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domingo, 26 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26427: Tabanca da Diáspora Lusófona (30): José António Marinho, que vive em New Jersey, e pertenceu à CCS/BCAÇ 2928, Bula, 1970/72 (João Crisóstomo)



1. Mensagem recebida pelo formulário de contacto do Blogger:


Data - sexta, 24/01/2025, 03:45


Vivo nos EUA en NJ (New Jersey), gostava. que me inscrevessem no blogue. 

Estive em Bula. de
1970. a 1972, na CCS/BAÇ 2928.
Obrigado

Cumprimentos,
José Antônio A Marinho | Email: (...)


2. O nosso coeditor Carlos Vinhal está a tratar do pedido de ingresso na Tabanca Grande. Pedimos, entretanto, ao régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona, o  João Crisóstomo,  para contactar o seu "vizinho" de New Jersey e nosso camarada... Eis a mensagem que ele lhe enviou:


Caro camarada José António Marinho,


Acabo de receber uma mensagem do “comandante” de todos os "camaradas da Guiné”, Luís Graça, dando-me conhecimento da tua mensagem: (...) "Vivo nos EUA en NJ gostava. que me inscrevessem no blog, estive em Bula,  de 1970. a 1972 na CCS/BCAÇ 2928. Obrigado." (...)

Mas que agradável surpreza! Um camarada meu, que vive em New Jersey, portanto meu vizinho, (eu vivo em Queens , Nova Iorque ) e eu nem sequer tinha conhecimento!

Podes dar-me o teu número de telefone que eu ligo-te, talvez mesmo ainda hoje, ou amanhã?

Eu estive na Guiné: Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole, Missirá… em 1965/67. Temos com certeza "manga de assuntos" de interesse para falar.

Espero a tua resposta por E mail, pode ser? Ou mesmo telefone,  se quiseres ligar-me. Senão eu ligo-te. Diz-me as melhores horas para ti, Eu , embota já velhote, ando/estou sempre a correr, sempre com mil coisas a fazer mas para os meus amigos ( e, para mim, os "camaradas da Guiné” são como irmãos),  eu cá me viro…  
 
(...) Com "parte mantenhas”…

João Crisóstomo (segue a morada e os contactos)



João Crisóstomo, 

_______________

Nota do editor:

Último poste da série > 1 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26333: Tabanca da Diáspora Lusófona (29): Happy New Year 2025! (João Crisóstomo, Régulo, Nova Iorque)

sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26375: Pensamento do dia (28): "A gente, afinal, só se ri do mal que não faz mal a ninguém, nem a nós nem aos outros"... (Luís Graça)


1. Comentário ao poste P26369 (*):


Bom, João, não se pode dizer que é "humor... negro", porque a expressão (pelo menos, até há pouco tempo) é ou era "politicamente incorreta"... nem muito menos "humor... branco", para mais na tua "nova terra prometida", os "United States of America" (USA)... Seríamos logo apodados de racistas ou supremacistas...

Mas se a sentinela do Enxalé viu, é porque viu. É pressuposto a sentinela ver tudo, para lá e para cá do arame farpado... 

Portanto, a "tua" história só pode ser verdadeira e de resto tu estavas lá, entre as testemunhas (não por teres visto o "ato em si", mas por teres ouvido contar a cena e observado depois a reação do enfermeiro)...

Na época (c. 1965/67) não havia drones, por isso os nossos postes de vigia, no Enxalé,  estavam acima das nossas cabeças bem como do arame farpado. 

Algumas sentinelas tinham alucinações à noite (em Bambadinca um básico viu uma manada de elefantes ao pé do arame farpado, no meu tempo)...Não terá sido o caso do teu sentinela, que, pelo que contas,  era "de olho vivo", não lhe escapava nada ..
Mas essa "cena",  digamos,  de tipo "porno bizarro", e que ajudou a matar o tédio da tua sentinela,  não é coisa assim tão invulgar como isso, na vastidão dos nossos campos ou ou nos exíguos espaços dos nossos apartamentos... 

O comportamento sexual do "homo sapiens sapiens" (que é, antes de mais, um "bicho", um animal, primata, territorial, social e sexualmente promíscuo)...e qualquer que seja o seu fenótipo, tem uma amplitude maior que o espectro do arco-íris, as paleta do pintor, ou a imaginação do contador de "estórias"...

As parafilias, incluindo as zoofilias, são um catálogo quase infindável... E a internet está cheia de vídeos de zoofilias (pornográficas), em que os pobres  animais são vítimas de exploração sexual... (Mas, também é verdade, nunca vi os respeitáveis e púdicos partidos dos animais indignarem-se publicamente contra contra esta e outras violações dos direitos dos animais.)

Mas, abreviando... Esta "cena" diz muito sobre o "teatro do absurdo" que era aquela p*ta de guerra, bem como sobre a "miséria" do nosso quotidiano, nos Enxalés da Guiné... 

De facto, o que é que um gajo podia fazer entre duas "saídas para o mato" ou duas "colunas logísticas" até à vilória mais próxima (para se ir abastecer) ?... Nada, não havia programas de tempos livres, distrações, centros comerciais, restaurantes, cinemas, e coisas dessas... 

Então como se matava o tempo durante dois anos ? (Ainda por cima só havia duas estações, intermináveis, a da chuva e a do tempo seco, e a noite começava cedo como o caraças!)...

O leque de escolhas do combatente era muito limitado: dormir (mal), comer (porcamente), beber (muito, havendo cerveja e uisque), "jogar à lerpa", dar uns chutos na bola, escavar mais o buraco, ler e escrever aerogramas, contar anedotas (parvas), ir a Bissá comprar vacas, apanhar um "esquentamento"  (por causa de uma "cambalhota) ou uma "bilharziose" (por um simples mergulho  no rio ou travessia de uma bolanha),  e pouco mais... (E o pouco mais podia ser, por exemplo, uma minazinha A/P ou A/C, ou uma "bailarina" ou uma roquetada...).

Alguns de nós estavam à beira da loucura: a sorte da tropa é que não havia psiquiatras, e os loucos já viviam enterrados nos seus manicómios (do Enxalé a Missirá, de Mansambo a Guileje, de Jumbembém a Gadamael, do Xime a Canquelifa, etc., sem esquecer o manicómio maior que era Bissau, onde estavam os loucos mais famosos...).

João, no Enxalé, hoje estaríamos todos agarrados aos telemóveis (como estão, dizem os "mentideros" das redes sociais, os desgraçados dos soldados norte-coreanos arrebanhados para a guerra da Ucrânia, a devorar, pobres diabos, filmes pornográficos e a "tocar pívias" entre duas barragens de artilharia...).

Felizmente, João, que hoje aquele tipo de guerra, a do nosso tempo,  de guerrilha e contra-guerrilha ("subversiva e contrassubversiva", diziam os nossos "man...jores"), do toca-e -foge- senão - eu-mato-te, não mais é possível, de um lado e do outro... 

O pobre do Amílcar Cabral, se tivesse nascido setenta anos mais tarde, não ganharia coisa nenhuma, apenas a fama de ter chegado tarde demais à Guiné... Ou nem o Spínola, para se poder cobrir de "honra e glória"...

A Guiné está cada vez mais desflorestada... E com os satélites, os drones, os robôs, a inteligência artificial, o laser, etc., não há mais "heróis do ultramar" nem muito menos "combatentes da liberdade da Pátria"... 

Além disso, João, no nosso tempo havia a 5ª Rep, o Café Bento, onde, de um lado e do outro, se propalavam as pequenas grandes mentiras daquela guerra... Hoje tens uma gigantesca 5ª Rep, à escala mundial, globalizada, a trabalhar para os multimultimilionários que são os donos disto tudo...

João, começo a ter saudades das piedosas mentirolas do Café Bento... E até desses grandes dois grandes atores de opereta que eram o Cabral e o Spinola...

Mas valha-nos, ao menos, o humor de caserna!... Da "nossa caserna"....Saibamos cultivá-lo até ao fim dos nossos dias, sinal de que os nossos neurónios ainda não estão em curto-circuito...

