmente, a sua pista da vida foi curta, morre aos 70 anos de doença crónica degenerativa. Saibamos honrar a sua memória. É um ano trágico, este de 2021, em que a gadanha da morte está a ceifar muitos de nós. (*)

 Até sempre, camarada!... 

PS - Os meus votos de pesar, em nome de toda a Tabanca Grande, vão para a sua família, amigos mais próximos e camaradas do Blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74. 

3. Adenda: a última vez que nos vimos, se não erro, foi no lançamento do livro  ("Voando sobre um ninho de Strelas" , 1ª ed.), do gen pilav ref António Martins de Matos (ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), em Lisboa, em 11 de dezembro de 2018. Depois meteu-se  a pandemia, a partir de março de 2019... e deixou de haver convívios das nossas tabancas e sessões de lançamento de livros.

Esteve também, que me lembre, no V Encontro Nacional da Tabanca Grande, em Monte Real, em 23 de junho de 2010. Veio de Vouzela, onde vivia e trabalhava como empresário. Também esteve no VI Encontro Nacional, também em Monte Real, 4 de junho de 2011.
 

Lisboa > Hotel Travel Park > 11 de dezembro de 2018 > Sessão de apresentação do livro "Voando sobre um ninho de Strelas"  >  Da esquerda para a direita, o autor, António Martins de Matos, e os editores dos blogues Especialistas da B12 Guiné 65/74, Tabanca do Centro e Tabanca Grande, respetivamente, Victor Barata, Joaquim Mexia Alves e Luís Graça, que fizeram curtas intervenções de 5 minutos sobre o autor e o livro. Segiu-se depois uma discussão aberta ao público, composto essencialmente por antigos militares da FAP e do exército, que passaram pelo TO da Guiné, incluindo o casal mais 'strelado' do mundo, os nossos queridos amigos e camaradas Miguel e Giselda Pessoa. "Este livro foi escrito, não para vós, mas para os vossos filhos e netos", disse o autor.

Foto: © Miguel Pessoa (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Monte Real > Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande > De que estarão a falar o Jaime Brandão (Monte Real / Leiria) e o Victor Barata (Vouzela)? Só pode ser do blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74 de que o Victor é o fundador e comandante... 

Foto: © Manuel Resende (2011). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 
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Notas do editor:


Guiné 61/74 - P22659: Notas de leitura (1390): Cabo Verde, os bastidores da independência, por José Vicente Lopes; Spleen Edições, 3.ª edição, 2013 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Novembro de 2018:

Queridos amigos,
Há que reconhecer que esta investigação de José Vicente Lopes nos assegura uma maior transparência para a compreensão da evolução do PAIGC antes, durante e após a luta armada na Guiné. O que mais impressiona neste trabalho, rigoroso dentro das regras do que se chama a história oral, é permitir ouvir os quadros cabo-verdianos, vinte anos depois das independências e perceber claramente que havia enormes divisões, desconfianças e desacertos nas linhas do rumo a traçar para os dois países. E perpassa, ao longo de toda esta investigação, de forma liminar, que aqueles dois povos não podiam coincidir para um futuro comum, eram patentes os antagonismos e os constrangimentos ditados pela cultura, pela identidade e até pela religião. É pena que o documento de José Vicente Lopes quanto a Cabo Verde não tenha o contrapeso de outro documento de igual valor e seriedade na Guiné-Bissau.

Um abraço do
Mário



Cabo Verde, os bastidores da independência (2)

Beja Santos

T
rata-se do primeiro livro do jornalista e investigador José Vicente Lopes, construído a partir de entrevistas com mais de cem personalidades cabo-verdianas, guineenses e portuguesas, cruzadas com fontes documentais e bibliográficas: “Cabo Verde, os bastidores da independência”, por José Vicente Lopes, Spleen Edições, 3.ª edição, 2013.

