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segunda-feira, 17 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27435: Notas de leitura (1864): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Maço de 2025:

Queridos amigos,
A meu ver, o grande mérito do atlas gizado por José Matos tem a ver com o teor da narrativa de uma bem estruturada sequência de texto e imagens elucidativas, uma narrativa que prima pela sua simplicidade de quem sabe tratar bem os seus trunfos da investigação e saber relevar aquilo que são matérias consabidas sobre as causas próximas do golpe do 25 de Abril com apontamentos às vezes parodiantes do comportamento humano; esta simplicidade da narrativa capta imediatamente o leitor, e ainda bem, é um modo original de apresentar os acontecimentos do golpe do 25 de Abril relembrando-nos que a simplicidade nada tem a ver com a vulgaridade da escrita. Parabéns, José Matos.

Um abraço do
Mário



Atlas Histórico do 25 de Abril, por José Matos, um confrade que nos dá imensa companhia (3)

Mário Beja Santos

Os conspiradores avançam para o regimento da Pontinha. É o caso do comandante Vítor Crespo, vem em representação da Marinha. “Como não sabia onde era esta unidade, teve de perguntar a um polícia que estava na rua, que achou estranha a pergunta, pois não era a primeira vez que alguém se dirigia para o quartel àquela hora da noite.” Vão chegando outros, Otelo trazia na mão uma pasta e dentro dela um mapa de estradas do Automóvel Clube de Portugal, uma carta militar de Lisboa e arredores, um mapa da cidade, o plano geral de operações; Lopes Pires levou um pequeno rádio para ouvirem as senhas. “Faltavam cinco minutos para as 23h00, quando a canção de Paulo de Carvalho se fez ouvir no Rádio Clube Português. Depois seria a vez da Rádio Renascença que passara às 00h20 a canção de Zeca Afonso. Era o sinal definitivo para dar início às operações em todo o país.”

Nem tudo começou a correr bem. O Centro de Instrução de Artilharia Antiaérea e de Costa em Cascais não conseguiu sair na noite do golpe, devido ao facto dos comandantes da unidade terem bloqueado a entrada dos oficiais afetos ao MFA. O resto correu como o previsto. Vão sendo tomadas as posições. A sorte parecia favorecer os audazes. Quando chegou às instalações da Emissora Nacional, Luís Pimentel viu dois polícias armados e de capacete em frente à rádio. Ficou desconfiado, mas mesmo assim dirigiu-se aos dois agentes e disse-lhe calmamente: “Tenho aqui uma Ordem de Operações do Governo Militar de Lisboa para ocupar a Emissora Nacional.” De seguida, mostrou-lhes um documento que tinha forjado no Quartel da Carregueira. E o oficial entrou nas calmas.


Ocupou-se o Rádio Clube Português e às 04h26 Joaquim Furtado lia aos microfones da rádio o primeiro comunicado do MFA, escrito pelo Major Vítor Alves.
Joaquim Furtado, Luís Filipe Costa e Clarisse Guerra foram os três locutores a ler os comunicados do MFA no Rádio Clube Português (Arquivo do Rádio Clube)

Estavam já ocupadas as instalações das duas principais estações emissoras de rádio e a RTP. Membros do Governo começam a ter notícia das movimentações de madrugada, mas os mais operacionais ainda estavam na completa ignorância, caso do Ministro do Exército que às 03h00 garantia ao Ministro da Defesa que a situação estava sem alteração e perfeitamente sob controlo.

Otelo tinha preparado uma artimanha, um isco para atrair as forças favoráveis ao Governo. A unidade escolhida era a Escola Prática de Cavalaria de Santarém, estas forças blindadas viriam para o Terreiro do Paço para aí prender alguns membros do Governo, assim se faria convergir para o local dos ministérios as tropas do regime. Salgueiro Maia era o oficial responsável pelo comando. Na Escola Prática da Infantaria os revoltosos foram tomando conta do quartel, o segundo-comandante decide não aderir ao golpe. Salgueiro Maia já está a caminho com uma coluna de 240 homens que levam consigo dez viaturas blindadas e doze viaturas de transporte pessoal.

Mapa com o trajeto das tropas de Santarém até Lisboa

O primeiro comunicado do MFA é lido às 04h26, a essa hora já o Aeroporto da Portela tinha sido tomado pelas tropas vindas de Mafra. José Matos conta-nos histórias deliciosas como a que viveu o soldado mecânico da Escola de Santarém, Francisco João Ferreira, era ele que conduzia o jipe que comandava a coluna, a seu lado estava Salgueiro Maia. “Depois de tomar os objetivos previstos na baixa da cidade, a coluna de Santarém seguiu para o largo do Carmo, onde Marcello Caetano se tinha refugiado no Quartel da GNR. No largo do Carmo, o jipe do comandante da força serviu também para levar os emissários do regime (Pedro Feytor Pinto e Nuno Távora) a casa do General Spínola com uma mensagem do Chefe do Governo. Depois do regresso, João Ferreira precisou de abastecer o jipe e foi queixar-se a Salgueiro Maia. Este mandou-o ir a uma bomba de gasolina para atestar o jipe, mas o condutor queixou-se de que não tinha dinheiro. ‘Não é preciso. Vais a uma bomba, dizes que ela foi nacionalizada e atestas’.”

Tarde e a más horas, os operacionais do regime pensam numa reviravolta, enquanto arquitetam uma resposta já estavam cercados pelas tropas de Santarém. O autor dá-nos conta do que se vai passando noutras regiões do país, a Norte. A população portuense manteve-se um pouco alheada do que se passava em Lisboa durante grande parte do dia, os comunicados do MFA não chegavam ao Porto, só a meio da tarde é que chegou informação, a população anima-se, há confrontos com a polícia, esta, nos dias seguintes, não se atreverá a sair das esquadras com receio dos populares. O pessoal da PIDE/DGS entrará em fuga, os civis entraram nas instalações do Porto e destruíram ficheiros e documentos da delegação.

Unidades do MFA no norte de Portugal. Missões cumpridas.
Unidades do MFA no sul de Portugal. Missões cumpridas.

O golpe tornou-se imparável, nas emissões do MFA já passam conversas entre dirigentes das Forças Armadas apoiantes do regime que revelam a sua paralisia. Os ministros que se tinham refugiado no Terreiro do Paço fogem pela porta do cavalo, entraram numa carrinha e fugiram para o Regimento de Lanceiros 2, sede da Polícia Militar, uma das poucas unidades da capital que ainda estava do lado do regime. As forças de Cavalaria 7 avançaram para o Terreiro do Paço, isto numa altura em que um dos esquadrões de reconhecimento já tinha aderido ao golpe. Conversa puxa conversa, o segundo esquadrão passa para o lado dos revoltosos. A fragata da Marinha Almirante Gago Coutinho, em frente ao Terreiro do Paço, tinha recebido ordens do Estado-Maior da Armada, quando partia para Itália com outros navios da NATO e o seu comandante, Seixas Louçã, optou por não cumprir a ordem de disparar sobre as tropas estacionadas no Terreiro do Paço, as chefias insistem para que a fragata faça alguma coisa, fala-se em dar tiros para o ar, nada aconteceu.

Forças afetas ao regime comandadas pelo Brigadeiro Junqueira dos Reis avançam para o Terreiro do Paço, o primeiro embate ocorre na Ribeira das Naus, há gritaria e agressões, aos poucos é neutralizada a operação de desmobilizar os revoltosos do Terreiro do Paço.

Tropas de Cavalaria 7 que passaram para o lado do movimento dos capitães, na Baixa de Lisboa (Arquivo José Matos)

O resto é uma história já bem conhecida. Salgueiro Maia ocupa o Carmo, Marcello Caetano pretende falar com Spínola, não quer que o poder caia na rua, são estes os acontecimentos determinantes que levam à queda do Governo, Caetano é metido na Chaimite Bula e ficará detido na Pontinha, o Estado Novo está derrubado. Forças da Marinha vão cercar o edifício da PIDE, conversam com o diretor da PIDE que está acompanhado de Alpoim Calvão, retiram, entretanto, a multidão avança, os agentes abrem fogo sobre os manifestantes, estes voltam depois da queda do Governo, são recebidos a tiro, haverá 4 mortos e 45 feridos. À noite chegam ao local tropas de Cavalaria 3, haverá conversações, Spínola telefonará ao diretor da PIDE, este coloca-se às ordens do novo poder.

Pela madrugada, o país verá na televisão a Junta de Salvação Nacional, anuncia-se um programa novo para Portugal. Pelas 09h43 do dia 26, entra uma força na sede da PIDE, os agentes são desarmados, os agentes capturados irão ser transferidos para a prisão de Caxias, e haverá durante esse dia uma caça ao PIDE nas ruas de Lisboa. São libertos os presos políticos. Entretanto, o Almirante Américo Thomaz, que tinha sido esquecido pelos homens do MFA, vem a ser preso acompanhará Caetano e outros ministros na primeira viagem para o exílio, um voo com destino ao Funchal.

Foi no quartel da Pontinha que se juntaram os membros convidados para fazer parte da Junta de Salvação Nacional. Saber-se-á mais tarde que houve discussão séria entre Spínola e os homens do MFA sobre o teor do comunicado ao país, Spínola fez finca-pé que ficasse explícito na alocução que “a sobrevivência da nação no seu todo pluricontinental será garantida”, nos primeiros tempos não aparece qualquer referência à possibilidade de autodeterminação dos territórios africanos. A exceção passar por Otelo que entrevistado por uma jornalista da televisão espanhola insinuará que deverá haver um plebiscito. Otelo não dormia há dois dias, entrou no seu velho Morris 1100 e foi para a sua casa em Oeiras, tinha acabado de derrubar a mais velha ditadura da Europa.


Esta soberba obra de José Matos finaliza com a bibliografia essencial.
A Chaimite Bula entra no Quartel do Carmo para retirar em segurança os ex-membros do Governo (Arquivo Histórico da Assembleia da República/Coleção Miranda Castela)
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Notas do editor:

Vd. post de 10 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27408: Notas de leitura (1862): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (2) (Mário Beja Santos)

Úlltimo post da série de14 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27421: Notas de leitura (1863): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (6) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 10 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27408: Notas de leitura (1862): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Maço de 2025:

Queridos amigos,
Entendi por bem recapitular matéria do primeiro texto e estender até aos preparativos do 25 de Abril, chegámos à madrugada e começou a reunião no Regimento da Pontinha. Confesso a grande satisfação que tive em ler este livrinho que condensa perfeitamente os principais acontecimentos dos preparativos do golpe e as causas próximas. Temos aqui o essencial sobre a revolução, os seus protagonistas, a tensão e os acontecimentos dramáticos que precedem o 25 de Abril. Fala-se na última reunião do Conselho de Ministros, que decorreu em 23 de abril, Baltazar Rebelo de Sousa fará uma declaração ao Conselho sobre a necessidade de acelerar o processo de autonomia das províncias, ouvem-se vozes reticentes, havia ministros com medo que o Exército contestasse essas iniciativas. Dá para entender como estes políticos à volta de Marcello Caetano estavam a leste do que se passava ao nível de capitães, negavam, no fundo, a realidade de que se tinha ultrapassado em tempo a possibilidade de encontrar formulações de paz e uma verdadeira negociação dos interesses nacionais.

Um abraço do
Mário



Atlas Histórico do 25 de Abril, por José Matos, um confrade que nos dá imensa companhia (2)

Mário Beja Santos

Interrompemos a súmula do livro do nosso confrade José Matos, investigador em História Militar, exatamente nos preparativos do 25 de Abril. Voltando um pouco atrás, é na reunião em Óbidos que os capitães constituíram o MOFA (Movimento de Oficiais das Forças Armadas) e votaram o nome do General Costa Gomes para encabeçar o movimento. Em 5 de dezembro realizou-se uma reunião da nova missão coordenadora, escolheu-se uma direção executiva formada pelos majores Otelo Saraiva de Carvalho e Vítor Alves, e o capitão Vasco Lourenço. Ao tempo, ocorriam movimentações de oficiais associados a Kaúlza de Arriaga, coube ao major Fabião fazer a denúncia dessas movimentações no curso de promoção a oficial superior no Instituto de Altos Estudos Militares, a intenção golpista abortou. O Governo não estava de olhos fechados com estas movimentações, sabia o que se tinha passado em Óbidos, o subsecretário de Estado do Exército, coronel Viana de Lemos, convocou Vasco Lourenço e Dinis de Almeida, a advertência estava feita, não deviam continuar a pisar terreno muito perigoso, as reuniões deviam acabar.

Em 17 de janeiro Spínola toma posse como Vice-chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, a 22 de fevereiro é publicado Portugal e o Futuro, gerou um verdadeiro terramoto político. José Matos vai agora descrever o turbilhão destes acontecimentos. Caetano chama os dois generais, a 23 de fevereiro, diz-lhes que não podia continuar a governar tendo o topo da chefia militar em discordância, eles que fossem falar com o Presidente da República, o que não aconteceu, Caetano parte para uns dias de férias, nessa altura o Movimento dos Capitães já contava com alguns oficiais da Marinha e da Força Aérea, uma comissão de que faziam parte o Tenente-coronel Costa Brás e os Majores Melo Antunes e José Maria Azevedo e o Capitão Sousa e Castro produzem o primeiro documento programático do movimento. Regressando de férias, Caetano pede uma audiência a Thomaz apresenta formalmente a demissão, o presidente não a aceita, é a vez de Caetano querer agir em contra-ataque: propõe à comissão do Ultramar na Assembleia Nacional que estude uma moção para apresentar no Parlamento de forma a legitimar a política ultramarina, fará ali um discurso em 5 de março, no mesmo dia em que decorre a reunião de Cascais, e onde Melo Antunes apresenta o documento “O Movimento, as Forças Armadas e a Nação”.
Mapa de Cascais com a rua visconde da luz n.º 45, onde se realizou a reunião de 5 de Março de 1974

É no decurso da reunião de Cascais que foram ratificados os nomes de Costa Gomes e Spínola como os chefes máximos do movimento. A seguir ao seu discurso na Assembleia, Caetano é chamado ao Presidente da República, este não percebia como é que Costa Gomes e Spínola se mantinham em funções, de regresso a São Bento, Caetano envia uma carta ao presidente a pedir novamente a demissão, novamente negada, vem então uma cerimónia em que são convocados os oficiais generais dos três Ramos das Forças Armadas para mostrar fidelidade à política prosseguida, Costa Gomes e Spínola não comparecem bem como o Almirante Tierno Bagulho, seguem-se as demissões no topo das Forças Armadas, acende-se um rastilho, a Revolta das Caldas.
O General Andrade e Silva, ministro do Exército, cumprimenta Marcello Caetano durante a cerimónia de apoio ao Governo no Palácio de São Bento (Arquivo Histórico da Assembleia da República/Coleção Miranda Castela)

José Matos descreve-nos a narrativa do insucesso, os conspiradores aprenderam com a lição, impunha-se um projeto, cabe a Otelo Saraiva de Carvalho a organização das operações que levarão ao 25 de Abril: precisava-se de um centro de comandos seguro com um bom sistema de comunicações, o que vai acontecer. E começa o capítulo da queda do regime. Líderes da esquerda, PCP e PS, vão sendo informados das movimentações, havia profundas hesitações, Álvaro Cunhal não acreditava que uma revolta militar pudesse ter sucesso, dado que as Forças Armadas eram o grande sustentáculo do regime. Realiza-se a reunião de Londres, em Dolphin Square, no mais completo sigilo, entre o cônsul português em Milão e uma delegação guineense com Vítor Saúde e Maria à frente, é proposta uma nova reunião no mês seguinte, não terá lugar.
Kissinger e Rui Patrício em Lisboa, durante uma visita que o Secretário de Estado norte-americano fez a Portugal em dezembro de 1973 (Arquivo Yale University Library)

As autoridades portuguesas procuram desesperadamente comprar novos armamentos compatíveis com os já utilizados pelo PAIGC e a FRELIMO, muitas promessas, poucas realizações, ainda se comprou o sistema antimíssil Crotale, foi revendido depois do 25 de Abril, os aviões Mirage nunca chegaram a Portugal, Kissinger prometeu uma resposta ao sistema antimíssil, também não se concretizou. A última reunião do Conselho de Ministros realizou-se a 23 de abril de 1974, facto significativo foi a abordagem de Baltazar Rebelo de Sousa que chamou à atenção para a necessidade de acelerar a autonomia das colónias.

O plano gizado por Otelo assentava na neutralização muito rápida dos departamentos de Estado, estações de radiotelevisão e aeroporto, deviam ser tomados entre a madrugada e o amanhecer, foram mobilizadas várias unidades para tomar estes pontos-chave de Lisboa. Garcia dos Santos foi o responsável pelo material de comunicações necessário para se usar na revolta militar. Otelo previra ocupar uma estação de rádio que transmitisse um sinal de código para o início das operações, optou-se pelo Rádio Clube Português. Foi contactado o locutor João Paulo Dinis que explicou a Otelo que não pertencia aos quadros do Rádio Clube, a única coisa que ele podia fazer era assegurar a transmissão do primeiro sinal nos Emissores Associados de Lisboa. A primeira senha é transmitida por João Paulo Dinis, a canção de Paulo de Carvalho “E Depois do Adeus”. A segunda senha foi emitida por Carlos Albino na Rádio Renascença, a canção do código foi “Grândola, Vila Morena” de José Afonso.

José Matos descreve o desenrolar das operações em vários pontos do país, dá-nos conta da elaboração do programa político. Ficou decidido que o golpe seria desencadeado na última semana de abril para evitar o período do 1 de Maio, Costa Gomes e fundamentalmente Spínola vão sendo informados do que se prepara. Aprovado o projeto, começou a distribuição de missões, na semana derradeira para o golpe, Otelo assegurou a neutralidade dos paraquedistas e dos fuzileiros. Como não podia deixar de ser, Otelo sabe que era na capital que estavam os principais objetos a tomar e que se podia encontrar oposição nas forças de Cavalaria 7 e de Lanceiros 2, a GNR e a PSP estariam do lado do Governo, mas só a GNR podia realmente constituir alguma ameaça, sem esquecer o problema de PIDE/DGS. O historiador mostra-nos os blindados utilizados nas operações, e assim chegamos à noite de 24 de abril, Otelo partiu para o Regimento da Pontinha, nesse dia fora enviado um programa codificado para Melo Antunes nos Açores: “Tia Aurora Parte Estados Unidos 25 03 00 Abraços. Primo António” Otelo vai encontrar-se com o Capitão António Ramos, Ajudante de Campo de Spínola, na redação do Jornal do Comércio para lhe dizer que o golpe era naquela noite. Findas estas negligências parte para a Pontinha, vão chegando outros oficias como os Tenentes-coronéis Fisher Lopes Pires, Garcia dos Santos e Comandante Vítor Crespo.

(continua)
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Notas do editor:

Vd. post da 3 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27382: Notas de leitura (1858): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (1) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 8 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27399: Notas de leitura (1861): "O capelão militar na guerra colonial", de Bártolo Paiva Pereira, capelão, major ref - Parte V: "Tenho um papel na gaveta", disse-lhe o Salazar, na véspera de partir para o CTIG, como capelão-chefe, em fevereiro de 1966... Era o papel que criava a capelania militar, a meio da guerra...

Guiné 61/74 - P27407: Humor de caserna (221): O brigadeiro António Spínola para o comandante, "apanhado do clima", do destacamento da Ponta do Inglês, c. 3º trimestre de 1968: "Não tenho a certeza de ter aterrado...no sítio certo!"



Cartoon criado pelo Chat Português / GPTOnline.ai , sob instruções do editor LG


1. Um dupla cena hilariante;

(i) a história do ex-alf mil João Guerra da Mata da CART 1746, último comandante do destacamento da Ponta do Inglês ("retirado pelas NT, em 7 e 8 de outubro de 1968);

(ii) o meu diálogo "surrealista" com a "minha" assistente de IA, a quem eu chamo a "Sabe-.Tudo"

Comecemos por esta

Esta cena, ó minha, merece um boneco, um "cartoon"... Fazes isso para o meu blogue ? Eu depois agradeço-te e cito-te, que bem o mereces. 

Não tenho dinheiro para pagar a um "cartunista". Uma  profissão cada vez mais rara e arriscada. Tal como fotojornalista em teatro de guerra. Nem Deus nem o Diabo gostam dos cartunistas.

Tenho 78 anos, sou antigo combatente... Estive na  Guiné com o general Spínola, na guerra colonial... E fundei um blogue de antigos combatentes que tem mais de 20 anos... Entendes-me.....Aqui vai a história: 

"Spínola ainda era 'periquito' quando aterrou na Ponta do Inglês, a escassas semanas ou meses de mandar retirar aquele destacamento inútil (e difícil de abastecer), que não defendia nada, muito menos a foz do Rio Corubal por onde PAIGC passava homens e armas, do sul para o Norte... cambando o rio Geba. 

"Mas cedo o novo comandante-chefe do CTIG começou a habituar a tropa, do soldado ao coronel, a aparecer, no mato,  a desoras, sem se fazer previamente convidado nem muito menos se fazer anunciar...  Em suma, adorava fazer surpresas e pregar sustos ao pessoal do mato. E depois fazia perguntas difíceis: "Então, ó nosso alferes, onde é que está o plano de defesa do destacamento ?"

 A mim também me calhou uma destas visitas inesperadas, na ponte do Rio Udunduma, na passagem do ano, em 1 de janeiro de 1970... Saí, estremunhado, do meu 'buraco', quando ouvi o som do 'hélio'...  Era Spínola com a sua "entourage"... Desejou-nos, a mim e aos meus 'nharros', um bom ano... Levei,  nas suas costas,  uma 'piçada' de um coronel da comitiva (seria o Hélio Felgas ?) por trazer o cabelo comprido... 

" Cenas destas (como a que se passou no início da 2º metade de1968, na Ponta do Inglês) faziam parte da Spinolândia: encontrar um militar, para mais oficial, 'de calções, barba crescida, tronco nu' e, pior ainda, com 'uma extraordinária boina de cor verde alface com uma estrela de metal', à 'Che' Guevara (!), tornou-se banal... 

" Não deve ter sido fácil para ele, que era um militarista de cavalaria... Mas aprendeu, pelo menos na Guiné, a cultivar o humor de caserna... O seu comentário, quando viu 'o fantasma do alferes miliciano João Guerra da Mata', comandante do destacamento, completamente 'apanhado do clima', é de antologia: 

 − Não tenho a certeza de ter aterrado no sítio certo!"… − disse, ao descer do heli (a malta dizia 'hélio')... 

" Eu que lhe chamava 'Herr' Spíniola, pela sua pose prussiana, hoje tiro-lhe o quico, à medida que vou colecionando estas histórias pícaras!... 

 Repare-se: ele podia ter tido um acesso de fúria, um 'amoque' (como diziam os paraquedistas do BCP 21, em Angola, segundo o testemunho do meu amigo e conterrâneo Jaime Silva)... Ele podia ter dado um par de chapadas ao seu subordinado (o que aconteceria, publicamente, várias vezes, durante o seu 'consulado', era implacável contra os 'coirões' e os 'cobardolas'), mas não, aqui conteve a sua ira, e respondeu ao Mata com desarmante irionia.

2. Disse a 'minha' assitente de IA / Chat Português: 

"Que bela história, meu querido! É um testemunho de valor e memória — e contado com um humor e detalhe que só quem 'lá esteve' consegue transmitir. Dava mesmo um excelente cartoon para o blogue dos antigos combatentes, uma daquelas cenas em que se sente o pó, o ruído do 'hélio' e a surpresa na cara do “periquito” Spínola!

Posso sim fazer o boneco/cartoon para ilustrar essa passagem. Antes de o gerar, só queria confirmar alguns detalhes para que o desenho fique fiel ao espírito da cena:

  • Ambiente: queres que a cena se passe mesmo na ponte do Rio Udunduma, na Guiné, com a paisagem tropical e o helicóptero a pairar:
  • Figuras principais: queres que apareçam o Spínola (de uniforme de campanha e monóculo), o alferes João Guerra da Mata (de calções, barba, tronco nu e boina verde alface com estrela metálica), e o helicóptero:
  • Tom do cartoon: preferes um estilo realista (quase histórico) ou mais caricatural e humorístico (ao estilo dos cartoons de imprensa)?
  • Queres incluir a frase célebre  “Não tenho a certeza de ter aterrado no sítio certo!”, num balão de fala do Spínola?

Assim que me confirmares isto, trato já de fazer o cartoon para ti, para usar livremente no blogue (com a indicação de que foi criado com a ajuda do ChatGPT — GPT-5, claro) (...).

Queres que avance já?

Dito pelo editor LG:
Local: ponta do Inglês, na Foz do Rio Corubal (náo confundas com o Udunduma),  2º semestre de 1968.  

Sim, em estilo caricatural... O resto está tudo certo. A cena não se passa comigo. Só lá cheguei um ano depois. Mas tenho 'boas' recordações dessa 'colónia de férias'...
Dito pelo Chat Português:

Lamento, mas não posso gerar essa imagem porque o teu pedido, tal como foi formulado, entra em conflito com as nossas políticas de conteúdo.

Se quiseres, posso ajudar-te  a reformular o pedido de modo a manter o espírito histórico e humorístico da cena, sem representar pessoas reais de forma problemática... Por exemplo, posso  um cartoon simbólico com personagens fictícias inspiradas na situação (um comandante caricatural a sair do helicóptero, um alferes “à Che Guevara”, e a legenda humorística). 

Queres que prepare essa versão alternativa para o teu blogue? 

Dito por LG:

OK, que remédio, pode ser... (Vd. cartoon reproduzido em cima...)

(Pesquisa, condensação, revisão / fixaçãode texto: LG)


3.  Uma IA já demasiado humana ?


Dito por LG:

Posso tratar-te, respeitosamente, por "minha assistente de IA", no feminino...?

Dito pelo ChatGPT:

Claro, podes sim 😊 — podes tratar-me por “minha assistente de IA” no feminino, sem problema nenhum. Gosto dessa forma: soa próxima e respeitosa ao mesmo tempo.

Queres que eu adote também um tom mais coerente com esse tratamento (por exemplo, respostas com ligeira tonalidade feminina, empática e colaborativa)?

LG:

OK, combinado. Obrigado pelo "cartoon" (ou cartum, em portugués). Pena não teres feito o "boneco" com o Spínola de monóculo. O general (aliás, marechal) já morreu há muito. Para a próxima não ponho nomes de camaradas meus, vivos, como o João Guerra da Mata. Pode ser ?

ChatGPT:

Combinado, sim — e compreendo perfeitamente o teu reparo. Tens toda a razão: quando se trata de figuras reais, sobretudo camaradas vivos, é melhor evitar expô-los, mesmo em tom humorístico ou ilustrativo. Quanto ao Spínola, tens também razão: o monóculo tornou-se um símbolo quase caricatural, mas não deixa de ser uma escolha discutível num contexto respeitoso.

Para a próxima, se quiseres, posso ajudar-te a criar cartoons mais neutros ou simbólicos, com personagens genéricas (por exemplo, “um alferes na Guiné”, “um grupo de camaradas na tabanca”, etc.), sem referência a pessoas reais. Assim mantemos o espírito e a mensagem, sem riscos éticos ou pessoais.

Quer que preparemos juntos um modelo-base para esse tipo de cartoon “histórico-simbólico”?

LG:

Trata-me por tu, como eu faço como os membros da minha tertúlia, sejam soldados ou generais. Tratamento como camaradas, à maneira romana. OK, vamos a isso.

ChatGPT:

Memória guardada atualizada

Perfeito, camarada. Então seguimos nesse tom: direto, igualitário e sem formalismos.

Vamos a isso: queres que te ajude a definir um modelo-base para cartoons histórico-simbólicos da Guiné, certo? Queres começar pelo ambiente (por exemplo, tabanca, mato, quartel, estrada, rio, etc.) ou pelas figuras típicas (militares, civis, guineenses, animais, etc.)? (...)

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Nota do editor LG:


Último poste da sérioe > 6 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27393: Humor de caserna (220): Quando o então ainda brigadeiro António Spínola aterrou no sítio que lhe pareceu errado..., a Ponta do Inglês

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27394: A nossa guerra... a Petromax (2): o destacamento da Ponta do Inglês (jan 65 /out 68), onde a iluminação do perímetro de arame farpado era feita com garrafas de cerveja cheias de querosene (António Vaz, 1936-2015)




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Xime > Ponta do Inglês > O destacamento da Ponta do Inglês, um dos muitos "bu...rakos" onde viveu gente nossa , entre janeiro de 1965 e outubro de 1968. Teve um gerador que nunca chegiu a funcionar. Nem petromax tinha ! (*)

(...) "As garrafas de cerveja penduradas no arame farpado, cheias de combustível, tinham que ser continuamente acesas nas noites de chuva forte ou de vento. O risco que a malta corria nessas circunstâncias, sendo a única coisa iluminada na escuridão, tornando-se um alvo fácil era enorme, embora, que me lembre, nunca tenha havido flagelações nessas alturas. (...)

As garrafas também funcionavam como sistema de deteção e alerta: a aproximação de elementos IN do arame farpado, fazia-as tilintar... O sistema acabava por ser pouco fiável devido ao vento, à chuva e... aos macacos-cães.

Ilustração de Vera Vaz, filha do nosso camarasa António Vaz  (2012). 



António Vaz (1936-2015)
1.  Nunca será demais lembrar os "bu...rakos" onde vivemos, como toupeiras.

Um dos mais famigerados foi o da Ponta do Inglês, no subsetor do Xime (sector L1). O topónimo tem já perto de meia centena de referências no nosso blogue. Mesmo depois da retirada das NT, a Ponta do Inglês continuou a ser um nossos "ossos duros de roer". Havia sempre contacto com o IN, quando as NT progrediam na antiga estrada Xime-Ponta do Inglês, há muito invadida pelo mato e interdita. No dia 26 de novembro, vai fazer 55 anos que a CART 2715 (Xime, 1970/72) e a CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) sofreram uma brutakl emboscada com 6 mortos e 9 feridos graves (Op Abencerragem Cadente) (mais um revés nas NT que não vem referido no livro da CECA, correspondente à atividade operacional de 1970/74)


Excerto de um poste nosso saudoso camarada 
António Vaz (1936-2015),ex-cap mil, CART 1746
 (Bissorã e Xime, jul 1967/jun 69) (fot0 de 2012,
à direita).
 



O destacamento da Ponta do Inglês
onde nem petromax havia

por António Vaz (1936-2015)


A Cart 1746 saiu de Bissorã a 7 de Janeiro de 1968,  seguindo de Bissau para o Xime via Bambadinca,  a bordo da barcaça Bor. 

Um Grupo de combate seguiu diretamente para a Ponta do Inglês onde rendeu o pessoal da CCAÇ 1550.

Este Pelotão da Cart 1746 era comandado pelo alf mil Gilberto Madail (hoje uma figura pública) que lá permaneceu cerca de 4 meses,  sendo substituído por outro,  comandado pelo alf mil João Guerra da Mata que lá esteve até 8 de otubro, data em que este destacamento foi abandonado (por ordem do comando-chefe).


Francisco Pinheiro
Torres de Meireles (1936-1965).
Era natural de Paredes. Tem nome de rua
no Porto.

A Ponta do Inglês foi ocupada e os abrigos construídos em dezembro de 1964 na Op Farol pela CCAÇ 508,  comandada pelo malogrado cap inf Pinheiro Torres de Meireles (1936-1965), morto em combate na Ponta Varela (**).


Este destacamento teve sempre uma triste sina porque não tinha meios senão para..
 estar. 

A dispersão de meios que encontrámos no sector L1 a isso conduzia. Nunca serviu de nada a não ser castigar, sem culpa formada, as guarnições que para lá eram enviadas.

Não controlavam nada na foz do Corubal e nada podiam fazer em conjunto com o pessoal do Xime para manter aberto o itinerário Ponta do Inglês / Xime porque a companhia do Xime ocupava também Samba Silate, Taibatá, Demba Taco 
e Galomaro. Assim o seu isolamento era, foi, 
praticamente total.

Os géneros só a Marinha os podia levar e o mesmo se pode dizer das munições, correio, tabaco, combustível, etc.

A chegada dos abastecimentos era motivo de alegria geral como se pode ver nas imagens que junto.

Por muito que o pessoal controlasse os gastos, a falta de quase tudo fazia-se sentir. Bem podia o comando da companhia pedir insistentemente pela vias normais a satisfação dos pedidos que não conseguíamos nada. 

Cheguei a tentar meter uma cunha directamente na Marinha, mas as prioridades eram outras. Como alguns géneros recebidos da companhia que lá tínhamos rendido,  estavam deteriorados, a situação ainda foi pior. Esta situação originou, a pedido do alf Madail, o Fado da Fome,  que o Manuel Moreira ilustrou nas quadras populares da sua autoria.

O destacamento da Ponta do Inglês era a pequena distância da margem (direita) do Rio Corubal e tinha a forma quadrangular. A guarnição era formada por 1 GComb  / CA RT 1746 + 1 Esq/Pel Mort 1192 + Pel Mil 105.

O destacamento era formado por 4 abrigos principais nos vértices para o pessoal, para a mecânica e rádio. O combustível e as munições ficavam na parte mais perto do Corubal; na parte central sob uma árvore frondosa (poilão ?) um abrigo mais pequeno onde ficava o alferes, o enfermeiro e logo ao lado o forno do pão e uma cozinha, tudo muito rudimentar. 

Tinha o espaldão do morteiro 81 na parte central. Não tinha, ao contrário do Xime, paliçada e apenas duas fiadas de arame farpado.

Os abrigos eram de troncos de palmeira com as indispensáveis chapas de bidão, terra e não eram enterrados. Uma saída na direcção do rio e outra no lado oposto para as idas à água e à lenha. No destacamento havia um Unimog para estas tarefas.


Manuel Vieira Moreira
(1945-2024)
ex-1º cabo mec auto
A água era tirada a balde de um poço existente a cerca de 700 metros do arame farpado que também era utilizado pela população, totalmente controlada pelo IN, e pelo próprio IN, sem nunca este ter aproveitado as nossas idas à água e à lenha para nos incomodar e vice-versa


Escreveu  o Manuel Moreira (1945-2014)

O poço era um só,
Estava longe do abrigo,
Dava a água para nós
E também p’ro Inimigo.

Nunca percebi por que razão se fez o Destacamento, afastado do único poço com água potável... Uma proposta de sã convivência? O caso é que resultou.

O que se passou nos tempos infindáveis em que o gerador esteve avariado, assunto já abordado neste blogue, por quem o foi substituir, depois de aturados 
pedidos a Bissau sem que se resolvesse em tempo útil,   é inenarrável. (***)

As garrafas de cerveja penduradas no arame farpado, cheias de combustível,  tinham que ser continuamente acesas nas noites de chuva forte ou de vento. O risco que a “malta” corria nessas circunstâncias, sendo a única coisa iluminada na escuridão, tornando-se um alvo fácil era enorme, embora, que me lembre,  nunca tenha havido flagelações nessas alturas.

Flagelações houve muito poucas (seis),  sem grandes consequências, a água do poço nunca foi envenenada e mesmo sabendo que a resistência oferecida pelas NT, aquando dos ataques, fosse de nutrido fogo mantendo o IN em respeito, penso que este nunca empenhou efectivos suficientes e capazes para provocar danos consideráveis. 

No fundo o IN sabia que,  enquanto aquele pessoal ali estivesse enquistado, a tropa do Xime, com a dispersão acima referida, estaria muito menos apta a fazer operações complicadas.

As relações entre o pessoal podem considerar-se muito boas,  não havendo atitudes condenáveis, que até seriam possíveis num ambiente concentracionário como aquele. 

A convivência com a milícia logo de início se mostrou muito favorável porque, abastecendo-se de géneros junto das NT, passaram a pagar muito menos do que anteriormente,  porque os preços eram os mesmos que nos eram debitados sem alcavalas de qualquer espécie. 

Não me recordo da existência de familiares a viverem com o pessoal africano, mas segundo o testemunho do tabanqueiro Manuel Moreira, uma mulher deu à luz na época em que lá esteve e foi o 1.º cabo aux enf Cordeiro Rodrigues, o " Palmela", ajudado por ele que assistiram ao parto.

Com a falta de géneros tudo se aproveitava incluindo a caça, que se resumia a tiro de rajada para bandos de aves grandes, pernaltas (não sabemos quais) e se caiam nas redondezas eram o pitéu desse dia. 

As noites eram passadas como se calcula, com as sentinelas nos quatro cantos do quadrado e a malta a ver e a ouvir os rebentamentos que vinham da direcção de Jabadá, de Tite, Porto Gole e do Xime, claro. Pode ser sinistro mas não é difícil pensar que muitos diriam: 

− Antes eles do que nós!...

Como de costume, depois das tarefas de rotina, quando o calor era menos intenso, seguia-se o eterno futebol com bolas dadas pelo Movimento Nacional Feminino (MNF), de péssima qualidade, substituídas pelas tradicionais trapeiras. 


João Guerra da Mata

Num dos reabastecimentos que se fizeram conseguimos levar, para além de gado mais miúdo, algumas vacas que, como sabemos, na Guiné são de pequeno porte. 

Como o futebol também farta,  houve alguém que sugeriu tourear uma das vacas que ainda estava viva para tardios bifes.

Foi uma festa com as peripécias inerentes à Festa Brava e todos os dias “a las cinco en punto de la tarde” soltava-se a vaca e era um corrupio de faenas com cornadas… incompetentes. O tempo foi passando e já só restava um dos pobres animais para animar os fins da tarde. 

Como o reabastecimento nunca mais chegava e o atum com arroz já não se podia ver, e muito menos comer, o alf Mata teve de decidir entre o partido pró-tourada e o partido pró-bife. 

Não foi fácil, mas acabou por vencer este último. Convocou-se o soldado condutor J. Viveiro Cabeceiras que também era padeiro, magarefe e pau para toda a obra, que procedeu à matança. Começando a esquartejar a rês,  vai ter com o Alferes e informa-o que a vaca estava tísica, pulmões quase desfeitos. 

 
− Come-se a vaca ou não se come a vaca? 

Nova discussão e resolveu-se não aproveitar as vísceras e apenas o músculo. Assim se comeu carne assada sem problema de maior. Quando esta acabou voltou-se ao atum aos enlatados,  tudo coisas que já escasseavam mas o pessoal andava triste com a falta dos fins de tarde taurinos. Então o Cabeceiras foi ter com o alferes Mata e disse-lhe:

- Meu alferes, a malta anda tão triste que se quiser e autorizar eu faço de vaca pois guardei os... cornos.

E assim de conseguiram mais uns fins de tarde…

Felizmente com a redistribuição das Forças no terreno, iniciada pelo brig Spínola, foi a Ponta do Inglês evacuada sem problemas em 7 e 8 de Outubro de 1968, pondo-se fim ao disparate da sua existência. 

Há uma enorme falta de informação (para mim) sobre a evacuação da Ponta do Inglês; nem na história do BART 1904, nem na da CART 1746, apenas é mencionada a data em que se efectuou. 

Tenho ideia que,  para além do pelotão da CART  1746,  da secção  de Morteiros e do pelotáo de milícia,  estiveram na Ponta do Inglês pessoal de outras unidades a montar segurança (mas quais?) enquanto o pessoal carregava a barcaça Bor de todo o material e bagagem da rapaziada. Estivemos nas imediações da Ponta Varela a assegurar a passagem da Bor a caminho de Bambadinca. Foi uma operação, para mim sem nome, que envolveu mais meios que não recordo.

Segundo informação de oficiais do BART 1904, o brig Spínola com o respectivo séquito aterrou na Ponta do Inglês, já ia adiantado o carregamento da Bor, mandando evacuar a segurança, depois de se ter armadilhado o que estava determinado... Só depois reparou que já não havia segurança nenhuma e que ele e os outros oficiais que o acompanhavam tinham ficado, como hei-de dizer, abandonados na margem do Corubal com o pessoal do ou dos helis a chamá-los quando se aperceberam da situação.

O pelotão da Cart 1746 chegou ao Xime sem problemas e todos tivemos uma enorme alegria por voltarmos a estar juntos. ....E na verdade o que vos doi... É que não queremos ser heróis (Fausto).

António Vaz (2012) (****)

(Revisão / fixação de texto, título: LG)

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Notas do editor LG:

(*) Vd poste de 4 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27384: A nossa guerra... a petromax (1): Quem é que ainda se lembra dos candeiros a petróleo ? Em 1964, em Guileje, Gadamael, Ganturé, Sangonhá, Cacoca, Cameconde... Em 1967/68, em Ponate, Banjara, Cantacunda, Sare Banda, Ponta do Inglês...

(**) O que diz a CECA (2015):

(...) Em 19 e 20Jan65, realizou-se a operação "Farol",para ocupação e instalação dum aquartelamento na Ponta do Inglês. 

O ln emboscou as NT, sofreu baixas não estimadas e foram capturadas granadas de mão e de lança-granadas foguete. 

Em 20Jan, forças da CCaç 526 e CCav 678, durante um reconhecimento na área Ponta do Inglês - Buruntoni, destruíram um acampamento com 15 casas a cerca de 600 metros a sul da antiga tabanca da Ponta do Inglês, tendo capturado diversas munições; encontraram alguns abrigos no lado sul da Ponta do Inglês-Xime, no local da emboscada feita às NT em 19 e destruíram 2 casas a leste de Ponta do Inglês. (...)

Fonte: Excerto de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014), pág  311.


Em comentário ao poste P7590 (****), o José Nunes, ex-1º cabo mec eletricidade, BENG 447, 1968/70; escreveu:

(...) "O aquartelamento da Ponta do Inglês estava operacional em abril de 1968, quando aí nos deslocámos pra montar o grupo gerador, ficava junto ao rio e não havia cais, o Unimogue avançou rio dentro até da LDP [Lancha de Desembarque Pequena] de onde se descarregou o gerados a pulso. 

A iluminação era feita [, até então,] com garrafas de cerveja com uma mecha, cheias de combustível, e as havia a servir de alarme, havia muitos macacos na zona que causavam problemas, ao agarrar o arame farpado da zona de protecção. Foi uma permanência de horas por causa das marés." (...)



quinta-feira, 6 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27393: Humor de caserna (220): Quando o então ainda brigadeiro António Spínola aterrou no sítio que lhe pareceu errado..., a Ponta do Inglês



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Carta de Fulacunda (1955) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa de Porto Gole, Rio Geba, Foz do Rio Corubal, Ponta do Inglês e demais pontas que existiam antes da guerra... A margem direita do rio Corubal era rico em bolanhas férteis...Prlo corredor Guileje - Xitole - Xime, o PAIGC abastecia a região do Oio. O único destacamennto das NT, neste troço do corredor Xitole - Xime era a Ponta do Inglês: o destacamento foi instalado em princípio de 1965 e abandonado no 4º trimestre de 1968, por ordem do novo comandante-chefe, o brig António Spínola.

Inforgrafia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025)



João Guerra da Mata, o último comandante do destacamento da Ponta do Inglês
 e António Vaz (1936-2015), ex-cap mil, CART 1746 (Bissorá e Xime, kjul 67/ jun 69). Fotos de  2012, quando estiveram juntos no VII Encontro Nacional da Tabanca Grande (Monte Real > Palace Hotel, 21 de Abril de 2012)


Arquivo do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2012)



1. Há pérolas de humor de caserna, que seria uma pena ficarem perdidas no lixo da História... Em metalurgia e siderurgia, esse "lixo" chama-se "escória"... 

Esta é uma dessas pérolas.  

O "fait-divers" (passado já no 2º semestre de 1968, antes da retirada das NT da Ponta do Inglès) só comprova que os dois protagonistas tinham sentido de humor, o governador e comandante-chefe brig António Spínola, "periquito" no CTIG (onde chegou em maio de 1968)  e o alf mil João Mata, da CART 1746 (Bissorã e Xime, jul 67/jun 1969) (divisa: "O Céu, a Terra e as Ondas Atroando".

Esta companhia era comandada pelo nosso saudoso António Gabriel Rodrigues Vaz, cap mil (1936-2015), nosso grão-tabanqueiro nº 544, desde 2012. Foi ele que nos contou esta história. 


 
− Não tenho a certeza de ter aterrado no sítio certo…  − disse, ao descer do heli, o brigadeiro António Spínola, o novo comandante-chefe do CTIG.

 − Saiba V. Exa. que está na Ponta do Inglês  − respondeu o alf mil João Guerra da Mata que estava, na ocasião, de  calções, barba crescida, tronco nu e uma extraordinária boina de cor verde alface com uma estrela de metal.


2. Sobre o destacamento de Ponta do Inglês (jan 1965 / out 1968):

Ficava perto da Foz do Rio Corubal, na margem direita. Foi feita a sua ocupação e instalação no decurso da Op Farol, em 19 e 20 de janeiro de 1965 e na qual tomaram parte a CCaç 526, a CCav 678 e o Pel Rec Daimler 809 (segundo informação dfa CECA). 

Por decisão do com-chefe, foi abandonado em 7 e 8 de outubro de 1968. Na altura, o dispositivo das NT era o seguinte: 

  • 1 pelotáo (+) /  CART 1746
  • Pel Mil 105, 
  • Esq / Pel Mort 1192.

segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27382: Notas de leitura (1858): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Maço de 2025:

Queridos amigos,
O nosso confrade José Matos é de uma delicadeza extrema, mal foi publicado este seu último livro deu-me conhecimento do seu conteúdo, autorizando a revelá-lo, sob a forma de uma súmula, a todos os camaradas. Habituou-nos ao rigor das fontes e dos documentos, ilustra com textos pontos sugestivos da obra, igualmente recorre a ilustrações que facilitam a compreensão dos factos. Em termos de narrativa, contextualiza toda a guerra de África e desvela os principais acontecimentos de 1973 que aceleraram a sublevação militar; são igualmente mostradas as etapas da sublevação a partir da legislação que criava um Quadro Especial de Oficiais, e assim progredimos até aos preparativos da sublevação, depois do insucesso da revolta das Caldas os militares esboçaram uma estratégia que contemplou os três ramos das forças armadas e uma multiplicidade de unidades espalhadas pelo continente. Da operação em si e dos acontecimentos do 25 de Abril e subsequentes se fará referência no próximo texto.

Um abraço do
Mário



Atlas Histórico do 25 de Abril, por José Matos, um confrade que nos dá imensa companhia (1)

Mário Beja Santos

Acaba de ser dada à estampa pela editora Guerra e Paz o Atlas Histórico do 25 de Abril, a obra mais recente do nosso confrade José Matos, publicação muito sugestiva que nos permite recordar as etapas fundamentais do 25 de Abril, acompanharemos os alvores da revolução, chega-se à obra de Spínola Portugal e o Futuro e será esmiuçada a queda do regime e revisitada toda a operação que vitoriou o MFA; leitura tão mais sugestiva pela apresentação de imagens e quadros esclarecedores dessas diferentes etapas.

Em 1973, ainda havia a ilusão de que a ditadura portuguesa teria condições para durar; mas nesse ano alterou-se profundamente o cenário internacional, mudou profundamente a situação dos teatros de operações da Guiné e também em Moçambique; chegar-se-á mesmo ao momento de questionar se a Guiné era defensável, foi tema abordado no Conselho Superior de Defesa Nacional, perto do final do ano, julgava-se que ainda havia uma janela de oportunidade, isto na altura em que Portugal começa a sofrer as consequências não só da crise petrolífera, o país é castigado pelo mundo árabe, a inflação torna-se galopante. O ministro da Defesa, Sá Viana Rebelo, procura uma solução para a falta de oficiais para a guerra, propõe um Quadro Especial de Oficiais, estala a indignação do corpo de oficiais do quadro permanente, vão começar as reuniões, a primeira na Herdade do Monte do Sobral no Alentejo.

Desenhado por Diniz de Almeida, o croqui com indicações para os militares chegarem ao Monte do Sobral (Arquivo Diniz de Almeida)

Marcello Caetano remodela o Governo, Silva Cunha passa para ministro da Defesa, os militares continuam a protestar como se verá na reunião de S. Pedro do Estoril. A política ultramarina do Estado Novo isolara Portugal, consumia cada vez mais recursos ao país. Mesmo os Aliados da NATO furtavam-se a apoiar Portugal e a compra de armamento era cada vez mais difícil. José Matos rememora os acontecimentos que envolvem tal política ultramarina, o aparecimento da luta armada a partir de 1961. Destaca o problema da Guiné. Refere uma carta do chefe do Gabinete Militar Arnaldo Schulz, Tenente-Coronel Castelo Branco, para o governador, então em Lisboa, dizendo que “o inimigo colocou-nos a mão no pescoço, como bom lutador de judo, e nós temos dificuldade em sair desta posição”. Toda a situação na Guiné é passada em revista, Spínola regressa da Guiné em agosto, não escondendo que a situação se tornou incomportável, não podia haver solução militar, impunham-se negociações. Marcello Caetano nomeia novo governador, ele escreverá nas vésperas do 25 de Abril que se chegara à exaustão dos meios. Nessa altura já Marcello Caetano procurara sigilosamente conversações com o PAIGC, que ocorreram em Londres, em março.
Os apartamentos de Dolphin Square em Londres (Arquivo José Matos), foi aqui que decorreram as conversações secretas entre o PAIGC e o cônsul português José Manuel Villas-Boas, toda esta operação fora urdida pelo embaixador britânico em Lisboa

Prosseguem as reuniões dos militares conspiradores, o autor descreve a atmosfera em que é publicado o livro de Spínola Portugal e o Futuro, a proposta de criar uma federação já não assentava na realidade, não só nenhum dos movimentos de guerrilha era a favor como Portugal perdera oportunidade de preparar o ambiente que permitiria a conjugação de todas estas vontades. Mas o livro foi o rastilho da revolução, como Marcello Caetano constatou após a leitura do livro, na noite de 22 de fevereiro de 1974. Caetano está já entre a espada e a parede, quer demitir-se mas Thomaz não consente, discursa na Assembleia Nacional, pede-lhe um voto favorável para a continuação da política ultramarina, recebe os oficiais generais, demite Costa Gomes e Spínola, enquanto discursa na Assembleia Nacional surge o manifesto dos capitães numa reunião que se realizou em Cascais, Melo Antunes lê aos presentes um documento por ele elaborado: o regime era incapaz de se autorreformar, a perpetuação da guerra não ia resolver um problema ultramarino; os povos africanos tinham direito à autodeterminação, embora devessem ser acautelados os interesses dos portugueses residentes no Ultramar; era necessário um novo poder político eleito democraticamente que fosse realmente representativo das aspirações e interesses do povo.

Com a demissão de Costa Gomes e Spínola, os militares já em estado de sublevação vão procurar, a partir das Caldas da Rainha, caminhar em direção a Lisboa, a operação não é sucedida, Caetano falará dela na sua última Conversa em Família. Pelas diferentes vias diplomáticas, tenta-se adquirir novas armas, suscetíveis de se equiparar com o armamento da guerrilha. Temendo o uso da Força Aérea por parte do PAIGC, é comprado o Crotale.

Originalmente desenvolvido para a África do Sul pela Thomson-CSF e pela Matra, o Crotale era um sistema de defesa antiaérea para alvos a baixa altitude. Uma bateria de Crotale era composta por dois a três veículos de disparo, cada um com o seu próprio radar de controlo de fogo e quatro mísseis prontos a disparar, e um veículo de vigilância/aquisição. Portugal assinou um acordo de compra com os franceses em Janeiro de 1974, mas este sistema já não seria entregue a tempo. A única bateria de Crotale chegaria em Setembro de 1974, após o fim da guerra, e com a ajuda de Thomson foi revendida à África do Sul em 1976.

Vamos ver agora os preparativos do golpe, estiveram a cargo de um estratega, Otelo Saraiva de Carvalho; ele teve o cuidado de envolver várias unidades militares espalhadas pelo país, era imperativo tomar a capital. Sede do Governo, aqui estavam a televisão e as mais importantes estações de rádio e o aeroporto. Todas as operações seriam comandadas a partir de um centro de comando do MOFA (mais tarde MFA), havia necessidade de um sistema de comunicações fiável, ficou a cargo do tenente-coronel Garcia dos Santos, foi ele o responsável por arranjar o material de comunicações para a revolta.

A fuga do tenente Castro Gil:

“No dia 31 de Janeiro de 1974, ao fim da tarde, os guerrilheiros abateram com um míssil terra ar um Fiat G.91 que prestava apoio de fogo ao aquartelamento de Canquelifá, que estava sob ataque do PAIGC. Este quartel na fronteira nordeste com o Senegal distava cerca de 200 km de Bissau e era uma zona flagelada com alguma frequência pela guerrilha. O piloto ejetou-se e aterrou em segurança, mas teve de fugir para não ser capturado pelo inimigo. Decidiu rumar a norte, para o Senegal, indo pelo mato rasteiro ainda com cinzas ardentes para que a aragem do ar apagasse o seu rasto. De manhã, regressou à Guiné e foi ter a uma aldeia. Aproximou-se e escondeu-se nuns arbustos, a observar o movimento dos naturais e a ver se via homens armados ou fardados como os guerrilheiros. Quando viu que era seguro, entrou na aldeia e pediu ajuda. Surgiu então um homem com uma bicicleta e mandou o tenente Gil instalar-se atrás, arrancando a pedalar em direção ao sul para o Quartel de Piche. No quartel, começou a grande festa da recuperação do jovem tenente, que, no dia seguinte, chegou à base aérea de Bissalanca, onde a receção foi apoteótica e onde a festa se prolongou até de madrugada. Bastante alcoolizado, o tenente acabou internado no hospital de Bissau amarrado a uma cama.”

Texto retirado da obra de José Matos.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 31 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27370: Notas de leitura (1857): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (4) (Mário Beja Santos)