Obrigado, mano, por este pequena preciosidade, que te ocorreu quando ias a caminho do teu ginásio, lá no teu "bairro" de Queens, em Nova Iorque... Não és só tu a rir-te sozinho com "cenas caricatas" (e afinal tão humanas) como estas, a do "dono" da bezerrinha atrás do patife do "djubi" violador... (Quiçá de bisturi em punho, já que o homem era o "barbeiro-sangrador" da companhia: eis um detalhe picaresco com que podes enriquecer a próxima versão desta "estória"...).

Às vezes também me apanho, a mim próprio, a rir sozinho de cenas destas (caricatas, estúpidas, humanas, inofensivas, inocentes, pícaras, deliciosas): a gente, afinal, só se ri do mal que não faz mal a ninguém, nem a nós nem aos outros)...

O nosso "humor de caserna baseia-se assim no velho princípio do "Primum non nocere" da medicina hipocrática (em primeir... Trocando por miúdos, pode- se dizer mal, mas não fazer mal... Nos tempos de correm, de atropelos á liberdade, há muita gente a confundir maledicência com maleficência ...

 (**)

Luís Graça
_____________

Notas do editor:

Guiné 61/74 - P26369: Humor de caserna (93): o guardador das vacas do Enxalé que violou... a bezerrinha do furriel enfermeiro (João Crisóstomo, ex.afl mil, CCAÇ 1439, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67)

 



Guiné >  Zona Leste > Pel Caç Nat 54 > Enxalé > Agosto de 1966 >  Vacas compradas em Bissá, pelo comandante da CCAÇ 1439, cap Pires.

Foto (e legenda): © José António Viegas  (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Mensagem do João Crisóstomo   [(foto abaixo à esquerda com a Vilma): (i) é um luso-americano, natural de Paradas, A-dos-Cunhados, Torres Vedras; (ii) conhecido ativista de causas que muito nos dizem, a todos nós, portugueses: Foz Côa, Timor Leste, Aristides Sousa Mendes; (iii) Régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona, tendo sido alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): (iv) vive desde 1975 em Nova Iorque, depois de ter passado por Inglaterra e Brasil; (v) é casado, em segundas núpcias, desde 2013, com a nossa amiga eslovena, Vilma Kracun; (v) tem mais de 250 referências no nosso blogue;  (vi) está aqui "atabancado" desde 26 de julho de 2010 (nº 432)].

 
Data - 9 jan 2025 02:40  

Assunto .- Humor de caserna

Caro Luís Graça,

Certos postes, uns mais que outros, como os teus recentes postes sob o tema "humor de caserna” (e dentre estes, sem desprimor para os outros, tenho de destacar os relacionados com os baseados nos feitos e vida do "alfero Cabral”) ocasionam sempre resultados por vezes inesperados. 

De repente vejo-me a reler (pela terceira ou quarta vez) as “Estórias Cabralianas”, ou outros livros que me tocam por dentro e por fora. E não é a primeira vez que isso sucede: neste caso porque Missirá foi quartel general para tantas “estórias" e histórias, esta tem-me levado a reler os livros do Beja Santos, o livro do Abel Rei, e outras fontes que me fazem vaguear por essas terras por onde também andei. 

Por acaso até mais cedo que a maior parte destes nossos camaradas: eu estive lá em 1965 a 1967 ; o José António Viegas, em 1966; o Abel Rei esteve em 1967/68; e o Beja Santos de 68/69, o Jorge Cabral, em 1970/71, o que me faz “sénior" senão na intensidade de experiências vividas, pelo menos na escala cronológica.

Mas desta vez a minha vagueação andou mais por Porto Gole e por Enxalé, sede da minha companhia, a  CCAÇ 1439. E comecei-me a lembrar de coisas que lá vivi, algumas delas más, mesmo muito más; e outras boas, algumas muito boas. Boas, no sentido de bom ambiente e camaradagem que lá experimentei. 


Vilma e João (2013)


Lembro que a nossa companhia era muito diversificada quanto a crenças, valores e costumes. E havia uma compreensão grande e aceitação por parte de todos das posições dos outros, mesmo que estas fossem completamente diferentes das suas. Eu verifiquei e experimentei isso várias vezes. 

 Mas entre as "outras boas” …"muito boas mesmo”, lembro-me de algumas que ainda hoje me fazem rir. Hoje de manhã foi uma destas ocasiões.

Estávamos a caminho do ginásio, que eu a Vilma frequentamos (ela pelo prazer da natação e sauna;  e eu porque a minha velhice exige exercícios terapêuticos aquáticos). 

 A Vilma, enfermeira de profissão, que agora,  além de ser minha esposa,    acumula os encargos de chofer, deu comigo a rir sózinho e perguntou-me qual a razão. 

Contei-lhe então que há poucos dias, nos vários telefonemas que fiz para dar um abraço de Boas Festas, vim a saber que alguns dos meus colegas na Guiné estão, como me sucede a mim, duma maneira ou outra experimentando os efeitos da idade. E que me veio à memória uma história engraçada de um deles, que por acaso até era o furriel enfermeiro da Companhia. E vi que a curiosidade dela, enfermeira, arrebitou imediatamente. Aqui vai a "estória" para a série... "Humor de caserna". JC

PS - A "cena" passa-se no Enxalé ( que a Vilma agora já "conhece", pelos contactos com camaradas e pelas muitas vezes que dele falo).


Humor de caserna > o guardador das vacas do Enxalé que violou... a bezerrinha do furriel enfermeiro

por João Crisóstomo 


O furriel enfermeiro da CCAÇ 1438, como profissional era extraordinário, com conhecimento práticos muito além dum simples enfermeiro, sendo-lhe creditado ter salvo a vida a vários camaradas que,  se não fora os seus vastos conhecimentos de enfermagem (até de operações cirúrgicas de emergência não tinha medo), teriam perecido  ("lerpado") mesmo antes da chegada dos helicópteros. 

Como homem,  era muito calmo, sem grandes exuberâncias, aparentemente introvertido, mas sempre amigo de toda a gente e, como tal,  respeitado por todos. Nunca da sua boca se ouvia uma palavra menos respeitosa.

No Enxalé havia um terreno onde se cultivavam vegetais para suprir a sua muita falta na cozinha. Outras faltas tentavam-se solucionar, comprando galinhas e mesmo vacas nas tabancas vizinhas.

 O nosso capitão Pires fazia questão de ser ele a  negociociar quando se tratava de comprar vacas, ou bezerras, que geralmente eram compradas na tabanca dos balantas na região de Bissá. E nestas ocasiões fazia-se acompanhar pelo furriel enfermeiro. Não sei se este era o encarregado do tal terreno para cultivo de vegetais e do cuidado das vacas por nomeação ou se ele mesmo se tinha oferecido para essa tarefa. 

A verdade é que se notava que o fazia com prazer, com todos os cuidados para que as suas vacas pudessem pastar à vontade e até fossem protegidas do calor e outras intempéries quando elas sucediam.

Depois da "ida à feira",    por vezes sucedia haver 3 ou mais vacas no Enxalé ao nosso cuidado. E era frequente ver o nosso enfermeiro tratando as suas vacas,  parecia mesmo  com compaixão, sobretudo para com as mais jovens, sabendo do destino que as esperava.

Para isso ele tinha como ajudante um rapaz dos seus 14 ou 15 anos que havia sido capturado aos "turras" e agora “pertencia” à nossa companhia.

Lembro uma dessas ocasiões em que haviam duas vacas na altura,  no Enxalé. Um dia, não me lembro quantos éramos , mas sei que eu e o tal furriel enfermeiro fazíamos parte dos muitos, próximos ou junto ao bar , uns fumando e cavaqueando, outros, como eu, bebendo a nossa cerveja Cristal ou outras libações. 

 E como sucedia frequentemente veio à baila, na conversa entre o pessoal, o assunto  das bajudas, lavadeiras, e suas relações com o pessoal.  E foi então que um soldado que acabara de fazer o seu turno de sentinela,   se saiu com o inesperado: que "o rapaz,  o ajudante na lida e cuidado das vacas, com certeza ainda não tinha conseguido bajuda própria, pois ele o tinha visto a descarregar a sua tensão de jovem frustrado, montado num das vacas ao seu cuidado.”

A reação foi uma risada pela maior parte dos que ouviram o acontecido. Outros pareceram prestar pouca atenção; entre estes o nosso enfermeiro, mas, que de repente, como que a despertar dum sonho, perguntou num súbito berro : 

  Qual delas , qual delas ?!...