Amílcar Cabral definira, em termos inquestionáveis, a unidade Guiné-Cabo Verde com uma grande consigna que levaria à independência os dois países. A tese, chamemos-lhe assim, não entusiasmou todos os simpatizantes do PAIGC, e muito menos os que dele estavam fora. Reconheço que o maior mérito deste livro é deixar claro o que separa a cultura guineense da cultura cabo-verdiana. Amílcar Cabral tudo fazia para encontrar afinidades históricas na complementaridade, camuflando problemas da longa duração de péssimo relacionamento entre os profissionais liberais, os funcionários da Administração colonial, os comerciantes de extração cabo-verdiana e as etnias guineenses. Logo em 1963 se pôs a questão da luta em simultâneo, pela independência da Guiné e Cabo-Verde. Não havia saída para lançar a guerrilha no Arquipélago, tão só a subversão, infiltrar elementos do PAIGC e sensibilizar as populações das ilhas, a luta armada foi sempre diferida, houve treino militar na RDA, na URSS e em Cuba, o desembarque adiado. Jorge Querido, então o responsável do PAIGC em Cabo Verde, ainda supôs ser possível lançar comandos e atacar aquartelamentos e fazer reféns, mas tudo isso foi dado como inviável, utópico. Alguém comenta: “Seriamos depois cercados e morreríamos de fome, ou então acontecia o contrário: o próprio povo chacinaria em dois tempos os dirigentes da luta armada em Cabo Verde, antes que ele próprio morresse de fome”. Amílcar Cabral viverá em permanente tensão todo o seu relacionamento com os cabo-verdianos, houve mesmo a sugestão de criar um posto avançado da luta em Nouakchot, na Mauritânia, mas os mauritanianos não apoiaram tal projeto. E por ironia da História, estes cabo-verdianos desviados da luta armada nas ilhas irão ter um papel determinante na ofensiva de 1973.

Nem mesmo com a morte do líder do PAIGC o problema da luta armada em Cabo Verde diminuiu de intensidade. Abílio Duarte resolve desenterrar o problema no II Congresso do PAIGC, realizado de 18 a 22 de julho de 1973, na região do Boé. Ele sugere a criação da Comissão Nacional de Cabo Verde, foi fortemente contestado, acusado de estar a quebrar a unidade. José Vicente Lopes vai dando a palavra a outros protagonistas como Osvaldo Lopes da Silva, que também tinha uma relação cortante com Cabral. Segundo ele, o líder do PAIGC entrega-lhe a missão de tomar um quartel, escolheu-se Guileje. É neste congresso que Abílio Duarte terá salvo Osvaldo Vieira de fuzilamento, corria o rumor de que este guerrilheiro mítico estava seriamente envolvido no complô do assassinato do líder. Osvaldo foi suspenso de todas as suas atividades e morreu alguns meses depois.

É neste contexto que vai ganhando notoriedade Pedro Pires, que se irá distinguir na dita Comissão Nacional de Cabo Verde. Aristides Pereira é confirmado como novo secretário-geral do PAIGC e Luís Cabral como seu adjunto, julgava-se ter pacificado o interior do partido, a rivalidade entre gente de dois países entrara num compasso de espera, impunham-se medidas enérgicas de luta, como virá a acontecer em Guileje, Gadamael e Guidaje e em 24 de setembro dá-se a independência unilateral, o autor descreve a diplomacia de Cabral, a procura da conquista dos emigrantes, a operação de preparar eleições junto das populações afetas ao PAIGC, a elaboração da Constituição, o apoio da ONU e de muitas dezenas de países para reconhecerem a Guiné-Bissau como um Estado independente parcialmente ocupado por uma potência colonial.

Com muito detalhe e pormenor, o autor descreve Cabo Verde nas vésperas do 25 de abril e não ilude o facto de que a agitação do PAIGC nas ilhas era muito reduzida, a PIDE sufocava com relativa facilidade os agitadores. E assim chegamos ao 25 de abril, logo o PAIGC começou a preparar o regresso às ilhas de quadros relevantes e mesmo oposicionistas de peso ao PAIGC, como Leitão da Graça, pensaram em regressar. Começam as negociações com as novas autoridades portuguesas, assim se vai chegar aos acordos de Argel, o PAIGC entrará em Bissau em outubro de 1974. As negociações decorrem numa atmosfera difícil quanto ao reconhecimento à independência de Cabo Verde, imiscuíam-se interesses geoestratégicos e geopolíticos, tais como as preocupações da NATO, o temor de bases soviéticas nas ilhas, dificuldades em voos da África do Sul no aeroporto do Sal, por exemplo.

Os quadros cabo-verdianos entrarão em luta renhida, na disputa pelo poder. Jorge Querido é arredado, guerreiam-se várias linhas, com peso para os marxistas-leninistas e trotskistas, o PAIGC terá a vida facilitada por uma linha do MFA que impedirá a circulação de outras forças políticas, incluindo a de Leitão da Graça. De novo José Vicente Lopes transfere a sua linha de leitura para a Guiné, voltamos ao protocolo de Argel, o PAIGC entra em alta com o reconhecimento internacional, volta-se a Cabo Verde e descreve-se minuciosamente a consagração do PAIGC, o modo como irão ser sufocadas as oposições, a formação de um Governo de transição, os saneamentos, o papel desempenhado por Aristides Pereira, Luís Cabral e Pedro Pires. Há eleições em 5 de junho de 1975, o partido único elege 56 deputados, há Assembleia Nacional Popular. Aristides Pereira é eleito Presidente da República, ele apela a que “todos os cabo-verdianos, independentemente da sua tendência, acabarão por aderir à causa da independência da sua terra”. Aristides Pereira e Pedro Pires não ignoram os condicionalismos internacionais, as colónias de emigrantes cabo-verdianos nos Estados Unidos e na Europa, expectantes quanto à natureza do Estado a implementar, os sucessivos anos de seca, a fortíssima oposição ao PAIGC. E nessa hora de independência, as figuras gradas da oposição são recambiadas para Portugal.

(Continua)

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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE OUTUBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22640: Notas de leitura (1389): Cabo Verde, os bastidores da independência, por José Vicente Lopes; Spleen Edições, 3.ª edição, 2013 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22658: Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo (António Graça de Abreu) - Parte XIX: Copenhaga, Dinamarca, junho de 2017







Reino da Diamarca > Copenhaga > Junho de 2017 > Alguns dos sítios icónicos da capital da pátria de Hsmlet.

 
Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2021).. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da série "Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo" (*), da autoria de António Graca de Abreu [, ex-alf mil, CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74. 
Texto e fotos recebidos em 27 de setembro último.


Escritor e docente universitário, sinólogo (especialista em língua, literatura e história da China); natural do Porto, vive em Cascais; é autor de mais de 20 títulos, entre eles, "Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura" (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp); "globetrotter", viajante compulsivo com duas voltas ao mundo, em cruzeiros. É membro da nossa Tabanca Grande desde 2007, tem mais de 290y referências no blogue. 


Copenhaga, Dinamarca, junho de 2021

por António Graça de Abreu


Tenho finalmente a sorte programada, em Junho de 2017, de pôr o pé e a cabeça na singular capital da Dinamarca. Ignoro quase tudo sobre o reino dinamarquês, mas venho ao encontro do príncipe Hamlet, o da caveira e do “to be or not to be”, (coisas inglesas, made in Shakespeare…), mais Hans Christien Anderson com histórias de fadas para encantar crianças. Até descubro a sereia famosa abanando a cauda no porto de Copenhaga.

Palácios reais que nunca mais acabam, Amalienborg, Christiansborg, Charlottenborg, Rosenborg, as jóias da coroa, de portas abertas para toda a gente,

Meio dia para ir ao Tivoli, não o teatro lisboeta, na nossa Avenida da Liberdade, não o palácio e jardins nos arredores de Roma, mas o Tivoli da Dinamarca plantado na cidade para diversão das pessoas da terra. Um lago, uma montanha russa, um altaneiro pavilhão chinês, uma péssima cópia de um templo indiano. Carrocéis piramidais, um restaurante croata, relvados, flores e jardins. Entretenimento para novos, velhos, para toda a gente.

Na cidade, comer, dormir, respirar, tudo muito caro se considerarmos a minha depauperada bolsa lusitana.

Passou-me ao lado o bairro hippie de Christiania, existente desde 1971, paraíso para a venda de drogas leves e pesadas, tolerado pelas complacentes autoridades dinamarquesas. É uma área que não faz parte das minhas opções de vida.

Nyhavn, o Novo Porto é um dos ícones da capital. Trata-se de um largo canal escavado no século XVII por prisioneiros suecos, o que possibilitou a entrada de navios quase até ao coração de Copenhaga, transportando peixe e todo o tipo de mercadorias. De ambos os lados de Nyhavn erguem-se casas antigas com vários andares, cada uma com a sua cor alegre, em tons pastel fortes, os amarelos, azuis, verdes, vermelhão. E bares, restaurantes, cafés, alguma música amenizando as noites.

Como disse Hamlet, príncipe da Dinamarca, ao aproximar-se das horas da morte, “o resto é silêncio.” Silêncio, após o ruído incessante dos dias, também nestas paragens nórdicas.

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Nota do editor:

(*) Último poste ds série > 6 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22602: Depois de Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74: No Espelho do Mundo (António Graça de Abreu) - Parte XVIII: Montanha Wutai, província de Shanxi, China, 2002

domingo, 24 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22657: (De) Caras (180): 55 anos depois, o reencontro ao vivo, em São da João da Madeira, com o ex-alf mil médico Francisco Pinho da Costa (BCAÇ 1888, Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68) (João Crisóstomo, Nova Iorque, de visita a Portugal)


São João da Madeira > 23 de outubro de 2021 > Dois velhos camaradas do tempo de Porto Gole: o alf mil at inf João Crisóstomo, da CCAÇ 1439 (1965/67) e o alf mil médico Francisco Pinho da Costa, do BCAÇ 1888 (Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68).


São João da Madeira > 23 de outubro de 2021 > À esquerda, o ex-alf mil médico António Azevedo Praia de Vasconcelos, do BCAV 1897 (Mansoa e Mansabá, 1966/68).


Fotos (e legendas): © Vilma / João Crisóstomo (2021).. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do João Crisóstomo, com data  de hoje, dia 24, às 10:14:, antes do encontro marcado para hoje, domingo, com missa às 12h30, no Mosteiro  do Varatojo, Torres Vedras, das famílias Crispim & Crisóstomo (*):


Caro Luís Graça,
   
Acabo de chegar a casa (, em Torres Vedras, depois da Vilma ter regressado a bordo, no passado, dia 20, vinda da Eslovénia) . Gostas que partilhemos experiências relacionadas com a Guiné … aqui vai o que se passou ontem comigo:

Fui a Coimbra onde tinha deixado para encadernar um calhamaço que comprei um dia numa feira em Nova Iorque. Reencaderná-lo lá era proibitivo mas lembrei-me de o fazer em Portugal. E foi em Coimbra que encontrei quem o fizesse. 

Aí lembrei-me de vários amigos e camaradas que tenho encontrado em anos anteriores e que gostaria de encontrar outra vez. Tenho pena de o não poder fazer, que o tempo e outras razões não permitem tudo. Mas há um indivíduo, camarada da Guiné,  que, graças ao António Figueiredo,   da minha CCaç 1439,   eu consegui reencontrar há cerca de dez anos e com quem tenho falado desde então pelo telefone, mas cuja oportunidade de encontrar pessoalmente tem sido elusiva. 

 Sabia que ele morava perto dali e telefonei-lhe. Estava em casa e ficou satisfeito de saber que eu estava em Portugal. Imediatamente combinamos um encontro/almoço num restaurante local, o "Katekero", mesmo em frente da câmara municiipal e lá fomos, eu e a Vilma a conduzir como de costume, até S. João da Madeira.

Não te preciso dizer o que senti, que em circunstâncias é experiência muito repetida , mas que não deixa de ser menos sentida sempre que um de nós reencontra um camarada.

Dentro em pouco falávamos da Guiné: 

"Olha, João    − disse- me ele logo ao começar   −, estive lá só quatro meses,  mas fiquei a gostar daquilo e hoje tenho saudades.” 

E logo lembrou a emoção que sentiu um dia quando numa visita ao Porto, em frente ao centro comercial de Brasília,  deparou com o capitão Amândio Pires, comandante da CCaç 1439…
 
Trata-se do alferes médico Francisco Pinho da Costa, do BCaç 1888,  sediado em Bambadinca,  em 1965 /66. Tem agora 84 anos, com uma memória ainda muito boa, lembrando coisas nos seus pormenores, capacidade que eu há muito perdi substancialmente. 

