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terça-feira, 30 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27269: O início da guerra (Armando Fonseca, ex-sold cond, Pel Rec Fox 42, mai 62 / jul 64) - Parte I: aquele terrível mês de setembro de 1963



Portugal > s/l> s/d >  "Soldados prontos para o embarque... mas não para a guerra"...


Guiné > s/l > s/d > Pel Rec Fox 42 (196264) > O  "Alenquer" é o primeiro da esquerda... Comendo uma "bucha", no mato...


Guiné > s/l > s/d > Pel Rec Fox 42 (196264) > O  "Alenquer" é o primeiro da direita. Uma pausa junto à Fox para comer...



Armando Fonseca, ex-sold cond cav, Pel Rec Fox 42, Bissau, Mansoa, Porto Gole, Buba, Bedanda, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64; também conhecido como o "Alenquer", integra a nossa Tabanca Grande desde 22 de setembro de 2010; tem cerca de 20 referências no nosso blogue. Julgamos que nasceu em 1941. Natural de Alenquer, vive na Amadora desde 1965, depois do regresso à "peluda". É autor da série "O Alenquer retoma o contacto" (de que se publicaram 7 postes, em 2012).
 

Fotos (e legendas): © Armando Fonseca (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


I. O Armando Fonseca (conhecido como o "Alenquer"), ex-soldado cond cav,  Pel Rec Fox 42 (1962/64), foi dos primeiros militares de cavalaria a chegar à Guiné, quando  "oficialmente" ainda não havia guerra, diz a CECA...

 As suas impressões desses primeiros tempos (que vão de maio de 1962 a julho de 1964) são um testemunho precioso.  São anos que ainda não estão bem documentados no nosso blogue (e nos livros da CECA)... 

Com a sua Fox, ele  percorreu boa parte do CTIG, funcionando como uma espécie de 112, as ordens do Comando Milita,  em Bissau.. 

Vamos recuperar e reconstituir, por ordem cronológica, parte dos seus apontamentos já publicados.


 O início da guerra  (Armando Fonseca,  ex-sold cond, Pel Rec Fox 42,  mai 62 / jul 64) 

Parte I:  aquele terrível  mês de setembro de 1963



1. Chegado a Bissau a 28 de maio de 1962 no N/M António Carlos, não cito aqui os arrepios da partida visto que todos nós vivemos esse suplício, o navio fundeou ao largo e fui transportado para terra numa lancha, onde nos esperavam GMC para transporte até ao Quartel General onde fiquei instalado.

As camas e as respectivas roupas ainda não tinham sido desembarcadas. Dormi as primeiras noites numa cama de campanha apenas com uma manta para me defender dos mosquitos mas com o calor intenso que se fazia sentir, ou se morria de calor ou se era comido pelos mosquitos.

No terceiro dia lá apareceu a cama e a roupa, e a promessa de mosquiteiro que nunca chegou a aparecer, se quis evitar de ser comido pelos bichos tive que ir comprar tecido e mandar fazer um mosquiteiro num alfaiate da cidade.


2. O Pel Rec Fox 42  levava como missão reforçar a defesa da cidade, incluindo o aeroporto, e então o meu primeiro serviço foi exactamente piquete ao aeroporto. Fazia 24 horas de serviço dia sim dia não, garantindo a segurança das partidas e chegadas dos aviões, quer fossem civis ou militares.

Antes das aterragens ou dos levantamentos lá ia passar revista a toda a pista observando se havia algo de anormal e só depois os aviões entravam na pista.

Às vezes no dia aparecia outro biscate para fazer,  inclusive atender a algumas escaramuças que apareciam na cidade, visto que, àquela data,  o comando do PAIGC era nos arredores da cidade, no Pilão, que se situava entre esta e o Quartel General (em Santa Luzia).

Permaneci assim,ais de um ano,  até aos finais de agosto de 1963, altura em que fui sorteado para ser deslocado com a guarnição do meu carro para Mansoa, porque o BCAÇ  512 que aí se encontrava e tinha distribuídas companhias em Mansabá e em Bissorã, as quais tinha que abastecer: já estava com graves problemas nas deslocações das suas colunas e então pediu o reforço de um carro de cavalaria para acompanhar essas colunas.


3. Cheguei então a Mansoa em 28 de agosto e comecei de imediato a fazer escoltas: quase todos os dias saía para Mansabá ou Bissorã, e quando assim não era, havia que escoltar pessoal que se deslocava para a capinagem das bermas das estradas  ao longo desses percursos.

