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domingo, 14 de julho de 2024

Guiné 61/74 - P25742: Timor Leste : passado e presente (12): Notas de leitura do livro do médico José dos Santos Carvalho, "Vida e Morte em Timor durante a Segunda Guerra Mundial" (1972, 208 pp.) - Parte IV: A vida de um médico de saúde pública, Baucau, 1941


A parte oriental da  parte portugues da ilha de Timor, em 1940, com os percursos (de automóvel e a cavalo) feitos pelo dr. José dos Santos Carvalho na sua primeira visita à sua zona sanitária (integrando as circunscrições de Bacau, Manatuto e Lautém). O mapa é da sua autoria, com as devidas adaptações feitas por  nós (LG)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)



Timor Leste > Baucau > O antigo mercado público ("bazar"), restaurado em 2014. Foto de J. Patrick Fischer.  Fonte: Wikipedia, com a devida vénia...



Timor > Bacau ou "Vila Salazar > c. 1936-1940 > O "bazar" ou mercado público



Timor > Bacau ou "Vila Salazar > c. 1936-1940 > Igreja




Timor > Bacau ou "Vila Salazar > c. 1936-1940 > Um aspeto da vila

 
Timor > Bacau ou "Vila Salazar > c. 1936-1940 > Armazéns de trigo



Timor >  Manatuto > c. 1936-1940 >  Paisagem


Timor >  Manatuto > c. 1936-1940 >  Aileu ou "Vila General Carmona"


Timor >  s/l > c. 1936-1940 >  Propaganda do Estado Novo: timorenses, deitados, formam a palavra "SALAZAR".


Timor >  s/l > c. 1936-1940 >  Propaganda do Estado Novo: timorenses, deitados, formam a palavra "CARMONA".


Fotos do Arquivo de História Social > Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa > Álbum Fontoura. Imagens do domínio público, de acordo com a Wikimedia Commons. Editadas por blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024). Com a devida vénia...



1. Continuamos a publicar notas de leitura e excertos do livro do médico José dos Santos Carvalho, "Vida e Morte em Timor durante a Segunda Guerra Mundial" (*), disponível em formato digital no Internet Archive.

Timor Leste foi  o único território  ultramarino (na altura, designado como "colónia" , até 1951)  que foi invadido e esteve ocupado por forças estrangeiras, durante a II Guerra Mundial (entre dezembro de 1941 e setembro de 1945): tropas anglo-autralianas e holandesas, primeiro, e depois japonesas).

O livro em apreço é um notável documento, memorialístico,  importante para se conhecer melhor este dramático  período da nossa história do séc. XX. E no pequeno território de Timor (de 15 mil quilómetros quadrados, menos de metade da superfície da Guiné)  a vida não era muito diferente da pacata colónia da África Ocidental (acabada de "pacificar" em 1936...), tirando a distância da metrópole, que era cinco vezes maior (entre Lisboa e Dili eram quase 20 mil km em linha reta).

Atualizámos a ortografia e a grafia dos topónimos. O livro foi redigido no principio da década de 1970, sendo uma edição da Livraria Portugal Editora, na Rua do Carmo 70  (que já não existe como editora), tendo sido composto e impresso na Gráfica de Lamego. (O autor seria natural do concelho vizinho de Armamar.)


Vida de um Médico em Baucau, em 1941 (pp. 24-31)

por José dos Santos Carvalho


(i)  O dr. José dos Santos Carvalho, chegado a Dili em finais de 1940,  preparava-se, em meados de 1941,  para conhecer a sua "delegacia de saúde",  a da zona leste, para a qual tinha sido nomeado, e   que abrangia as circuncrições de S. Domingos (com sede em Baucau), de Manatuto e a de Lautém (vd. mapa de Timor, 1940; recorde-se que na época o território  estava dividido em cinco circunscrições administrativas com sede em Bobonaro, Aileu, Manatuto, Baucau e Lautém,  e um concelho, que era o de Díli).

A sede da zona sanitária oriental era  Bacau, então conhecida por "Vila Salazar"...

Vila Salazar  era também a antiga designação colonial da cidade angolana de N'dalatando (hoje capital da província do Cuanza Norte) ; mas também da  cidade moçambicana da Matola (capital da província da Matola).  Em Timor também havia uma "vila general Carmona", que era Aileu.
 
Baucau é hoje um dos 13 municípios administrativos de Timor-Leste. Fica localizado na parte zona oriental do país. Segundo o censo de 2010, tinha à volta de  112 mil habitantes e uma superfície de  cerca de 1,5 mil km² (10% da áera total do país). A cidade de Baucau é a segunda cidade de Timor Leste,  distando 122 km de Dili (qur fica a oeste). (Fonte: Wikipedia).