Perante a minha surpresa, uma vez que estivemos na Guiné na mesma altura e ele ter mais sete anos que eu, explicou que isso se deve ao facto de ter adiado o serviço militar várias vezes para que ele pudesse acabar o seu curso de medicina. Pensei que ele tinha feito o curso de oficial miliciano em Mafra, mas esclareceu-me me "ter sido preparado" em Santarém, uma preparação rápida "ad hoc" (disse ter sido apenas cerca de um mês, se me não engano) ao fim da qual, mesmo sem saber ainda bem o que era e como funcionava uma G3, foi enviado em rendição individual para a Guiné.



Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Fevereiro de 1966 > Cecília Supico Pinto, presidente do Movimento Nacional Feminino, na sua 1ª visita à Guiné, então já com 44 anos (ia fazer 45 em 30 de maio de 1966). De pé à esquerda, na primeira fila, de óculos,  o alf mil médico Francisco  Pinho da Costa, hoje, com 84 anos, a residir em São João da Madeira.

Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Apesar das poucas vezes que estive com ele (ele apenas esteve na Guiné quero meses e apenas apareceu algumas vezes na CCaç 1439), lembro-me bem dele, como um indivíduo afável, bem disposto e sempre a querer ajudar no que quer que fosse: mostrei-lhe,  no computador que propositadamente tinha trazido,  vários postes do nosso blogue, nomeadamente os postes P22258 e P22478. Ele aparece numa foto (vd, acima),  a do primeiro poste, o P22258 ( da esquerda é o segundo, de óculos, ) por ocasião da visita da Supico Pinto a Porto Gole e reconheceu , parece mais e melhor que eu, a maioria dos que aparecem nessa foto. Outras fotos que lhe mostrei foram para ele momentos de emotiva saudade. 
 
Mas foi a leitura do relatório sobre a operação Gorro que lhe ocasionou ume enxurrada de comentários e detalhes, alguns deles a meu respeito que eu tinha já completamente esquecido mas que me vieram à memória então.

Lembrou que o Capitão Pires o havia mandado para ir nessa "saída ao mato”. Mas,  quando ele se preparava para o fazer,   alguns elementos da tabanca vieram ter com ele, avisando-o que não fosse. Mas ele não lhes deu ouvidos: o capitão tinha-o mandado ir e portanto ia. Mas que mais tarde os mesmos membros da tabanca que o haviam aconselhado a não sair, voltaram e desta vez com mais insistência o avisavam de que não devia ir pois que iam ser atacados. Que não lhes deu atencão, mas que,  perante a insistência deles de que iam ser atacados,  resolveu então levar uma G3, como todos os outros.

Lembra-se de ir em pé em cima do “granadeiro”,  agarrado à “parede da frente "por trás do condutor António Figueiredo, quando a mina explodiu e foi pelos ares. "Foram os maiores minutos da minha vida”… sentiu e ficou consciente do sopro da explosão que o fez ir pelos ares mas que depois "parecia nunca mais chegar ao chão”… 

 E quando de pernas direitas atingiu o chão, percebeu logo que tinha partido uma das pernas, para logo verificar que tinha o calcanhar e tornozelo da outra também estavam partidos. Mas que haviam vários feridos (pensa ele que eram cerca de oito) , os que foram com ele pelos ares e as dores eram sofríveis. 

Com um bocado duma tábua e alguma ajuda que lhe deram ele próprio endireitou e imobilizou a  perna partida e começou a ajudar aqueles que precisavam da sua ajuda; lembra-se de ter instruido um indivíduo — pensa ele que era um cabo enfermeiro que estava ferido — a tapar e fechar com os próprios dedos a veia junto ao ouvido, pois este estava a sangrar pelos ouvidos e tinha de ser evacuado imediatamente. Depois de evacuado nunca soube mais dele.

