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quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Guiné 61/74 - P27494: Aviões que serviram na guerra colonial na Guiné, e os do tempo da CCAÇ 816 (1965/67) (Rui Silva, ex-2.º Sarg Mil)

1. Trabalho enviado ao blogue pelo nosso camarada Rui Silva, ex-2.º Sarg Mil da CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato e Mansoa, 1965/67) que ele elaborou e publicou no facebook privado da CCAÇ 816.


AVIÕES QUE SERVIRAM NA GUERRA COLONIAL NA GUINÉ, E OS DO NOSSO TEMPO (1965-1967)

- Nota: algumas destas aeronaves estiveram na Guiné antes de nós ali chegarmos e outras estiveram posteriormente

Os 9 primeiros conhecemo-los bem e, pessoalmente, mais ainda a avioneta DORNIER DO 27, o avião DAKOTA DC-6 e os helicópteros ALOUETTE II e o ALOUETTE III, estes 2 últimos no transporte de feridos do mato para o Hospital Militar de Bissau, nomeadamente nas operações a Iracunda (23Jun/65 e 7Mai/66), Biambi (10Jul/65), na limpeza da estrada Olossato-Farim (1 Ago/65) e na célebre operação a Morés (20Fev/66) aqui mais no transporte de evacuados por insolação e do material capturado levado para o Olossato:

A última foto mostra o avião civil (não militar) o quadrimotor “Super. Constellation” da TAP, no aeroporto de Bissau, que nos trazia para férias na metrópole. A viagem demorava cerca de 8 horas de Bissau para Lisboa e era direta. O regresso fazia-se com escala na ilha do Sal em Cabo Verde.


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Bombardeiro bem nosso conhecido, muitas vezes atuaram em operações nossas com realce para a atuação na célebre emboscada na bolanha de Joboiá (estrada Olossato-Farim) naquele domingo em 1 de Agosto de 1965 onde os bombardeiros tiveram uma ação preponderante e decisiva, sem esquecer a nossa valentia.arvard.
O T-6 foi um dos mais famosos aviões monomotores de hélice, conhecido por nomes como Texan, Harvard, Yale, Wirraway, Mosquito, Boomerang e Tomcat, conforme o país que o usava.
Foi adoptado na Força Aérea de 55 países, desde avião de treino de pilotos a bombardeiro.
Criado em 1935 pela North American, começou a ser utilizado em força em 1940, sendo introduzido em Portugal em 1946.
O T-6,avião convertido em caça-bombardeiro ligeiro, equipado com metralhadoras, mísseis, bombas convencionais ou de napalm debaixo das asas ou a actuar como avião de reconhecimento.

Caraterísticas do avião:
Monomotor de propulsão a hélice
Envergadura de 12,81m
Potência: 600 CV
Veloc. máx.: 335 km/h
Voo até 7400 metros de altura
Veloc. de subida: 6,1 metros por segundo

Equipamento de combate do T6:
4 metralhadoras Browning 7,7 mm (duas em cada asa)
2 bombas de 50 kg
6 bombas de 15 kg
Contentores de napalm (alternativa)
1 mira de pontaria


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Caça-bombardeiro monomotor turbo-jato também bem nosso conhecido.
Com 8,56 metros de envergadura, atingia a velocidade máxima de 1090 km/h; tinha um raio de acção de 1850 km; com tecto de serviço de 13.260 m.
Era armado com quatro metralhadoras Browning 12,7 mm ou dois canhões DEFA de 30 mm para além de 3 câmaras fotográficas Vinten, 1 frontal e 2 laterais.
Em Março de 1966, foram embarcados oito FIAT G.91R/4 que iriam constituir a Esquadra 21 "Tigres" na Base Aérea n.º 12 em Bissalanca, ex-Guiné Portuguesa, a qual se tornou operacional em finais de Junho do mesmo ano.
Regressaram a Portugal em 1974, após mais de 14.000 horas de voo em missões de combate.
Na Guiné foram abatidos ou destruidos por acidente 7 Fiat, 6 abatidos pelo inimigo, 3 deles por mísseis Strela; 1 por acidente com bomba, tendo morrido 1 piloto num dos aviões abatidos.


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Esta avioneta foi utilizada na Guiné em missões de observação e sobretudo para transporte de mantimentos, evacuação de feridos, etc. dadas as suas capacidades de descolar e aterrar em espaços muito curtos.
No Olossato, aquando das primeiras vezes que lá fomos antes de nos instalarmos definitivamente, ainda deu para ver os destroços de um junto à messe dos Furrieis.
Aeronave monomotor de trem de aterragem convencional fixo com roda de cauda, monoplano de asas altas, totalmente revestido a tela.
Tripulação: 1 piloto.
Capacidade de carga: 2 passageiros.
160 CV de potência.
Envergadura 10,97 metros
Velocidade máxima 211 km/h
Tecto de serviço 3900 metros.
Esta avioneta viria a ser substituida pelos Dornier, ainda dentro do nosso tempo


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Muitos de nós andaram nesta avioneta e logo começou nos primeiros tempos com o transporte por evacuação de Bissorã para o Hospital Militar de Bissau, do “Maravilhas” acidentado com arma de fogo.
O DO 27 é um avião monomotor, asa alta, trem de aterragem convencional fixo, com a capacidade de transportar seis passageiros ou o equivalente em carga.

Na Guiné tinha a missão de transporte de passageiros, evacuação de feridos, militares para consultas no Hospital Militar em Bissau, reconhecimento aéreo e transporte de correio a nossa avioneta do coração.
Esta avioneta transportou muitos elementos da Companhia para Bissau para férias ou ali em trânsito para férias na Metrópole.
Era também a avioneta do correio e muito exaltávamos quando a víamos no ar no dia certo.
Esporadicamente foram utilizados em missões de apoio utilizando foguetes montados sob as asas.
Avioneta com uma envergadura de 12 metros; uma velocidade máxima de 250 km/h e um teto máximo de 5,5 km.


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Avião bimotor, operava em missões de carga e transporte de passageiros. Durante a Guerra do Ultramar nas três frentes executaram missões de reconhecimento aéreo, lançamento de paraquedistas (principalmente), transporte de feridos, busca e salvamento e até serviu de bombardeamento.
Tripulação: 4 (piloto, co-piloto, navegador e operador de rádio)
Passageiros: (paraquedistas e outros) 28
Envergadura: 29,41m
Potência: 1200 CV
Velocidade máxima: 360 km/h
Teto máximo: 8045m


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Avião dos evacuados para os Hospitais da metrópole; o avião que me trouxe como evacuado (Jan1966), e ao “Doutor" e ao Alferes Costa em outras datas.
Eram aviões quadrimotores, construídos no final da II Guerra Mundial para missões de transporte de longa distância. A Força Aérea utilizou os DC-6 nos Transportes Aéreos Militares (TAM) que ligavam a Metrópole a Bissau, Luanda e Beira. Serviram frequentes vezes para evacuar os feridos dos teatros de operações para o Hospital Militar Principal em Lisboa. Podiam transportar além de uma tripulação de 4 pessoas também cerca de 55 passageiros, a uma velocidade de 500 quilómetros por hora.
16 horas de voo com escala (45 minutos) em Las Palmas, de Bissau a Lisboa.
Avião com uma envergadura de 35,81 m
Teto máximo 7600 m


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Avião bimotor de dupla cauda e de asa alta, com 2 motores em estrela e um peso máximo de descolagem de 21 mil kg. Visualização de manobras aéreas com salto de paraquedistas.
Intrigavamo-nos quando víamos passar aquele avião com duas fuselagens. Único no género, que víssemos.
Usados em Tancos para treino de paraquedistas e, nas colónias, conjuntamente com os Douglas (Dakotas), deram suporte aéreo nas áreas de comunicação, lançamento de paraquedistas e transporte de feridos.
Com uma envergadura de 32,5m
Velocidade máxima: 405 Km/h
Tecto de serviço: 7100 m
Distância máxima de voo: 2500 Km
Capacidade de transporte: 32 passageiros ou carga até 5800 Kg
Tripulação: 5 (2 pilotos, mecânico, navegador e operador de rádio).