(...)   Entretanto, passaram-se os seis meses do meu estágio de médico que iniciava a carreira em meio colonial, pelo que fui nomeado delegado de saúde da zona leste, em fins de julho de 1941, seguindo para Baucau, a florescente Vila Salazar, no vapor 'Oé-Kússi'.

(...) Chegado o 'Oé-Kússi' à praia de Baucau, aí me esperava o colega dr. Francisco Rodrigues,  trazido no automóvel da administração da circunscrição que, com o respectivo motorista,  era posto à disposição do delegado de saúde da zona leste, sempre que o serviço público o requeria.

Subimos cerca de três quilómetros e assim me encontrei na nova terra onde iria exercer a minha actividade nos campos da saúde pública e da assistência médica.

A residência do delegado de saúde construída recentemente em pedra e cimento, estava esplendidamente situada fora da vila, a cerca de 500 metros, e dela se avistava um magnífico panorama sobre o mar, tendo por pano de fundo a ilha de Wetar 

[hoje indonésia

ilha de Wetter, na grafia do livro

].


Rodeada por alterosos coqueiros e por aprazíveis várzeas em socalcos, amorosamente cultivadas pelos timorenses,  era, na verdade, uma habitação muito confortável e simpática.

No dia seguinte, depois de ter acompanhado o meu colega a praia onde embarcou no 'Oé-Kússi' para Dili, dirigi-me para a sede da delegacia de saúde, muito razoavelmente instalada no centro da vila, relativamente perto da sede da administração da circunscrição, da residência do administrador, do monumental 'bazar' 
[designação comum para os mercados públicos ], do edifício do correio e telefone, da escola chinesa e do 'palácio', residência de recreio do governador da colónia. (...) 

(ii) Descreve sumariamente os equipamentos de que dispunha a
 delegacia de saúde de Baucau que funcionava, já nesse tempo, como um verdadeiro "centro de saúde" (sic),  conhecido pelos habitantes locais como  "o hospital". 

(...) "Dispunha de variadas dependências, nomeadamente de enfermaria no total de quarenta camas, serviços administrativos, farmácia e depósito de medicamentos, sala de operações cirúrgicas, sala de tratamentos, etc, e, em anexo, um posto de consultas externas e tratamentos ambulatórios.

Sob as minhas ordens directas tinha eu dois enfermeiros e três enfermeiros auxiliares, todos diplomados no hospital Dr. Carvalho. (...)


(iii) Nessa  ocasião  conheceu o administrador da circunscrição, tenente Pires  e o seu secretário,  Howell de Mendonça. 
Em nota de rodapé, diz-nos que o  administrador da circunscrição de S. Domingos, com sede em Baucau, era o tenente de infantaria Manuel de Jesus Pires, que havia combatido na Flandres, na Primeira Guerra Mundial; fiel è República,  pertencera às tropas que sufocaram a "Monarquia do Norte", uma tentativa de restauração da monarquia a partir do Porto,  de 19 de janeiro a 13 de fevereiro de  1919. Veio para Timor, em 1928 como militar: depois de pedir licença ilimitada do serviço do exército, passou, em 1932, para o quadro administrativo, onde até então (1941) muito se distinguia pelas "excecionais qualidades de inteligência e cultura e intensíssima actividade,apesar de já passar dos cinquenta anos".

O médico visita também a Missão Católica que ficava no centro da vila de Bacau, para cumprimentar os missionários, padres António Manuel Serra  e Júlio Ferreira, ambos naturais de Freixo de Espada-à-Cinta. Tinham sido formados no seminário de Macau e então eram novatos em Timor.   

(iv) Dá para perceber que Timor tinha, há 80 anos atrás,  uma economia, essencialmente de base agrícola, fracamente monetarizada, praticando os timorenses uma agricultura de autossubsistência. Praticamente não havia colonos nem comerciantes europeus.

Para as deslocações pelo interior, o nosso médico comprou  "dois fogosos e bonitos cavalos, excelentes para trepar, apesar de não serem ferrados, as íngremes e difíceis encostas timorenses".

(...) Não era difícil a vida económica em Baucau, por esses tempos, apesar dos ordenados serem muito reduzidos. É que o povo timorense cultiva largamente tudo o que é necessário à subsistência sendo muito poucos os produtos que é necessário importar.  Para estes, tais como o vinho e o azeite e géneros de mercearia, havia os dois estabelecimentos comerciais dos chineses,  Mu-Ping-Ki e Mu-A-Si. 

Quanto a criados, conservei os que serviam o dr. Rodrigues e os colegas anteriores, todos antigos na casa e perfeitos no seu trabalho. Comprei ao dr. Rodrigues a mobília que ele também tinha adquirido ao colega precedente e juntei-lhe magníficas peças chinesas em teca por mim compradas em Dili e delicadas obras de escultura javanesa que conseguira obter na minha passagem pela ilha de Bali. (...)

(v) Podemos depois seguir o percurso do delegado de saúde nas suas primeiras visitas à sua zona, utilizando o automóvel, junto à costa norte, e o cavalo, no interior montanhoso (vd. infografia acima)

(...) Começando pela circunscrição de Baucau, segui, de automóvel, para Venilale e daí para Ossú, indo pernoitar a Viqueque, na tranqueira, residência do chefe de posto.

No dia seguinte, ainda de automóvel, pude visitar o posto de Uátu-Lári,  sendo fidalgamente recebidos pelo chefe de posto, filho do liurai de Bobonaro, D. Aleixo Corte Real, que tinha sido aluno de um instituto de ensino médio em Lisboa. Regressando a Viqueque, à tarde, aí pernoitei.
[ "Tranqueira" era uma fortficação ou cerca feita de estacas e terra. (LG)]

Agora, somente cavalgando eu poderia completar este meu programa de viagem.

De madrugada, montei a cavalo e mudando várias vezes de montada, após oito fatigantes horas de caminhada, cheguei a Barique onde almocei com o respectivo liurai [régulo].

De tarde, andando ainda três horas sem descansar, alcancei a tranqueira de Lacluta onde recebi amabilíssima hospitalidade do chefe de posto, sr. José Tinoco. No dia seguinte regressei a Viqueque e aí retomei o automóvel para Baucau.

Passados alguns dias completei as minhas visitas na circunscrição de S. Domingos, seguindo de automóvel para leste, indo almoçar a Kelikai, onde encontrei uma enfermaria regional magnificamente instalada.

De tarde, segui para Báguia, ficando na tranqueira, residência do chefe de posto, sr. cabo Alegria, tendo passado pelo posto de Laga e sido aí recebido fidalgamente pelo chefe de posto , sr. Matos e Silva. No dia seguinte regressei a Baucau.

A visita às formações sanitárias da área da circunscrição de Lautém, pôde ser, toda, feita de automóvel. Passando outra vez por Laga e seguindo por Laivai, alcancei rapidamente Lautém onde o administrador, sr. Manuel de Barros e a sua esposa me cumularam de atenções e gentilezas, hospedando-me na tranqueira, sua residência.

O dia seguinte foi destinado às visitas ao posto sanitário de Fui-Loro e a uma digressão turística a Tutuala, apreciando a maravilhosa paisagem e a vista do ilhéu do Jaco.

No terceiro dia regressei a Baucau tendo visitado então o posto sanitário do Luro, por uma estrada que entroncava na de Laga a Báguia.

Coube, por fim, à circunscrição de Manatuto a sua vez de ser visitada, o que me deu oportunidade de conhecer o posto sanitário de Vemássi, da área da circunscrição de S. Domingos, que ficava em caminho.

Fui hospedado, com toda a gentileza e distinção, pelo administrador da circunscrição de Manatuto, dr. Mendes de Almeida, na sua residência, a tranqueira de Saututo, situada como um castelo da metrópole no alto de uma colina junto à vila de Manatuto.

No dia seguinte visitei a enfermaria regional de Manatuto que estava a cargo do enfermeiro, sr. Senanes, e a missão onde conheci os srs. padres Almeida, natural de Goa, e Madeira, natural de Timor. Em seguida, (acompanhado pelo administrador e na carrinha da administração que ele próprio guiava) ,visitei o posto sanitário de Cribas e, voltando a Manatuto, o posto sanitário de Laleia. 

Regressei a Baucau, pois sabia que, em breve, teria uma missão oficial na Soibada e, então, poderia concluir as visitas às formações sanitárias da área a meu cargo. (...)

(vi) A falta de recursos humanos na  ilha (professores, médicos, magistrados, engenheiros, etc.) levava a soluções  "ad hoc" como esta, referida pelo autor, que foi nomead0 
 para presidir ao júri dos exames da 4ª classe do ensino primário no colégio da Soibada", juntamente com um dos missionários...


 (...) Saí de Baucau com o senhor padre Serra (que tinha sido também nomeado membro do júri) no automóvel da circunscrição de S. Domingos que nos levou a Cribas. Aí, montámos a cavalo e subimos até Laclúbar, onde fomos recebidos pelo sr. chefe de posto e fazia um agradabilíssimo frio.

Chegámos à Soibada já de noite, sendo acolhidos fraternalmente pelo superior da missão, padre Januário, e pelos outros padres que aí prestavam serviço missionário e pedagógico.

No dia seguinte, de manhã, todos nos encontrámos junto ao mastro da bandeira nacional colocado em frente do colégio e junto do campo de jogos, para assistir à cerimónia que aí todos os domingos se fazia do hasteamento da bandeira, com os corneteiros da banda da missão tocando a sentido.

A sensação de intenso ardor patriótico que, então, de mim se apoderou, nunca a esquecerei, sobretudo por ver aqueles jovens portugueses de tão longe se comportarem como os melhores da metrópole, cheios de aprumo e garbo, cantando a 'Portuguesa' e marchando como autênticos soldados. (...)


(vii) De assinalar também o facto de às autoridades civis (administradores e chefes de posto) e tradicionais ("liurais" ou régulos) incumbir tanbém o dever de hospitalidade, como por exemplo de alojar o delegado de saúde em serviço pelo interior da ilha.

 De entre os funcionários  administrativos,  que ele vai conhecedendo, e que lhe dão hospedagem, há o Augusto Padilha: pormenor curioso, era formado pela Escola Superior Colonial de Lisboa (criada  em 1906, por iniciativa  da Sociedade de Geografia de Lisboa, antecessora do ISCSPU - Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina, hoje ISCPS / UL, Instituto Superior de Ciências Sociais (ISCPS); da Universidade de Lisboa).

(...) Acabados os exames, pude repousar uns dias e aproveitá-los para visitar o resto das formações sanitárias da delegacia da zona leste e o lugar da Pualaca onde vi extrair petróleo, com toda a facilidade, por meio de um copo de folha seguro por uma argola na ponta dum bambu e que, introduzido num cano que aí havia sido metido por prospecções anteriores da Allied Mining Timor Corporation, vinha cheio dum líquido que ardia perfeitamente e era usado pelos timorenses em candeeiros.

Após a visita a Fátu-Berliu, cujo chefe de posto era o sr. Augusto Padinha , aproveitei o facto de estarem perto e, assim, visitei os postos administrativos de Maubéssi e Turiscal, da circunscrição do Suro.

 

(viii) Em Baucau, os poucos portugueses existentes, reuniam-se para conviver e passar o tempo livre, jogando por exemplo ténis e merendando em conjunto.

(...) Todas as tardes disponíveis nos encontrávamos e quase sempre jogávamos ténis no corte que o tenente Pires havia mandado construir, há pouco, junto ao jardim público e à caudalosa e puríssima nascente que jorra em borbotões no centro da vila.

O secretário Howell de Mendonça e o Padre Serra tinham sido educados em Macau sendo, por isso, bons tenistas. Comigo e com a D. Hermínia, esposa do secretário, disputavam agradabilíssimas partidas de jogo que duravam até ao fim da tarde, o qual passávamos em merendas familiares, alternadamente nas casas uns dos outros.

O Tenente Pires aparecia, sempre, no seu corte, embora não jogasse, divertindo-nos com o seu inalterável bom-humor. (...)

(ix) Isolados do mundo, sem electricidade, sem conunicações, sem jornais, sem rádio,  iam tendo notícias da guerra, muito esporadicamente... Em Dili, passou a haver, entretanto, três consulados: o do Japão, o da Austrália e o da Holanda.

(...) Assim se passava o tempo em Baucau, longe do resto do mundo, do qual, praticamente nada sabíamos pois somente o tenente Pires dispunha de uma radiotelefonia cuja electricidade era fornecida pelas baterias de acumuladores do carro e do camião da circunscrição.
 
(...) O tenente Pires, inquieto com a situação internacional ouvia assiduamente, o noticiário fornecido pelas emissoras australianas e dava-nos parte dos acontecimentos mais importantes, frisando a hipótese de os japoneses pretenderem firmar o pé em Timor para saltarem sobre a Austrália que, tal como ainda hoje,  estava muito despovoada oferecendo as maiores possibilidades de colonização e de ocupação à sua gente que iá mal cabia nas ilhas de origem.

(x) Mas a guerra vai entrar brutamente nas suas vidas e na vida do povo timorense...

(,...) No dia 7 de dezembro de 1941 surpreendeu-nos com a quase inacreditável notícia de que aviões japoneses haviam atacado a esquadra americana ancorada na base de Pearl Harbor, nas ilhas Havai, causando-lhe severos prejuízos. 

Ora, o Japão não estava em guerra com os Estados Unidos e sabia-se que até havia negociações entre os dois países para um entendimento, visto estes últimos terem congelado no seu país os créditos japoneses, em Julho deste ano, o que tinha sido logo imitado pelo Governo britânico, pelos Domínios e pela Índia.

Somente no fim da Guerra eu pude saber quanto os Estados Unidos haviam sofrido com o ataque a Pearl Harbor por aviões e submarinos japoneses, pois aí foram afundados oito grandes couraçados, encalhados oitenta e seis navios secundários e destruídos duzentos e quarenta e sete aviões, tendo passado deste modo, em poucas horas, o domínio do Pacífico dos americanos para os japoneses.

Porém, duma coisa nunca, então, restou dúvida. Os japoneses estavam senhores duma força avassaladora que seria dificílimo deter, embora empregando todos os recursos das nações aliadas. (...)

Fonte: José dos Santos Carvalho: "Vida e Morte em Timor Durante a Segunda Guerra Mundial", Lisboa: Livraria Portugal, 1972, pp. 24-31.

(Continua)
 
(Seleção, revisão / fixação de texto, títuoo, parêntses retos, itálicos e negritos: LG)


Capa do livro de José dos Santos Carvalho: "Vida e Morte em Timor Durante a Segunda Guerra Mundial", Lisboa: Livraria Portugal, 1972,  208 pp.  Cortesia de Internet Archive.

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Notas do editor:



segunda-feira, 6 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25485: Os 50 anos do 25 de Abril (17) : Conversas sobre "Portugal-África. Guerra Colonial. Madrinhas de Guerra", com Marta Martins Silva e 3 antigos combatentes, Hélder Sousa, Luís Graça e Jaime Silva. 3ª feira, dia 7 de maio, no ISCSP-ULisboa, Campus Universitário do Alto da Ajuda

 


Cartaz do evento "Vozes e Pensamento em Torno de uma Revolução", a ter lugar no auditório Oscar Soares Barata, ISCSP - Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Universidade de Lisboa, 

Campus Universitário do Alto da Ajuda
Rua Almerindo Lessa - 1300 - 663, Lisboa
+351 213 619 430 | +351 213 619 442 



Às 16h00 de amanhã, 3ª feira, dia 7 de maio, haverá uma conversa sobre "Portugal-África. Guerra Colonial. Madrinhas de Guerra". Os convidados são Marta Martins Silva (jornalista e escritor), e os antigos combatentes da guerra do ultramar / guerra colonial  Hélder Sousa e Luís Graça (TO da Guiné) e Jaime Silva (TO de Angola).

A participação destes três membros da nossa Tabanca Grande nasceu de um desafio (e convite) lançado ao "régulo" da Magnífica Tabanca da Linha, Manuel Resende, no passado dia 14 de março de 2024. A professora associada, especialista em antropologia,  do ISCSP, Sónia Frias, esteve pessoalmente com alguns de nós, já no fim do almoço do 55º convívio, em Algés. 

Originalmente estavam previstos 3 nomes,  o Hélder Sousa, o Luís Graça e o Virgínio Briote. Por razões de datas, o Virgínio Briote (que previa por esta altura ter que fazer uma operação a uma catarata) foi substituído pelo Jaime Bonifácio Marques da Silva (que vem trazer outra experiência como antigo alferes miliciano paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72). A conversa entre os três é centrada sobre a sua experiência pessoal como antigos combatentes da guerra do ultramar / guerra colonial. 

O evento é aberto ao público. A conversa é moderada por dois alunos da prof Sónia Frias (cremos que um da licenciatura de antropologia, e outro de serviço social). 

Segue-se, às 18h00, uma conferência sobre a "componente externa" do 25 de Abril, a cargo de Fernando Jorge Cardoso (UAL).

Recorde-se que o ISCSP (que tem diversos cursos e programas de licenciatura, mestrado e doutoramento em antrolopologia, serviço social, sociologia, ciência política, ciênicas da comunicação,  relaçõe internacionais, gestão de recursos humanos, administração pública e políticas do território) é uma instituição já centenária, com forte ligação aos países de língua portuguesa.

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Nota do editor:

Último poste da série > 2 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25469: Os 50 anos do 25 de Abril (16): O fotornalismo da guerra, que os senhores do lápis azul deixavam passar, às vezes, em revistas como a "Flama", órgão oficial da JEC-Juventude Escolar Católica (1937-1983)

quarta-feira, 6 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23145: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte IV: Histórias pícaras: (vii) Os Mais dos... Progressistas (divisa da companhia e também título do jornal de caserna)



O jornal de caserna da CCAV 3420 (Bula, 1971/3), Os Progressistas - Quinzenário de Divulgação, Cultura  e Recreio da CCAV 3420. Director: Cap Cav Fernando José Salgueiro Maia. SPM 1898.


Detalhe do guião da CCAV 3420, que tinha duas divisas: "Os Progressistas" e "Perguntai ao Inimigo Quem Somos"...




Guião da CCAV 3420 (Bula, 1971/73), comandada pelo cap cav Salgueiro Maia


1. O jornal de caserna podia ser (e deve ter sido)  uma forma interessante de manter alto o moral das tropas, no CTIG,  e fazer a ligação com a Metrópole  (embora não devesse lá chegar). Alguns jovens capitães do QP, como o Salgueira Maia, o Mário Tomé, o Carlos Trindade Clemente, o Jorge Golias e outros (como o nosso António J. Pereira da Costa,  membro da Tabanca Grande) perceberam a sua importância (*).

A lista de "jornais militares" ou "jornais de caserna" devia ser mais extensa do que aquela que se conhece. Alguns títulos já aqui foram referidos como O Jagusdi, O Saltitão, O Serrote, O Seis de Camtanhez, Os Progressitas...

De qualquer modo, esta faceta do Salgueiro Maia, como director de um jornal de caserna chamado Os Progressistas (CCAV 3420, Bula, 1971), é capaz de ser um aspecto menos conhecido (e até desvalorizado) do seu currículo militar. Tanbém há quem estranhe que ele tenha conseguido dar à sua companhia, para mais de cavalaria, esse nome, Os Progressistas. Pelo sim pelo não, e talvez para "despistar" no verso do guião da CCAV 3420 pode ler-se uma segunda divisa: "Perguntai ao inimigo quem somos". 

Em Portugal, na época, em pleno marcelismo, o termo "progressista" tinha uma certa conotação político-ideológica: por exemplo, falava-se dos "católicos progressistas", do pós-Vaticano II, para os distinguir dos mais ortodoxos e tradicionalistas... Mas o vocáculo que é adjetivo e nome é relativamente neutro: progressista é aquele que é partidário do progresso, que professa ideias de progresso... Mas na época entendia-se que era toda a gente do "reviralho", os que eram contra  a "situação" (não só o regime político vigente como a "guerra colonial")... e como tal "inimigos da Nação".

Imagino que este, como os outros jornais de caserna,  tivesse um formato A4 e fosse feito a stencil ( hoje diz.se "estêncil", o termo já está grafado nos nossos dicionários)... Nessa altura, a máquina a stencil (ou duplicador) estava muito vulgarizada na Guiné... Todas as companhias e batalhões tinham de ter um duplicador, pro causa das ordens de serviço e outra documentação.  Ainda não havia as fotocopiadoras... 

Na secretaria da minha companhia, a CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (Cntuboel e Bambadinca, 1969/71) havia uma, foi graças a ela que eu pude fazer um edição, quase clandestina, da nossa história da unidade, (com cerca de meia centena de página, escrita e dactilografada por mim)...Fizeram-se umas escassas dezenas de exemplares de uma brochura que foi distribuída pelos graduados à revelia do cap inf Carlos Alberto Machado de Brito (um bom homem que hoje é cor inf ref, e que eu espero    que ainda esteja bem de saúde).

Do quinzenário O
s Progressistas não sei sei quantas edições se fizeram. De qualquer modo, o José Afonso era um dos seus colaboradores.   E revelou-se um bom contador de histórias, como já aqui pudemos comprovar (**). 

Hoje republicamos mais um texto, que deve ter surgido no "jornal da caserna" por altura do Natal de 1972 e em que ele faz uma "ronda" pelos "craques" da companhia, no fundo, as figuras mais "castiças". É a história nº 7 das "Histórias pícaras" (**).


2. Mas, "en passant", deixem-me ainda aqui fazer uma confidência:   o Salgueiro Maia foi, circunstancialmente, meu colega, no ano lectivo de 1975/76, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCPS), embora eu pouco ou quase nada privasse com ele, porque eramos de cursos diferentes (eu, de ciências sociais; ele,  de antropologia), com o estatuto de trabalhadores-estudantes. E penso que andávamos em anos diferentes, ele já tentara inscrever-se no ISCSP em 1969, antes de ir para a sua primeira comissão, em Moçambique.

Íamos às aulas à noite e a algumas Reuniões Gerais de Alunos (RGA), numa altura em que o ISCSP passava por um período de vida muito conturbado (saneamento de praticamente todos, senão todos, os docentes com assento no Conselho Científico, pelo menos os professores catedráticos  e associados...), o que levou no final do ano lectivo de 1975/76 (ou nas férias...) ao seu encerramento, por ordem do então Ministro da Educação, o socialista Sottomayor Cardia (1941/2006), e ao consequente início de um duro processo de luta estudantil contra a tutela e o regresso das múmias (como, depreciativamente, eram então chamados os professores doutorados, alvo de saneamentos selvagens, de natureza claramente político-ideológica, incluindo o Prof Doutor Adriano Moreira, antigo Ministro do Ultramar).

Além disso, num ambiente, claramente esquerdista como era então o ISCSP, virado do avesso, com diversas fações a digladiarem-se (da UEC ao MRPP, do MES à UDP...), o Salgeiro Maia do 25 de Abril era ofuscado pelo Salgueira Maia do 25 de Novembro... Esta ambivalência não terá facilitado as aproximações pessoais...

Salgueiro Maia, como bom alentejano e como militar, oriundo da Academia Militar, era, por outro lado, um homem reservado e discreto... E rigorosamente apartidário.  O início do ano letivo de 1975/76 foi claramente  agitado pelo contexto, interno e externo, incluindo as "sequelas" quer do"verão quente" quer do "25 de novembro". 

O  facto de ele ter estado na Guiné não me dizia nada: definitivamente eu esquecera a Guiné!... Foi um processo de denegação por que muitos de nós passaram. Vivi os cinco anos pós-Guiné com culpa e denegação: Guiné ? Não, nunca ouvi falar... Perdi, com isso, a oportunidade única de ter conhecido (isto é, privado com) um herói vivo... Creio que nem ele, na altura, tinha completa consciência do papel histórico que tinha desempenhado no 25 de Abril de 1974. E comportava-se, ali, como um "anti-herói"...Nunca me apercebi que trivesse tiques de vedeta. Era um estudante como os outros... Aliás, um trabalhador-estudante.  Mas devo acrescentar que era preciso coragem, naquela época, naquele ano letivo de 1975/76 ( e mesmo nos seguintes), para dar aulas... 

Em 1976/77, frequentei o então ISEF - Instituto Superior de Economia e Finanças, na rua do Quelhas, e só depois no ano seguinte fui ara o ISCTE, onde me licenciei em sociologia, em 1980.  Perdi, pois,  o rasto ao Salgueiro Maia que entretanto começara a ser, logo em 1976,  vítima de "bullying" castrense: a hierarquia militar fez-lhe a vida negra, procurando humilhá-lo e discriminá-lo... Mas isso são outras histórias.


Histórias pícaras >  (vii) Os craques, os "Mais" dos "Progressistas"

por José Afonso

Era uma vez... Assim começam todas as histórias e a minha também, para não fugir à tradição. Certamente estão a pensar que vão ter uma história de Natal, mas enganam-se: esta história é um sumário de muitas histórias, começadas em Março de 1971 em Santa Margarida, e continuada em Bula, Mansoa, Cacheu, Capunga; Pete e Ponta Consolação. 

 A minha história refere a existência de uma colecção de craques, são eles eles "Os Mais... dos Progressistas". 

 A abrir, o camarada BIGODES, assim chamado por ter possuído em tempos um farfalhudo bigode, estilo Gengis Khan, e ter uma maneira de viver que o faz andar sempre de pelos eriçados; não é mau tipo apesar de não topar o Lino nem os turras; nas horas vagas faz versos que até costumam rimar. 

 Vem depois o VELHINHO, a instituição mais respeitável de Capunga City; é sapateiro remendão, mata vacas, esfola porcos etc. Tem um ar de Golias de trazer por casa, usa os calções mais "pop" em todo Teatro de Operações. Há tempos por causa de um macaco...,  bem, ia sendo o fim da macacada.

 A seguir temos o CAJADO, rapaz esbelto, guerrilheiro de todas as panelas, usa faca na liga, que já fez manga de ”mortos”. Passa a vida a refilar com todo o mundo, nunca se sabe bem porquê. 

 Continuemos com o MOUCO que em tempos o foi, até um certo dia! Bem não falemos de coisas tristes. Pois o Mouco é homem que trabalha com o morteiro 81, a arma mais técnica que a Companhia possui; é só olhar para o seu aspecto de homem conhecedor de morteiro 81, por não se impressionar com o barulho das granadas a sair do tubo. O Mouco é um homem desiludido: passou 17 meses a convencer o pessoal de que é Mouco e ninguém acreditou. 

 Temos a seguir o TERRINAS, o homem mais trabalhador da Companhia, e o mais comedor, também conhecido por RUÇO; será por isso que é o homem mais procurado pelas bajudas de Pete? É um trabalhador nato, domina todos os ofícios mas considera-se com pouco valor comparado com o da sua noiva. É um homem feliz. 

 Temos ainda o clarim MATA, não toca a lavar mas quase. Há 17 meses que toca o clarim que faz uivar todos os cães das redondezas, e não consegui ainda deixar de nos mimosear com as suas fífias. É um homem calmo no tipo dos barman dos bares do Texas, talvez por isso seja “o homem do tosco”. É especialista em convencer os “gaseados”, para não arranjarem problemas. 

 Vem agora o RATO o homem que não gosta de andar de Jeep e que está perto de lerpar o cabelo, porque não fez ainda o “Menino Jesus” para o presépio de Pete. Gosta pouco de beber e é sem dúvida o mais crava da Companhia. Passa o mês a cravar, no fim deste, paga a quem deve e, como fica sem dinheiro volta ao princípio. Bem esperamos que com o 13.º mês o rapaz acerte a escrita. 

 Ao falar do Rato temos que falar no BARBEIRO, a alma gémea do Rato, que é o único no género, pois só corta cabelos quando está sem patacão. É o protótipo do soldado do futuro, pequeno para criar pouco alvo; com um capacete onde ele cabe quase todo, cheio de granadas à volta do corpo parece o homem dos pneus Michelin. Com o dinheiro ganho a cortar os cabelos já poderia ter ido à Metrópole, mas como é possuidor das maiores sedes do CTIG, só foi à cerveja; passa a vida a dizer para lhe darem ferramenta nova, pois não tem dinheiro para a comprar. 

 Temos agora o BÁRTOLO, especialista em sopa de nabos, e que afina quando lhe dizem que é triste  que deixem entrar miúdos para a tropa, ou que ele vai fazer de "Menino Jesus" no Presépio. 

 Já me esquecia do GRÁCIO. Este é o das mil e umas maneiras para conseguir ir a Bula, ou jogar futebol. É sempre voluntário quando a coisa dá para o torto, mas fora disso anda sempre a tentar desenfiar-se. 

 Estes são OS MAIS, e por hoje ficamos por aqui, mas, há muitos mais, desconhecidos, de que daremos público conhecimento oportunamente. Esta foi a prenda de Natal publicitária para os craques.

Aos simples mortais desejamos um Bom Natal e um Melhor Ano Novo. Em resumo: Que a Comissõa Não Nos Pese.

José Afonso

(Continua)

[ Revisão / fixação de textos e títulos, para efeitos de publicação deste poste no blogue: LG ]

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Notas do editor:


(*) Vd. poste de 1 de agosto de  2019 > Guiné 61/74 - P20025: Jornais de caserna publicados no CTIG (de 1961 a 1974) (n=47) (Jorge Santos / Luís Graça)

(**) Vd. postes de:

5 de abril de  2022 > Guiné 61/74 - P23142: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte III: Histórias pícaras: (iv) A "guerra de Bissau": guardando as costas dos nossos "maiores" ; (v) Capunga: o furriel de calções à "pop"; (vi) O "Velhinho", antigo refractário

4 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23140: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte II: Histórias pícaras: (i) Os matraquilhos e a astúcia do capitão; (ii) Uma heli-evacuação e a enfermeira paraquedista que não queria levar o "passageiro" em pelota; (iii) As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P16921: Agenda cultural (536): dia 6, sexta-feira, às 15h00, no ISCPS, polo universitário da Ajuda, Lisboa: conferência anual da CCIPGB/ISCSP sobre a Guné-Bissau: Guiné-Bissau. Governança e Mercado: Região da CEDEAO





O convite é da organização, uma iniciativa conjunta do:

(i) Centro de Estudos Africanos (CEAF)  do ISCSP (Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Universidade de Lisboa)



No sítio do do CEAF, pode ler-se:

(...) "Fundado em 1906 [, como Escola Colonial] , o Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), da Universidade de Lisboa, é uma das mais antigas e prestigiadas instituições académicas do mundo para o estudo de África. 

O Centro de Estudos Africanos (CEAF), recentemente reorganizado, é o polo interdisciplinar que suporta as atividades de investigação sobre África e as suas dinâmicas históricas e contemporâneas. Trabalha em estreita cooperação com várias unidades internas de ensino, incluindo os Estudos Africanos, Ciência Política, Antropologia, Relações Internacionais, Estratégia e Estudos do Desenvolvimento. E cultiva também a cooperação internacional na investigação e na educação, especialmente com as instituições científicas de Países de língua oficial portuguesa." (...)