E lembra-se bem de mim: que eu ia ao lado do condutor e que eu ia a dormitar quando a mina rebentou. A mim e ao condutor não nos sucedeu nada, apesar de termos sido lançados pelos ares. Lembra-se que eu o abracei quando vi que ele estava vivo; e lembrou-me dum facto que de todo tinha esquecido até hoje: que lhe disse que eu estava ferido, mas que não sentia dores, mas que — dizia eu— o sangue me corria pelas pernas. E logo verificou que o que eu pensava ser sangue a escorrer na perna era apenas o azeite de uma lata de sardinhas… Sucede que eu tinha comigo a ração de combate e um estilhaço qualquer atingiu o meu saco da ração de combate mas a lata de sardinhas salvou-me do pior. E a verdade é que quando ele mencionou isto eu lembrei-me imediata e vivamente de tudo isso. 

O raça da idade faz destas coisas… . Como me lembrei também da troça de que fui alvo depois muitas vezes … o que me admira é ter completamente esquecido isto; um facto que se não fosse o médico a lembrar-me agora, provavelmente nunca mais me viria à memória…

E foram umas atrás das outras, as histórias e memórias que relembramos, umas boas, outras menos boas: a historia dum alferes, Alves Moreira, conhecido como "o Grilo” que era comandante do Xime: havia no Xime um cão de guerra ( devo dizer que nunca ouvi isto antes) que,  embora não atacasse ninguém sem razão, só respeitava mesmo o soldado que o havia treinado. O alferes porém pensava que, porque alferes, sabia melhor que os outros, e gostava de mostrar as suas capacidades e conhecimentos no manejo de cães de guerra; mas o cão parecia não concordar e não reconhecia autoridades; e um dia atirou-se ao alferes que apenas se salvou de pior porque o treinador presente controlou imediatamente “ aquela falta de respeito” a um oficial . 

Um dia perguntou o que é que seria feito do cão quando o treinador deixasse de o ser por qualquer motivo. Para seu desmaio foi informado que muito provavelmente nessa altura o pobre bicho teria de ser abatido… O mesmo alferes estava um dia em cima duma ponte (que identificou mas cujo nome não lembro,) e estava de queixo e braço apoiados na proteção/berma da ponte, quando dele se aproximou um indivíduo que havia acabado de chegar ao Xime. E, ainda periquito, não sabendo de quem se tratava mas procurando informação ou conselho, aproximou-se dele e perguntou: 

"Olha lá, tu conheces o comandante aqui do Xime? dizem-me que é um grande filho da puta”… Ao que o alferes, sem uma nem duas, espetou-lhe uma grande murraça enviando o inocente desgraçado para o meio do rio…

Do Enxalé lembrou ainda que quando aí esteve havia uma grafonola; mas o problema é que só havia um disco e ele depressa se cansou da variedade musical que isso oferecia… Foi neste momento que eu compreendi que deve ter sido então no Enxalé que nasceu o popular dito "vira o disco e toca o mesmo"…

E quando estávamos nós neste desfilar de recordações apareceu um indivíduo que conhecia bem o nosso Francisco Pinho da Costa. Depois das devidas apresentações, vim a saber que se tratava de um outro veterano da Guiné, de nome António Azevedo Praia de Vasconcelos. Também ele foi alferes miliciano médico nos anos 1966/68 do BCAV 1897, cujo comandante era o tenente coronel Vasconcelos Porto, e lembrava as companhias desse batalhão : CCav 1615, 1616 e 1617 . Esteve em Canquelifá, Nova Lamego, Madina do Boé, Mansabá, e Bissorã (se bem percebi estes últimos dois nomes). 

Tivmos pena do encontro ter acontecido tão "em cima da hora"; o Francisco Pinho da Costa (e parece-me que o recém-chegado António Vasconcelos também) conhecem o Adão Cruz , membro da nossa Tabanca Grande, e teria sido um encontro ainda mais interessante. Mas "como não pode ser desta vez, ficará para outra ocasião".. Oxalá as distâncias e idades o permitam. (**)

João Crisóstomo

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Notas do editor:


(**) Último poste da série > 19 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22645: (De)Caras (144): O que é que o José Manuel Matos Dinis (1948-2021) pensava do nosso blogue, em abril de 2013