Na madrugada do dia 3 de setembro chegou ao quartel a notícia de que Porto Gole tinha sido atacado e lá fomos pelas seis da manhã escoltar um pelotão da CCAÇ  413 para ver o que se tinha passado.

 Ao chegarmos encontrámos um cenário desolador, haviam:

  • cinco moranças totalmente queimadas,
  • dois cipaios mortos, 
  • tendo os guerrilheiros levado preso o chefe de posto e um colono branco (**)

Já não regressámos a Mansoa e no dia seguinte começou a ser erigido ali um aquartelamento visto que tinha deixado de haver a segurança, até aí feita pelo chefe de posto e pelos cipaios, e aquele era um ponto crucial para apoio aos barcos que pelo Geba se deslocavam de Bissau para o interior (Xime, Bambadinca, Bafatá)

Permaneci ali até haver condições para as tropas de caçadores terem um mínimo de segurança. Durante esse período a alimentação baseou-se quase sempre em bolachas e conservas, até haver condições para começar a matar uns carneiros e umas galinhas que por lá havia.


4. No dia 9 regressei a Mansoa, sendo retomada a rotina de escoltas e agora também a Porto Gole porque ninguém dava um passo sem que a autometralhadora não fosse à frente da coluna.

No dia 13 um pouco antes do almoço ouviu-se ao longe um rebentamento e passado algum tempo apareceram dois homens a informar que o rebentamento tinha sido na tabanca de Cutia e que havia lá feridos.

Seguimos para lá e deparámos com dois feridos graves:
  • um tinha um buraco na cabeça;
  • e o outro tinha uma perna e as duas mãos cortadas;
  • o primeiro foi levado para o hospital;
  • e o segundo, a família não deixou que o levassem, porque quiseram que ele morresse junto deles.

Em 22 fomos chamados para socorrer uma viatura civil e uma ambulância de transporte colectivo que estava a ser atacada entre Mansoa e Mansabá. Fomos lá e quando chegámos,  já o IN tinha abandonado o local levando todo o dinheiro e os géneros que seguiam nas viaturas.

A partir desta data, além das deslocações militares que chegavam a ser duas por dia, apareceram também as colunas civis que já não se deslocavam sem escolta militar.

No dia 24 saímos de Mansoa pelas cinco da manhã para ir tirar umas árvores que o IN tinha colocado na estrada que ligava Porto Gole a Enxalé e a deixara intransitável.  Ás oito horas com 44 árvores cortadas e retiradas, encontrámos uma companhia que vinha de Enxalé ao nosso encontro e que a cerca de um quilómetro tinha sofrido uma emboscada.  

Havia um pelotão com vários feridos ligeiros e um furriel com uma perna cortada, o qual, ao fim de cinco horas, sem o socorro que a situação exigia, veio a falecer.(***)

Além dos feridos havia ainda um "granadeiro",  atascado na bolanha que nos deu muito trabalho a retirar.

Quando regressámos a Porto Gole,  era já noite e apenas com o pequeno almoço das quatro da manhã no estômago; depois de comermos alguma coisa, regressámos a Mansoa que distava cerca de 27 quilómetros.

 (Continua)


(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos, títulos: LG)
__________

(*) Vd. poste de 22 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7023: Tabanca Grande (245): Armando Fonseca, ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42 (Guiné, 1962/64)


(**)  Este episódio, grave, não é referido pelo livro da CECA,  respeitante á  atividade operacional no CTIG no período de 1963/1966.


(***) Fur mil at inf José Inácio da Ascensão da Costa Pinheiro, CCAÇ 412, mobilizado pelo BCAÇ 10, Chaves; natural de Sousel:  morreu em 25 de setembro de 1963, em Porto Gole, na sequência de ferimentos em combate; está sepultado no cemitério da sua terra natal.
 

quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24602: Por onde andam os nossos fotógrafos? (7): Ex-alf mil cav Jaime Machado, cmdt Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70) - Parte III: as pequenas inundações de setembro de 1969, na baixa ribeirinha de Bambadinca

 


Foto nº 1A


Foto  nº 1


Foto nº 2A



Foto nº 2



Foto nº 2B



Fito nº 3A



Foto nº 3B



Foto nº 3


Foto nº 4A


Foto nº 4B


Foto nº 4C





Foto nº 4
 

Fotos (e legendas): © Jaime Machado (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Jaime Machado
1. Continuação da publicação de uma seleção (*) das melhoras fotos do álbum do nosso camarada e amigo Jaime Machado, ex-alf mil cav, cmdt Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70), que vive em Senhora da Hora, Matosinhos (*):

Recorde-se que esta subunidade de cavalaria esteve ao serviço do comando do BART 1904 (Bambadinca, maio /setembro 68) e depois do BCAÇ 2852 (Bambadinca, outubro 68/fevereiro 70).

 Os "14 furões" váo  terminar a sua comissão em fevereiro de 1970,  três meses antes do BCAÇ 2852, tendo sido rendidos pelo Pel Rec Daimler 2206, comandado pelo nosso camarada e velho amigo J. L. Vacas de Carvalho. O BCAÇ 2852 por sua vez será rendido pelo BART 2917 (1970/72).

Publicaram-se 17 postes com o álbum fotográfico do Jaime Machafo (que tem 150 "slides" do tempo da Guiné (**).

2, A ordem de publicação das fotos não é a da sequência cronológica, mas sim a dos conteúdo temático, São imagens (de "slides" digitalizados) que nos chegaram, sem legenda... Estas imagens que (re) publicamos hoje, com legendas reformuladas,  são da época das chuvas, tendo  sido todas tiradas em setembro de 1969, segundo esclarecimento adicional do autor (em 2/10/2015). 

Recorde-se que a época das chuvas, na Guiné, vai meados de maio a meados de novembro, sendo os meses de maior precipitação julho, agosto e setembro. (Na época seca, os meses mais frescos são o dezembro e o janeiro.)

Vemos uma coluna auto a chegar a Bambadinca, vinda de Bafatá (foto nº 1). Na escolta vem uma autometrelhadora Daimler, de matrícula ME-01~37 (Fotos nºs 1, 1A, 2 e 2A).  Nas fotos nºs  1 e 1A está meia enconberta por uma viatura civil, O Jaime Machado está  de costas nas fotos nºs 2 e 2A com boina castanha e sentado na Daimler.

A coluna estava atravessar a baixa ribeirinha de Bambadinca (que, em mandinga, quer dizer "a cova do lagarto") (fotos nºs 1, 2, 3 e 4) , A viatura civil encostu à esquerda (no sentido ascendente(Fotos nº 4 e 4A). Era de um comerciante local, que não conseguimos identificar. Os dois mais conhecidos, na época,  era: (i)  o  Zé Maria cuja loja e bar ficavam à esquerda na direcção do quartel mais ou menos a meio da reta; e  (ii) o Rodrigo Rendeiro que ficava à direita entre a fonte e a rampa de acesso ao quartel,.

Nalgumas fotos é visível um dos ícones de Bambadinca, a fonte, cuja contrução era de 1948. (Foto nº 4B e 4C)

 No tempo das chuvas, recordo-me que era habitual haver pequenas inundações na zona fluvial de Bambadinca. O rio Geba Estreito transbordava. 

Por outro lado, as instalaçóes militares (o quartel) e civis (o posto administrativo, incluindo a escola, a capela, etc,) (cujo acesso se fazia pela tal rampa bastante íngreme, visível na fotos nº 2 e 2b) ficavam num pequeno morro ou planalto, rodeado de bolanhas... 

Na época das chuvas, era mais fácil a acumulação de água nas zonas baixas, e nomeadamente na margem esquerda do rio (porto fluvial e destacamento da intendència). Havia sempre pequenas inundações na zona ribeirinha, afetando algumas moranças e casas de comércio. No entanto, não impedia o trânsito de viaturas.

A chegada das chuvas (dantes, talvez fosse um pouco mais cedo do que hoje,  por volta de meados de maio) era sempre uma festa para pequenos e graúdos. Ia até meados de novembro.  Aumentava também, nesta época, o risco de paludismo, devido à água estagnada.
 

domingo, 19 de julho de 2020

Guiné 61/74 - P21184: Memórias cruzadas nas 'matas' da região do Óio-Morés em 1963: o caso da queda do T6 FAP 1694 em 14 de outubro de 1963 (Jorge Araújo) - II (e última) Parte


Foto 5 - Citação: (1963-1973), "Comandante Pedro Pires com dois combatentes do PAIGC", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43495, com a devida vénia.


 Foto 6 - Citação: (1963-1973), "Guerrilheiros do PAIGC atravessando um rio", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43140, com a devida vénia.
  



O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger,
CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior; vive em, Almada, está atualmente nos Emiratos Árabes Unidos; tem cerca de 260 registos no nosso blogue.


MEMÓRIAS CRUZADAS
NAS 'MATAS' DA REGIÃO DO ÓIO-MORÉS EM 1963
- NUANCES DA MISSÃO DE LOURENÇO GOMES EM OUT'63 -
II (e última) PARTE



Mapa da região do Óio-Morés (satélite) com infografia da queda do «T-6 matrícula FAP 1694», pilotado pelo Cap Pilav João Cardoso de Carvalho Rebelo Valente, ocorrida em 14 de Outubro de 1963, 2.ª feira.

► Continuação do P21151 (08.07.20)


No primeiro fragmento deste trabalho – P21151 (*) – procedemos à análise dos temas inseridos no relatório elaborado pelo dirigente do PAIGC do Bureau de Dakar, Lourenço Gomes (1922-1999?), natural do Canchungo (Teixeira Pinto), referente à sua "missão" de contacto com três das bases da região do Óio-Morés (território da Zona Norte): Morés (base Central), Fajonquito e Maqué, realizada entre 08 e 18 de Outubro de 1963.

Com recurso a outras fontes de informação primária, relacionadas com os mesmos factos, foi possível identificar alguns conflitos factuais entre as «Memórias Cruzadas», nomeadamente o episódio do acidente (queda) do «T-6 FAP 1697», pilotado pelo Cap Pilav João Cardoso de Carvalho Rebelo Valente, ocorrida em 14Out1963, naquela região, e que serviu de pretexto para a escolha do subtítulo.

Agora, nesta segunda (e última) parte, com recurso à mesma metodologia, utilizamos um outro relatório, que estava apenso ao primeiro do Lourenço Gomes, elaborado por Pedro [Verona Rodrigues] Pires (1934-), natural de São Filipe, Ilha do Fogo, Cabo Verde, a partir das informações transmitidas pelo guia - "estafeta" Biagué Sagne, após a sua chegada a Dakar, depois de ter conduzido dois desertores da marinha portuguesa até Ziguinchor.

Para além de ser considerado como elemento de confiança dos dirigentes da estrutura de Dakar, Biagué Sagne ("estafeta de eleição") era quase sempre o escolhido para as "missões" de ligação entre os dois lados da fronteira Norte (Senegal/Guiné-Bissau), conforme consta na literatura. 

Conhecedor exímio da geografia do território e simultaneamente dos itinerários de risco controlado, face ao contexto das movimentações militares, Biagué era elogiado por ser um caminhante muito resistente, a fazer lembrar, na época, a "Locomotiva de Praga", apelido atribuído ao checo Emil Zátopek (1922-2000), o único atleta a vencer os 5.000 metros, 10.000 metros e maratona numa mesma Olimpíada (J.O. de 1952, em Helsínquia, na Finlândia), e que em 2012, durante as celebrações do centenário da «IAAF» (International Association of Athletics FederationsAssociação Internacional de Federações de Atletismo), realizadas na sua sede em Monte Carlo, no Principado do Mónaco, foi imortalizado no "Salão da Fama do Atletismo".

2.2 - RELATÓRIO (elaborado por Pedro Pires)

► Segundo informações colhidas a partir das declarações do Biagué.

Dakar, 21 de Outubro de 1963 (data em que assinou o documento dactilografado)

Bombardeamento do dia 14Out63 (2.ª feira) = 

 Houve 8 feridos entre os quais uma rapariga que ficou com uma perna fracturada. O Tiago [Aleluia] Lopes feriu-se na cabeça, mas está completamente restabelecido. O bombardeamento foi muito próximo da base [Central] do Osvaldo Vieira. Foi perto da tabanca de Morés.

# «MC» ▼ 

Os oito feridos referidos acima, cujos nomes não foram identificados neste relatório do Pedro Pires, seriam divulgados, quatro meses mais parte, por Bebiano Cabral d'Almada, no âmbito da sua (nova) visita às bases do Óio – P21095 (P-I) – a saber:    




Citação: (1964), "Relatório do Bureau de Dakar sobre a viagem à região de Casamansa e às bases do Norte da Guiné", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41387, com a devida vénia.

Por outro lado, e como contraditório à obra de Norberto Tavares Carvalho – "De campo em campo: dos estádios de futebol à luta de libertação nacional dos povos da Guiné e de Cabo Verde"; conversas com o comandante Bobo Keita. Edição de autor, Porto, 2011, recupero a opinião transmitida pelo Luís Graça, a propósito de duas notas incluídas no P17123, «(D)o outro lado do combate: Vida e morte de Simão Mendes, vítima de bombardeamento, pela FAP, da base central do Morés, em 20 de fevereiro de 1966 (Jorge Araújo)».

▬ Dizia, então, o camarada Luís Graça:  

(…) "O Bobo Keita não é bom de datas. Antecipou, ao que parece, a morte do Simão Mendes em 1 ano e três meses…".

De facto, podemos hoje concluir que algumas das datas e contextos relatados pelo Cmdt Bobo Keita (1939-2009), "nas suas conversas publicadas em livro" [capa ao lado], estavam desfasadas da realidade, o que se compreende, face aos muitos "sustos" que, certamente, apanhou durante os anos em que foi guerrilheiro.

Exemplos retirados da op. cit. p. 244:

"(vi) Morreu [Simão Mendes], mais tarde, no intenso bombardeamento da base de Morés ocorrido no dia 14 de Novembro de 1964". Seria que estava-se a referir ao bombardeamento de 14 de Outubro de 1963, aquele que acima é citado, onde aconteceram 8 ou 13 mortes… (mas não a de Simão Mendes)?

"(vii) Nesse bombardeamento, "os camaradas Juvêncio Gomes e Tiago Aleluia Lopes foram atingidos por estilhaços", na cabeça (o Tiago Lopes), nas mãos e parte do rosto (o Juvêncio Gomes). Mais uma vez se infere que a data aludida por Bobo Keita não confere, mas sim a de 14 de Outubro de 1963, onde o Tiago Lopes e o Juvêncio Gomes foram, de facto, feridos, o primeiro recuperou na base, do ferimento na cabeça, e o segundo foi evacuado para o Hospital de Ziguinchor, por ter sido atingido com "estilhaços na cara e no pescoço, e com fractura do braço esquerdo e ferimentos no pé", conforme consta na descrição supra.

Barco = 

[Durante a evacuação dos oito feridos], os portugueses surpreenderam os camaradas quando atravessavam o rio [Cacheu] numa cambança, cambança por onde passaram com o Rendeiro e o Timóteo [em 18 de Setembro de 1963], e apreenderam o barco que viera de Conacri há pouco tempo. 

Os soldados fizeram fogo sobre os nossos e tiveram que abandonar o barco. Não houve feridos.

Base = 

O Osvaldo Vieira vai mudar de base.

Soldados portugueses = 

Estão detidos em Ziguinchor. Foram conduzidos por um guia [Biagué Sagne] que foi encarregado desse serviço pelo Zain Lopes [Rafael Barbosa]. Precisamos de ver esse problema dos refugiados no Senegal mais profundamente. Espero as vossas instruções nesse sentido. Não podemos ter confiança absoluta em ninguém e julgo que é necessário separar o Lar [Ziguinchor] do Bureau [Dakar].

Julião [Lopes] = 

Este camarada continua em Ziguinchor [ferido por um dos seus três camaradas por ele assassinados em Encheia] porque não está completamente restabelecido. O Paulo Santi [que havia sido ferido, também, pelo Julião Lopes, no mesmo episódio de Encheia] já entrou.

Chico Té [Francisco Mendes] e o Constantino Teixeira = 

Devem vir a Dakar para seguirem para Conacri [a fim de reunirem com Amílcar Cabral].

# «MC» ▼ 

A reunião teve lugar a 27 de Outubro de 1963, domingo, encontro que contou apenas com a presença do Secretário-Geral e de Chico Té [Francisco Mendes], na qualidade de responsável político. 

Durante a sessão de trabalho foi apresentado e analisado o novo "plano de acção militar" para as zonas da Região do Óio (Central) e Gabú (Interior Norte). As "missões" a levar à prática incluíam:

(i) – meios de reconhecimento;
(ii) – criação da base em Geba;
(iii) – controlo da ligação fluvial e terreste;
(iv) – receber mais gente do Yaya [Koté];
(v) – intensificar as acções de sabotagem;
(vi) – liquidação dos Régulos (?).

Para a supervisão deste "plano de acção militar", foram indigitados trinta responsáveis (Comndantes), distribuídos pelas diferentes bases existentes nessas zonas.
De seguida apresentam-se os pontos mais relevantes dessa reunião, indicados acima.



Citação: (1963), "Reunião com Chico Té", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41265, com a devida vénia.

Oportunistas = 

Teriam estado na Gâmbia onde teriam encontrado o Cônsul e mesmo teriam ido a Bissau os oportunistas da clique do Benjamim Bull. Devem ter feito parte desse grupo: Bull, Domingos Araújo e Madjo. 

Teriam mesmo falado com o Rafael Barbosa, em Bissau, segundo as informações de Quebá Mané. "Foram ver o Governador e este pediu-lhes para contactarem o Rafael…". O Domingos Araújo esteve ausente cerca de 23 dias. Teria ido a Bissau via Gâmbia.

Carta = 

Os camaradas interceptaram uma carta do Cônsul que era dirigida a Domingos Araújo e uma outra a Ernestina para o Cônsul. As cartas estão com o Lourenço Gomes.

Malas de Correio = 

Os camaradas interceptaram uma camioneta do Lulula e apoderaram-se da mala do correio.

Timóteo e Rendeiro = 

O Rodrigo Rendeiro seguiu para Bissau. O Timóteo Pinto continua em Dakar, pelo menos, estava cá há cinco dias. Estou a ver se consigo descobrir o paradeiro dele. O Osvaldo Vieira e os camaradas do interior já estão informados da fuga deles.

# «MC» ▼ 

Sobre as "Histórias do Rodrigo Rendeiro e Timóteo Pinto" sugere-se a consulta das narrativas a seguir mencionadas:

▬ P17920: "A odisseia do português, da Murtosa, Rodrigo Rendeiro: uma viagem atribulada, de 3 a 26 de Setembro de 1963, de Porto Gole, … até ao Senegal (Samine, Ziguinchor e Dacar)".

▬ P17926: "Continuação da odisseia do Rodrigo Rendeiro que acabou por regressar a Bissau, com um salvo-conduto do consulado da Suíça em Dacar, que o levou até à Gâmbia…".

▬ P17929: "O Rodrigo Rendeiro, depois de regressar a Bissau, terá fornecido preciosas informações à FAP, permitindo a localização (e bombardeamento) das bases do PAIGC em Morés e Dando…".

Oportunistas = 

Teriam estado na Gâmbia há uns quinze dias [início de Outubro'63], coincidindo com a partida dos dois traidores [Timóteo e Rendeiro].

Lourenço Gomes = 

Ele foi detido antes de ontem juntamente com os soldados portugueses [Manuel José Fernandes Vaz e Fernando Fortes]. Haverá relação entre os panfletos tendenciosos e a atitude do Governo de Casamansa? Penso que não. Esses panfletos não terão, pelo menos, um estímulo do Governo do Senegal? Qual a atitude do Partido perante o "tracked" [vigia/controlo de movimentos] que se refere a Cacine e Casamansa?

Polícia = 

Estive hoje por duas vezes na "Sûreté" [Segurança), mas o Director e seu Adjunto estavam ausentes.

Medicamentos = 

Peço que levem em consideração o pedido do Lourenço Gomes.

Peças do motor Kelvin = 

É preciso que mandem as peças avariadas para poder comprá-las.



Citação: (1963), "Relatório sobre a visita de Lourenço Gomes à região de Óio", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41412, com a devida vénia.

► Fontes consultadas:

Ø  CasaComum, Fundação Mário Soares. Pasta: 07075.147.046. 

Título: Relatório sobre a visita de Lourenço Gomes à região do Óio. 

Assunto: Relatório assinado por Lourenço Gomes sobre a sua visita ao interior, região de Óio. Visita aos locais onde foram abatidos os aviões portugueses; ataque à base de Ambrósio Djassi [Osvaldo Vieira]. Necessidade de medicamentos no interior. Material de Guerra.Despesas. Viatura para transporte dos feridos. Envio dos militares portuguesas, Fernandes Vaz e Fernando Fortes, para a base de Abel Djassi. Em anexo documento assinado por Pedro Pires, datado de 21 de Outubro de 1963, com as informações colhidas das declarações de Biagué. 

Data: Quinta, 24 de Outubro de 1963. 

Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios XI 1961-1964.

 Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral. 

Tipo Documental: Documentos.

Ø  Outras: as referidas em cada caso.

Concluído.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
09JUL2020
_____________

Nota do editor: