1. Mensagem do nosso camarada Alberto Branquinho, (ex-Alf Mil Art da CART 1689 / BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), advogado e escritor, autor de, entre outros livros, "Cambança"; "Cambança Final" e "Deixem a Guerra em Paz", com data de 11 de Dezembro de 2025:LITERATURA DA GUERRA COLONIAL?
Livro: “O último avô” de Afonso Reis Cabral[1]
1 – Não venho apreciar o livro - em si mesmo - venho somente dizer que não vi, não li no livro nada para que possa ser designado por “literatura DA guerra colonial”. Também não venho fazer uma apreciação do livro como obra literária.
É que este livro surge publicitado como sendo sobre a guerra colonial.
Aliás, modernamente falando, no conceito de “guerra colonial” tanto cabe uma obra onde se aborde ou onde se escreva qualquer coisa “à volta” da guerra colonial e não somente aquelas obras que tratam daquilo que se passou no terreno, no ambiente próximo ou afim ao conflito ou na sua proximidade, a montante ou a jusante dele. O que, cada vez mais, é voz comum, é que tudo o que se escreva e que, de algum modo, faça menção à guerra colonial, é…. literatura da guerra colonial.
Este livro, para além dos enredos e vicissitudes familiares e de outras relações também próximas, descritas e analisadas por um rapaz, depois, jovem adulto, de guerra colonial nada tem. Tem, isso sim, um avô egocêntrico e difícil que surge ao longo de todo o texto e que, apesar de ter sido alferes miliciano de transmissões sem qualquer actividade operacional, escreveu sobre as suas (inventadas) experiências traumáticas de ex-combatente, apesar de NUNCA ter sido combatente. É que, ressalvada uma breve e rápida referência a Cabinda (sem mais pormenores), o autor coloca toda a acção do livro na zona de N’Dalatando (antiga Vila Salazar) e só depois do “25 de Abril”. Ora, N’Dalatando fica a cerca de 250kms a leste de Luanda e era, antes desses tempos conturbados, local de passeio dos civis residentes em Luanda.
Nunca houve confrontos entre tropa portuguesa e guerrilheiros em N’Dalatando antes do 25 de Abril. Só depois disso foi essa zona área de confrontos entre o MPLA e FNLA, que a pretendiam controlar. A tropa portuguesa esteve envolvida procurando “mediar” o conflito entre as duas forças, como aconteceu, também, em outras zonas de Angola e nem sempre com sucesso.
Aliás, se Angola fosse, por esse tempo, já um país independente, esse conflito seria referido como “guerra civil”.
Todo o envolvimento do avô narrador na sua “guerra colonial” foi nessa zona de N’Dalatando e é essa “inverdade” que o narrador vem mais tarde a descobrir.
2 – Com tudo o que vai escrito atrás não pretendo dizer que toda a literatura da guerra colonial tenha que ser trágica ou dramática. Não, até porque, mesmo debaixo de fogo, acontecem situações com humor ou caricatas, que, naquele momento, não são apreciadas como tal devido às circunstâncias.
Escrevi no prefácio do livro “Memórias boas da minha guerra” do José Ferreira da Silva (Silva da CART 1689):
“A guerra é a guerra!
MAS, mesmo na guerra (em tempo de guerra) surgem, por vezes, imprevistos, situações bizarras e com humor em perfeita contradição com o ambiente que se vive, embora só mais tarde, ao recordar, nos provoque uma gargalhada.”
3 - Meditando sobre a construção literária constante do livro surge uma questão: - Será que o livro poderá ser entendido como uma denúncia de uma falsa literatura da guerra colonial em que, p.ex., o “combatente”, em vez de ser um “oficial de transmissões”, seja um médico ou um outro militar com funções na retaguarda?
4 – Certo é que o autor (narrador) inclui no texto (embora de passagem) uma referência (não muito explícita) ao sofrimento de uma geração, que foi a geração do seu avô inventão.
5 – Tudo isto traz à colação a necessidade de definir se uma certa literatura que, simplesmente, fale, aborde, disserte ou refira a guerra colonial é literatura da guerra colonial. Sem o saber de experiência feito.
Nota de AB: Sobre este assunto, vide poste Guiné 63/74 - P16440: Contraponto (Alberto Branquinho) (54): Literatura da guerra colonial, o que é? de 2 de Setembro de 2016)
_____________
Notas do editor:
[1] . Vd. post de 6 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27290: Notas de leitura (1846): "O Último Avô", de Afonso Reis Cabral, Publicações Dom Quixote, 2025 (Mário Beja Santos)
Último post da série de 2 de dezembro de 2025 > Guiné 61/74 – P27485: (Ex)citações (442): Com a lonjura do tempo a corroer-se… Da Guiné para outros palcos (José Saúde)














