E ao ouvir que a sua bezerrinha de estimação tinha perdido a virgindade e sido ela o objeto da predileção do seu ajudante, o nosso pacato enfermeiro, correndo e rugindo de raiva, gritava : 

– Ai seu filho da p*ta, seu grandessíssino c*br*o,  que te vou matar!!!...

João Crisóstomo

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos, título: LG)

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7 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26357: Humor de caserna (92): "Então a senhora não me conhece ?!...Foi-me buscar a Bambadinca quando eu fui ferido!"... (Maria Arminda Santos, ex-ten grad enfermeira paraquedista, FAP, 1961/70)

quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26366: "Dia da Consciência e o Humanismo Universalista Lusófono Em Aristides de Sousa Medes e Luís Souza Dantas” (Pe. Vitor Melícias, OFM, novo membro da Academia Internacional da Cultura Portuguesa)



1. 
Tomada de Posse do 
Padre Vítor Melícias, OFM,  como Académico de Número, Academia Internacional da Cultura Portuguesa, Lisboa,  12 de dezembro de 2024.


Realizou-se no passado dia 12 de dezembro, às 17h00, na sede da AICP - Academia Internacional da Cultura Portuguesa,sita na Sociedade de Geografia de Lisboa, a tomada de posse do  Padre Dr. Vítor Melícias, como Académico de Número.

Em representação do João Crisóstomo e do nosso blogue, esteve presente o nosso grão-tabanqueiro Joaquim Pinto Carvalho.

O novo académico proferiu, na ocasião,  uma conferência cujo texto passamos a reproduzir (cortesia sua e do João Crisóstomo): 



Lisboa, AICP, 12 de dezembro de 2024 > O Pe. Vit0r Melícias e o Dr. Joaquim Pinto de Carvalho

Foto (e legenda): © Joaquim Pinto de Carvalho (2024). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]


“Dia da Consciência e o Humanismo Universalista Lusófono Em Aristides de Sousa Medes e Luís Souza Dantas”

por Vítor Melícias



“Buona sera, buona gente”. Com estas palavras saudava S. Francisco de Assis as pessoas que algures o acolhiam.

Com a mesma saudação, Boa tarde a todos vós, gente boa e amiga. Bem-vindos.


-Senhora Presidente e estimada Profª Doutora Maria Regina

-Ilustríssima Mesa

-Caros e eminentes Académicos

-Caro amigo e irmão Fr. Silvestre Ministro Provincial dos Franciscanos Portugueses e demais irmãos franciscanos aqui presentes

-Caros Presidentes nacionais dos Bombeiros, das Misericórdias, do Montepio e outros Altos dirigentes da Economia Social e do Mutualismo

-Caros Representantes da Fundação, da Comissão do Dia da Consciência e de outros organismos ligados a Aristides de Sousa Mendes

-Meus caros familiares, conterrâneos e demais amigos

-Senhor Embaixador em representação da CPLP

E, permitam-me, em menção muito especial, the last but not the least:

-Caro David Godorovitch e outros membros das comunidades judaicas portuguesa e brasileira

- Caríssimo irmão e amigo D. José Rodriguez Carballo, ilustre Académico Correspondente da nossa Academia, Arcebispo de Mérida e Badajoz, ex-Ministro Geral da Ordem Franciscana. A vossa presença honra-me muito e dignifica assás a nossa comum Academia.

A todos, também como franciscano, começo por saudar com as palavras com que S. Francisco mandou os seus frades saudarem dizendo “Il Signore vì dia Pace”, “O Senhor vos dê Paz”, aquela paz serena e confortante dos que, em bom espírito, se reúnem por boas causas.

É, de facto, em bom espírito e por boas causas que aqui estamos e que, antes de mais, desejo agradecer, bem cá do fundo do coração, a V. Excia, Senhora Presidente, e ao osso muito ilustre Conselho Académico pela subida, ainda que por mim imerecida, honra de passar a integrar o núcleo institucional dos Académicos de Número da nossa prestigiada e prestigiante Academia.

Como muitas vezes digo em idênticas circunstâncias, quanto menos mereço mais agradeço. Bem hajam.

Em primeiro lugar, seguindo o espírito e a letra dos Estatutos desta nossa Academia, desejo homenagear e enaltecer os que me precederam nesta cátedra, que tanto dignificaram.

Evocá-los neste momento de entrada para o lugar que nos deixaram é confirmá-los na galeria de eternidade dos que da lei da morte se foram libertando e na memória sem empo se vão perpetuando. Honra e glória a todos eles. Perpétua memória aos seus nomes.

Ao ponderar de entre os vários temas que melhor pudessem corresponder à identidade e originária vocação pro-cultural da nossa Academia, acabei por escolher, em contexto de comemoração do 70º aniversário das suas mortes, quase simultâneas, evocar aqui as históricas e corajosas opções de consciência de Aristides de Sousa Mendes e de Luís de Souza Dantas, dois dos símbolos maiores do humanismo identitário da cultura lusófona e, por isso, inspiradores do Dia Mundial da Consciência.

Daí, e também em sentido de homenagem, o ter intitulado e contextualizado esta minha primeira comunicação de Académico de Número como “Dia da Consciência e Humanismo Universalista Lusófono em Aristides de Sousa Mendes e Luís Souza Dantas”.

Como é de universal conhecimento, por proposta de Reino de Barém no seguimento do Congresso Internacional sobre a Paz e  a Mente dos Homens, organizado pela UNESCO na Costa do Marfim em 1989, a Assembleia Geral da Nações Unidas decretou, pela Resolução 73/329 de 25 de julho de 2019, que o dia 5 de abril de cada ano fosse celebrado
como “Dia Mundial da Consciência” com o expresso objetivo de “mobilizar os esforços da comunidade nternacional para promover a paz, tolerância, inclusão, entendimento e solidariedade em ordem a construir um mundo de paz, solidariedade e harmonia”.

Após a primeira celebração em 6 de abril de 2020 na sede da ONU em Nova York, o Dia passou, logo no ano seguinte, a ser celebrado na sede da UNESCO em Paris no âmbito da semana que incluísse o dia 5 de abril e, já em 2024, nas instalações da ONU em Genève com ressonância, aliás, muito reduzida.

Ora acontece que, precisamente 20 anos antes, em Nova York um grupo de membros da comunidade portuguesa aí residente, em direta ligação com a Igreja Católica e a Comunidade Judaica e mobilizados por João Crisóstomo, nosso conterrâneo torriense há muito radicado nos Estados Unidos, intrépido promotor de Grandes Causas ligadas a Portugal, como a defesa das Gravuras do Vale do Coa, o apoio político e humanitário à independência de Timor-Leste e, com grande afinco, à reabilitação de Aristides de Sousa Mendes, tinham já lançado um movimento a nível mundial precisamente com a designação de “Dia da
Consciência”, em homenagem e promoção dos valores de humanismo universalista pelos quais o diplomata Aristides de Sousa Mendes, para salvar vidas inocentes e invocando “deveres de consciência”, desobedecera às normas então em vigor e aos seus legítimos superiores, designadamente a Oliveira Salazar, que ao tempo era simultaneamente Presidente do Conselho de Ministros e Ministro dos Negócios Estrangeiros, chegando mesmo a dizer publicamente “não
participo em chacinas, por isso desobedeço a Salazar”.

Esse movimento, que se iniciara, desde logo, com a bênção e patrocínio do Cardeal Renato Martini, Observador Permanente da Santa Sé junto da ONU, recentemente falecido, assentava na promoção de celebrações
eucarísticas em sés catedrais e outros destacados locais de culto católico ou em celebrações culturais e religiosas em sinagogas judaicas de algum modo acessíveis através, nomeadamente, da Fundação Raoul Wallenberg, da qual, aliás, João Crisóstomo era e é Vice-Presidente e da qual, por proposta sua, foram admitidos como “Honorary Members” António Guterres, Jorge Sampaio e eu mesmo.

Celebrado todos os anos a 17 de junho, data em que o cônsul Aristides de Sousa Mendes entrou a conceder, em frenesi de ato salvador, passaportes e visas “a todos os que precisem”, o Dia da Consciência de âmbito judaico-cristão foi-se expandindo gradualmente com o apoio e
direta participação de personalidades tão eminentes como o Cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado do Vaticano, o Cardeal Cláudio Hummes, franciscano meu colega de estudos em Roma e grande amigo do Papa Francisco, que foi aquele que no momento da eleição papal lhe disse “não te esqueças dos pobres”, ou, em Portugal, do Cardeal Manuel Clemente e do seu bispo auxiliar D. Tomás Nunes, que Deus tenha, de D. Serafim Ferreira da Silva, D. António Montes Moreira e tantos outros. 

Eu mesmo recebi e conservo com muito carinho uma carta oficial de John Paul Abranches, filho de Aristides de Sousa Mendes, que, na qualidade de International Chairman do “International Committee to Commemorate Dr. Aristides de Sousa Mendes”, ao agradecer a minha participação nas iniciativas dessa Comissão ou Comité, me escreveu em inglês no dia 30 de maio de 1995: 

“You are the first member of the clergy in Portugal to publically acknowledge the actions of this Portuguese hero of conscience”.

O facto é que foi de tal maneira persistente e eficaz o empenhamento de João Crisóstomo e seus amigos colaboradores na promoção deste Dia da Consciência ligado a Aristides de Sousa Mendes e, ultimamente,
também ao eminente diplomata brasileiro Luís Souza Dantas, que, com surpresa geral, o Papa Francisco na sua Audiência Geral de 17 de junho de 2020 evocou (cito) o “Dia da Consciência, inspirado no testemunho do diplomata português Aristides de Sousa Mendes que, oitenta anos
atrás, decidiu seguir a voz da consciência e salvou a vida de milhares de judeus e outros perseguidos”.

Entusiasmado com este inequívoco apoio e a sua dimensão universalista, João Crisóstomo e os seus mais diretos colaboradores, vencendo algumas compreensíveis resistências à mudança devidas ao receio de que se desvirtuasse a original ligação a Sousa Mendes e ao Holocausto e ao 17 de junho, data mais expressiva da sua corajosa ação, decidiram que (cito literalmente o que ele escreveu em carta ao Cardeal
Parolin) o Dia da Consciência “embora baseado no testemunho de Aristides de Sousa Mendes, em 17 de junho de 1940, será celebrado a partir de agora na mesma semana em que as Nações Unidas celebram o seu ‘Dia Internacional da Consciência’ para evitar qualquer ideia,
mesmo involuntária, de competição e proselitismo, como disse um ilustre diplomata português”.

Como, entretanto, se processava no Brasil a reabilitação de Luís de Souza Dantas, eminente Embaixador do Brasil em França e um dos mais prestigiados diplomatas brasileiros de todos os tempos, o qual evocando, como Sousa Mendes, motivos “de consciência e humanidade” salvara também centenas de vidas de judeus e outros fugitivos do
nazismo e dos seus campos de concentração, em muito boa hora os promotores do Dia da Consciência decidiram estendê-lo ao mundo lusófono e celebrar a 5 de abril o único e universal Dia Mundial da Consciência, mas concentrando as celebrações na específica evocação dos ideais e motivações humanistas tanto de Sousa Mendes e Souza Dantas bem como de todos os que, brasileiros, portugueses ou de qualquer outra fonte lusófona, defenderam e salvaram vidas e se guiaram pelos mesmos critérios de humanidade e consciência como Teixeira Branquinho, Sampaio Garrido, P. Joaquim Carreira
e tantos outros, cujos feitos e nomes se perderam na clandestinidade dos seus atos ou no esquecimento coletivo como, por mero exemplo, Frei Rafael dos Santos, irmão leigo franciscano natural do Vilar, Torres Vedras, o qual, como eu mesmo ouvir de sua própria boca, escondeu,
alimentou e confortou dezenas de famílias judaicas nos extensos sótãos do Colégio Internacional, hoje Universidade, “Antonianum”, na Via Merulana, em Roma, onde, aliás me formei em direito canónico e ele esteve por muitos anos ao serviço da Ordem, situação que só era
conhecida do Superior da casa e de dois outros irmãos que com ele tinham acesso clandestino aos sótãos.

De entre todos sobressaem os dois que estou hoje aqui a homenagear, ambos “Justos entre as Nações”, que, como eferiu o Papa Francisco a propósito de Sousa Mendes em mensagem enviada à inauguração do Museu Sousa Mendes, na sua Casa do Passal, em Cabanas, eram
“homens peritos em humanidade”.

Dois peritos em humanidade, dois modelos de humanismo.

Comecemos por Sousa Mendes.

Votado, por largas décadas, ao mais profundo e intencional esquecimento imposto por vontade e expressas diligências de Salazar e do seu regime, os quais, além da demissão, assim o pretendiam castigar por desobediência, Aristides de Sousa Mendes e a sua obra, recuperadas por ação das liberdades de abril, são hoje plenamente reconhecidas sobretudo em Portugal, no mundo lusófono e na comunidade judaica mundial. 

Assim, tem desde 3 de julho de 2020 honras de Panteão Nacional, tendo também sido condecorado a título póstumo com a Grã-Cruz de Cristo em 1995, a Grã-Cruz da Liberdade em 2016 e a Grã-Cruz do Mérito e declarado, em 1966 , “Justo entre as Nações” pelo Yad Ashem e Museu do Holocausto em Jerusalém, continuando ainda a merecer, como reabilitação a nível mundial, as mais variadas celebrações e altas referências, incluindo uma Fundação e Museu com o seu nome e ainda nomes de ruas, praças e monumentos, biografias, teses e publicações e representações várias.

Não carece, pois, nem se justificaria, que aqui evoquemos todos os passos e feitos da sua vida, pelo que referirei apenas os essenciais para enquadrar o sentido de humanismo com que, por expresso imperativo de consciência e contrariando sucessivas ordens dos seus superiores hierárquicos, ele salvou de modo heróico dezenas de milhares (fala-se mesmo em cerca de 30.000) de vidas de judeus e outros perseguidos pelo nazismo.

Nascido em 19 de julho de 1885 em Cabanas de Viriato, Carregal do Sal, no seio de uma família profundamente católica e de formação franciscana, licenciou-se em Direito na Universidade de Coimbra ao mesmo tempo que seu irmão gémeo, César, tendo depois, tal como seu irmão, entrado na carreira diplomática, onde exerceu as funções
de Cônsul em Zanzibar, Brasil, Espanha, Estados Unidos, Bélgica e, a partir de 1938, em Bordéus.

Neste último Consulado Geral, acorrendo a Bordéus multidões de refugiados das perseguições e campos de concentração nazis, Sousa Mendes, apesar de adoentado, com a ajuda dos filhos e sobrinhos e do Rabino Jacob Kruger, que teria conhecido em Antuérpia e agora
reencontrara numa rua em Bordéus, principalmente nos três dias e três noites de 18, 19 e 20 de junho de 1940, aos milhares carimbou passaportes e passou vistos, dizendo em certo momento, no meio do terror e emoção generalizada entre os requisitantes, “a partir de agora, darei vistos a toda gente; já não há nacionalidade, nem raça
nem religião”. 

Isto é humanismo universalista.

Alertado de que estaria a contrariar e desobedecer a expressas e repetidas orientações governamentais, respondeu “Se há que desobedecer, prefiro que seja a uma ordem dos homens do que a uma ordem de Deus”. 

Isto é a reta consciência a funcionar.

Apesar de lhe terem sido enviadas ordens expressas e funcionários governamentais, incluindo o poderoso Embaixador Teotónio Pereira, para o dissuadir e conter, o corajoso Cônsul, movido por intenso ardor humanitário continuou a passar vistos e carimbar passaportes. E mais:
tendo-lhe chegado a informação de que Espanha ia recusar a entrada e passagem destes refugiados, com a sua própria viatura conduziu uma coluna de veículos de refugiados até à fronteira franco-espanhola, conseguindo fazê-los passar. 

Isto é a determinação a seguir a consciência.

Perante isto e sob as pressões mais variadas, foi compulsivamente exonerado e mandado regressar ao país. Aí começou um calvário de castigos e marginalizações que o reduziram à mais profunda pobreza. Tendo morrido sua mulher Angelina, os filhos para sobreviver foram forçados, porventura com auxílio de alguns familiares ou amigos de
seu pai, a emigrar para os Estados Unidos e Canadá, de modo que, após um largo processo persecutório e punitivo, veio a morrer só e abandonado, como na altura escreveu sua sobrinha, único familiar que o acompanhou na morte:

“Lisboa, 3 de Abril de 1954. Estou no Hospital da Ordem Terceira, na Rua Serpa Pinto. O meu tio, Aristides de Sousa Mendes, acaba de falecer, trombose cerebral agravada por pneumonia. A sua esposa, a minha tia Angelina, morreu em 1948 com uma hemorragia cerebral e
ficou vários meses em coma, coitada.

"Todos os seus filhos, meus primos, vivem hoje nos Estados Unidos e Canadá, conseguiram escapar a tempo do purgatório… Sou a única familiar presente. O meu tio era um homem bom sempre a pensar nos outros. É por isso que morreu pobre e desonrado”.


Foi sepultado com hábito franciscano, provavelmente escapulário e cordão da Ordem Terceira de S. Francisco, da qual era membro, tal como seu irmão gémeo César, que foi Ministro desta Ordem Terceira então ainda existente em Cabanas.

Este verdadeiro herói, português, cristão e franciscano, “Justo entre as Nações”, que em determinado momento dissera “Como pode a minha consciência estar tranquila quando penso que tantas pessoas estão a sofrer e a morrer?”, em peças dos processos disciplinares, com que Salazar e o regime o perseguiram, sempre se defendeu com o
argumento de que agira por “dever de consciência de cristão e bom português”.

E, claro, acrescento eu, também de bom irmão terceiro franciscano, que ele era, cuja Regra, ao seu Capítulo II, nº 5,  determina que os Irmãos 
“Estejam sempre presentes com o testemunho da sua vida humana e também com iniciativas corajosas, quer individuais quer comunitárias, na promoção da justiça, principalmente no âmbito da vida pública, comprometendo-se com opções concretas e coerentes com a sua fé”, designadamente, obedecendo sempre aos seus superiores “a não ser que as suas ordens sejam contra a nossa alma e a nossa Regra”, norma
fundamental do franciscanismo deixada pelo próprio S. Francisco no texto da sua Regra dos Frades Menores. Um franciscano deve obedecer sempre, exceto por razões de consciência.

Assim, por exemplo, no processo disciplinar, arquivado no Arquivo Histórico -Diplomático do MNE, Sousa Mendes disse: “a minha atitude inspirada única e exclusivamente nos sentimentos de altruísmo e de generosidade de que os portugueses, através dos seus oito séculos de história, soubemos tantas vezes dar provas eloquentes e que tanto
ilustram os nossos feitos históricos”.

Isto é o “Humanismo Universalista dos Portugueses” que Jaime Cortesão escolheu como título da sua bem conhecida obra.

Em razão desse seu comportamento humanitário bem merece ser -e de facto já é- reconhecido como símbolo e modelo de humanismo, dever máximo da consciência universal, que o Dia Mundial, a partir de agora, celebra a 5 de abril.




Cartaz do Convite, em inglês, para a celebração de dois grandes humanistas, os diplomatas, o português Sousa Mendes e o brasileiro Sousa Dantas, por ocasião dos 70 anos das suas mortes, e da sua acção em defesa das vítimas de perseguição na II Grande Guerra. Uma iniciativa do Comité do Dia da Consciência, Missão Permanente de Portugal nas Nações Unidas, Igreja Eslovena de São Ciro, Fundação Internacional Raoul Wallenberg e Fundação Sousa Mendes. A cerimónia realizou.se no passado dia 7 de abril de 2024, em Nova Iorque (*)

Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2024). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]



Evoquemos então, ainda que ligeiramente, Souza Dantas:

De entre outros heróis que, por dever de consciência e não raro desobedecendo a explícitas ordens superiores, salvaram milhares de judeus e outros perseguidos pelo nazismo, destaca-se o eminente Embaixador brasileiro Luís de Souza Dantas, que, mais recentemente do que Aristides, foi também ele resgatado do olvido imposto pelos
poderes políticos no seu jogo de interesses e artes da diplomacia.

No seguimento da aprofundada investigação de Fábio Koifman, nosso académico correspondente já eleito ainda não empossado, autor do grosso volume “Quixote nas Trevas – O embaixador Dantas e os refugiados do nazismo” e de “Two Diplomats and People in Need” (Sousa Dantas e Raoul Wallenberg) bem como do direto envolvimento (após contato pessoal de João Crisóstomo em Nova York) do então Presidente Fernando Henriques Cardoso, Sousa Dantas, em 10 de dezembro de 2003 foi, tal como Sousa Mendes, reabilitado no Brasil e consagrado pelo Yashem “Justo entre as Nações” com lugar próprio no
Jardim do Holocausto em Jerusalém e passou a integrar a galeria dos “Heróis da Consciência” no mundo da lusofonia.

A própria Comissão que, a partir dos Estados Unidos, promovia o Dia lusófono da Consciência (17 de junho) passou, a partir de 2004, a associá-lo a Aristides de Sousa Mendes nas respetivas celebrações com a constatação da impressionante coincidência de circunstâncias, que João Crisóstomo, emérito aristidesista e, de certo modo pai, do Dia lusófono da Consciência, descreve assim, a páginas 25 do seu “O Papel das Comunidades Luso-Americanas no Reconhecimento de Aristides de Sousa Mendes”:

“É impressionante o quanto estes dois humanistas têm em comum: Os dois têm como língua materna a língua portuguesa. Ambos seguiram a vida diplomática e ambos se encontraram em França, quase vizinhos, no desencadear da WWII. 

"Ambos tomaram a decisão de desobedecer aos mandatos errados dos seus governos para seguir a voz das suas consciências, salvando
indivíduos perseguidos pelo terror nazi. E ambos, aparentemente mesmo sem se conhecerem, vão declarar mais tarde durante os processos disciplinares de que vão ser vítimas, ter sido o dever de “seguir a sua consciência de cristãos”, a razão do seu proceder. 

"E como que para selar todas estas 'irmandades' os dois vêm a morrer no mesmo mês e no mesmo ano, a escassos dias um do outro: Aristides de Sousa Mendes morreu a 3 de abril e Luís Martins de Sousa Dantas duas semanas depois, a 16 de abril de 1954”.

De Sousa Dantas e da sua vida e obra ímpar em favor da liberdade de consciência e do mais profundo humanismo universalista certamente nos falará Fábio Koifman na sua comunicação de posse nesta sua e nossa Academia, pelo que aqui e agora me limito a transcrever duas das múltiplas frases lapidares com que, em processos disciplinares por
causa delas, Dantas justificou as suas corajosas opções.

Assim, em telegramas oficiais ao seu Ministro Aranha, referindo-se ao “internamento em campos de concentração comparáveis ao inferno de Dante”, Souza Dantas evoca a “generosidade da alma brasileira” como justificação para “continuar a passar visas livres de encargos para sair de França” (onde eram horrivelmente perseguidos), e ainda:

“Eu fiz o que faria o mais frio de coração, com a nobreza de alma dos Brasileiros, movido pelos mais elementares sentimentos de piedade Cristã”.

Esta “alma dos brasileiros” é, na verdade, aquela “alma”, “alma portuguesa repartida pelo mundo” de que nos falava amões e que, muito para além dos interesses políticos e económicos, é hoje partilhada na troca de princípios e valores comuns entre os vários intervenientes do grande e permanente “encontro de povos, culturas e crenças diferentes”, a que, em razão do muito que têm de comum,
chamamos lusofonia.

Como escreveu o nosso já clássico Eduardo Lourenço no seu precioso texto “Repensar a Lusofonia” incluído no vol. IV das suas Obras Completas, embora “talvez a muitos apareça inviável,”, “este sonho universalista”, “esse continente imaterial que é a lusofonia” (Nau de Ícaro, 174) é possível, mas “só o aprenderemos a fundo no convívio,
no contato e, quanto possível, na comunhão daqueles (povos e gentes) que quisemos ensinar e que, por sua vez, nos ensinaram e nos recriaram. É uma empresa futurante esta, endereçada à redefinição de nós mesmos no horizonte do mundo lusófono, que nos compreende e nos ultrapassa, e não na revisitação nostálgica de um passado de muitas cicatrizes”. Empresa, diz ele, que “apetecia tutelar pela mais lusófona das vozes, a voz imensa, acusadora e ecuménica de António Vieira”.



Eis porque escolhi por tema desta minha intervenção de caráter institucional a convicção pessoal de que o lusófono humanismo universalista, gerado na fé e marcado de franciscanismo, do qual Aristides e Dantas são testemunho repleto de atualidade.

Sim. Homens como estes precisam-se. Hoje talvez mais que nunca. Os valores, princípios e causas, que regeram as suas corajosas opções não podem perder-se.

A cultura do humanismo, da solidariedade sem barreiras nem fronteiras e a fidelidade à consciência têm de se recuperar, corrigindo a desvairada globalização dominante de interesses e individualismos opostos aos valores da consciência e do universalismo humanista.


Por isso, me congratulo com a feliz decisão de, a partir do próximo ano, passarmos a celebrar o nosso Dia da Consciência na mesma data, objetivos e contexto do Dia Mundial proclamado pelas Nações Unidas, assim evitando duplicações e separatismos, mas permitindo-nos “lusofonizar” (desculpem o atrevimento do neologismo) a celebração do único e universal “Dia da Consciência” com acento tónico nos valores ancestrais identitários da nossa cultura humanista e na evocação dos nossos “heróis da consciência”.

De facto, a própria Resolução 73/329 da Assembleia Geral das Nações Unidas, que o criou, estabelece que a celebração e objetivos do Dia se realizem, (cito) “de acordo com a cultura e com outras circunstâncias ou costumes adequados às suas comunidades locais, nacionais e regionais, sobretudo por meio de uma educação de qualidade e de atividades de sensibilização do público”.


É essa intenção que cada vez mais justifica que Portugal, o Brasil e demais Países-Irmãos da CPLP, evocando esses heróis e revitalizando a sua comum cultura identitária de humanismo universalista, façam que aquela partilhada cultura, que da camoniana “saudade para além dos mares” fez “sodade, sodade dess ‘nha terra San Niclau” seja agora por eles partilhada como vigoroso instrumento de Paz.

Do mesmo modo, sendo a nossa Academia, “instituição de índole cultural”, cuja finalidade fundacional e estatutária é (cito) salvaguardar e promover “as tradições e padrões culturais portugueses no estrangeiro e a identificação e estudo das comunidades filiadas na cultura portuguesa radicadas fora de Portugal” é natural e altamente desejável que assuma o “Dia lusófono da Consciência” como lógico e
envolvente instrumento de portugalidade em lusofonia e, portanto, do humanismo universalista como padrão identitário da cultura lusófona.


Por isso, e a terminar, permitam-me, Senhora Presidente e caros Confrades Académicos, a ousadia de sugerir (que não me sinto com autoridade para propor) que o próximo dia 3 de abril de 2025 seja aqui celebrado como “Dia da Consciência” com convite para vir tomar posse e apresentar a sua inerente comunicação o nosso Académico Correspondente brasileiro Fávio Koifman.

É mera sugestão, claro. Mas oxalá seja compreendida e aceite. OBRIGADO.

Bem hajam todos pela vossa presença e paciência.

Viva o Brasil de Souza Dantas.

Viva Portugal de Sousa Mendes.

Vivam a Lusofonia e a nossa Academia.


P. Vítor Melícias,

OFM

(Revisão / fixação de texto, para efeitos de publicação neste blogue: LG) 
(Com a devida vénia ao autor...)

________________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 4 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25338: Tabanca da Diáspora Lusófona (23): Nova Iorque, Igreja Eslovena de São Ciro, domingo, 7 de abril: recordando e cebrando os 70 anos da morte de dois grandes diplomatas e humanistas do tempo da II Grande Guerra, o português Sousa Mendes, e o brasileiro Sousa Dantas (João Crisóstomo)

sábado, 4 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26345: Humor de caserna (90): teimoso... que nem um burro (João Crisóstomo, Nova Iorque)


João Crisóstomo, 2017. Foto: LG

 1. O João Crisóstomo , como lhe  disse uma vez um seu amigo, o futuro cardeal patriarca de Lisboa, o José Policarpo (1936-2014), é um "berbequim", uma verdadeira força da natureza, persistente, teimoso, perseverante...

O João  já era conhecido, no seu tempo de menino e moço, como um gajo teimoso como o caraças... Quando se metia numa coisa, não desistia logo às primeiras...

 Se não assim, não teria tido sucesso, na emigração,  na diáspora, no seu trabalho, nas "causas sociais" em que se tem metido  (Foz Coa, Timor Leste, Aristides Sousa Mendes...) nem muito menos reencontrado a "sua" Vilma 40 anos depois de ter perdido o seu paradeiro (em Londres)...

Esta história. aqui meia perdida na minha caixa de correio, tem a sua piada (***). E, segundo penso, está relacionada com as suas diligências para associar as autoridades políticas e religiosas portuguesas â celebração da efeméride dos 70 anos da morte do Aristides de Sousa Mendes (Viseu, 19/7/1885 - Lisboa, 3/4/1954) (*)

Dizer que o João é "teimoso... que nem um burro", não é um insulto, é um elogio, a ele (e ao burro) e aos nossos milhões de compatriotas que escolheram viver e trabalhar (e morrer) longe, fora da Pátria.


Humor de caserna > Teimoso... que nem um burro 

por João Crisóstomo


Data - quinta, 21/03/2024, 20:27
 
Assunto - Vale a pena ser teimoso…


Eu contei, em Nova Iorque,  ao Fernando Santos (**) a minha odisseia em Portugal (em março de 2024: que o Presidente cancelou; que o Cardeal nem apareceu, mas por outro lado a secretária do Presidente facilitou-me a vida...

Aqui está a "verdade verdadinha", segundo "São Fernando”:

"Agora já sei por que é que o cardeal não compareceu. O Cardeal telefonou ao Pe. Melicias a saber quem era esse tal João Crisóstomo e ele disse-lhe: 

− Tenha muita cautela, não apareça, ele mete-o em trabalhos. 

O Cardeal telefona imediatamente ao Presidente Marcelo e avisa-o. 

−  Tenha cautela com um esse senhor João Crisóstomo. Vai metê-lo em trabalhos. 

O Marcelo então avisa a secretária Ruela: 

− Cancele o encontro com João . 

Ela responde. 

− Impossível, Sr. Presidente , o João Crisóstomo já está aqui! 

− Oh, menina Ruela, por favor. Então diga-lhe que eu que lhe disse que eu não estava. 

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Guiné 61/74 - P26333: Tabanca da Diáspora Lusófona (29): Happy New Year 2025! (João Crisóstomo, Régulo, Nova Iorque)


Vilma e João em Nova Iorque
1. Mensagem de João Crisóstomo, régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona:

Data . terça, 31/12/2024, 18:51
Assunto -  Tabanca da Diáspora Lusófona

Caros Luís Graça e Carlos Vinhal,


Falei com uma jornalista do jornal "on line" "JOrnal das Comunidades".

Falei do nosso blogye, e ela mostrou-se interessada... "Adiantei" os contactos...

 Em relação à malta da lista de contactos da Tabanca da Diáspora Lusófona,  tenho para vos dizer que tentei contactar pelo telefone : Macau, Cabo Verde, Guiné, Austrália, Suécia, Brasil, França…

Não perdi completamente o meu tempo: consegui falar com o Picanço no Canadá, o Tony Borié, na Flórida, o Meneses em New Jersey, o Manuel Salvador na Holanda …( Portugal não conta neste caso!, mas também falei com diversos camaradas.)

 Ainda hoje prefiro falar diretamente com alguém pelo telefone do que mandar-lhe um email. Mas não tenho o telefone de muitos camaradas que vivem aqui, no Canadá e nos EUA e outras partes do mundo. Mas a todos desejo que  em 2025 possamos festejar a vida, o estarmos aqui e, com vontade e gana, continuarmos a brindar o prazer de estarmos juntos.

______________

Nota do editor: 

quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26282: Desejando Boas Festas, Feliz Ano Novo de 2025, e aproveitando para fazer... prova de vida (4): Mensagem natalícia de João Crisóstomo, ex-Alf Mil da CCAÇ 1439


1. Mensagem natalícia do nosso amigo e camarada João Crisóstomo, ex-Alf Mil da CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67):

Caríssimos Luís Graça, Carlos Vinhal, Helder Valério, Luís Lomba, Valdemar Queiroz, Eduardo Francisco, Beja Santos, Carlos Silva…

É-me quase impossível mandar as Boas Festas individualmente, como gostaria, pelo que tem de ser em grupos.
Ontem consegui contactar o nosso camarada Lopes que há anos, depois de 50 anos, encontrei de novo num encontro em Porto Dinheiro. Agora fiquei/estou desolado que ele se encontre com Parkinson, já adiantado. Se, como dizem e acredita muita gente, bons augúrios de amigos ajudam em situações assim, unamo-nos num abraço virtual neste momento.

E não nos esqueçamos que o Natal está à porta.

Dentro do possível, que os próximos dias sejam de “Festejar a vida, o estarmos aqui e querermos permanecer; (…) brindar o prazer de estarmos juntos e de vibrar em sintonia”, (usando palavras da jornalista Christiana Martins, em artigo no "Expresso Curto” de 12/12/2024). Dias de “coração ao alto”: que “quem canta seus males espanta”.

De coração, os meus sinceros votos para esta época festiva: Um Feliz Natal! E um Feliz Ano Novo também.
João e Vilma

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Nota do editor

Último post da série de 17 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26277: Desejando Boas Festas, Feliz Ano Novo de 2025, e aproveitando para fazer... prova de vida (3): Mensagens natalícias de José Firmino, Tony Boré, Rui Silva, António Ramalho, Manuel Rei Vilar e Artur Conceição

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26254: Desejando Boas Festas, Feliz Ano Novo de 2025, e aproveitando para fazer... prova de vida (1): João Crisóstomo (e Vilma) (Nova Iorque)




T/T Niassa, CNN,  [5 de agosto de ] 1965 - Programa do "jantar de despedida servido em honra das Forças Militares que se destinam a nossa Porvíncia da Guiné, com desejos das maiores felicidades e venturas"... Era capião de bandeira António Bénard da Costa Pereira, c.f.[ capitão-de-fragata], comandante João Figueiredo Fragoso, imediato Manuel Ribeiro Pires, chefe de máquinas Júlio Monteiro Emílio Carreira, médico Agostinho Maria Ribeiro, radiotelegrafista Fernando Aragão Freire de Andrade, capelão José Maria da Fonseca Guimarães [1923-2023] e comissário José Horácio Mantas...

Assinaturas: 

João Crisóstomo (alf mil, e cmdt interino, CCAÇ 1439)

José Maria da Fonseca  [ Guimarães ] 

[...] Silva, alf para  [?] 

Do programa musical, destaque-se a última peça, um tango de 1927,  "Adios Muchachos", de Júlio César Sanders, depois de uma valsa de Strauss (para dançar... com a G3).

Os últimos versos da canção não podiam ser mais sinistros aos ouvidos de quem ia ara a guerra:

(...) Adiós muchachos, compañeros de mi vida
Barra querida de aquellos tiempos.
Me toca a mi hoy emprender la retirada
Debo alejarme de mi buena muchachada.

Adiós, muchachos, ya me voy y me resigno,
Contra el destino nadie la calla.
Se terminaron para mí todas las farras.
Mi cuerpo enfermo no resiste más.



T/T Niassa, CNN > Quarta feira, 5 de agosto de 1965 > Ementa:  Creme Cardeal | Linguado à Monte Carlo | Espargos au Vinagrette |Peru à 'Niassa' | Doce: Vulcão | Fruta cristalizada | FRuta fresca: Pêssego. maçãs, Chá, Café

Fotos (e legendas): © João Crisóstomo  (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




João & Vilma 
1. Mensagem do João Crisóstomo, régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona, com sede em Nova Iorque:


Data - quarta, 4/12/2024, 10:06
Assunto - Capelães... e viagem no "Niassa" até à Guiné


Caro Luís Graça,

Ao vasculhar no meu baú de recordações encontrei este menú do jantar de despedida no “Niassa” na véspera de chegar à Guiné.

Como sabes, a minha companhia era “madeirense" 
e o Niassa depois de zarpar de Lisboa passou pelo Funchal onde “apanhou" a CCAÇ 1439. A nossa Companhia era “individual" e o nosso capitão Amândio Pires, tinha partido de avião dias antes para preparar a nossa chegada.

Na sua ausência quem devia ir a comandar a companhia era o o alferes Freitas, madeirense, pro sinal, mas este tinha um assunto qualquer pendente e, por razões burocráticas, fui eu que fui a comandar a CCAÇ 1439 até chegarmos à Guiné.

Isto está explicado na nossa troca de comentários ao post 22051, de 30 de março 2021, onde aparecem algumas fotos e numa delas sou eu que estou a receber as despedidas do governador militar da Madeira.

Ao ver agora este "menu” senti uma "piada negra" (na altura nem reparei nisso) que no Programa Musical a última peça musical tenha sido “Adios, muchachos”… Não sei se era o mesmo programa em todas as viagens ao chegar à Guiné, mas agora olhando para trás fez-me arrepios! Não havia com certeza qualquer"segunda intenção", mas …lembrando agora o que vim a experimentar depois... foi o que senti.

Bom, lembrei-me de te enviar isto, para se um dia o assunto de capelães tornar a ser falado, talvez queiras juntar os capelães que serviram no Niassa e outros navios que nos transportaram para lá e para cá…

Não creio que muitos se tenham sequer apercebido que havia um padre capelão a bordo … mas havia.

Mas sobre capelães, pois é este o assunto que me levou a escrever este: Eu sabia que o Horácio Fernandes,  além de ter estado  na Guiné como capelão militar, esteve também como capelão num submarino. Não tenho a certeza mas creio que foi depois do serviço na Guiné.

O que me lembro bem,  foi de que nesta viagem no Niassa encontrei um padre franciscano, o padre Fonseca ( José Maria da Fonseca Guimarães,) que tinha sido meu professor de Geografia em Montariol: era o capelão do navio Niassa nessa viagem. 

Fiquei tão contente por o ver que acabei por lhe deixar um presente para que comprasse um par de patins para os alunos em Montariol, onde o meu primo, padre António Sabino,  que era na altura o guardião/superior,  tinha adaptado uma sala grande no rés do chão para jogos de hóquei em patins. Recordo-me que fiz sso porque eu queria contribuir para que os estudantes tivessem mais possibilidades de praticar desportos.

É que durante os cinco anos que estive neste colégio, por razões que a razão não conhece, nos era proibido jogar futebol. Recordando esses tempos parece-me tão absurdo que é com raiva que lembro tudo isso: os “castigos” mais ou menos sérios que incluíam ficar de joelhos ou mesmo apanhar com a “tabuada" de madeira nas mãos, quando alguém tinha tido a coragem de dar um pontapé nalguma bola de andebol ou basquetebol. 

Mas sobretudo a frustração que eu sentia (estive lá dos meus dez aos quinze anos) que me dissessem para jogar andebol mas que não podia jogar futebol. Nao sei se havia mais algum colégio com a mesma postura quanto a futebol. Não creio que houvesse , mas se houver alguém que esteve em algum colégio com a mesma mentalidade,  gostava de saber. Em Montariol, quanto a eles, era um jogo violento…

Bom, imagina que um simples menu me deu ensejo a desabafar as minhas frustrações da minha juventude! Junto a foto do menu, devidamente “assinado” pelo comandante do Niassa na página da “Ementa” . A assinatura do capelão, José Maria da Fonseca, está na primeira entre a minha e a de um outro alferes,  que não me recordo quem seja.

A quem ler isto um grande abraço. E,  se for antes do Natal, Boas Festas e um Ano Novo tão bom quanto possível para todos.

João Crisóstomo (e Vilma),  Nova Iorque

PS - Luís, tinha aqui uma lista de quase meia centena de endereços de email, para mandar aos meus (e, alguns, da Vilma) amigos e conhecidos da Tabanca Grande, com votos de Merry Christmas and Happy New Year... Aproveuto este ensejo, para de uma só penada desejar festas felizes a todos vocês, os amigos e camaradas da Tabanca Grande... E, de acordo com a tua habitual solicitação, aproveito também para fazer  a minha "prova de vida"!

quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26100: (In)citações (267): Memorando sobre a Escola São Francisco de Assis, em Timor, entregue ao primeiro-ministro Xanana Gusmão através do embaixador Dionísio Babo Soares, representante do país nas Nações Unidas (João Crisóstomo)



Nova Iorque > 23 de setembro de 2024 >  O João Crisóstomo com Xanana Gusmão:
 e "a expressão de surpresa deste por ver a Escola São Franciscoo de Assis em páginas do  blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné"…



Nova Iorque > 23 de setembro de 2024 >  O João Crisóstomo, à direita, com 3 timorenses, da esquerda para a direita: 
(i) Luís Guterres, embaixador de Timor Leste em Washington;  (ii) Dionísio Babo Soares, embaixador de Timor nas Nações Unidas;  e (iii) uma senhora, possivelmente a ministra da educação do govermo de Xanana Gusmão


Fotos (e legendas): © João Crisóstomo  (2024). Todos os direitos reservados 
[Edição e lendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


João Crisóstomo, um "advogado de causas 
justas e solidárias"


1. Mensagem de João Crisóstomo, com data de 4 do corrente, dando conta aos amigos de Timor da correspondência trocada com o embaixador timorense nas Nações Unidas, Dionísio Bobo Soares, depois do encontro que teve em Nova Iorque, em 23 de setembro último,com o primeiro-ministro Xanana Gusmão.

Sabemos que o embaixador Dionísio Babo Soares já encaminhou para o seu governo o memorando, feito pelo João Crisóstomo, na sua qualidade de sócio da ASTIL,  sobre a ESFA - Escola São Francisco de Assis. Fazemos votos para que estas diligências tinham um fim feliz, por mor das crianças de Liquiçá, Manatti / Boebau.


(i) Senhor Embaixador Dionísio Babo Soares, Representante de Timor Leste nas Nações Unidas Nova Iorque, 4 de Outubro de 2024

Creio que os dias de grande azáfama nas Nações Unidas devem ter passado ou pelo menos estarão agora reduzidos a programas menos prementes que lhe permitam já um pouco de merecido descanso. Por isso permito-me enviar o que segue, conforme acordado por Vossa Excelência depois do encontro com o Senhor Primeiro-Ministro Xanana Gusmão.

Minha esposa Vilma associa-se a mim na certeza da nossa amizade e apreço pela sua atenção e os nossos respeitosos cumprimentos.

João Crisóstomo


(ii) Ex.mo Senhor Embaixador Dionísio Babo Soares

Mais uma vez o meu "Muito muito Obrigado" pela oportunidade e convite que nos permitiu encontramo-nos de novo no dia 23 de setembro, o que me permitiu ainda o encontrar-me com Sua Excelência o Senhor Primeiro-Ministro Xanana Gusmão (*), Embaixador Luís Guterres, Senhora Elisabeth Exposto e tantos outros que fizeram desta ocasião um dia extraordinário.

Como sabe,  aproveitei a ocasião, e em boa hora o fiz, para pedir a sua Excelência o Senhor Primeiro-Ministro Xanana Gusmão o favor da sua ajuda para a escola S. Francisco de Assis (por coincidiência hoje, dia 4 de outubro, é o dia de S. Francisco de Assis na Igreja Católica).

Conforme instruções do senhor Primeiro-Ministro, junto uma sinopse do que julgo ser o que Sua Excelência tinha em mente nas instruções que me deu:
 
  • A Escola S. Francisco de Assis é uma escola construida em 2017 nas montanhas de Liquiçá por iniciativa de alguns amigos de Timor Leste em Portugal e Estados Unidos, que para isso fundaram uma organização de solidariedade, a ASTIL (Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste ). 
  • Esta escola foi inaugurada a 19 de Março de 2018.
  • A "Escola S. Francisco de Assis, Paz e Bem” está localizada no Município de Liquiçá, Suco de Leotalá, povoação de Boebau e lugar de Manati.
  • A Escola S. Francisco de Assis está integrada na rede escolar do Ministério de Educação de Timor Leste com o número 36. 
  • O seu objectivo é providenciar às crianças de Manati /Boebau que por razões de distância e outras não têm acesso a escolas, os programas escolares instituídos pelo ministério de Educação de Timor Leste para os graus pré-escolar e ensino básico.
  • A Escola preocupa-se em formar os seus alunos no quadro dos valores universais e da cultura timorense, com especial ênfase para o ensino da língua e cultura portuguesa com  destaque para a música.
  • Quando em plenbo funcionamento a escola tem capacidade para 180 alunos, contabilizados nos dois períodos matinal e vespertinos.
  • Dadas as limitações e dificuldades ainda existentes a escola desde a sua inauguração tem funcionado e providenciado cada ano ensino apenas para 80 a 85 alunos.

Todos os encargos e despesas de construção, manutenção, ensino e outros relacionados têm até ao momento sido suportados essencialmente pelos membros da ASTIL e amigos.

A ASTIL tem neste momento 85 sócios. Deve-se a esta o seguinte :

(i) Construção da "Escola S. Francisco de Assis, Paz e Bem”, localizada no Município de Liquiçá, Suco de Leotalá, povoação de Boebau e lugar de Manati.

(ii) Construção de uma casa/residência, T3, para uso dos professores.

(iii) Construção de uma cozinha. (Esta porém como está é pequena demais e precisa de ser remodelada para maior eficiência.)

(iv) Um muro, que neste momento está ainda em vias de construção para proteção da escola e dos alunos

(v) Fornecimento de todo o equipamento escolar incluindo todo o mobiliário.

(vi) Fornecimento de formação gratuita , em média de 84 alunos, do ensino pré-escolar e ensino básico.

(vi) Pagamento das compensações, até ao momento a três professoras e um responsável de manutenção da escola. O seu bom funcionamento porém é mais devido ao sentido de solidariedade do que pelos benefícios derivados por emprego.

(vii) Os uniformes ( fardamento) e materiais escolares têm sido totalmente gratuitos.

À ASTIL se deve ainda :

(viii) A construção de uma casa /residência T3 para um antigo comandante de guerrilha em Ailok-Laram, já falecido em 2021,  que tinha uma grande família, mas que vivia em grandes dificuldades.

(ix) O fornecimento de ajuda a crianças pobres através dum programa de apadrinhamento criado pela ASTIL. Neste momento 41 crianças são ajudadas por membros da ASTIL, famílias portuguesas ou de origem portuguesa a residir no estrangeiro, nomeadamente nos Estados Unidos.

(x) Ajuda a dois jovens universitários, um de Liquiçá , que se licenciou em Gestão na Indonésia, e uma jovem, também de Boebau, que, graças também à ajuda da UNPAZ, se licenciou em Relações internacionais. Esta jovem é agora uma das professoras nesta escola S. Francisco de Assis.

A presente situação desta escola, mesmo nas condições presentes,  não é sustentável indeterminadamente. Temos feito vários contactos, nomeadamente com o Senhor Dr. Roger Soares, coordenador das escolas CAFE de Timor Leste.

A "Escola S. Francisco de Assis Paz e Bem “ para que possa continuar a funcionar precisa agora da ajuda das entidades oficiais de Timor Leste, especialmente na concessão de professores acreditados, para que possa funcionar e providenciar o ensino e ajuda a estas crianças.

O mentor e motor principal desta escola é o professor Rui Chamusco , cujos contactos são  (...).

Se achar que precisa de mais algo por favor não hesite em me contactar ou diretamente ao professor Rui Chamusco. 

João Crisóstomo (**)

(Revisão / fixação de texto para efeitos de publicação deste poste: LG)
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Notas do editor

(*) Vd.poste de 24 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26072: (In)citações (266): Será que é desta ?... Se Xanana Gusmão não vai à nossa Escola nas montanhas de Liquiçá, a nossa Escola vai ter com ele em... Nova Iorque (João Crisóstomo)

(**) Último poste da série > 26 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26082: (In)citações (267): Não às armas nucleares e às mudanças climáticas: carta do Papa Francisco e o testemunho dos Hibakusha (os sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki), cuja organização, a Nihon Hidankyo, acaba de receber o Nobel da Paz de 2024 (João Crisóstomo, Nova Iorque)