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O helicóptero que transportava os feridos em macas suspensas do lado de fora da aeronave. Bem nosso conhecido pois, logo de princípio víamo-los passar por cima do quartel de Brá onde estivemos nos primeiros 15 dias de Guiné, já bem baixos e a caminho do Hospital Militar mais adiante e ali perto.
Intrigávamo-nos porque eles levavam um ou duas (uma de cada lado) o que pareciam macas suspensas do lado de fora da aeronave. Deduzimos que só podia ser para servirem ao transporte de feridos (ou mortos) e assim era.
Alguns militares da CCAÇ 816 chegaram a utilizá-los pelos piores motivos (feridos), nomeadamente em consequência das operações a Iracunda (23Jun65 - 2 feridos), a Biambi (10Jul65 – a única operação que atuamos em conjunto com a CCAÇ 818 –1 ferido) e na estrada Olossato-Farim (1Ago65 -3 feridos graves +1 morto, este o Furriel Silva que não chegou a sair do Olossato onde esteve em câmara ardente). Aqueles 3 feridos transportados também para o Hospital Militar de Bissau.
Os Alouette II começaram a ser substituídos em Novembro de 65 (tínhamos meio ano de Guiné) pelos Alouette III que se mantinham em operacionalidade quando regressamos à então Metrópole.
O Alouette II foi o primeiro helicóptero do mundo, motorizado com turbina a gás a ser certificado para voo.
Diâmetro do rótor principal: 10,20m
Potência: 530 CV
Velocidade máx: 185 km/h
Tecto máximo: 2300m
Capacidade de transporte: Piloto e co-piloto, e cinco passageiros ou peso equivalente de carga; ou então duas macas e assistente.


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O Alouette III veio substituir o II por ser mais rápido, mais ampla cabine de pilotagem e com capacidade para mais pessoas no interior; os feridos eram transportados no seu interior. O Alouette III tinha também uma mais ampla capacidade de voo, mais veloz e mais teto.
É um desenvolvimento do Alouette II, tendo um tamanho maior e uma maior capacidade de carga. O Alouette III era reconhecido pelas suas capacidades de operação em grandes altitudes, sendo o ideal para o salvamento em áreas montanhosas, o que na Guiné não era o caso.
Em Novembro de 1965 ocorreu o primeiro voo de Alouette III na Guiné, sendo colocados na BA 12 - Bissalanca.
Estes helicópteros foram introduzidos em Portugal em 1963, primeiro em Angola e depois na Guiné. Portugal terá sido o primeiro país que os usou em combate, em missões diversas, desde transporte de feridos ou por evacuação, mormente por insolação, até ao apoio no combate ou até escolta.
O Alouette III evacuou 3 feridos da CCAÇ 816 e outros evacuados por desidratação e ainda na envolvência de transportes de armamento militar capturado ao inimigo na célebre operação “Castor” em 20 de Fevereiro de 1966. Aqui foram 6 helicópteros a atuar, pela celeridade da operação, e num vai-e-vem constante. Mais tarde, aquando de nova operação a Iracunda, em 7 de maio 1966, transportou 1 ferido grave, o saudoso Tiago Manso, que viria a falecer uns dias mais tarde no Hospital Militar de Bissau. (RIP Tiago).
Tripulação: piloto e co-piloto + 5 passageiros
Diâmetro do rotor horizontal: 11,02m
Velocidade máxima: 220 km/h
Potência: 870 CV
Teto máx.: 3200 m


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Avião caça-bombardeiro, com motor turbo jato, monomotor e monoplano.
Foram fornecidos aos aliados dos EUA, nomeadamente Bélgica, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Noruega, Portugal, Turquia e Republica da China (Taiwan) e a países não alinhados como o Irão, Tailândia, e Jugoslávia. Portugal seria o último país a abater os seus F-84G ao serviço operacional da sua força aérea, em 1976, depois de os utilizar de forma intensa na guerra de independência das suas colónias em África, em particular em Angola, onde equipou a esquadra 93.
Este caça terá atuado fugazmente na Guiné
Velocidade máxima: 1020 km/h
Teto de serviço: 12350 m
Taxa de subida: 19,1 m/s


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Avião caça transónico, com motor turbojato, monomotor, monoplano.
Primeiros caças na Guiné como aviões de reconhecimento antes da guerra eclodir.
Quando aquela começou estes caças transformaram-se em bombardeiros e equiparam-se com seis metralhadoras Browning Colt TM3, calibre 12,7 mm, e podiam transportar vários tipos de armamento, como os foguetes de 2,75”, bombas GP de 50 e 250 kg e tanques de napalm de 350 L.
Os Sabre foram, ainda em 1963, substituídos pelos T6 Havard que nós tão bem viemos a conhecer e a tê-los em companhia em diversas operações.
Tripulação: 1 piloto
Envergadura de 11,31m
Veloc. máx.: 995 km/h
Teto de serviço: 14600 metros


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O Lockeed PV2 Harpoon era um bombardeiro médio, bimotor. Transportava bombas no compartimento central e nas asas, podendo ser instaladas até oito metralhadoras 12,7 mm na proa.
Utilizado na Guiné também como se fosse um caça-bombardeiro.
Atingia a velocidade de 450km/h


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O C-54 Skymaster é um avião movido a hélice de quatro motores, desenvolvido pela Douglas Aircraft Company. Operou durante a Segunda Guerra Mundial e no transporte aéreo em Berlim. A partir de 1945, muitas companhias aéreas civis operavam com esta aeronave em todo o mundo.
Úteis em tarefas de transporte, lançamento de paraquedistas, como avião-hospital, etc.
O C-54 Skymaster foi usado na Guerra Colonial inclusivamente na Guiné
Envergadura: 35,8 m
Potência: 1450 CV
Velocidade máxima: 442 km/h
Teto máximo: 6800 m


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O avião Douglas Invader B-26 foi um avião bimotor desenvolvido pelos Estados Unidos como uma aeronave de ataque e bombardeiro leve durante a Segunda Guerra Mundial,
O trem de aterragem era triciclo, com comando da roda de proa a partir do “cockpit”.
3 tripulantes (piloto, mecânico de voo e operador de rádio)
Equipava metralhadoras, foguetes e bombas.
Envergadura: 21,34 m
Potência (por motor): 2000 CV
Velocidade máxima: 570 km/h
Teto máximo: 6700m


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Avioneta de fabrico francês utilizada em reconhecimento, transporte ligeiro, evacuação, etc. Avioneta parecida com a Auster e a Dornier, já acima referidas e que passou fugazmente pela Guiné.
Os franceses utilizaram os Broussard na luta contra os guerrilheiros argelinos, utilizando um canhão móvel que disparava através da porta traseira, situada no lado esquerdo.


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Aeronave bimotor terrestre de trem de aterragem convencional retrátil, monoplano de asa baixa, duplo estabilizador vertical, revestimento metálico, cabina integrada na fuselagem, destinado a transporte ligeiro, patrulhamento, reconhecimento e instrução de navegação.
Envergadura: 14,5 m
Velocidade máxima: 352 km/h
Teto de serviço: 5548 m
Tripulação: piloto e co-piloto


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Em 1970, (já passados 3 anos do regresso da CCAÇ 816) a Força Aérea Portuguesa adquiriu 13 helicópteros Puma, devido à necessidade de maior capacidade de transporte durante a Guerra do Ultramar.
Com uma tripulação de 2 pilotos e podendo transportar 18/20 homens com o seu equipamento habitual (paraquedistas), um número bastante superior aos 5 passageiros possíveis com os Alouette III, o que aumentou significativamente a mobilidade do Exército Português.
Considerado um helicóptero médio com capacidade para voar com todo o tempo. Estava equipado com 2 turbinas “Turbomeca” com 1900 CV de potência, tinha um peso máximo à descolagem de 3770 kg e uma velocidade máxima de 258 km/hora, possuindo uma autonomia de 5 horas. Podia ser equipado com armamento: 1 canhão de 20 mm, 2 metralhadoras coaxiais de 7,62 mm ou mísseis.
Também possuía um guincho para recolha de pessoas a partir do chão ou do mar, radar e piloto automático que lhe permitia fazer estacionário automaticamente.


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Foram 2 destes aviões que vieram a substituir os Dakota DC-6 que desde 1961 vinham mantendo a ligação da metrópole com Angola, Guiné e Moçambique.
O Boeing 707 é um avião comercial a jato quadrimotor de porte médio e fuselagem estreita desenvolvido e produzido pela Boeing entre os anos de 1958 e 1979.
Foram os aviões quadrireactores que passaram a transportar as tropas entre a Metrópole e as 3 colónias em guerra, substituindo os navios.
No nosso tempo a pista do aeroporto de Bissau não reunia condições para estes aviões a jato nem sequer estes existiam na frota portuguesa da TAP.
Tripulação: piloto, co-piloto e engenheiro de bordo
Capacidade para 202 passageiros
Envergadura 44,42m
Velocidade (de cruzeiro) 815 km/h

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Avião monomotor de asas fixas e baixas com um piloto e até 6 passageiros.
Avioneta com caraterísticas semelhantes às “Dornier”.
Possuía uma envergadura de 10 metros e uma potencia de 300CV, com uma velocidade máxima 280 km/h e com um teto de serviço de 4950m.


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O P2V5 Neptuno, equipados com meios sofisticados electrónicos principalmente para a detecção e o combate a submarinos.
A Força Aérea fez deslocar rapidamente vários meios aéreos para os chamados territórios ultramarinos e os P2V-5 passam também a ser usados nas colónias portuguesas em missões de natureza diversa.
O P2V5 Neptuno é um avião bimotor, asa média, de trem de pouso retráctil,
Aeronave de patrulha marítima e anti-submarina, com motores radiais a pistão e motor turbojato, bimotor monoplano, para uso civil e militar
Velocidade máxima: 515 km/h
Envergadura: 30,48m
Estavam equipados com oito suportes de rockets em cada asa


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sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19199: Notas de leitura (1121): "Tatuagens da guerra da Guiné", de Capitão Luís Riquito [, cmdt, CCAÇ 818, Bissorã, Olossato e Mansoa, 1965/66) ("Elo", jornal da ADFA, novembro de 2018)


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Recorte que nos acaba de ser enviado pelo nosso camarada A. Marques Lopes , lisboeta que vive em Matosinhos [, cor DFA, na reforma, ex-alf mil,  CART 1690,  Geba, e  CCAÇ 3, Barro (1967/68)], e  que reproduzimos, para divulgação, com a devida vénia ao jornal ELO, órgão de informação, de periodicidade mensal, da ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas.


Nota do portal Wook sobre o autor, Luís F. G. Riquito:

 (i) nasceu em Parada de Gonta, no concelho de Tondela;

(ii) fez o curso liceal em Braga, Évora, Coimbra e Viseu; (iii)

(iii) ingressou em 1957 na Escola do Exército, onde se formou no Curso de Infantaria;

(iv) mobilizado para o Ultramar, cumpriu comissões em Timor, Guiné e Moçambique, onde montou e comandou a segurança da construção da barragem de Cabora Bassa;

(v) em 1975, foi considerado Deficiente das Forças Armadas (DFA), por abate do helicóptero onde seguia quando apoiava as populações a realojar pelo enchimento da albufeira da barragem de CB;

(vi) é condecorado com a Ordem Militar de Avis – Grau de Cavaleiro, com a Medalha de Prata de Valor Militar com Palma, com três Medalhas de Prata de Serviços Distintos com Palma e a Medalha de Mutilados e de Inválidos de Guerra;

(vii) licenciou-se no ISCTE em OGE (Organização e Gestão de Empresas);

(viii) em 1980, assessorou o Serviço Nacional de Protecção Civil no apoio a Angra do Heroísmo, atingida pelo sismo;

(ix) continuou nos fogos florestais de 1981 e na seca de 1982- -1983;

(x) dirigiu o CCDPC (Centro de Coordenação Distrital de Protecção Civil) de Viseu, intervindo na seca, nos fogos florestais e nos acidentes rodoviários;

(xi) regressou em 1992 ao Serviço Nacional como Vice-Presidente com o pelouro dos estudos dos Riscos Naturais que promoveu;

(xii) de 1985 a 1992, foi Presidente da Câmara e da Assembleia Municipal de Tondela, onde organizou e implementou a actividade autárquica; definiu o plano de desenvolvimento para o Concelho, assente em projectos de candidatura a apoios do Governo e da CEE, que elaborou; empenhou as Juntas de Freguesia na resolução dos problemas locais, para quem transferiu meios económicos, técnicos e humanos
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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19187: Notas de leitura (1120): “Lineages of State Fragility, Rural Civil Society in Guinea-Bissau”, por Joshua B. Forrest; Ohio University Press, 2003 (1) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18631: Notas de leitura (1066): “Tatuagens da Guerra da Guiné”, pelo Capitão Luís Riquito; Guerra e Paz Editores, 2018 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
O então Capitão Luís Riquito desembarcou em Bissau em 1965, andou a afeiçoar a sua CCaç 816 em territórios de inequívoca dureza, entre Bissorã e Olossato, e meses depois, quando o Olossato estava no centro do furacão, coube-lhe construir e reconstruir em Olossato, Ponte Maqué, desobstruir estradas e abrir caminho, ao tempo tão intimidativo, para a base do Morés.
Para surpresa de muitos leitores, aparece em relatos em que os grupos de combate se afoitam pela floresta e tratam gente que vive sob o controlo remoto da base do Morés e grupos incidentes. Foram reagrupados e de um modo geral não voltaram a fugir para o mato.
Um relato um tanto formal onde não se escondem dolorosas e também dulcificantes situações naquele contexto tão áspero em que o PAIGC firmava posições e era crucial afronta-lo, no dia-a-dia.

Um abraço do
Mário


Nas terras do Oio, entre 1965 e 1966

Beja Santos

“Tatuagens da Guerra da Guiné”, pelo Capitão Luís Riquito, Guerra e Paz Editores, 2018, é um relato memorial de quem comandou a CCaç 816, que desembarcou em 26 de maio de 1965, o narrador dá pelo nome do Capitão Fernando Gonçalves, usa a terceira pessoa do singular e centra o essencial do seu registo em terras do Oio, mais concretamente Mansoa, Bissorã e Olossato. Para quem desconhece aquela floresta densa e fechada, o narrador fala-nos de várias campanhas de pacificação e dos seus povos. É informado das bases do PAIGC espalhadas pelo Oio: Morés, Iracunda, Cai, Cansambo, Cambajo (quatro bases de segurança periférica da base central), e de Maqué, de Biambi, de Queré e de Rua, bases regionais vocacionadas para o apoio logístico e o controlo das populações.

É uma peça de literatura memorial que obedece à estrutura de um relatório desdobrado em itens. Depois do que ele denomina treino operacional, esta Companhia independente chega em finais de setembro de 1965. Descreve o subsetor do Olossato e as missões de que está incumbida a sua Companhia. Era tudo trabalhoso e tanto, as forças do PAIGC não davam descanso: frequentes emboscadas às colunas da estrada para o Olossato; a estrada para Farim estava interdita, fora limpa e aberta em julho de 1965, não deixou de haver violência; destruição em 3 de agosto de 1965 da ponte de Maqué, onde foram implantadas minas antipessoal; abatises na estrada entre Mansoa e Bissorã, foram removidos; ataque à guarnição de Olossato, em 15 de agosto de 1965, e muito mais. Havia que reabilitar e construir infraestruturas, procurar e acolher populações transmalhadas, gerar boa convivência, patrulhar, intervir em operações, assistir e abastecer as populações dentro das suas tabancas. E tudo se descreve: a destruição de uma serração, um ponto estratégico onde as forças do PAIGC atacavam quem partia ou chegava ao Olossato; o diálogo com os Muçulmanos. E é dentro desta formalidade descritiva, um tanto seca e rígida, que surge um episódio emocionante, uma memória de Bacar Queba, este diligentíssimo combatente é atingido por uma mina, levado para a enfermaria, ficara cego, quer falar com o Capitão, e este regista a conversa pungente e transmite-nos uma dor universal:
- Esta mina era mesmo muito perigosa, Bacar, e tu conseguiste safar-te, pá. Aquela era para limpar quem apanhasse e tu safaste-te. Tiveste mesmo muita sorte, Bacar. Sabes como foi e como podia ter sido, pá! Dentro deste azar, tu sabes que tiveste muita sorte por continuares aqui a falar comigo e tens todos os teus amigos da OITO16 a rezar por ti, para que fiques bem e continuares a trabalhar por esta tua gente. Uma vez que chegaste aqui, o nosso furriel está a preparar tudo para seres transferido para o Hospital de Bissau e os médicos podem resolver e recuperar a tua vista, percebes?
- Pois é, Capitão, mas eu estou aqui sozinho mesmo, pá, e o que eu quero mesmo, mesmo, é voltar para aí! Para sentir isso aí fora, percebes Capitão? Dá cá a tua mão, para eu sentir outra vez isso aí fora, pá!

O Capitão estendeu a mão direita a Bacar que, ao segurar, a apertou com força, num cumprimento de esperança, de camaradagem e de amizade correspondida, e desabafou:
- Agora já sinto, Capitão, já sinto isso aí fora onde tu estás e estou a ver-te, mas eu estou longe, pá; mas agora assim estou melhor, já sei onde estou e a lembrar com quem estou a falar, sabes. Parece que voltei, Capitão, já sinto mesmo, pá.

Há um aspeto que seguramente emocionará o leitor, a integração das populações espalhadas pelo mato que em sucessivas ações os homens da CCaç 816 vão ao contacto, e trazem quase sempre com sucesso gente que é forçada a cultivar e a alimentar as forças do PAIGC. Um conjunto de descrições que deverá doravante merecer a atenção dos historiadores para situar naquele tempo ainda fortes debilidades no controlo remoto exercido por Morés sobre populações que viviam foram da base.

A batalha de Maqué, expressão usada pelo autor para esmiuçar todo o trabalho desenvolvido para beneficiar o destacamento e garantir a segurança da ponte de Maqué, não deixando de referir que para além destas reconstruções, a CCaç 816 foi envolvida num conjunto apreciável de operações, patrulhamentos, emboscadas a que não faltaram duros confrontos, abrindo-se caminho para ir mais destemidamente até ao núcleo central do Morés.

Luís Riquito muniu-se de informação sobre as campanhas de pacificação, leu René Pélissier, Luís Cabral, Amílcar Cabral, seguramente que guardou arquivo de todas as atividades da CCaç 816, a não ser todo este arquivo não nos poderia dar com tal grau de minúcia as intervenções no Oio e no Morés. E destaca aquela coroa de glória que foi a Operação Castor, onde intervieram a CCaç 816 com um grupo de combate da CCAÇ 1418 e Caçadores Nativos do Olossato, saíram do Olossato em 19 de fevereiro de 1966 e apanharam muitíssimo material e algumas emboscadas pelo caminho.

Em 27 de julho de 1966 a CCaç 816 deixa o Olossato e vai para Mansoa, passa a intervenção e fica-se igualmente com um relato das operações por onde andaram. A memória detalhada do Capitão Luís Riquito culmina com um grande desastre ocorrido no quartel novo de Mansoa, o Capitão procurou evitar mais graves danos humanos e materiais, houve para ali um forte litígio verbal e não-verbal com um camarada de armas.
O documento termina com a orgânica da CCaç 816, os seus mortos e feridos e louvores.

Uma peça a considerar para o estudo da guerra da Guiné na zona crucial de Morés, entre 1965 e 1966.
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18622: Notas de leitura (1065): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (34) (Mário Beja Santos)

domingo, 22 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14398: Convívios (659): Encontro do pessoal da CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato e Mansoa, 1965/67), dia 23 de Maio de 2015 em Fátima (Rui Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 17 de Março de 2015:

Caros e considerados amigos Luís, Vinhal e Magalhães Ribeiro
Recebam os maiores votos de uma boa saúde e também de uma boa forma (sempre) para sustentar este extraordinário Blogue.

Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Queiram publicar no Blogue o anúncio de mais uma Festa anual da Companhia de Caçadores n.º 816 - Guiné Portuguesa 1965 / 67, e do qual se junta em anexo.

Passem bem (!) e daqui vai também um grande abraço.
Rui Silva

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Nota do editor

Último poste da série de 18 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14382: Convívios (658): Almoço do pessoal da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, dia 18 de Abril de 2015 em Vila Real (António Nobre)

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13310: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (28): O dia em que o Trovoada caiu ao poço

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 3 de Junho de 2014:

Caros amigos e ilustres editores do Blogue:
Aqui vai mais um “salpico” que espero os vá encontrar de boa saúde, harmonia e bem-estar. 

Abração.
Rui Silva



Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Do meu livro de memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”

28 - O Trovoada no fundo do poço! Os morcegos alvoraçados e o Grilo a gritar!

É verdade, o “Trovoada” (Zé) caiu ao poço, bem fundinho, ali a uns escassos quilómetros do Olossato, para os lados de Maqué, e em pleno terreno da guerrilha.
Esta, como se sabia, era já ali, era só passar o arame farpado do aquartelamento.
Foi um grupo constituído por cerca de trinta homens, à lenha e, como era habitual e necessário: a lenha e o efetivo militar.
Desta feita foram então para os lados de Maqué, aí a uns 3-4 quilómetros e o local era o de uma Tabanca abandonada e, assim, provavelmente, um bom sítio para encontrar alguma lenha.

Eu, no entroncamento do carreiro para Maqué com a estrada Bissorã-Olossato e no “intervalo” (se é que haviam intervalos) de uma operação. Na foto, vê-se, em segundo plano, se não é o celebre poilão de Maqué, é outro lá perto. Toda a Companhia (e pelo que as conheci) tinham o seu fotógrafo. Na minha era o Correia radiotelegrafista. Ainda hoje nos Convívios lá anda ele a fotografar a tudo que mexe.

Uma parte do grupo procedia à recolha daquilo que podia então servir de lenha e a outra parte fazia a necessária segurança.
O “Trovoada”, elemento dos que garantiam a segurança aos esgravatadores da lenha, com tão redobrada atenção, acabou por vislumbrar uma bananeira e então há que ir buscar um cacho que tanto jeito fazia para tirar a barriga de misérias.
Pensou e melhor o fez; foi buscar um cacho e trouxe-o para junto do “Grilo” a quem se propunha dividir as bananas, mas o “Grilo”: - “Dividir o quê? Vou é lá buscar um cacho também pr’a mim”.

E assim, com a companhia do amigo do batedor “Trovoada” foi lá arrancar um cacho, só que o “Trovoada”, que ia à frente, pois sabia onde elas estavam, pisou capim de raiz falsa, que, para grande azar dele, cobria um poço que outrora abastecia, com certeza, a referida tabanca, agora, e como disse, abandonada.

Pamba!!... tchoc, tchoc… 

O “Grilo” gritou logo, ante o desaparecimento relâmpago do seu companheiro de safra e do consequente estoiro, o qual também surpreendeu toda a gente que logo constatou que alguém tinha caído a um poço, provavelmente.

- “É o Trovoada, é o Trovoada”, grita o “Grilo”

O “Trovoada” qual voz do outro mundo, e passados uns segundos, diz lá de baixo e para sossego do alvoraçado “Grilo”.
- “Oh Grilo, eu estou bem!!”

Pois, não estava muito mal, depois de tirar a medida à altura da água, segurou-se como pôde e ficou à tona, contou ele depois, cá em cima e já algo refeito do susto.

O preto, o padeiro civil, que era também parte interessada na recolha da lenha, como já se vê, propôs-se a ir lá baixo buscar o “Trovoada”. Mas como? E com quê?


Já bastava um no fundo do poço. Uma outra versão do Black and White, podia acontecer.
Alguém se lembrou de que só com uma corda é que ele saía dali e então um pequeno grupo foi buscá-la ao aquartelamento do Olossato.

O Pinto (paz à sua alma – faleceu há meia dúzia de anos-) condutor da Unimog que iria trazer a lenha, mais 2 ou 3 elementos voaram para o aquartelamento. É verdade, por ali havia uma corda aí com 30 metros. Vá lá, vá lá…
Para lamento do “Trovoada” o Pinto, que até voou, demorou tempos infinitos.

Chegados ao local da tragédia, há que içar o “Trovoada” que apesar de tudo até nem era dos mais nervosos.

- Cara-ho (!) lá em baixo andavam morcegos que voavam à frente do meu nariz”.

O “Trovoada” a sacudir-se todo de alto abaixo, e alguém pergunta :
- “Oh carago (carago é favor) e a G3?… e as cartucheiras?”
- “ Ficaram lá no fundo!”, diz o “Trovoada” com ares de “eu é que já me safei!! Que se f… o resto…”

Bom, aí é que o preto padeiro, que estava ansioso por mostrar serviço (de coragem), com a ajuda da dita corda, amanda-se pelo poço abaixo e no regresso surge ele do poço com a arma e as ditas cartucheiras do “Trovoada”, sorridente e a mostrar toda a sua cremalheira branca encaixilhada por grossos lábios à boa maneira da natureza nativa, e com cara de quem acabou de fazer qual truque de magia.
E ele que ansiava ser protagonista.

Tudo acabou em bem, afinal, e para o Olossato veio a lenha e também vieram os cachos de bananas do “Trovoada” e do “Grilo“, que tanto custaram a apanhar, principalmente ao primeiro. Este quase que arranjou foi lenha para se queimar (afogar).

O preto padeiro, esse, nunca mais deixou de arreganhar a tacha.

Eu e o meu amigo Zé “Trovoada”, passados 48 (!) anos de o Zé ter caído ao poço, ou, (soa melhor), ter saído do poço, algures na Guiné. (foto tirada agora no último Convívio da 816 (10/5/2014)

Rui Silva
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12601: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (27): Operações Vacas

terça-feira, 20 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13170: Convívios (598): Rescaldo do Encontro do pessoal da CCAÇ 816, realizado no passado dia 10 de Maio de 2014 nas Caldas das Taipas ( Rui Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 12 de Maio de 2014:

Caro e estimado amigo Vinhal:
Recebe um abração!

No passado sábado, e como é habitual fazer no segundo sábado de Maio, a Companhia de Caçadores n.º 816, que esteve na Guiné entre 1965 e 1967, realizou mais um Convívio anual e que, mais uma vez, teve, para grande satisfação da malta, uma boa presença.

Cerca de 60 (!) militares da Companhia conviveram alegre e fraternalmente durante praticamente todo o dia. Esposas, muitas, filhos e netos – não faltará muito para haver bisnetos- juntaram-se também à grande festa da 816.

O evento realizou-se desta feita nas Caldas das Taipas (Guimarães), terra do seu realizador, o grande amigo “Manel das Taipas”, um elemento da 816, claro está.

A festa começou com a concentração do pessoal no Largo da Feira junto aos bombeiros.
Seguiu-se a habitual missa por Ação de Graças dos que faleceram, os muito saudosos e queridos da Companhia, o Furriel Silva e o soldado Manso que deixaram a vida em combate, e outros que entretanto e ao longo do tempo nos foram deixando. A Missa teve lugar na bonita Igreja de Sande S. Martinho onde pontificavam bonitos altares em talha dourada e pinturas no teto adequadas à religião.
Um bonito Grupo Coral deu mais brilho à cerimónia.

No restaurante Albino, também na localidade de Sande S. Martinho, seguiu-se o almoço de confraternização.
Pelo meio da tarde, o momento solene da divisão do Bolo tradicional, sempre com o emblema da 816 destacado, e com o champanhe a acompanhar.

O Capitão, Comandante da Companhia (hoje Tenente Coronel reformado) Luís Riquito, fechou a cerimónia com a habitual e reconfortante alocução.

A despedida teve então lugar com abraços e mais abraços agora já com lágrima a aflorar nos olhos (sempre são quase 50 anos que partimos para a Guiné) de muitos, pois, como alguém disse, a vivência na guerra da Guiné tornou-nos muito, muito mais, que amigos.

Eu, com o amigo Jorge, figura incontornável da Companhia que veio com esta para Portugal. Viveu e cresceu com a família Marques (o Luís José Marques, Furriel da Companhia) que o acolheu e protegeu de forma insuperável

 A cerimónia litúrgica na bonita Igreja de Sande S. Martinho

 Na escadaria da Igreja houve lugar à foto de família (só os ex-militares)

A sala do restaurante preenchida com os militares da 816 e suas famílias

O bolo tradicional muito bem desenhado e confecionado

O Capitão Luís Riquito parte o bolo com a “ajuda” de um neto do “Manel das Taipas”
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Nota do editor

Último poste da série de 20 DE MAIO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13168: Convívios (597): Rescaldo do Convívio da CART 2679 e Pel Caç Nat 65, realizado nos passados dias 10 e 11 de Maio de 2014 em Tomar (José Manuel Matos Dinis)

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12926: Convívios (577): Encontro comemorativo do 47.º aniversário do regresso da CCAÇ 816, a realizar no próximo dia 10 de Maio de 2014 nas Caldas das Taipas (Rui Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 15 de Janeiro de 2014:

Caríssimos:
O que me ocorre logo e antes de tudo, é formular o desejo de uma boa saúde nas vossas pessoas e familiares queridos.
Agradecia que fosse publicado no “Querido Blogue” o programa da festa da família 816 que este ano ocorre na simpática terra de Caldas das Taipas.
Manda di ronco no dia 10 de maio e que faz sensivelmente 47 anos da chegada ao cais da Rocha do Conde de Óbidos. Isso mesmo, da chegada!... Irra!!).

Um abraço para toda a tertúlia.
Rui Silva


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Nota do editor

Último poste da série de 30 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12916: Convívios (576): XVII Encontro do pessoal do BCAÇ 4514, Estarreja, dia 5 de Abril de 2014

sábado, 18 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12601: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (27): Operações Vacas


1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 15 de Janeiro de 2014:

Caros amigos Luís, Vinhal e M. Ribeiro:
Aí vai, com um abração, mais um conto extraído do meu caderno de memórias.
Rui Silva



Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Do meu livro de memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa” 

27 - OPERAÇÕES - VACA

Na minha Companhia era assim e provavelmente na tua também.
O que se apanhava, e refiro-me aqui e agora à recolha (desvio, mudança de dono, etc.) de gado no mato, era compartilhado irmãmente pela população do Olossato: vaca para nós; vaca para eles.

- Não serei o primeiro a dar-lhe este nome (operação-vaca) aqui no Blogue, pois o Veríssimo Ferreira assim lhe chama no Post 12413.
(Não sabia que no célebre K3 - bifurcação das estradas para o Olossato e para Mansabá, para quem vinha de Farim - já lá havia tropa em 1966). Andámos lá perto em operações de golpes-de-mão e emboscadas -.

O nosso Capitão, e honra lhe seja feita, tinha uma filosofia da guerra muito ortodoxa (para mim e por certo para toda agente da 816). Grande comandante operacional no terreno e também no desenvolvimento dos valores morais, da ética e sobretudo humanos e culturais das povoações por onde assentávamos arraiais.
O tratamento com os seus militares era insuperável, era como se diz, “terra-a-terra” mas sem a mínima quebra do respeito hierárquico. Respeitava e fazia-se respeitar.
Uma das suas primeiras preocupações, não militares, era pôr as crianças numa “escola” com um Furriel a ensinar.
A simbiose população-tropa ou tropa-população, era um dos seus propósitos prioritários.
Não me esqueço mais, e isto já no campo militar, ele tirar a MG 42 do tripé e pô-la no parapeito da autometralhadora improvisada numa GMC (o “Águia Negra” Rogério Cardoso sabe do que estou a falar) expondo-se assim, muito a jeito, à trajetória das balas e dos estilhaços (destes não se livrou, ainda que não gravemente) das granadas inimigas (não foram poucas) numa das emboscadas mais problemáticas que a Companhia sofreu durante a refrega africana. Outra atitude de rara coragem e aqui vou citar o meu grande amigo Rui Alexandrino no seu extraordinário e singular livro “Rumo a Fulacunda”:

...acorri ao local onde deparei com uma cena terrivelmente chocante e verdadeiramente trágica.
Numa viatura GMC da Companhia que estava parada junto à arrecadação, anexa à caserna dos Soldados que se aprontava para escoltar aquela coluna, envoltos em chamas, atingido que fora o depósito da gasolina, ardiam 2 militares do 3.º pelotão.
Rebentavam ininterruptamente granadas de mão e de morteiro que já tinham sido colocadas na caixa da viatura.
O pandemónio e a desorientação eram gerais.
Imóveis os sinistrados, já mortos, ardiam.
Incrédulos, protegiam-se os restantes encobertos pelos cantos e pelas paredes dos edifícios anexos sem saber muito bem qual a atitude a tomar, qual a acção a desenvolver.
Tomou então a iniciativa o Capitão Riquito, comandante da 816 que, protegido por uma auto-metralhadora DAIMLER se aventurou até junto da viatura em chamas, a destravou, lhe engatou um cabo de reboque para que fosse arrastada para o meio da parada, longe da arrecadação onde existiam mais granadas e munições.
Esgotado o combustível e arrefecida a viatura, foi então possível fazer o rescaldo do incêndio e resgatar os corpos que estavam completamente carbonizados.
Uma verdadeira desgraça! Um inacreditável horror!

Recordo bem das primeiras advertências do Capitão (particularmente, e ainda hoje, chamamos-lhe Grande Capitão) dele, logo nos primeiros dias de campanha: Quem fizesse engravidar assumia a paternidade. Balizava o procedimento do pessoal de uma forma humana e muito altruísta. Aquele foi um dos mandamentos a cumprir. Terá sido cumprido?... Julgo que sim.

O povo do Olossato e a tropa da 816 puxavam para o mesmo lado.
Olossato era uma povoação guineense das mais pequenas certamente.
Fomos ali substituir a 566 (um abraço Zé Ribeiro) uma Companhia que tinha feito um belíssimo trabalho quer no campo da luta, quer na construção e na defesa do aquartelamento, quer ainda na ajuda aos sacrificados nativos. Fomos “apresentados” numa ida à base de Iracunda e que foi o batismo de fogo para 2 Grupos de Combate da 816, um batizado que demorou aproximadamente 25 minutos de fogachada (chamei pela minha mãe ali a primeira vez - será que ela ouviu? Até pareceu…-).

Para começar… nada mau…. e eu que me gabava de não me meter com ninguém.
Julgo que a 566 foi a primeira Companhia a sediar e a reconstruir o Olossato.
Nós da 816, fomos render aquela Companhia em outubro de 1965.
Ficamos por ali praticamente 1 ano.

O Olossato foi por assim dizer a nossa terra na Guiné. Fomos encontrar meia dúzia de casas em alvenaria, supostamente outrora de colonos, e o resto era a pequena tabanca das gentes nativas do Olossato.

Havia um chefe de posto com casa própria. Do lado para Farim a loja de panos do Sr. Fodé, a casa do padeiro do outro lado e pouco mais. Isto logo a seguir ao cavalo de frisa que fechava o aquartelamento desse lado. Do lado de Bissorã, já havia mais casas. Logo imediatamente antes da “Porta d’armas”, 2 a 3 casas a vender miudezas, panos garridos e diversidade de coisas muito simples e corriqueiras, regionais e artesanais - a necessidade aguça o engenho - ouvi já isto em qualquer lado. Por ali também inevitavelmente o grande barracão, outrora serração onde se acomodava a guarnição dos Obuses do meu querido amigo Alferes miliciano Brandão.

Libaneses, nem um, ao contrário de Bissorã onde lembro os bailes em casa do Sr. Rui. (eu? Não, o Libanês). Saudades? Talvez! Até então onde tínhamos estado.
No Olossato, bem dentro do aquartelamento, este bem fortificado com troncos de palmeira e chapa de bidão a guarnecer, e de planta quadrada, apenas um civil: um velhote cabo-verdiano que cultivava ananases não sei onde e para o lado de Maqué. Saía de bicicleta e usava um chapéu típico de expedicionário africano. Para ele não havia guerra.
Tinha uma casa também em alvenaria e esta ficava escondida num matagal de plantas e árvores, com algum toque de ajardinado, diga-se. Figura um pouco enigmática.

Dentro do quartel só havia casas em alvenaria e também mais um barracão (sempre as serrações) que servia de caserna aos soldados.
A tabanca da população flanqueava todo o lado Norte do aquartelamento e do lado de fora deste.
Olossato, bem dentro do Oio, e relativamente perto de Morés sempre foi uma povoação da Guiné mas terá sido completamente abandonada aquando de Morés se tornar uma das principais bases inimigas na Guiné. Aqui e julgo que foi a 566 que recolheu gente no mato e trouxe para o Olossato e aí renasceu aquela terra.

Um momento de festa e alegria do humilde povo do Olossato. Senti o pulsar da franca alegria daquela gente. Arrepiava, o chão, vermelho, até tremia. O riso das bajudas e até das mais velhas (estas mais traquejadas nos movimentos da dança) era largo. De face a face, e a mostrar toda uma dentadura muita branca e alinhada. Dentes tinham, nozes? Nem tanto…

Passado este introito (talvez longo. Desculpem!) vamos então às célebres e denominadas “Operações-vaca”.
As “Operações-vaca” tinham por fim, e daí a afinidade com o seu nome, o apanhar, para não usar outro termo mais apropriado, de gado ao inimigo ou pró-inimigo. A maioria do gado em poder daqueles, sabia-se, que era “roubado” aqui e acolá em pequenas povoações indefesas ou aquelas que não queriam colaborar com eles, e que na maioria dos casos não tinha qualquer proteção da tropa. Acresce dizer, que nestas povoações, sem qualquer proteção da tropa, o pessoal aí habitante era sempre suspeito, claro, de colaborarem com os “turras”, ou, no melhor das hipóteses, jogarem com um pau de 2 bicos - coitados pelo dilema -, isto é, eram por eles quando estes apareciam e eram por nós quando aparecíamos nós. Claro que esta situação nunca era de nos convir e, portanto, sempre que eles se negavam ao nosso convite de virem fazer a sua vida e o seu trabalho na povoação de Olossato, onde estariam a coberto das investidas e da política inimiga, ficavam então rotulados de "meio-turras” senão de “turras” mesmo, e daí as consequências. Estas no entanto não eram bem dentro da maneira de atuar da 816 mas, outras Companhias, para quem não acompanhasse a tropa ia-se lá ao outro dia…
Não estou, seguramente, a fazer juízos de valor.
O inimigo também fazia as suas retaliações, para com aquele pessoal, oh(!) se fazia!

Bom, mas para não me desviar das “Operações-vaca”, então sempre que nos inteirávamos de que o inimigo tinha algures grande quantidade de vacas que justificasse a nossa ida (e a nossa necessidade) lá nos púnhamos a caminho. O gado normalmente era guardado por um ou outro indígena, quase sempre armado, e que logo tratava de se por ao fresco, fazendo no entanto antes uma rajada ao pressentir a aproximação da tropa. A rajada era mais para avisar as “casa-de-mato” próximas do que alvejar alguém, mas se pudesse acontecer as duas coisas…

Como estas operações se faziam com alguma frequência nunca faltava carne à tropa e à ávida população, pois o Capitão compartilhava o “apuro” com os nossos fieis amigos e nativos do Olossato.

Era uma operação típica e grotesca; o risco a correr pela malta, salvo um encontro fortuito, embora sempre de admitir logo fora do arame farpado, não era muito previsível, pois, como atrás disse, as vacas nunca estavam, obviamente, perto dos refúgios dos “turras”, e, uma vez as vacas na nossa posse, toda a cena decorrente fazia lembrar o “Far-West”. Aquela grande quantidade de reses, só de uma vez foram à volta de 100, em fila indiana, acompanhada da malta de arma nas mãos, também a fazer lembrar os pistoleiros daquelas paragens do Oeste americano. Havia soldados que chegavam a montar nas vacas, ao bom estilo do rodeo americano, o que elas, aos pulos, tentavam sacudir. Alguns bem queriam mas não havia hipótese, e tudo aquilo tinha feições de um filme de “cow-boys”. Um rodeo (!), isso mesmo! Como víamos nos filmes.

Raramente os terroristas apareciam emboscados, pois como o sequestro era feito de surpresa e em jeito, só tarde eles se apercebiam do golpe, e quando eles apareciam, o azar que havia, era ficar uma ou outra vaca com uma rajada no lombo, pasto para os abutres que andavam sempre por perto. Homem armado, abutre por perto, parecia.

Junto da nossa cozinha, refiro-me à cozinha dos Furriéis, havia uma enorme árvore e por lá estavam sempre meia dúzia de abutres. Apetecia fazer tiro ao alvo, mas constava-se que era proibido (?) matar abutres. E por falar em abutres também lembro-me bem de encontrarmos um burro morto ali para os lados da célebre serração na estrada para o K3 inteirinho na carcaça exterior e com todo o interior comido.
Parecia que estava a dormir. Curioso. Os abutres tiveram o cuidado de preservar a total fisionomia exterior do burro. Literalmente. Prontinho a encher para embalsamar. Impressionante o trabalho cirúrgico dos sinistros abutres.

Carne (aqui já estou a falar das vacas não da do burro), portanto não faltava mesmo com semanas a comer com arroz (mal) pilado, por falta de reabastecimento. O pontão de Maqué (entre Bissorã e Olossato, mais ou menos a meio caminho) onde obrigatoriamente passavam as colunas motorizadas e de reabastecimento era destruído com alguma regularidade pelo inimigo. Mais tarde teve ali lugar um destacamento.
Na nossa companhia havia um magarefe de profissão (civil), o que ajudava e muito a seleção criteriosa de toda a carne do animal Os miolos fritos bem regados a cerveja era um pitéu logo ao meio da manhã.

As operações-vaca rendiam uma boa petiscada ao meio da manhã: miolos fritos muito bem regados a cerveja. Como se pode ver, nos Furriéis também havia bons corneteiros. Eu estou a dizer para a objetiva “ai que rico pitéu”.


Vistas aéreas (de ângulos diferentes - quase opostos -) de Olossato . A primeira foto, propriedade do meu amigo José Ribeiro (CART 566) foi tirada em 1965 e a segunda em 1966, com a diferença sensivelmente de um ano, portanto. Como ponto de referência das duas fotos a caserna dos soldados (A).
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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12188: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (26): Como se faz acabar o vício de cravar cigarros aos outros

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Guiné 63/74 - P12188: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (26): Como se faz acabar o vício de cravar cigarros aos outros

1. Mensagem do nosso camarada Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 14 de Outubro de 2013:

Olá amigos Luís e Vinhal!
Vai tudo bem no reino do Blogue?
Bem me parece que sim!
Para além de vocês Luís e Vinhal, aproveito também para saudar o meu amigo (nosso) Magalhães Ribeiro.

Em anexo aí vai mais um “salpico”.
Rui Silva


Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.


Do meu livro de memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”

26 - Como se faz acabar o vício de cravar cigarros aos outros e aproveita-se até para lhe dar a alcunha duma marca de cigarros muito em voga na Guiné, na altura, e que veio mesmo a calhar: “CRAVEN A”

Na Guiné, mais propriamente em Bissau, fomos encontrar coisas boas no comércio. Uma surpresa! Logo ali na rua paralela à marginal, na Casa Pintosinho, haviam as últimas novidades eletrónicas. Os melhores rádios, transistors, pick-ups, aparelhagens de som, máquinas de barbear e todo o mais. Akai e Pioneer era do mais reclamado e moderno. Estavam na moda.
Um rádio para pôr na mesinha de cabeceira era o que se pretendia mais. No mato, já a ventoinha, a 5 dedos da cara, ganhava bem aos rádios. Alguns compraram autênticos rádios de sala e andavam com eles debaixo do braço, como que a dizer que o meu é maior do que o teu, e os donos da música fossem eles; outros ficavam pelos mais pequenos (vulgo transístor) que se levava no bolso e para qualquer lado.

Um camarada comprou um rádio que se transformava em pick-up após uma ligeira articulação. Foi de abrir a boca. Na Casa Pintosinho comprei ali mais tarde um “Mitsubishi”. Este transístor andava em propaganda radiofónica local e assim andou durante bastante tempo. Seduzido por tanta propaganda fui lá buscar um mais tarde, quando passei por Bissau em trânsito para férias na metrópole. Boa compra, durou muitos anos e tocava dentro do carro como se fosse um auto-rádio. Uma relíquia, mesmo depois de deixar de tocar (os tombos foram muitos), posta fora inadvertidamente, para desespero meu.
A Casa Pintosinho era uma casa atualizada e a tropa era lá muito bem recebida e atendida.
Pudera! Sargentos e Oficiais tinham manga de patacão.

Na mesma rua e mais para o lado da Amura, na loja Taufik Saad comprava-se, principalmente, entre outras, louças decorativas, vulgo bibelots, louças de servir à mesa, faianças e porcelanas, louça fina, entre esta bonitos Serviços de chá e café que vinham da China. Louça “casca d’ovo “, louça de fina espessura para não fugir aquele nome, onde no fundo se podia ver recortada na própria louça o rosto de uma linda chinesa. Ainda hoje guardo um serviço destes. Era uma casa requintada ao nível das melhores de Lisboa.



Vendo uma das montras do Taufik Saad. Muita cabeçada ali no vidro. As grades, no lado de dentro do vidro enganavam e a curiosidade levava a bater com a cabeça no vidro. Foram muitos os cabeçudos, daí a curiosidade de incluir isto no texto. Ah(!), o rapazinho a ver a montra sou eu! Turista? Se calhar ao outro dia já estava a atirar-me para o chão, lá bem para dentro do Oio. Engraçado (!) ali vivia-se as duas faces da moeda.

Mais à frente e já virada para a Avenida principal, o Café Bento. Mesas cá fora, em jeito de esplanada e sob árvores bem frondosas. O ponto de encontro da malta da tropa, com boas bebidas e para todos os paladares e com boa vista para a avenida principal.

Em Bissau vendiam-se também Whiskies das melhores marcas, algumas nunca vistas na metrópole, quando muito só faladas: Vat 69, Black and White, o Johnnie o preto e o vermelho, Dimple, o Ballantines, etc, etc. Bons Scotches, bons Licores. O Licor Drambuie que era muito procurado pela malta.

Marcas que nunca tinha ouvido, e eu que não tinha chegado propriamente de um colégio de freiras. Brandies, tabacos, tudo da melhor marca. Terra pobre, muito pobre, mas onde as bebidas espirituosas os apetrechos eletrónicos, os melhores tabacos, os melhores chocolates belgas e holandeses, se viam em algumas casas comerciais. Camisas muito bonitas e adequadas para aquele clima. Dizia-se que vinham da China (ou Taiwan?). Muito contrabando se calhar….
Deu para ver com algum espanto que a Guiné tinha mesmo do melhor para a malta dos vinte anos. Se calhar foi esta que fez trazer as coisas. Sobretudo boas bebidas, do melhor tabaco, e outras coisas, outras coisas.

E na Avenida, também passavam bajudas bonitas e formosas. Mais as cabo-verdianas, de olhos grandes claros e expressivos, mas havia nativas que não ficavam atrás, pelo menos nas três medidas standard para a harmonia feminina. Os bifes na casa de uma senhora mulata que me esqueci do nome, o frango assado no Tropical, etc, etc.

Se lhe juntarmos o bom e diversificado marisco, isto já produto do domínio e captura doméstica, não era preciso mais nada. A guerra, essa podia esperar… Na altura era preciso sair 20 ou 30 Km. de Bissau para entrarmos em contenda. No meu tempo e para o norte, esta só andava para lá de Mansoa. No Sul não seria preciso andar tanto depois de atravessar o Geba. Para Este e Oeste havia já alguns arrufos e não muito longe.

Bom, eu estou a dizer isto do bom de Bissau mas, cuidado, estávamos em trânsito para o mato. Ali em Bissau, melhor, em Brá, estivemos apenas 13 dias. O nosso destino estava traçado: Alancar para o OIO, pois a Ópera era para esses lados. Houve quem fizesse a comissão inteira em Bissau e que nunca tenha ouvido um tiro, mas convém dizer que não faziam nem mais nem menos do que cumprir ali a sua missão porque fora essa a destinada. Sortes!!...

Ainda me lembro e pegando na moda de uma cantiga na altura, que, e quando chegamos ao mato (Bissorã), cantávamos : “beijinhos com beijinhos pra cá… bazocadas e granadas pra lá”. Deixem que digam (!), que pensem(!), que falem (!)… deixa lá”…

Ainda em Bissau começava-se pelas ostras e acabava-se, se é que percebo, isso mesmo, em perceves (!) passando por outros mariscos de nomeada. Nisto de marisco a barriga desligou-se de misérias. O Tropical ali tão perto. E isto a pensar que marisco, na metrópole, só um camarão escanzelado ali pr’as Portas de Santo Antão em Lisboa. Salvo a Solmar, mas aí era preciso mais dinheiro. Aí,“cá tem”.


Na esplanada (passeio na rua) do Tropical. No verso desta foto descobri agora que a tinha enviado na altura aos meus pais em correio. Curioso como escrevio ano (MIL 966)

No café Bento pedi uma cerveja, um pão partido ao meio e o chocolate tal.

O empregado pensou que estava a gozar com ele. Perante a cara dele perguntei-lhe se podia ser ou não e ele meio desconfiado foi para dentro e apareceu-me pouco depois com o que lhe pedi. Vá lá… Sabia bem uma sandes de chocolate a puxar pela cerveja. Essa mania trouxe-a do bar do Niassa. Seria pancada? Julgo que não…

Neste bar também se adquiriam coisas curiosas. Comprei ali uma máquina de barbear “Philips” que trabalhava com pilhas. Ainda hoje a tenho.

Falando dos bons tabacos. Os Três Vintes,  o CT, o Português Suave, etc. tinham ficado na viagem. Os últimos foram queimados no Niassa.

Ali na Guiné a fumaça era feita através de tabacos mais finos e requintados, entre eles o “Craven A” (novidade) que é afinal o protagonista desta história e que eu passo a contar:

À mesa no Olossato, ao serão, jogava-se às cartas e começava-se com a sueca (jogo). Lá por o andar da noite passava-se então à lerpa e acabava-se inevitavelmente no abafa e onde de vez em quando saía um ou outro bem (des)abafado.

A história que eu quero contar era ainda à mesa da sueca. Parceiros habituais na minha mesa, eu, o Carneiro, o Piedade e outro que é o centro do episódio e que passo a chamar-lhe o “nosso amigo” (por razões óbvias omito o nome real).
Portanto parceiros certos ali e acolá nas mesas.

Depois (só) de alguns dias é que nos apercebemos que um dos jogadores da minha mesa fumava os nossos - dos outros - cigarros e à vez:
- Dá-me um cigarro se faz favor.

Ao outro:
- Posso?
- Posso fumar um destes? - ao terceiro.

Dava a volta, pelo menos havia o bom senso (e o cuidado) de não cravar o mesmo duas vezes seguidas. Também a tática era logo ali detetada mais facilmente.

Bem, isto não podia ser assim alvitramos nós os três após a constatação, o que ainda levou tempo.

Sentávamo-nos à mesa e cada um punha à sua frente o seu maço e o isqueiro em cima. Primeiro os isqueiros que tinham vindo connosco da metrópole, mais tarde já usávamos os que as senhoras do Movimento Nacional Feminino, que por ali passaram fugazmente, nos ofereceram.
Isqueiros de pedra a fazer faísca e mecha embebida em benzina impregnada numa espécie de algodão e em depósito para o efeito.

Então teríamos de fazer alguma coisa para que os cigarros não fossem assim tão mal repartidos. O tabaco predominante ali era então o “Craven A”.

Pegamos numa embalagem de cigarros vazia e colamos num rótulo que se podia ver, logo mal abríssemos a caixa, com o dizer. "Vai cravar o car(v)alho". Ver, tal e qual, a figura seguinte.



Tinha no meu pelotão um soldado que se chamava Carvalho (que se calhar até nem fumava), mas não era esse o que queríamos apontar. Era o outro, o mais popular, o do léxico portuga, o que até ficou bem explicado na caixa, claro.

O maço ficou dissimulado em cima da mesa e à frente como era habitual de um dos contendores.
- Posso tirar um? - agora já apontando para o maço armadilhado.
- Podes…

Quando calhou de cravar no maço dito cujo, então o nosso amigo abriu, leu, e discretamente fechou. Como nada tivesse acontecido. Também não havia cigarros. Não sei se o maço tivesse cigarros o rótulo passava ao lado.

Bom, acabou ali o cravanço do nosso amigo e começou a risota, dissimulada, ao mesmo tempo que o nosso ilustre camarada logo “ganhou”, (perdeu nos cigarros) dali para a frente, a alcunha do “Craven A”, visto isso, e para memória futura.

Rui Silva
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Nota do editor

Último poste da série de 31 DE MAIO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11658: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (25): Os três Hospitais Militares que conheci