Mostrar mensagens com a etiqueta Jorge (George) Freire. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Jorge (George) Freire. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P23988: Casos: a verdade sobre... (33): Vitorino Costa, o primeiro comandante da guerrilha, formado em Pequim em 1961, a ser morto pelas NT em meados de 1962

 

Grupo de quadros do PAIGC recebidos por Mao Tse-Tung na República Popular da China, em 1961 |

Instituição: Fundação Mário Soares | Pasta: 05360.000.084 | Assunto: Grupo de quadros do PAIGC recebidos por Mao Tse-Tung na República Popular da China, para iniciarem treino militar na Academia Militar de Nanquim: João Bernardo Vieira [Nino], Francisco Mendes, Constantino Teixeira, Pedro Ramos, Manuel Saturnino, Domingos Ramos, Rui Djassi, Osvaldo Vieira, Vitorino Costa e Hilário Gomes. | Data: 1961 | Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral | Tipo Documental: Fotografias


(1961), "Grupo de quadros do PAIGC recebidos por Mao Tse-Tung na República Popular da China", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43247 (2023-1-16)



(Detalhe: Reproduzido com a devida vénia... Legenda segundo o nosso colaborador permanente Cherno Baldé: "Na foto do grupo de Nanquim (China, 1961) estão presentes, a contar da esquerda, na fila da frente: Nino Vieira, um diplomata que não identifico, uma mulher que deve ser a companheira do diplomata (ou a tradutora, acrescentamos nós), o Presidente Mao Tse-Tung, Francisco Mendes (Tchico Té), Domingos Ramos, Osvaldo Vieira, Rui Djassi. Na segunda fila: Pedro Ramos, um diplomata Chinés, Vitorino Costa, Hilário Gomes, Constantino Teixeira (Tchutcho) e o Manuel Saturnino Costa".


1. Já aqui falámos de Vitorino Costa, Tem meia dúzia de referências no nosso blogue. De seu nome completo, Vitorino Domingos Costa, irmão de Manuel Saturnino da Costa (futuro primeiro ministro da República da Guiné-Bissau), foi morto, em 1962, antes do início oficial da guerra, por um grupo da CCAÇ 153, comandado pelo cap inf José Curto, na região de Quínara (nas proximidades de Darsalame ou perto de São João, não sabemos ao certo).

Sobre esta época, de 1962, em que o PAIGC começou a fazer trabalho de formação político-militar e a recrutar gente nas tabancas,  sobretudo nas regiões de Quínara e de Tombali, continuamos ainda a saber muito pouco. Faltam os testemunhos, orais e escritos, de um lado e do outro. Faltam os relatórios. Faltam as fotos.  

Mas sabe-se que  o ano de 1962 não começou bem para o PAIGC que viu, por exemplo, em Bissau (a "zona zero")  ser descoberto e preso o seu presidente (do Comité Central, nomeado já na prisão, pelo Partido), que vivia na clandestinidade, o Rafael Barbosa, de etnia papel, e com ele centenas de militantes e simpatizantes (100 dos quais serão depois deportados para o Campo de Chão-Bom, Tarrafal, ilha de Santiago, Cabo Verde)

De resto, era ainda escassa a presença do exército português no território. E a PIDE tinha acabado de se instalar. Por tudo isso, é um período que se presta a muita especulação. O filme do George/Jorge Freire ainda mostra uma Guiné relativamente idílica, calma, tranquila, onde se pode viver e viajar, em segurança, nomeadamente no leste, no chão fula. Mas por quanto tempo ? Quando deixa Nova Lamego, no leste,  e é colocado em Bedanda, no sul, em novembro de 1962, com a sua 4ª CCAÇ, o cap Jorge Freire ainda leva consigo a esposa. Mas em dezembro ela é obrigada a regressar a Portugal, por razões de segurança. 

2. Tudo indica que o 'comandante' Vitorino Costa terá morrido  na sequência de uma "ação punitiva" do nosso exército, depois de um conhecido comerciante de Empada ter sido assassinado barbaramente na estrada, no regresso de Darsalame para Empada. Mas não sabemos, ao certo, se há uma relação entre os dois acontecimentos.

Vitorino Costa e Manuel Saturnino Costa, além de irmãos,   eram dois dos históricos militantes enviados para a China para receber treino político-militar,  tendo sido inclusive  recebidos pelo então "grande timoneiro", Mao Zedong, em 1961 (Vd. foto acima). Eis a lista completa, por ordem alfabética,  do grupo dos "primeiros comandantes da guerrilha", formados na Academia Militar de Pequim (nenhum deles hoje vivo, o último a morrer foi o Saturnino Costa, em 2021):
  • Constantino Teixeira
  • Domingos Ramos
  • Francisco Mendes
  • Hilário Gomes,
  • João Bernardo Vieira (Nino)
  • Manuel Saturnino da Costa
  • Osvaldo Vieira
  • Pedro Ramos
  • Rui Djassi
  • Vitorino Costa

Sabemos que Vitorino Costa era um homem próximo de Amílcar Cabral (e de Luís Cabral) e que a sua morte foi sentida como um sério revés para a guerrilha, em preparação. Também Bobo Keita (ou Queita)  se refere ao seu nome, na sua biografia "De campo em campo", escrita por Norberto Tavares de Carvalho, (ed. autor, 2011).  É um dos seus vinte guerrilheiro do PAIGC  que morreram de morte violenta, e que ele evoca, no final do seu livro (p. 237):

(...) "Vitorino [o autor escreve Victorino ] Costa era responsável pela mobilização da zona de Quínara, Fulacunda, Tite, S. João [ correspondente então à Zona 8 do PAIGC - Bolama - Tite - Fulacunda - Buba - Empada - Darsalame.] .  

"Em plena campanha de recrutamento, foi pernoitar numa tabanca cujo chefe colaborava com os portugueses. Vitorino Costa foi denunciado.  Era no tempo daquele  que era conhecido como 'capitão Curto', um militar português muito temido pela população. O seu ultimato era conhecido: 'Fogo ou chapa'. O fogo significava um tiro na cabeça  e chapa referia-se ao emblema do Partido.  Quem era suspeito de pertencer ou de colaborar com o PAIGC, ou entregava o emblema ou era morto. 

"O capitão Curto, uma vez alertado  da presença de militantes do Partido na região, invadiu a tabanca com os seus homens.  Vitorino Costa viu-se  cercado e tentou defender-se com a única pistola que possuía. Naquele tempo , no princípio da luta, o Partido não dispunha ainda de armas. O combate era desigual. Depois de ter sido morto a tiro, foi decapitado e a sua cabeça enfiada num grosso ramo com o qual os portugueses exibiram a cabeça do nosso camarada, fazendo-a circular por toda a tabanca, ameaçando e intimidando a população a não colaborar com os 'turras' (...). Esta cena ocorreu antes do início da guerra. Foi em 1962". 

3. Luís Cabral, na suas memórias ( "Crónica da Libertação", Lisboa, O Jornal, 1984), tem uma versão ligeiramente diferente deste episódio (pp. 127/128);

(...) "No Centro-Sul, na região de Quínara, a situação também se tornava difícil. Depois da sua saída precipitada do Gabu  [onde foi cercado em Canquelifá, escapando por pouco às autoridades alertadas pelo chefe da tabanca, vd. pp. 115/117 ], Vitorino Costa tinha sido enviado a esta região para reforçar a equipa que já lá se encontrava . Instalou-se na área de Tite (...). 

"Vitorino era um jovem com muito orgulho e estava entre os quadros do Partido que tinham mais habilitações literárias. (...) Apercebia-se facilmente nele o desejo de fazer tudo para cumprir o melhor possível a sua missão em Quínara.

"Vitorino dormia com os seus homens na tabanca de S. Joana , na área de S. João  [gralha ?  seria Santa Maria ? não localizámos este topónimo, S. Joana,  na carta e São João, 1955, escala 1/50 mil], quando a casa foi cercada pelas tropas coloniais. O inimigo tinha conhecimento das nossas fracas possibilidades de defesa (...).

"No seu grupo, só o Vitorino tinha uma pistola e foi com ela  que conseguiu chamar a atenção das forças inimigas, às quais ainda resistiu corajosamente o tempo necessário para a retirada dos  seus companheiros.

"Gravemente ferido, (...) morria pouco depois,  O seu corpo, transportado num veículo,  foi levado pelas tropas coloniais a várias tabancas de Quínara. Ao seu companheiro  Seni Sambu,  cortaram-lhe a cabeça, que  foi exposta em Fulacunda, sua terra natal, em presença da sua própria mãe (...).


4. Não encontrámos uma única foto individual de Vitorino Costa no Arquivo Amilcar Cabral que, em boa hora, passou a estar disponível, para consulta, a partir de 20 de janeiro de 2013.  Na foto em grupo, tirada em Pequim, em 1961, e acima reproduzida, não temos a certeza de quem é o Vitorino Costa (nem a maior parte dos outros elementos do PAIGC).

De qualquer modo, sabemos que o capitão Curto e a sua CCAÇ 153 foram inimigos mortais do PAIGC. O Vitorino Costa (e mais alguns dos seus homens) terá sido  morto em meados de 1962 (talvez julho ou junho). 

A versão que sabíamos é que a tabanca onde foi abatido o Vitorino Costa seria em Darsalame, e a sua "cabeça" terá sido trazida para Tite, sede do BCAÇ 237.  Tratava-se de um "grande ronco" para as autoridades portuguesas em luta contra "o início da subversão", e foi seguramente um grande revés para o PAIGC (*) que, oficialmente, só vai começar a luta armada em 23/1/1963, com o primeiro ataque ao aquartelamento de Tite.

Falámos ao telefone, em tempos, em 2010,  com dois camaradas contemporâneos dos acontecimentos: o fur mil Octávio do Couto Sousa, da CCAÇ 153, de Ponta Delgada, e o José Pinto Ferreira, ex-1.º cabo radiotelegrafista, CCS/BCAÇ 237 (Tite, 1961/63), do Marco de Canaveses.   Infelizmente nenhum deles integra,  ainda hoje,  a nossa Tabanca Grande, apesar do nosso convite, e de já  termos publicado postes com o seu nome (**). Dada a delicadeza do assunto, o Octávio do Couto Sousa não nos autorizou, na altura, a publicação do seu depoimento; ele integrava o grupo do cap Curto que cercou, "em Darsalame" (sic),  o Vitorino Costa (menos de 30 homens).

Seria importante o testemunho de mais camaradas sobre estes acontecimentos do início (mal conhecido) da guerra. De qualquer modo, tanto o Octávio do Couto Sousa como o José Pinto Ferreira  reforçaram a ideia de que o  capitão Curto, pese embora a lenda a que está associada o seu nome na Guiné (mesmo ao fim de mais de meio século!), foi um militar destemido, corajoso e competente. (Temos 13 referências sobre este oficial, que infelizmente já faleceu em  18/11/2018, com o posto de ten gen ref.) 

No livro da CECA, não encontrámos qualquer referência a este episódio (Vd. Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 6.º volume:  Aspectos da actividade operacional. Tomo II: Guiné. Livro 1. Lisboa: 2014,  538 pp).

De qualquer modo, nunca é demais recordar que ao nosso blogue interessa apenas a verdade dos factos. E, como é nossa norma, não fazemos juízos de valor sobre o comportamento, individual, de nenhum combatente da guerra colonial na Guiné, muito menos dos nossos camaradas operacionais (de soldado a capitão). (***)

 Sobre a CCAÇ 153, escreveu o nosso camarada Octávio do Couto Sousa [Mafra, 1959, Tavira em 1959/60; furriel miliciano em 1960/61; sargento miliciano em 1962/63], em comentário ao blogue Rumo a Fulacunda, em 2/10/2008:

    (...) A Companhia 153 proveio do RI 13, de Vila Real, com cabos e praças daquelas redondezas, alguns com nomes das suas terras, o Vila Amiens, o Chaves, etc. Como disse no primeiro escrito, foi uma pena termo-nos separado em Vila Real, terminada a comissão, desejosos todos de partir para as nossas famílias, sem o cuidado de trocar endereços que nestes anos seriam preciosos para nos reencontrarmos. A maioria dos oficiais e sargentos foram mobilizados de outras zonas. No nosso caso e do João M. C. Baptista, estávamos já na disponibilidade e a viver nos Açores.

    O nosso Comandante de Companhia foi o Capitão, hoje General, José dos Santos Carreto Curto.

    Fomos a única companhia em todo o Sul da Guiné em 1961, com um pelotão em Buba e uma secção em Aldeia Formosa. Tivemos depois um pelotão em Cacine. Estivemos também aquartelados em Cufar numa fábrica de arroz, assim como em Catió, até que tudo se agudizou em termos operacionais. Para Buba chegou uma companhia, a 154, outra para Cacine e por muitas outras localidades foram chegando mais unidades consoante a guerra se intensificava.

    As fotos mostram o quartel de Tite onde se instalou o primeiro Batalhão, o 237, ao qual passámos a pertencer como tropa operacional e por questões de organização.

    Acompanhámos o primeiro ataque a Tite [em 23 de Janeiro de 1963], de Fulacunda saíram reforços nos quais estivemos integrados, visto que o Batalhão, como sede, não estava ainda operacional.

    A nossa companhia, a 153, acabou por ficar toda junta e em várias missões percorremos todo Sul na busca e destruição das casas de mato que o PAIGC proliferava por tudo quanto eram zonas mais ou menos isoladas. (...)


    5. Há uns largos anos atrás (mais de doze!), recebemos uma mensagem de um leitor nosso, guineense, que nunca chegámos a publicar... (Na altura, trabalhava localmente para as Nações Unidas.) Achamos oportuno fazê-lo agora, até na esperança de haver mais elementos informativos sobre este caso.

    De: Augusto Domingos  Costa <costa4@un.org>

    Data - quarta, 8/06/2011, 16:48

    Assunto -  Em busca de informações

    Caro Luís Graça!

    Saudações de uma longa vida a juntar e reconstruir memórias de um período agridoce e extremamente rico em termos de relacionamento humano entre nossos dois povos.

    Sou um cidadão guineense que vai lendo, sempre que possa, memórias plasmadas no vosso blogue. Mas interesso-me, neste momento, da história da CCAÇ 153, do lendário Cap Curto, Fulacunda, 1961/63. Já li o depoimento de José Pinto Ferreira, ex-1º Cabo Radiotelegrafista, acerca do Cap Curto não ter mandado cortar a cabeça do Victorino Domingos da Costa, e ter sido injustamente diabolizado com esse cunho. 

    Interesso-me também em saber a verdade, sem rancores nem mágoas, por esse Senhor que foi decapitado ser o primogénito da nossa família. Aguardo com serenidade o depoimento do ex-Fur Mil Octávio do Couto Sousa porque temos o objecto de encontrar as ossadas e trazê-las para Bissau.

    Um abraço,
    Augusto A. Domingos da Costa
    _______

    Notas do editor:


    (...)  Carta do futuro diplomata do PAIGC e da República da Guiné-Bissau, Gil Fernandes, a estudar em Boston, EUA, datada de 1/12/1962, dirigida a Amílcar Cabral. Começa nestes termos:

    "Caro Amílcar: Foi com grande consternação que recebi a sua última carta relatando a morte de Vitorino Costa. Eu e ele fomos grandes amigos e fui por algum tempo seu explicador. A sensação de choque  que se recebe perante acontecimentos desta natureza é absolutamente  indescritível, este é mais um crime que mais tarde os portugueses terão que dar conta. Imagino em que estado é que o Amílcar se deve encontrar, mas confio inteiramente na sua perseverança, agora é que é preciso mais coragem"  (...)"


    (...) "Fui telegrafista muito activo ao serviço do Comando do BCAÇ 237, o que me permitiu assimilar algumas verdades nunca desmentidas. Dito isto, peço que aceitem e reflictam no que se diz nos Postes acima referidos:

    (...) "O Comandante da CCAÇ 153 foi o Capitão José dos Santos Carreto Curto, aquartelado em Fulacunda. Era um oficial corajoso, visto como inimigo fidalgal pela Rádio Conakry. Nunca terá cortado cabeças a ninguém, mas tão só sido acusado injustamente de um acto menos digno que terá sido praticado por um seu subordinado no IN, morto quando fugia para o Rio. Actos repelentes, sem confirmação, não devem ser credibilizados." (...)

    Vd. também poste de 5 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19259: (D)o outro lado do combate (39): Vídeo de 2/3/2008 com entrevista a antigo guerrilheiro do PAIGC, contemporâneo do cerco a Darsalame, em julho de 1962, pelo grupo de combate da CCAÇ 153, comandado pelo cap inf José Curto (Luís Graça)

    (***) Último poste da série > 5 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23847: Casos: a verdade sobre... (32): o pós-25 de Abril no CTIG, as relações das NT com o PAIGC, a retração do dispositivo militar e a descolonização

    quinta-feira, 15 de setembro de 2022

    Guiné 61/74 - P23618: Bedanda, região de Tombali, no início da guerra - Parte II: Testemunho de Jorge (ou George) Freire, ex-cap inf, comandante da 4ª CCAÇ , no período de novembro de 1962 a maio de 1963



    Jorge Freire, ex-cap inf, que esteve na Guiné, em 1961/63, e desde então a viver nos EUA (aqui com a sua esposa), e onde é conhecido por George Freire, engenheiro e empresário. Desde julho de 2019, o seu blogue tem estado inativo. Esperamos que ele e a família estejam bem de saúde.

    Foto: © George Freire (2009). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


     

     Vídeo (9' 56'') George Freire > Nov 62 / mar 63 > Vídeo 2/3 > Nova Lamego, Buruntuma, Bissau, Cacine, Bedanda, Chugué... Os primeiros sinais da guerra, no sul da Guiné, em março de 1963: O primeiro morto, o primeiro prisioneiro, as primeiras transferências de população, ... A farda amarela, a mauser...Fauna local: a hiena, o crocodilo... O Rio Cumbijã...

    Inserido na conta do Virgínio Briote no You Tube / bra6567 (licar aqui, como alternativa, para visionar o filme)

    1. Todas as guerras tem um começo, um desenvolvimento e um fim... É como um rio, que é alimentado, desde a nascente, por mil e um riachos, ribeiras e outros rios... A guerra pela independência na Guiné, levada a cabo pelo PAIGC,  era perfeitamente previsível... Só restava saber a data,  a hora e o local do primeiro tiro, como viria a acontecer em 23 de janeiro de 1963, em Tite, pelas 01h45.

    Depois foi o jogo de xadrez... Nem sempre há xeque-mate, como foi o caso... Estupidamente, os dois contendores (e os seus estrategas, patrocinadores e  claques de apoio) deixaram a guerra / o jogo arrastar-se demasiado tempo, por onze (ou mais) longos anos. Acabou por se encontrar uma "solução política", esgotada a sorte das armas... que nem sempre protege os audazes.

    Recuemos, pois,  ao princípio imediato, passando por cima das complexas condições antecedentes (causas próximas e remotas), que isso fica para os historiadores... 

    Do lado português, é impressionante ver como uma  escassa força de algumas centenas de homens guarnecia, em agosto de 1962,  todo o sul da Guiné, compreendendo a região de Quínara (onde a guerra começou) e a região de Tombali, que era o celeiro da Guiné: Comando do BCAÇ 237 (Tite); CCAÇ 152 (Cacine, Gadamael Porto, Aldeia Formosa, Saltinho); CCAÇ 153 + Pel Caç 859 (Fulacunda);  1 Pel Caç / CCAÇ 84 (Empada e Cufat), 

    ZA (Zona de Acção) de Tite - Abrangia o sul com fronteira com a República da Guiné (*):
    • Comando do BCaç 237 (Tite); 
    • CCaç 152 (- Pel e 1 Sec) (Buba);
    • 1 Pel Caç / CCaç 152 (Cacine) com 1 Sec Caç (Gadamael Porto); 
    • 1 Pe1 Caç (-)/CCaç 152 (Aldeia Formosa) com 1 Sec Caç (Saltinho);
    • CCaç 153 (-1 Pel) e Pel Caç 859 (Fulacunda); 
    • 1 Pel Caç/CCaç 84 (- 1 Sec) (Empada) com 1 Sec Caç (Cufar); 
    • 4ª CCaç (-1 Pel e 1 Sec) (Bedanda) com 1 Pel Caç (Tite); 
    • 1 Sec Caç (Cacine); 
    • CIM: 2 Pel Caç (I) (Bolama); 
    • Pel Mort 19 (Tite);
    • Destac Man Mat 245 (Tite).

    Guiné > Dispositivo das NT em 8 de agosto de 1962.  Destaque para a ZA de Tite (que abrangia todo o sul, com fronteira com a Guiné-Conacri: umas escassas centenas de homens concentrados em Tite, Fulacunda, Bolama, Buba, Empada, Aldeia Formosa, Bedanda, Catió e Cacine:

    Infografia: CECA (2014) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné  (2022)

    Quatro meses depois, em 1 de janeiro de 1963, o  Sector Sul era guarnecido pelas seguinte forças,  parte delas do recrutamento local: 4ª CCAÇ + Pelotões de Caçadores Indígenas (*):
    • 1 Cmd BCaç, 1 Sec Caç Indígena (I) e 1 Pel Mort todos aquartelados em Tite;
    • 1 Pel Caç (+) em Aldeia Formosa
    • 2 CCaç (-2 Pel e 3 Sec) e 1 CCaç I (- 2 Pel e 4 Sec) em Bedanda
    • ClM, 1 Pel Caç (Pel Indígena - 1 Sec) em Bolama
    • 1 CCaç (-1 Pel) + 1 AMetr em Buba
    • 1 Cmd BCaç, 1 CCS (-1 Pel Rec Inf), 1 CCaç, 1 Sec Caç (Ind) e I Pel Mort todos aquartelados em Catió
    • 1 Pel Caç (1 Sec Ind) em Cabedú
    • 1 Pel Caç (l Sec Ind) em Caboxanque
    • 1 Pel Caç + 1 Sec Caç (Pel Ind) em Cacine
    • 1 Pel Rec Inf em Cufar
    • 1 CCaç (-3 Pel) + 1 Sec (1 Sec Ind) em Empada;
    • 1 CCaç + 1 Pel Caç + 1 AMetr em Fulacunda
    • 1 Pel Caç (-1 Sec), Pel Ind (- 2 Sec) em Chugué
    • 1 Pel Caç (1 Sec Ind) na Ilha das Galinhas.

    2. Contemporâneo destes acontecimentos, temos o Amadu Bailo Djaló (**), ex-sold condutor auto, que esteve em Bedanda, na 4ª CCAÇ durante o 1º semestre de 1963, antes de se oferecer, em 1964, para os Comandos do CTIG. Do que viu não gostou, nem teve saudades de Bedanda.  

    Verificamos agora que ele teve como comandante, nesse período, o ex-cap inf Renato Jorge Cardoso Matias Freire (ou só George Freire, como é conhecido nos EUA, para onde emigrou logo em meados de 1963, e na nossa Tabanca Grande, onde ingressou em 29/12/2008).

    Da leitura do diário da Guiné, de George Freire,  depreende-se que houve um rápido alinhamento da população local, com os fulas a mostrarem-se leais às autoridades portuguesas e os balantas (e outros: biafadas, nalus...) a ficarem do lado do PAIGC...  Ficamos a saber, por exemplo, que a população (fula) de Bedanda, em meados de 1965, ao tempo do cap inf Aurélio Manuel Trindade, era fundamentalmente oriunda do Cantanhez, e mais concretamemte de Iemberém (no nosso tempo, Jemberém).

    Houve seguramente terror e contraterror nestas ações de ambos os lados, nos primeiros tempos da guerra. Mas repare-se que os prisioneiros feitos pela 4ª CCAÇ eram  entregues ao batalhão (o George Freire não o identifica, claramente, mas seria o BCAÇ 356). 

    Por outro lado, um dos alvos privilegiados da ação da guerrilha são as casas comerciais, a Ultramarina (ligada ao BNU) e à Gouveia (pertencente à CUF)... O PAIGC apropriara-se, em Cafine, em 25 de março de 1963, do navio "Mirandela", pertencente da casa à Gouveia,  e do navio "Arouca",  da casa Brandão (serão depois utilizados  para transporte de pessoal e material em águas da Guiné-Conacri).

    A produção de arroz vai decrescer drasticamente nos anos seguintes. A importação de arroz mais do que triplica de 1962 (c. 9 mil toneladas) para 1964 (c. 30 mil toneladas). A Guiné nunca mais será a mais a mesma, depois do ataque de Tite, em 23 de janeiro de 1963. As comunicações (por terra e por rio), em particular, tornaram-se impossíveis ou difíceis.

    (...) A situação no Sul piorava. O inimigo actuava então em quase todo o sector, aproveitando o facto de serem muito escassos os efectivos militares. As deslocações destes tornaram-se cada vez mais difíceis, em face das obstruções das principais estradas da região. Em 2/3Abr, o ln atacou por três vezes o aquartelamento do Destacamento do Chugué; assassinou nativos e régulos que resistiam ao aliciamento; no dia 07, atacou elementos militares em reconhecimento na região de S. Miguel Balanta; em 21, numeroso grupo inimigo opôs forte reacção à CCaç 414, nas ilhas de Caiar e Como. Em 22, o ln atacou por duas vezes forças militares que actuavam em Jabadá.

    Esta actividade do ln levava a admitir que, no Sul da Província, só estavam efectivamente sob controlo das autoridades as populações que viviam próximo das guarnições militares; as mais afastadas consideravam-se sujeitas à pressão do ln, como é natural em guerra subversiva" (Fonte_ CECA, 2014, pág. 92).

    Todos estes topónimos, citados pelo George Freire, no seu diário, são-nos familiares, para muitos de nós: Bedanda, Cabedu, Caboxanque, Cacine, Cadique, Cafal, Cafine, Catió, Chugué, Jemberem, Mejo, Salancaur...  Ainda não se falava de Guileje nem de Gadamael... Repare-se que há tabancas que vão ser logo de imediato abandonadas (caso de Jemberém, cuja população fula é transferida então pela 4ª CCAÇ  para Bedanda), 

    Achámos oportuno voltar a publicar este documento que, a par do testemunho escrito do Amadu Djaló, nos ajuda a perceber a rápida degradação da situação mlitar no sul da Guiné, nos primeiros seis meses de 1963.

    2. O testemunho de George Freire [ex-cap inf Jorge Freire, da CCAÇ 153, da 3ª CCAÇ e da 4ª CCaç, Fulacunda, Nova Lamego, Bissau, Bedanda, 1961/63; hoje engenheiro, a viver desde agosto de 1963 nos EUA]

    (...) "Durante o Natal de 1961 a minha mulher veio passar um mês a Bissau onde eu estava na altura a comandar uma companhia de nativos. 

    Em Julho de 1962 a minha mulher voltou para a Guiné e passou quase 3 meses no Gabu (Nova Lamego), onde eu comandei uma companhia mista [3ª CCAÇ, futura CCAÇ 5, "Gatos Prertos", a partir de 1/4/1967, Canjadude, 1967/1974]. 

    Do Gabu fui transferido para Bedanda   [4ª CCAÇ, futura CCAÇ 6, "Onças Negras", a partir de 1/4/1967, Bedanda, 1967/1974], onde ela ainda passou quase um mês, mas nos fins de Dezembro tive que a mandar de volta a Portugal pois as coisas começaram a aquecer demais. (...) 


    O meu Diário da Guiné
     
    por George Freire

    Como história, transcrevo partes de um diário que encontrei no meio de papelada antiga numa gaveta da minha secretária. A primeira entrada no diário foi no dia 31 de janeiro de 1963 e a última, no dia 28 de maio do mesmo ano. Aqui vai:

    31/1/63:

    Ataque de terroristas aos Fulas de Jemberem 
    [no original, Emberém, hoje Iemberém]. Mataram o chefe da tabanca e outros 6 Fulas.

    2/2/63:

    Acção em Boche Falace pelas minhas forças de Emberém. Um grupo de terroristas balantas em fuga deixou grande quantidade de arroz cozido (!).

    6/2/63:

    O nosso destacamento em Salancaur foi atacado às 00:30. Tivemos baixas: um furriel e um soldado foram mortos do nosso lado e vários terroristas foram abatidos. 
    [O furriel foi o José do Rego Rebelo, açoriano de Ponta Delgada, CCAÇ 274 / BCAÇ 237; foi o segundo  furriel miliciano a morrer no TO da Guiné].

    Nesta mesma noite, também atacaram o nosso destacamento em Cacine, mas felizmente não houve baixas a assinalar.

    8/2/63:

    Fui a Bissau tratar de vários assuntos da Companhia [4ª CCaç].

    9/2/63:

    Volta de Bissau. Manga de trabalho em atraso devido as acções dos últimos dias. Recebemos informação de que vários terroristas passaram ao largo, vindo de Catió para a zona de Cacine. As instalações da Ultramarina foram assaltadas e o encarregado europeu foi morto.

    10/2/63:

    Lista de material extraviado em combate: 1 capacete em Chugué, 1 espingarda Mauser e 1 pistola-metralhadora em Jemberem.

    Esta madrugada as instalações da Gouveia em Salancaur foram atacadas. Os terroristas levaram cerca de 10 toneladas de arroz e outros géneros de comida.

    11/2/63:

    Efectuámos acções em Jemberem, Salancaur e Cadique. 

    Vários elementos terroristas que tinham tomado parte no assalto aos Fulas de Jemberem foram aprisionados e enviados para a sede do Batalhão.

    12/2/63:

    Um alfaiate mandinga, Mamude Djassi, que tinha sido aprisionado em Chacual pelos terroristas e que passou vários dias num dos seus acampamentos, conseguiu fugir e apresentou-se ao nosso destacamento do Chugué. Foi transportado para o nosso quartel em Bedanda. Enviei um rádio para o Batalhão para que este Mandinga possa ser aproveitado como guia na acção que está a ser preparada pelo Batalhão.

    13/2/63:

    Enviei um pelotão para Salancaur para proteger o embarque de arroz da Ultramarina e da Gouveia.

    14/2/63:

    Patrulhamento feito em Jemberem e Cadique. Nesta última povoação tivemos contacto com terroristas Balantas que puseram alguma resistência mas acabaram por fugir. Três foram abatidos.

    15/2/63:

    O nosso quartel em Bedanda foi visitado por 3 directores da CUF, procurando informações do que se está a passar na região. 

    Nessa mesma altura, terroristas rebentaram um pontão na estrada de Catió junto de Timbo

    Houve também grande tiroteio em Chugué e algumas explosões na estrada próxima da área. 

    Os 3 directores ficaram bem informados do que se está a passar...

    16/2/63:

    Chegou o Pelotão de acompanhamento da Companhia 273. Uma patrulha das nossas forças do Chugué foi atacada por um grupo armado de pistolas-metralhadoras. Não sofremos baixas mas 2 terroristas foram abatidos.

    Regressou à base o Pelotão destacado em Salancaur. Foi rendida por novas forças a Secção que se encontrava destacada em Emberém.

    17/2/63:

    Continuaram a chegar mais elementos da companhia 273.

    18/2/63:

    Reconhecimentos feitos a Salancaur, Jemberem e Cadique

    Aprisionámos alguns dos elementos que tinham atacado o nosso destacamento de Salancaur.

    22/2/63:

    Fomos visitados aqui em Bedanda pelo Comandante Militar e pelo Major Mira Dores, durante a altura em que tínhamos começado uma acção no mato de (Nhairom?), com 2 pelotões da CCaç 273 e 1 Pelotão da minha Companhia.

    23/2/63:

    Regresso da acção. Pobres resultados. Foram encontrados vários acampamentos terroristas, abandonados mas com indícios de terem sido ocupados recentemente. 

    Foi rendida a secção de Jemberem.

    25/2/63:

    Reconhecimento feito em Salancaur e Mejo. O Capitão Delfino, Comandante da Companhia que substituiu a CCaç 74, visitou-nos, para discutirmos colaboração.

    26/2/63:

    Outra visita pelo Comandante Militar e o Comandante da Força Aérea, para discussão sobre a colaboração da FA na próxima operação que iremos executar. Pormenores foram discutidos em detalhe.

    27/2/63:

    O Capitão Relvas veio da sede do Batalhão visitar-nos em Bedanda. Aparentemente, o Comandante do Batalhão está chateado por não ter sido consultado nos detalhes de apoio pela FA. e tomou a decisão de fazer a operação sem esse apoio. (Incompreensível!).

    A acção começará esta noite a partir das 00:04.

    A acção terminou pelas 15:00 do dia 28/2/63. Os resultados que poderiam ter sido bastante satisfatórios, foram praticamente nulos, pois vários grupos de terroristas conseguiram, (devido a configuração e extensão do terreno de acção), fugir e dispersar. Se a FA tivesse colaborado os resultados teriam sido tremendos, pois o número de terroristas que conseguiram infiltrar-se entre as nossos forças foi considerável. (Esta foi a opinião de todos os comandantes de pelotão directamente envolvidos na acção. Na área onde a minha companhia actuou, notamos exactamente os mesmos resultados).

    É evidente que os terroristas foram avisados da operação a tempo de poderem debandar. Nada me admira, pois temos um número considerável de soldados nativos, incluindo Balantas...


    1/3/63:

    Hoje pela 09:30 e mais tarde pelas 14:30, pessoal do pelotão do Cabedú sofreu emboscadas respectivamente entre Cafal e Cafine e no cruzamento de Cabante. Na segunda emboscada sofremos um morto e um ferido. Uma viatura Chaimite 
    [lapso: talvez Daimler ou Fox ou White, não havia Chaimites em 1963], foi destruída na primeira emboscada. Seguiram dois pelotões reforçados para os locais das emboscadas.

    Em Impungueda uma patrulha da CCaç 859 travou contacto com os terroristas e feriu alguns e os outros conseguiram fugir.

    2/3/63:

    Durante parte do dia de ontem e durante todo o dia de hoje as nossas forças percorreram todo o terreno nas zonas das emboscadas. Encontraram vestígios dos atacantes, fizeram um prisioneiro que tinha tomado parte numa das emboscadas, mas nada mais. O soldado ferido seguiu de avião para Bissau e o morto foi enterrado no cemitério de Bedanda.

    O prisioneiro foi interrogado mas poucas informações conseguimos. Foi enviado para o Batalhão para ser interrogado.

    3/3/63:


    O Comandante Militar veio cá hoje de avião com o segundo Comandante do Batalhão 356. Depois de informados dos acontecimentos dos últimos dias, seguiram para Catió.

    4/3/63:

    Recebemos informação do Batalhão de um possível ataque planeado pelos terroristas a Caboxanque e Jemberem.

    Enviei dois pelotões para Jemberem e Cadique, ponto de onde, segundo a informação, os terroristas se estavam a organizar para os ataques. Em Caboxanque executámos acções por um pelotão da minha companhia e outro da CCaç 273.

    6/3/63:

    Fizemos um reconhecimento à zona de Jemberem. O Alferes Gonçalves encarregou-se de falar aos chefes Fulas de Jemberem e discutir a possível mudança das suas tabancas para Bedanda. Há toda a vantagem dessas mudanças para incrementar a protecção da população Fula. Poderemos também formar aqui e em Bedanda um pelotão de uns 40 Fulas, o que nos poderá ajudar substancialmente na segurança da área e aliviar as nossas forças. Os chefes Fulas aceitaram a nossa oferta de braços abertos.

    7/3/63:

    Começámos o transporte da população Fula de Jemberem. Usámos 10 viaturas neste movimento. Calculamos que serão necessárias 3 mais viagens semelhantes.

    8/3/63:

    Continuação do transporte dos Fulas. Seguiram dois pelotões da CCaç 273 para a região de Salancur.

    9/3/63:

    Continuação do transporte dos Fulas. Os pelotões da CCaç 273 continuaram a operar na região de Salancur.

    Elementos Fulas de Emberem conseguiram aprisionar um nativo que sabiam estava ligado ao movimento terrorista. Quando este nativo (Balanta) foi interrogado aqui na Companhia, deu-nos a informação de que elementos terroristas estão no mato de Boche Falace a prepararem um ataque àquela povoação. Enviámos um pelotão da CCaç 273 para a área.

    Recebemos também informação, por elementos do Chugué, que um grupo de terroristas bem armado estava concentrado do outro lado da fronteira com a Guiné Francesa, perto da zona de Banta-Sida.

    Mais informações recebidas do pelotão de Emberem: cerca de 300 elementos terroristas estavam a preparar um ataque à nossa companhia em Bedanda na madrugada de amanhã.
    Dei ordens para que todo o nosso pessoal, (estávamos um pouco desfalcados pois tínhamos 2 pelotões em operações longe de Bedanda), estar em alerta em posições defensivas, já há muito preparadas para eventualidades semelhantes. Foi uma longa noite de nervos, mas o ataque nunca se deu.

    10 e 11/3/63:

    Acabámos o transporte dos Fulas de Emberem para Bedanda, contudo ainda teremos que transportar abastecimentos e víveres que ainda lá ficaram, em especial uma grande quantidade de arroz. 

    Os Fulas fizeram um outro prisioneiro que, após interrogado, nos deu boas informações sobre o grupo terrorista que tem actuado na zona de Boche Falace: nomes de comandantes, armamentos e locais aproximados do grupo. Este prisioneiro foi enviado para o batalhão.

    13/3/63:

    Recebemos novas informações sobre um outro possível ataque ao nosso aquartelamento no dia 16 ou 17.

    O Benfica venceu o Dukla de Praga para a Taça dos Campeões Europeus. Ouvimos o relato no rádio.

    15/3/63:

    Chegou um pelotão da CCaç 417 que seguirá para Caboxanque. Enviei uma grande coluna de 10 viaturas para Jemberem para trazer o resto dos víveres pertencentes aos Fulas.

    16/3/63:

    O pelotão da CCaç 417 seguiu para Caboxanque para render o Pelotão 859.

    18/3/63:

    Chegou o Pelotão 859 que seguirá para Bafatá. A CCaç 273 partiu para Jemberem em operações, não se sabendo por quantos dias.

    19/3/63:

    Visita do Major Pina para discutir os pormenores do movimento dos Pelotões 859, 870 e 871 para Bafatá. Eu irei a comandar a coluna e voltarei para Bedanda de avião.

    20/3/63:

    O Alferes Mendes seguiu com um pelotão para o Chugué dentro do novo plano de ordenamento dos dispositivos.

    22/3/63:

    Cabedú enviou uma mensagem informando que os terroristas estavam a planear uma emboscada às viaturas da CCaç 273 que se tinham deslocado para a região de Darsalame. Enviei imediatamente um rádio para o Capitão Gaspar com todos os detalhes da informação.

    23/3/63:

    Chegou outro pelotão da CCaç 417. Seguirá amanhã para Cabedú para render o Pelotão 871, que virá para Bedanda e depois para Bafatá na minha coluna.

    (...) O meu diário, cobrindo os acontecimentos que se passaram entre a minha partida para Bafatá com a coluna, a minha vinda de retorno a Bedanda e as semanas até ao dia 18 de Maio, extraviou-se, infelizmente.

    Lembro-me de alguns detalhes de possíveis ataques a Bedanda que, felizmente, nunca se concretizaram. Nós estávamos muito bem preparados, com todo o terreno à volta do aquartelamento (cerca de uns 150 metros), completamente limpo de arvoredo e vegetação.

    Tínhamos os morteiros de 60 todos treinados nas áreas prováveis de ataque, além de explosivos enterrados e comandados à distância. Bem no fundo, eu estava com esperança de que os terroristas tentassem um ataque, pois seriam totalmente aniquilados, mas nunca aconteceu, possivelmente porque eles sabiam que tal acção seria muito difícil e arriscada.

    No dia 18 de maio, o Capitão Nelson (meu colega de curso) (****) veio render-me. Durante os 4 dias seguintes fiz a entrega da 4ª CCaç ao Nelson e no dia 21 de maio segui de avião para Bissau.

    Ai estive à espera de transporte e finalmente no dia 27 de maio parti de volta a Portugal no navio da CUF “Ana Mafalda”.




    Curso finalista da Escola do Exército (hoje, Academia Militar) do ano de 1955, do qual faziam parte (além do George Freire, com 75 anos de idda em 2008, residente nos EUA, antigo comandante da 4ª CCAÇ - Fulacunda, Bissau, Nova Lamego Bedanda, Maio de 1961/ Maio de 1963),  os seguintes oficiais reformados do exército português: generais Hugo dos Santos, António Rodrigues Areia, Adelino Coelho e António Caetano; coronéis João Soares, Costa Martinho e Maurício Silva, entre tantos outros.  O capitão José Manuel Carreto Curto, ex-cap inf, CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63) era "do curso um ano mais velho do que o meu". (Faleceu em 18/11/2018, com ten gen ref.)

    Foto (e legendagem): © George Freire (2008). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

     ___________

    Notas do editor:

    (*) Fonte: Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 6.º volume: Aspectos da Actividade Operacional. Tomo II: Guiné. Livro I. Lisboa: 2014, pp. 62 e 88.


    (***) Vd. poste de 27 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11011: Efemérides (119): Diário de George Freire, ex-comandante da 4ª CCAÇ (Bedanda, 1962/63): o início da guerra no sul do CTIG (jan / mar 1963)...Recordando topónimos que nos são familiares: Cabedu, Caboxanque, Cacine, Cadique, Cafal, Cafine, Catió, Chugué, Jemberém, Mejo, Salancaur...

    Vd. também poste de 24 de janeiro de  2013 > Guiné 63/74 - P10996: Efemérides (117): O início da guerra no CTIG há 50 anos: Nova Lamego, Bissau, Bedanda... O paraíso... perdido (set 62/mai 63): filme de George Freire, ex-cap inf QP, a viver nos EUA há meio século (Virgínio Briote / Luís Graça)

    (****) Comandantes da 4ª CCAÇ (Bolama, Buba e Bedanda, 1958/67): Cap Inf Manuel Dias Freixo | Cap Inf António Ferreira Rodrigues Areia | Cap Inf António Lopes Figueiredo | Cap Inf Renato Jorge Cardoso Matias Freire (membro da Tabanca Grande, onde é conhecido como George Freire)| Cap Inf Nelson João dos Santos | Cap Mil Inf João Henriques de Almeida | Cap Inf Alcides José Sacramento Marques | Cap Inf João José Louro Rodrigues de Passos | Cap Inf António Feliciano Mota da Câmara Soares Tavares | Cap Inf Aurélio Manuel Trindade 

    quinta-feira, 25 de agosto de 2022

    Guiné 61/74 - P23553: Notas de leitura (1478): "Panteras à solta", de Manuel Andrezo (pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade): o diário de bordo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro comandante da CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67): as aventuras e desventuras do cap Cristo (Luís Graça) - Parte I: "Os alferes não gostaram do novo capitão. Acharam-no com cara de poucos amigos."






    Capa e contracapa do livro "Panteras à solta: No sul da Guiné uma companhia de tropas nativas defende a soberania de Portugal", de Manuel Andrezo, edição de autor, s/l, s/d 
    [c. 2010 / 2020] , 445 pp. , il. [ Manuel Andrezo é o pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade, ex-cap inf, 4ª CCAÇ / CCAÇ 6, Bedanda, jul 1965/ jul 67. ]

    Na foto acima, da capa, o "capitão Cristo, sentado ao centro, na casa do Zé Saldanha  [encarregado da Casa Ultramarina, em Bedanda, e onde se comia lindamente, graças aos dotes culinários da esposa, a balanta Inácia] . Por trás, em pé, os alferes Carvalho e Ribeiro e ainda o Zé Saldanha" (legenda, pág. 440).

    1. Um exemplar autografado, dedicado ao cor inf ref Arada Pinheiro,   foi-me emprestado por este para leitura e recensão no blogue. 

    O teor da dedicatória é o seguinte:  "Ao meu amigo Pinheiro com muito respeito e consideração para que se lembre sempre da Guiné, terra que ambos admiramos. 13/12/2020. Aurélio Trindade. " O Arada Pinheiro esteve no CTIG, como major inf, entre 1971 e 1973. E é um ano mais velho do que o autor, na Escola do Exército (é de 1951).

    O livro, composto por cerca de 70 curtos capítulos, pode ser considerado como um "diário de  bordo", embora não datado, do autor (ou do seu "alter ego"), que foi o último comandante da 4ª CCAÇ e o primeiro da CCAÇ 6 (a 4ª Companhia de Caçadores passou, a partir de 1 de abril de 1967, a designar-se por CCAÇ 6 ("Onças Negras"), conforme fichas de unidade que publicamos abaixo).

    A intensa atividade operacional é intercalada com pequenas, saborosas (e algumas pícaras=  histórias do quotidiano do quartel, da tabanca e seus "vizinhos"...

    Já li as primeiras sessentas páginas, com prazer e apreço. O estilo narrativo é poderoso. Seco, assertivo, direto, às veses quase telegráfico. A escrita é, visivelmente, de um militar, com experiência operacional, e forte espírito de liderança, que quer "chegar, ver e vencer", mas que vai encontrar uma companhia em farrapos (equipada ainda com a velha Mauser, sem fardas novas, mal alimentada, isolada, desmoralizada, mal vista pelo comando do setor, sediado em Catió). 

    É decididamente um militar que sabe que uma companhia vale pelo seu comandante operacional, e que quer fazer jus à sua divisa "Aut Vincere Aut Mori"  (Vitória ou Morte). Pelo que nos é dado inferir da leitura das primeiras dezenas de páginas, é um militar de "mão cheia", para usar uma expressão cara ao cor inf ref Arada Pinheiro, e que não regateia apoio aos seus soldados, mesmo que com isso tenha que enfrentar a incompreensão e até a desconfiança da hierarqui militar (em Catió e em Bissau). 

    Antes de devolver o exemplar que foi me emprestado pelo cor Arada Pinheiro, quero ver se faço algumas notas de leitura, partilhando-as com os nossos leitores. Julgo que o livro está fora do  mercado livreiro habitual, não sendo de fácil acesso. Não consta, pelo menos, na Porbase (Base Nacional de  Dados Bibli0gráficos). O seu interesse documental, para nós, antigos combatentes da Guiné, é por demais evidente. É um período (1965/67) ainda mal conhecido, e a 4ª CCAÇ tem menos de 20 referências no nosso blogue. Já a CCAÇ 6 (extinta em 20 de agosto de 1974) tem mais de uma centena de referências.

    Grande parte da narrativa, que segue um fio cronológico,  é constituída por episódios, entrecortados por muitos diálogos, sendo o principal protagonista o cap Cristo, "31 anos de idade, natural da Beira Alta, nascido e criado entre o duro granito da serra do Caramulo". É casado e pai de três filhos. Partiu no T/T Niassa, de Lisboa, em 30 de junho de 1965, com destino ao CTIG. 

    Vai em rendição individual. Tem já duas comissões no Ultramar: Índia e Moçambique (donde acabara de regressar há 10 meses). (...) "Vai triste. (...) À sua frente o desconhecido. Sabe apenas que vai para a Guiné onde a guerra é dura. " (...) (pág. 7). 

    Chega a Bissau a 5 de julho de 1965. E no dia seguinte, parte de imediato para Bedanda, de avioneta civil, com o cap Xáxa (a quem vai render), para tomar posse como novo comandante  da 4ª CCAÇ. O cap Xáxa fará as honras da sua apresentação aos militares e aos civis de Bedanda. E rapidamente a guerrilha do PAIGC (e a populaçao sob o seu controlo) vai passar a conhecê-lo e a temê-lo.

    As primeiras impressões não foram favoráveis: "Os alferes não gostaram do novo capitão. Acharam-no com cara de poucos amigos. Nem se sequer se atreveram a praxá-lo, uma tradição muito cara à companhia" (...) (pág. 13).

    (Continua)


    Fichas de unidade > 4ª  Companhia de Caçadores

    Identificação; 4ª CCaç

    Cmdt (a) : Cap Inf Manuel Dias Freixo | Cap Inf António Ferreira Rodrigues Areia | Cap Inf António Lopes Figueiredo |Cap Inf Renato Jorge Cardoso Matias Freire (membro da Tabanca Grande)| Cap Inf Nelson João dos Santos | Cap Mil Inf João Henriques de Almeida | Cap Inf Alcides José Sacramento Marques | Cap Inf João José Louro Rodrigues de Passos | Cap Inf António Feliciano Mota da Câmara Soares Tavares | Cap Inf Aurélio Manuel Trindade

    (a) Os Cmdts Comp são apenas indicados a partir de 1Jan61

    Divisa: "Aut Vincere Aut Mori"

    Início: anterior a 1jan61

    Extinção: 1abr67 (passou a designar-se CCaç 6)

    Síntese da Actividade Operacional

    Era uma subunidade da guarnição normal, com existência anterior a 1jan61 e foi constituída por quadros metropolitanos e praças indígenas do recrutamento local, estando enquadrada nas forças do CTIG então existentes.

    Em 1jan61, estava instalada em Bolama, com um pelotão destacado em Bedanda

    Em 8abr61, iniciou o deslocamento para Buba, onde foi colocada temporariamente, a partir de 6mai61. Em 3jul61, foi transferida para Bedanda, mantendo um pelotão em Buba, até à chegada da CCaç 152, em 28jul61.

    Entretanto, iniciou a instalação de forças em várias localidades da zona Sul, nomeadamente em Bolama, Bedanda, Cacine, Aldeia Formosa, Gadamael e Tite, as quais foram recolhendo à sede após substituição por outras forças, ou sendo deslocadas, para outras localidades, como Catió, Chugué e Caboxanque

    A partir de 25jul61, foi integrada no dispositivo e manobra do BCaç 237 e depois sucessivamente no dispositivo dos batalhões e comandos instalados no sector. Tomou ainda parte em diversas operações realizadas nas regiões de Caboxanque, Chugué, Bochenan, entre outras.

    Em 1abr67, passou a designar-se por CCaç 6.

    Observações - Não tem História da Unidade. Em diversos documentos, esta subunidade era
    muitas vezes designada por 4ª CCaç I.

    Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: fichas das unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pp. 625- 626




    Fichas de unidade > Companhia de Caçadores nº 6

    Identificação:  CCaç 6
    Cmdt: Cap Inf Aurélio Manuel Trindade | Cap Inf Renato Vieira de Sousa | Cap Inf Rui Manuel Gomes de Mendonça | Cap Art Ricardo António Tavares Antunes Rei | Cap Inf António Bernardino Fontes Monteiro | Cap Cav Carlos Domingos de Oliveira Ayala Botto | Cap Inf Gastão Manuel Santos Correia e Silva | Cap Inf Jorge Alberto Ferreira Manarte | Cap QEO Elísio José Brandão Alves Pimenta | Cap Mil Inf António Manuel Rodrigues
    Início: 01abr67 (por alteração da anterior designação de 4ª CCaç) | Extinção: 20ago74

    Síntese da Actividade Operacional

    Em 1abr67, foi criada por alteração da designação anterior de 4ª CCaç.

    Era uma companhia da guarnição normal do CTIG, constituída por quadros metropolitanos e praças indígenas do recrutamento local.

    Continuou instalada em Bedanda, onde detinha a responsabilidade do respectivo subsector e se integrava no dispositivo e manobra do sector do BCaç 1858, ficando sucessivamente na dependência dos batalhões e comandos ali instalados. 

    Por períodos variáveis, destacou temporariamente pelotões para reforço de outras guarnições, sendo especialmente orientada para a realização de acções nas regiões de Bantael Silá, Nhai, Bochenan e Flaque Injã, entre outras.

    Em 20ago74, sendo substituída na responsabilidade do subsector de Bedanda por forças do BArt 6520/73, foi desactivada e extinta.

    Observações -  Não tem História da Unidade.


    Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: fichas das unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 630.

    __________

    Nota de leitura:

    Último poste da série > 22 de agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23544: Notas de leitura (1477): "A Guerra de Bissau, 7 de Junho de 98", por Samba Bari, um guineense diplomado em Relações Internacionais pela Universidade Lusíada; Sinapis Editores, 2018 (1) (Mário Beja Santos)

    sexta-feira, 30 de novembro de 2018

    Guiné 61/74 - P19247: In Memoriam (331): O Tenente-General de Infantaria José dos Santos Carreto Curto, ex-Comandante da CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63), faleceu hoje, 30 de Novembro de 2018, no Hospital das Forças Armadas de Lisboa

    IN MEMORIAM


    Tenente-General José dos Santos Carreto Curto
    Ex-Capitão, CMDT da CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63)


    1. Mensagem de Ana Filipa Curto, filha do Tenente-General José dos Santos Carreto Curto, com data de hoje, 30 de Novembro:

    Olá, muito boa noite,

    O meu nome é Ana Filipa Curto e sou a filha mais velha do Tenente-General José dos Santos Carreto Curto. Encontrei os vossos endereços de email no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné e estou a contactar-vos no sentido de vos comunicar a notícia de que o meu pai infelizmente faleceu hoje de manhã no Hospital das Forças Armadas em Lisboa.


    Como sei que o meu pai tinha uma ligação muito forte com a Companhia 153 da Guiné, gostaria igualmente de solicitar a vossa ajuda no sentido de contactar os seus camaradas para lhes transmitir esta triste noticia, bem como pedir os contactos telefónicos daqueles que gostariam de assistir às cerimónias fúnebres que irão ter lugar muito brevemente (amanhã à hora do almoço já terei mais pormenores que vos transmitirei igualmente via email).(*)

    Agradecendo desde já a vossa vossa atenção, ajuda e gentileza, despeço-me cordialmente,

    Ana Filipa Curto


    Vila Real  > RI 13 > Agosto de 1963 >  CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63) > O regresso a casa... Na foto, o 1.º pelotão... Repare-se no fardamento, o caqui amarelo... O Comandante era o então Cap Inf José dos Santos Carreto Curto,  Ten-General reformado, natural de Castelo Branco, que faleceu ontem em Lisboa. O então Cap Inf José Curto foi o primeiro Comandante da CCAÇ 153, e era contemporâneo do George Freire (e do seu curso da Escola do Exército), que deixou a carreira militar e emigrou para os EUA. Seu nome completo: Renato Jorge Cardoso Matias Freire,  esteve na CCAÇ 153 - mas também comandou a 3.ª CCAÇ Indígena (a antecessora dos Gatos Pretos) e a 4.ª CCAÇ Indígena, antecessora da CCAÇ 6, sediada em Bedanda.

    Foto: © João Baptista (1938-2010), autor do blogue Fulacunda.  Todos os direitos reservados [Edição e legendagem:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


    2. Já aqui falámos do primeiro grande revés que o PAIGC sofreu, com a morte de Vi(c)torino Costa, Vitorino Costa foi morto, numa emboscada em 1962, antes do início oficial da guerra, por um grupo da CCAÇ 153, comandado pessoalmente pelo Cap Inf José Curto, na região de Quínara, nas proximidades de Darsalame. (**)

    Victorino Domingos Costa e o seu irmão, Manuel Saturnino da Costa (, futuro primeiro-ministro da República da Guiné-Bissau), foram dois  dois dos históricos militantes enviados para a China para receber treino político-militar, juntamente com João Bernardo Vieira (Nino), Francisco Mendes, Constantino Teixeira, Pedro Ramos, Domingos Ramos, Rui Djassi, Osvaldo Vieira e Hilário Gomes, tendo sido recebidos pelo "grande timoneiro", Mao Zedong, em 1961.

    Infelizmente temos poucas referências, no nosso blogue, ao Cap Curto (8) e à  sua CCAÇ 153 (17). E não temos nenhum camarada vivo, registado como membro da Tabanca Grande. Apresentamos à filha e demais família e amigos, bem como aos camaradas, ainda vivos, da CCAÇ 153, as  nossas condolências pela morte de mais um bravo da Guiné.


    3. Actualização da notícia:

    Mensagem recebida hoje, 1 de Dezembro, no nosso Blogue:

    Caro Carlos Vinhal,
    muito obrigada desde já pelas suas condolências e pela sua disponibilidade.
    Agradeça em meu nome aos Editores da Tertúlia do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

    O meu pai estará em Câmara Ardente na Capela da Academia Militar em Lisboa hoje a partir das 18h30 (entrada pelo Paço da Rainha), sendo que amanhã dia 02 de dezembro será celebrada missa de corpo presente pelas 16:00 Horas, prosseguindo depois para cremação no Cemitério do Alto de São João.

    Muito obrigada desde já e até breve,
    Ana Filipa Curto
     ____________

    Notas do editor

    (*) Último poste da série de 11 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19089: In Memoriam (330): Diamantino Gertrudes da Silva (1943-2018), ex-comandante da CCAÇ 2781 / BCAÇ 2927 (Bissum, 1970/72), "capitão de Abril", escritor (Carlos Matos Gomes)

    (**) Vd. poste de 25 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11005: Efemérides (119): A morte do comandante Vitorino Costa, um revés para o partido de Amílcar Cabral, em 1962, ainda antes do início oficial da guerra

    quarta-feira, 23 de setembro de 2015

    Guiné 63/74 - P15147: Inquérito online: resultados preliminares, num total de 110 votos, 1 em cada 5 nunca teve férias; 3 em cada 4 veio à metrópole, uma ou mais vezes... Encerramento das "urnas": 2ª feira, 28/9/2015, 14h05


    Guiné > Bissau > Bissalanca > Transportes Aéreos Portugueses  > Avião Super Constellation. Foto do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO), o primeiro à direita... Cortesia do seu blogue JERO > 10 de dezembro de 2009 > Lisboa-Bissau em nove horas. (Foto editada e reproduzida por LG, com a devida vénia).

    A. Resultados preliminares da nossa sondagem desta semana, quando faltam 4 dias para fechar as "urnas"... Nº de votos apurados (até às 14h00): 110


    SONDAGEM: "DURANTE A COMISSÃO, NUNCA VIM DE FÉRIAS À METRÓPOLE"


    1. Vim uma vez  > 37 (33,6%)


    2. Vim duas vezes  > 39 (35,5%)



    3. Vim três vezes  > 6 (5,4%)



    4. Fiz férias em Bissau  > 6 (5,4%)


    5. Fiz férias nos Bijagós > 0 (0%)

    6. Fiz férias no interior > 0 (0%)

    7. Nunca tive férias  > 22 (20,0%)



    Votos apurados: 110
    Dias que restam para votar: 4 (até 28/9/2015, às 14h05)

    Comentário do editor: mais uma vez se comprova que os leitores deste blogue (ou, pelo menos, os que votam neste tipo de sondagem digital) não representam (nem têm a veleidade de representar) o universo dos nossos combatentes que passaram pelo TO da Guiné, entre 1961 e 1974...

    Os resultados finais deste tipo de  "sondagem" dependem sempre da oportunidade e vontade do leitor (ou visitante) em responder... Por outro lado, nunca sabemos quem responde (e quem não responde): por exemplo, posto, arma, especialidade, ano em que foi mobilizado, etc.   Nem podemos garantir que não haja duplicações, ou até votações feitas com má fé (por ex., leitores ou visitantes que não foram combatentes no TO da Guiné, durante a guerra colonial).

    No caso da licença de férias, no TO da Guiné, podemos partir de uma hipótese (meramente teórica): só 1 em cada 5 muito provavelmente estava em condições (nomeadamente financeiras) de ir passar férias à metrópole... Não esquecer que as passagens áereas custavam, na época, 4 contos, o que era o pré de 4 meses para os nossos soldados...

    Numa companhia (grosso modo, 150 homens), estamos a falar de um máximo de  20% de elegíveis (ou sejam, 30, incluindo 1 capitão, 4 alferes, 15 furrieis e sargentos, e mais uns tantos cabos)... Ora esta sondagem sugere um resultado inverso: 3 em cada 4 de nós (75%) fomos de férias à metrópole... A explicação só pode ser esta: a amostra dos "graduados" (oficiais e sargentos) está sobrerrepresentada em relação às "praças" (soldados e cabos)...

    Posso estar a "ver mal" o problema,. já que a minha companhia (CCAÇ 2590/ CCAÇ 12) só tinha um máximo de 60 quadros e especialistas metropolitanos, sendo os restantes (uma centena) soldados do recrutamento local,,, Não sei se a totalidade (ou a grande maioria) dos meus camaradas metropolitanos da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 vieram de férias à metrópole em 1970...

    Desafiamos os nossos leitores a comentar os resultados preliminares desta "sondaem" que, à partida, estarão "enviesados"...  LG


    B. Comentários dos nossos camaradas (*):



    21 set 2015 14:44 

    Nunca tive férias e nunca pensei vir à Metrópole.
    Mas tive conhecimento de camaradas que vieram cá e já não voltaram à Guiné.

    21 set 2015 16:16

    Lamentando muito, sinceramente, quem não pôde vir e,
    como já contei numa das minhas estórias no blogue (P4675),
    vim à metrópole 3 vezes (30 + 5 dias cada).

    21 set 2015 16:24

    Fui para a Guiné em fins de Outubro de 1971 e vim de férias à Metrópole no dia dos meus anos, 21 de Maio de 72. Em Fevereiro de 73 voltei novamente de férias, na altura do carnaval. Sabendo o que me esperava na Guiné, foi preciso ter alguma coragem para voltar ao "local do crime", mas nunca me passou pela cabeça em dar à sola. Vim duas vezes de férias em avião da força aérea, beneficiando do facto de ser furriel paraquedista. Os soldados mais valorosos geralmente vinham uma vez de férias pela força aérea. Neste aspecto éramos uns privilegiados,mas também se pode dizer que éramos os mais sacrificados, não acham?

    21 set 21015 16:26

    Camaradas, esta pergunta para mim torna-se amarga, vim cá à metrópole uma vez, por morte do meu pai, faleceu em Novembro de 1967. Estava eu há sete meses na Guiné, como tinha direito à viagem gratuita pela força aérea, concorri e foi abrangido para vir cá em Março de 1968, estive cá um mês, de formas que foram uma férias amargas que nunca mais esquecem.

    21 set 2015 16:29
    Vim de Férias Em Outubro de 1971 para o casamento do meu irmão de quem fui padrinho.
    Foi na TAP num Boeing 727 que vim e que regressei.
    Penso que já existiam ou estarei enganado?
    De Bafatá para Bissau vim nessa altura num JU.

    21 set 2015 16:34

    Vim 2 vezes, em Janeiro de 1970 e Janeiro de 1971.
    O curioso é que, só agora me lembrei,
    me falta pagar metade da segunda viagem...  

    21 set 2015 19:23 

    Não vim nenhuma vez, por motivos de ter sido ferido
    e também por não ter disponibilidade financeira.

    Carlos Vinhal
     21 set 2015 19:56 

    Não sei se era norma oficial, mas na minha Companhia só se podia vir de férias após completados 6 meses de comissão, uma vez em cada ano civil, e toda a gente tinha que estar presente na época do Natal e Ano Novo.  Como chegamos à Guiné em 17 Abr 70, só depois de 17 de Outubro é que a malta pôde começar a vir à Metrópole. Como eu era o furriel mais novo (NM 19551569) só me tocavam 15 dias em Dezembro. Optei por vir só em Fev 71 (mais ou menos a meio da comissão), não tendo possibilidade de vir mais vezes, já que a nossa comissão acabava oficialmente em 17 Jan 72. Regressámos a 19 Mar 72.

    Luís Graça
    21 set 2015 21:45

    Dá para perceber, pela tendência de voto, ao fim de quase meia centena de votações, que passar férias no interior (na tabanca, no quartel, no destacamento onde se estava colocado...) é uma hipótese meramente teórica... Mesmo Bubaque, nos Bijagós, devia ser um luxo, já nessa época...
    Mas também havia, sim, senhor, quem fizesse férias [, de páscoa, por exemplo, ] em Bubaque...
    A malta que estava em Bissau, podia tirar uns dias e dar um salto aos Bijagós...
    Quem estava no mato, queria mas era ir a casa..

    21 set 2015 23:19 

    Vim duas vezes de férias.

    22 set 2015 00:56

    Vim uma vez, no mês de Maio de 1962,
    um ano após a minha chegada.


    Luís Graça
    22 set 2015 06:02

    Vim de férias em meados de 1970, uma ano depois do início da comissão, se a memória me não falha... Lembro-me de o avião da TAP fazer escala na ilha do Sal... Uma a duas horas... A TAP não podia, por razões "políticas", sobrevoar o continente africano...  O avião ia por "nossa" conta... Ver as pernas às hospedeiras de bordo estava "incluído" no preço... E tenho ideia que o consumo de bebidas a bordo era "generoso"... Começávamos as férias na "desbunda"... De Lisboa até casa (70 km) fui de táxi... Vir de férias, da guerra, era um luxo que não tinha preço!...

    Carlos Silva
    carlospintazevedo@gmail.com
    22 set 2015 07:43

    Férias,  nunca as tive ! ... Mas passei bons momentos em Bedanda, e outros menos bons como tudo na vida, nunca me arrependi do tempo que passei lá,  conheci nova gente com outra maneira de vida. Gente Humilde e tambem com sabedoria, sempre aprendi algo . Direi sempre não à guerra.

    Vasco Pires [Brasil]
    22 set 2015 13:13  

    Vim duas vezes de férias. No GAC 7 permitiam um mês de férias por ano.  Lembrei-me que nas primeiras férias encontrei [ o ...], aliás, ele me procurou. A companhia dele embarcou, ele conseguiu uma licença pois havia o nascimento iminente de um filho; como soube que eu conhecia o quartel onde estava a companhia dele, queria saber como eram as coisas por lá.  Procurei fazer um relato realista,  não sei se foi pelo meu relato, mas ele resolveu cumprir a comissão
    nas "bolanhas"... de Paris. 

    ___________________

    Nota do editor:

    (*) Vd. poste de 21 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15137: Sondagem: "Durante a comissão nunca vim de férias à metrópole"... A responder até ao dia 28

    Vd. também: