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terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

Guiné 61/74 - P26527: Tabanca Grande (568): Homenagem ao capitão e cavaleiro Leite Rodrigues (Aveiro, 1945 - Matosinhos, 2025), ex-alf mil cav, CCAV 1748 (1967/69), membro da Tabanca de Matosinhos: passa a sentar-se, simbolicamente, no lugar n.º 899, sob o nosso poilão, a título póstumo



Matosinhos > Tabanca de Matosinhos, Natal de 2024.
Leite Rodrigues. Foto: J. Casimiro Carvalho (2024)




Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Bafatá > 4 de abril de 2017 > O Leite Rodrigues dando uma aula de ciências naturais numa escola local...


Foto nº 2A > Guiné-Bissau > Bafatá > 4 de abril de 2017 > O Leite Rodrigues com a professora da escola...




Foto nº 3B, 3A e 3 > Guiné-Bissau > Binta > Abril de 2017 > O João Rebola (1945-2018) esteve aqui, com a sua CCAÇ 2444 (Bula, Có, Cacheu, Bissorã e Binar, 1968/70)... Da esquerda para a direita, na base do poilão, o Leite Rodrigues, o João Rebola, o José Cancela e o José Manuel Samouco.



Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Bissa > Abril de 2017 > Junto ao Hotel Coimbra > O Leite Rodrigues, com oosando parea a fotografia com um pano tradicional usado pelas mulheres guineenses, 

Fotos (e legendas): © José Cancela (2025). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Não tenho dúvidas que o nosso saudoso camarada Leite Rodrigues, que vai amanhã, dia 26,  descer à terra da verdade, sem ter completado os 80 anos (*),  merece figurar, a título póstumo, na nossa Tabanca Grande, sentando-se simbolicamente sob o nosso poilão no lugar nº 899, ao lado de outros tabanqueiros quer vivos quer  já falecidos (e sobretud0, neste caso, homens grandes da Tabanca Pequena de Matosinhos,  como o A. Marques Lopes, o João Rebola, o Joaquim Peixoto, o Jorge Teixeira (Portojo), o António Batista da Silva, o Xico Allen, o Francisco Silva, etc., alguns dos nomes que me vêm à cabeça, e que "da lei da morte já se libertaram").

Não tenho dúvidas em aceitar a proposta do nosso régulo e poeta José Teixeira, dando ao Leite Rodrigues honras de Tabanca Grande (*)... É nossa pequena homenagem a um homem, português e camarada de coração grande, generoso e solidário, que nos ajudou também a t0rnar menos agreste e penosa a nossa caminhada pela picada da vida (e nomeadamente aos membros da Tabanca de Matosinhos, cuja tertúlia ele frequentavca desde 2006).

Verifico agora, com mais atenção que ele foi ferido gravemente num operação a caminho de Sinchã Jobel no subsetor de Geba, quando a sua CCAV 1748 estava aquartelada em Conbtuboel... Mais de ano e meio depois eu próprio iria conhecer o CIM de Contuboel, cujo subsector era um "oásis de paz"...

Já agora a operação em que o cmdt do 4º peloitão da CCAV 1748 foi ferido com gravividade: Op Invicta II, de 5 a 8dez67,  que consistiu mum golpe de mão na região de Caresse, sector L2, envolvendo forças da CCaç 1788, CCav 1748 e 2 Sec/Pel Mil 112, e  com apoio aéreo. As NT atingiram o objectivo constituído por 10 casas de mato, capturaram munições diversas e fizeram 12 feridos ao lN, que reagiu pelo fogo. As NT tiveram 2 feridos.

2. Facto que eu desconhecia, ele também foi à Guiné-Bissau em 2017 ... Com o Zé Cancela, o João  Rebola, o António Barbosa, o Angelino Silva, o José Manuel Samouco, o Eduardo Moutinho, o Rodrigo Teixeira e outros camaradas da Tabanca de Matosinhos...

O Zé Teixeira, que dessa vez não foi (tinha ido em 2015),  diz-me que "o grupo foi recebido pelo Presidente da República, o JOMAV. Sei que falaram do seu ferimento e do comandante Gazela. O Eduardo Moutinho também foi, mas agora anda às voltas com uma pneumonia".

Pedi ao Zé  Cancela algumas fotos desta viagem (em que visitaram muitas localidades) para ilustrar a minha apreesentação do nosso novo grão-tabanqueiro, que deixa muitas saudades, não só entre os antigos combatentes mas também no mundo do oçlimpisco e no hipismo .  Fizemos uma primeira seleção.

Recordo-me de, antes da pandemia, o ter convidado a integrar a nosssa Tabanca Grande...  Mas, como diz o Zé Teixeira, ele gostava mais de cavalos (e mulheres bonitas) do que computadores. Gostava mais de falar (de improviso) do que escrever. Mas era uma exímio contador de histórias. 
 
Apurámos que o nosso infortunado camarada foi alf mil cav, CCAV 1748 ( subunidade que passou por Bissau, Bula, Contuboel e Farim, entre jul 67 e jun 69). Tem cruz de guerra de 4.ª classe, atribuída em 1972. Não tínhamos, até agora,  nenhum representante desta subunidade na nossa Tabanca Grande.

Segundo a página do facebook do portal Utw Ultramar Terraweb (nota de óbito, de 23 do corrente, 16:08), o Leite Rodrigues era capitão do quadro permanente da GNR, na situação de reforma. Em 1/12/1970, tinha sido promovido a ten mil, e colocado na GNR. Em 17/5/1984, foi gradudo em capitão e promovido a cap QP, da GNR.

Era uma figura conhecida e respeita no meio equestre, foi atleta olímpico, e é recordado tanto como cavaleiro como mestre na arte da equitação. Era natural de Aveiro. Tem uma filho, que vive em Lisboa. Tinha uma filha que morreu em circunstâncias trágicas, aos 14 anos,  em 2006,  na sequência de um acidente com um dos seus cavslos. A Filipa era uma promissora atleta da equitação portuguesa, seguindo os passos do pai.

Segundo o portal Equitação, o "Alberto Bernardo Azevedo Leite Rodrigues (1945 - 2025), capitão da Guarda Nacional Republicana, representou Portugal ao mais alto nível, tendo sido olímpico nos Jogos de Barcelona em 1992, na disciplina de CCE. Dedicou a vida ao desporto equestre, que viveu com paixão. Durante a carreira como atleta, venceu inúmeras competições no nosso país e no estrangeiro, em provas de Saltos de Obstáculos e CCE. Como Veterano e Embaixador regista títulos e medalhas nos Campeoanatos de Portugal e da Europa". Nomeadamente, em 2000, sagrou-se "Campeão da Europa de Veteranos de Saltos de Obstáculos".


segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Guiné 61/74 - P26525: Casos: a verdade sobre ... (52): o major cav Matos Guerra foi presidente da câmara de Bissau de mar71 a out73... Em 1966, a comandar a CPM 1489, nunca poderia ter discutido com os vereadores nenhum plano para arrasar o Pilão, contrariamente às memórias (baralhadas) do "Cadogo Pai"...


 O documento, de 26 páginas, que me foi entregue pessoalmente pelo autor, em Bissau, em 7 de março de 2008, e que tem por título: "
Memória de Carlos Domingos Gomes, Combatente da Liberdade da Pátria: Registos da História da Mobilização e Luta da Libertação Nacional. Recordar Guiledje, Simposium Internacional, Bissau, 1 a 7 de Março de 2008."

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008)






1. Diz-se, no poste P26522 (*):

(...) Temos apenas umas trinta e tal referências sobre o Pilão: famigerado, para uns; triste, para outros, vergonhoso, para os mais puritanos e conservadores... Houve um presidente da Câmara municipal de Bissau, o major Matos Guerra, que por volta de 1966 o terá querido arrasar (segundo  o comerciante Carlos Domingos Gomes, "Cadogo Pai", vereador na altura) ... 

Ainda bem que prevaleceu o bom senso... (A ideia teria partido do próprio Governador e Comandante-Chefe, Arnaldo Schulz: alegava-se que o Pilão era umn "ninho de terroristas.) (...)

2. Esta história está mal contada pelo "Cadogo Pai" (Bolama, 1929 - Coimbra, 2021), o empresário e político Carlos Domingos Gomes, cujas memórias já aqui publicámos no blogue. E-nos impossível verificarr, caso a caso, por falta de contradeitório,  a veracidade factual de tudo aquilo que aqui se escreve pelos nossos amigos e camaradas da Guiné. A não ser a posteriori, muitas vezes, cruzando com outras fontes.

"Cadogo Pai" engana-se nas datas: em 1966,  o major Matos Guerra ainda não era major nem muito menos presidente da Câmara Municipal de Bissau, cargo que só exerceu durante  dois anos anos e meio, de mar71 a out73 (portanto, no tempo do gen Spínola e não do gen Schulz).

Em 1966, José Eduardo Matos Guerra  era simplesmente cap cav, cmdt da CMP  1489 (Bissau, Amura e Sta Luzia, out65/jul67). (**)

Segundo o portal UTW - Dos Veteranos da Guerrra do Ultramar (nota de obituário do cor cav na situação de reforma, Eduardo Matos Guerra, 1931-2016), este antigo combatente, depois da comissão na Guiné (out64/jul67), em 23jul68,  encontrava-se colocado como adido na GNR,  sendo então "promovido a major"...

Logo a seguir, em 10 de setembro desse ano, regressa a Bissau, tendo sido "nomeado pelo CCFAG para chefiar a Secção de Reordenamentos e Autodefesas da Rep ACAP/QG"...

Em 24fev70, e ainda segundo a mesma fonte, é  agraciado com a Medalha de Prata de Serviços Distintos com palma  (...) "pela forma altamente eficiente, dinâmica e devotada como desempenhou as funções de chefe da divisão de organização e defesa das populações, do gabinete militar do comandante-chefe das Forças Armadas na Guiné, que estruturou e organizou de forma modelar, e ultimamente corno chefe de secção no quartel-general do comandante-chefe das Forças Armadas na Guiné, gerindo os mesmos assuntos" (...)

E mais se acrescenta sobre o teor do louvor, citando a mesma fonte:

(...) "Tendo chegado à Guiné em setembro de 1968 e sendo-lhe confiada a missão de estruturar e impulsionar o reordenamento e autodefesa das populações, o major Matos Guerra, no curto prazo de dezasseis meses, planeou e executou uma vasta obra neste sector. (...)

(...) "Foi ainda o major Matos Guerra pedra fundamental no estudo e elaboração da recente Iegislação sobre o recenseamento e controle da população, documentos de alto interesse e oportunidade na actual vida das populações da Guiné." (...)

Em 23out70 regressa à metrópole, ficando colocado no RC3, Estremoz. Em 1mar1971, "tendo sido requisitado pelo Ministério do Ultramar para desempenhar comissão de âmbito civil na Província da Guiné Portuguesa, volta a Bissau"...

Quinze dias depois, em 16mar71 no palácio do governo provincial da Guiné Portuguesa, "é empossado no cargo de presidente do município de Bissau", cargo que exerceu até 18out73.




Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > BART 2917 (1970/729 > Março de 1972 > Carreira de tiro > Da direita para a esquerda: (i) em primeiro plano, o general Spínola, e o ten cor Polidoro Monteiro (comandante do BART 2917); e atrásm (iii) o 
Guerra Ribeiro, transmontano. antigo administrador do concelho de Bafatá, e nesta altura  intendente  em Bafatá (e não em Bissau)

Foto (e legenda): © Paulo Santiago (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


A menos que quisesse referir-se a outro militar ou administrador civil (como, por exemplo, o Guerra Ribeiro, administrador da circunscrição  nos anos 60 e depois intendente em Bafatá, no tempo de Spínola), o então comerciante e vereador "Cadogo Pai" nunca poderia ter trabalhado, em 1966, com o Matos Guerra, que era capitão da Polícia Militar, e não presidente da Câmara Municipal de Bissau.

Repôe-se aqui a verdade dos factos (***).


3. Há um camarada nosso, membro da nossa Tabanca Grande, 0 Evaristo Reis, que trabalhou na Câmara Municipal de Bissau como "mestre de obras", ao tempo do maj cav  Matos Guerra: leia-se aqui o seu depoimento (****).

O Evaristo Pereira dos Reis descreve o maj cav Matos Guerra, então requisitado pelo Ministério do Utramar, para exercer funções civis no CTIG.  como um "homem duro, aliado e bastante protegido pelo Governador" (o gen Spínola).

________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 23 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26522: Humor de caserna (104 ): "Ontem fui ao Pilão, o que não quer dizer que fui às p..." (Bissau, 16 de dezembro de 1973, in: António Graça de Abreu, "Diário da Guiné", Lisboa, Guerra e Paz, 2007).


(**) Vd. ficha de unidade:

Companhia de Polícia Militar nº 1489

Identificação CPM 1489

Unidade Mob: RL 2 - Lisboa

Cmdt: Cap Cav José Eduardo Matos Guerra

Divisa: -

Partida: Embarque em 200ut65; desembarque em 260ut65 | Regresso: Embarque em 27Ju167


Síntese da Atividade Operacional

Ficou instalada em Bissau, no Forte da Amura, substituindo a CPM 590, com vista a desenvolver a actividade inerente à sua especialização, tendo efectuado acções e operações de policiamento, nomeadamente patrulhamentos, guardas, rusgas e escoltas.

Em 26Nov65, transferiu o seu aquartelamento para Santa Luzia, também em Bissau.

Em 26Ju167, foi substituída pela CPM 1751, a fim de efectuar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n.º 83 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: fichas das unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 581


(***) Último poste da série > 27 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26316: Casos: a verdade sobre... (51): a terrível emboscada na estrada Ponte Caium-Piche, em 14/6/1973 (ex-sold cond auto, Florimundo Rocha, c. 1950-2024; ex-fur mill Ribeiro, natrural de Braga, CCAÇ 35446, Piche, 1972/74)

(****) Vd, poste de 12 de janeiro de 2017 >  Guiné 61/74 - P16950: O nosso livro de visitas (190): Evaristo Pereira dos Reis, 66 anos de idade, residente em Setúbal... Ex-1º cabo condutor auto, de rendição individual, esteve no QG (1971/73), mas na maior parte da comissão foi mestre de obras da Câmara Municipal de Bissau, ao tempo do maj cav Eduardo Matos Guerra, como presidente


(...) Voltando à minha chegada,  fui colocado na secção do ficheiro, no Quartel General, local aparentemente privilegiado em relação aos meus camaradas, local onde comecei a ter consciência do que se passava naquela província em guerra. Nesse serviço estavam arquivadas as fichas de todos os intervenientes naquele teatro de guerra que eu considero de tortura física, mental e psicológica,

No arquivo assinalava os mortos, os desaparecidos, os evacuados, os que tiveram a sorte de já ter regressado e os que se encontravam presentes. Claro que a curiosidade principal foi ver a ficha do maestro da banda. Tive oportunidade de estar bem perto dele, diversas vezes, Refiro-me ao homem da lupa pelo qual nunca tive qualquer simpatia.

Passado um mês tive oportunidade de concorrer a um cargo de Mestre de Obras, para a Cãmara Municipal de Bissau para o qual estava talhado, Chefiada pelo major [cav Eduardo} Matos Guerra [1931-2016] como Presidente da Câmara, homem duro, aliado e bastante protegido pelo Governador,

A partir desse dia a minha farda foi arquivada no armário até ao dia do regresso, Foi muito difícil desempenhar tal cargo, a Câmara não tinha recursos, imaginem que tinha que fazer os remendos das ruas com cimento, porque não tínhamos alcatrão.

Mesmo assim consegui fazer obras de algum vulto praticamente sem recursos, recorrendo a máquinas da engenharia militar, chefiada pelo então Cap Branquinho e Furriel Guedelha, sobre os quais nunca mais tive noticias.

Também existia uma empresa civil de construção ali sediada com o nome de TECNIL. Esses eram os meus fornecedores gratuitos.


Fiz uma messe para Sargentos e renovei o bar de oficiais dentro do Hospital Militar. Alarguei parte da estrada de Bissalanca, para o aeroporto, arrancando dezenas de mangueiros. Fiz uma vala de drenagem e alargamento da estrada para o Quartel General, Enfim, fiz várias obras de beneficiação para melhorar aquela cidade, passando nestas lides diárias os restantes e difíceis 23 meses. (...)


(Negritos nossos).

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26074: (De) Caras (224): Maurício Saraiva, cofundador e instrutor dos Comandos do CTIG, cmdt do Gr Cmds Fantasmas - Parte II: Um dos momentos mais dramáticos que vivi, na sequência da terrível emboscada com mina A/C, em 28 de novembro de 1964, na estrada de Madina do Boé para Contabane, perto de Gobije (Antóno Pinto, ex-alf mil, Pirada, Madina do Boé e Béli, 1963/65)



Guiné > Brá > Comandos do CTIG > c. 1964 > Emblema de braço do Grupo Fantasmas, que pertenceu ao alferes  mil 'comando' Maurício Saraiva.

Angola > CIC - Centro de Instrução de Comandos > 1963  > O alferes mil Maurício Saraiva em Angola, aquando da frequência do curso de Cmds; no CTIG  será depois promoviodo, por mérito, a tenente e a capitão. 
  

Fotos (e  legendas): © Virgínio Briote (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Madina do Boé > 1966 > Vista aérea do aquartelamento (1966). Imagem reproduzida, sem menção da fonte, no Blogue do Fernando Gil > Moçambique para todas. Presumer-se que a sua autoria seja de Jorge Monteiro (ex-cap mil CCAÇ 1416, Madina do Boé, 1965/67) ou de Manuel Domingues, nosso tabanqueiro, ex-alf mil, CCS/BCAÇ 1856, Nova Lamego, 1965/66 (autor do livro: Uma campanha na Guiné, 1965/67).



1. Alferes, tenente e depois cap mil 'comando' (até  chegar a cor inf, na reforma extraordinária), Maurício Saraiva (1939-2002) foi idolatrado por uns, odiado por outros, "um mal amado", no dizer do Virgínio Briote (*)... 

A nível operacional, começou por integrar a 4ª CCAÇ (Bedanda, 1961) e,  depois de frequentar o curso de comand0s (em Angola, sua terra, 1963), voltou ao CTIG como instrutor e também como comandante operacional. 

A seguir à da Op Tridente (jan - mnar de 1964), irá  comandar o  Grupo Fantasmas, de que fez parte, entre outros, o nosso querido e saudoso tabanqueiro Amadu Djaló (1940-2015).  Recorde-se que o sold cond auto Amadú Djaló alistou-se nos comandos do CTIG, a convite do Maurício Saraiva.

O Amadu Djaló frequentou o 1º Curso de Comandos da Guiné, que decorreu entre 24 de Agosto e 17 de Outubro de 1964. Desse curso fizeram parte 8 guineenses: além do Amadu Djaló, o Marcelino da Mata, o Tomás Camará e outros. Deste curso sairam ainda  os três primeiros grupos de Comandos, que desenvolveram a actividade na Guiné até julho de 1965: Camaleões, Fantasmas e Panteras

Interessa-nos conhecer melhor o percurso do nosso camarada Maurício Saraiva, no CTIG, embora saibamos que ele virá a ser gravemente ferido, por mina A/P, em Moçambique, em 1968, enquanto comandante da 9ª CCmds. (Altamente medalhado por feitos em combate, é agraciado em 1970 com o o grau de Oficial da Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito; passaria em 1973 à situação de reforma extraordinária: vd. o seu impressiomnante CV militar, no portal UTW - Dos Veteranos da Guerra do Ultramar.)

Mas demos voz também àqueles que o conheceram,  para além  do Virgínio Briote (*) e da família (**). Foi o caso do António Pinto (***),  ex-alf mil inf, BCAÇ 506 (Guiné, 1963/65), um veterano de Madina do Boé e de Beli mas também um dos veteranos do nosso blogue. É mais um pequeno contributo para o seu "retrato" que o Virgínio Briote ainda há de fazer, se Deus lhe der vida e saúde... (****). 

 

António Pinto, II Encontro Nacional
da Tabanca Grande, Pombal, 2007

Um dos momentos mais dramáticos que vivi, na sequência  da terrível emboscada com mina A/C, em 28 de novembro de 1964, na estrada de Madina do Boé para Contabane, perto de Gobije


por António Pinto 

(...) A memória já me vai traindo um bocado, mas há momentos que jamais poderei esquecer e com certeza que me acompanharão para sempre. 

Guardei alguns documentos daquele tempo e, vasculhando-os, verifico que pertenci à 3ª Companhia de Caçadores, em Nova Lamego, e aos Batalhões de Caçadores, sediados em Bafatá, nºs 506 e 512 e,  finalmente,  ao Batalhão de Cavalaria nº 705.

Sobre Madina do Boé,  estive lá no 2º ano de comissão, lembro-me que fomos os primeiros a lá chegar e montar o 1º aquartelamento que ficou ao fundo da estrada, onde havia uma escola desactivada. 

Os primeiros tempos passámo-los sem sobressaltos de maior até que houve o 1º ataque, não posso precisar a data. Não tivemos feridos.

Há um episódio, no entanto, entre vários, que me marcou bastante. Vou tentar resumi-lo:

Uma tarde estávamos no destacamento, quando, de repente, ao fundo da tal estrada vimos chegar, com grande alarido,  dois ou três jipes com uma velocidade inusitada e alguém aos gritos, que só conseguimos entender quando chegaram à nossa beira. 

Era um grupo de comandos, chefiados pelo alferes  [Mauríco] Saraiva [um homem tremendamente marcado pela guerra em Angola, onde assistiu à morte de familiares seus, (dizia-se)].

Aos berros, pediu-nos viaturas e homens para efectuar uma operação (de que eu não tinha conhecimento ) nos arredores de Madina.

 De tal maneira ele estava transtornado que chegou a puxar de pistola para um furriel do destacamento, que estava a apertar as botas, tal era a sua pressa.

O que não posso esquecer é o pedido que um dos nossos soldados fez para substituir o condutor duma viatura, salvo erro, uma Mercedes, argumentando que, sendo ele pequeno ( e era-o de facto), se uma mina rebentasse,  ele saltava com mais facilidade, pedindo só para deixar tirar a capota da viatura. Não me recordo do nome dele mas vejo-o constantemente...

Essa patrulha, em que não participei, pois o Saraiva não o permitiu, foi atacada, após o rebentamento de minas. Morreram vários camaradas nossos, entre eles o referido condutor, que teve uma morte horrorosa.

Alguns desses camaradas deixaram este mundo nos meus braços e nos do médico que, na altura, estava conosco e que é por demais conhecido - o Luiz Goes, que todos conhecem, com certeza, pelos seus fados de Coimbra.

Este foi um dos momentos mais dramáticos que vivi na Guiné, para além de outros, especialmente em Beli, onde fui ferido (....)


______________

Notas do editor:

(*) 11 de agosto de 2024 > Guiné 61/74 - P25832: (De) Caras (308): Maurício Saraiva, cofundador e instrutor dos Comandos do CTIG, cmdt do Gr Cmds Fantasmas - Parte I: O "capitão Manilha", por Virgínio Briote (ex-alf mil cav, CCAV 489, Cuntima; e ex-alf mil 'cmd', Grupo Diabólicos, Brá; 1965/67)

(**) Vd. poste de 6 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11531: As Nossas Tropas - Quem foi quem (12): Maurício Leonel de Sousa Saraiva, ex-cap inf comando (Brá, 1965/67) (Luciana Saraiva Guerra)

Vd. também poste de:


(...) Tenho muito material sobre o cor Maurício Leonel Saraiva. Fotos, documentos e memórias de acontecimentos, histórias que corriam na altura, outras de que fui testemunha e uma ou outra em que até fui protagonista. Gostaria de fazer um trabalho sobre o Saraiva (já em tempos encomendado pelo Presidente da Associação de Comandos, mas que não pude levar adiante).

Foi ele, o Saraiva, que como tenente me convidou a concorrer aos comandos e, dois meses mais tarde, como capitão, foi meu director de instrução.(..:)


sábado, 19 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26057: Elementos para a história do Pel Caç Nat 51 - Parte IX: O cmdt que se seguiu ao Armindo Batata, entre dez70 e jul72, foi o alf mil inf José Daniel Portela Rosa (Lisboa, 1946 - Sintra, 2021)


1. Comentário de Luís de Sousa, ex-sold trms, CCAÇ 2797 (Cufar 1970-72),l membro dfa Tabanca Grande desde 14/9/2008:


Olá a todos, li o post do camarada Armindo Batata (*) que se refere ao alf  Rosa como sendo Manuel Rosa, com familiares em Dona Maria. 

Conheci bem o alf Rosa, julgo não haver grande probabilidade de se tratar de um segundo Rosa, o nome era de facto José Daniel Portela Rosa, Pel Caç Nat  51, vivia em Dona Maria. (Fot0 à direita, cortesia da página da CCAÇ 4740.)  

 Pontuava em todos os encontros anuais da minha CCaç 2797, assim como do BCAÇ 2930. 

Abraço à malta. Luis de Sousa (foto à esquerda).

17 de outubro de 2024 às 19:00

2. Comentário do editor LG:

Segundo o portal UTW - Dos Veteranos da Guerra do Ultramar, o nosso camarada José Daniel Portela Rosa, natural de Lisboa, residente em Dona Maria, Almargem do Bispo, Sintra, ex-alf mil inf, cmdt do Pel Caç Nat 51 (dez 1970 / jul 1972), morreu aos 74 anos, em 10 de janeiro de 2021

Era DFA. A 29  de julho de 1972, num patrulhamento ofensivo, no subsetor de Cufar, juntamente com 3 Gr Comb da CCAÇ 4740 e o Pel Caç Nata 51, o Rosa acionou uma mina A/P, ficando sem uma perna.  

Foi evacuado, com outros 2  camaradas da CCAÇ 4740, para o HM 241 (Bissau) e depois para o HMP (Lisboa). 

______________

Nota do editor LG:

(*) 13 de julho de 2024 > Guiné 61/74 - P25740: Elementos para a história do Pel Caç Nat 51 - Parte VIII: Cufar, no tempo do Manuel Luís Lomba (1965), do Armindo Batata (1970) e do Luís Mourato Oliveira (1973)

(...) Arrmindo Batata  | 1/7/2024, 17:08:

(...) O alferes que me rendeu, nos últimos dias de dezembro de 1970, foi o Manuel Rosa (sic). Creio não estar enganado no nome, até porque conheci-o na metrópole onde estive de férias, no final da minha comissão, tendo regressado quando me faltava cerca de um mês para completar os 24 meses.

O pai dele tinha uma loja de pneus na Rua São Filipe Neri, em Lisboa, e almocei com ele e a família numa casa que eles tinham em Dona Maria / Belas
   [ na realidade, Dona Maria, Almargem do Bispo, Sintra e não, Belas, Queluz].  

Imagina o quanto constrangedor foi aquele almoço, em que todos queriam saber "coisas" sobre o local para onde ele ia.  (...)

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25953: Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar: uma visão pessoal (Excertos) (Jaime Silva) - Parte X: Testemunho 5: "Desaparecido em combate, em Moçambique, em 15/11/1972: fur mil op esp / ranger João Manuel de Castro Guimarães"

 


SILVA, Jaime Bonifácio da - Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar : uma visão pessoal.

In:  Artur Ferreira Coimbra... [et al.]; "O concelho de Fafe e a Guerra Colonial : 1961-1974 : contributos para a sua história". [Fafe] : Núcleo de Artes e Letras de Fafe, 2014, pp. 23-84.


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Jaime Bonifácio Marques da Silva (n. 1946): 

(i) foi alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72); (ii) tem uma cruz de guerra por feitos em combate; (iii) viveu em Angola até 1974; (iv) licenciatura em Ciências do Desporto (UTL/ISEF) e pós-graduação em Envelhecimento, Atividade Física e Autonomia Funcional (UL/FMH); (v) professor de educação física reformado, no ensino secundário e no ensino superior ; (vi) autarca em Fafe, em dois mandatos (1987/97), com o pelouro de desporto e cultura; (vii) vive atualmente entre a Lourinhã, donde é natural, e o Norte; (viii) é membro da nossa Tabanca Grande desde 31/1/2014; (ix) tem 85 referências no nosso blogue.

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1. Estamos a reproduzir, por cortesia do autor (e com algumas correções de pormenor), excertos do extenso estudo do nosso camarada e amigo Jaime Silva, sobre os 41 mortos do concelho de Fafe, na guerra do ultramar / guerra colonial. A última parte do capítulo é dedicada a testemunhos e depoimentos recolhidos pelo autor (pp. 67/82).


Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar – Uma visão pessoal [Excertos] 


Parte X:  Testemunho 5: "Desaparecido em combate,  em Moçambique, em 15/11/1972: fur mil op esp / ranger João Manuel de Castro Guimarães"  (pp. 78/79)



Testemunho 5 : 

Há algum militar fafense desaparecido em combate?


O furriel miliciano ranger João Manuel de Castro Guimarães desapareceu em combate no Norte de Moçambique durante a Guerra Colonial. O seu desaparecimento ocorreu durante uma operação realizada junto da povoação de Kytaia, aldeia situada no sul da Tanzânia, nas margens do rio Rovuma, e cujo corpo nunca mais foi resgatado.

Tenho em meu poder cópia de um documento que me foi cedido pela Direção do Centro de Trabalhos de Fafe da Associação de Operações Especiais – “Ranger” em 12.03.2012 e que descreve as circunstâncias do desaparecimento do furriel Guimarães.

O texto é da autoria de Carlos Vardasca, ex-soldado condutor nº mec. 15263570,  da CCAÇ 3309, estacionada no aquartelamento de Nangade. 

Vardasca afirma que só foi possível elaborar o documento com o depoimento de Filipe Manuel Cardão Pinto, ex-furriel mil da  CCAÇ 3309 e comandante dos GES 212, estacionados no aquartelamento de Nhica do Rovuma, em Cabo Delgado.

Relata que a operação denominada “Baga 6” teve como objetivo vigiar junto da fronteira da Tanzânia, a cerca de nove quilómetros do aquartelamento, as movimentações da população moçambicana que trabalhava em machambas (terrenos de cultivo) comunais junto da povoação tanzaniana de Kytaia, nas margens do rio Rovuma, e cujos produtos alimentares serviam para guarnecer os guerrilheiros da FRELIMO que, com bastante regularidade, ali se abasteciam para reentrarem em Moçambique e efetuarem as suas operações contra o exército português.

A operação decorreu entre os dias 14 a 16 de novembro de 1972, sendo enviado um pequeno grupo comandado pelo furriel Guimarães, recentemente chegado da Metrópole (designação dada a Portugal no período colonial).

Na tarde de 14 de novembro, o grupo atingiu o local previsto junto ao rio Rovuma e, dado o adiantado da hora, decidiu emboscar ali para observar as movimentações do outro lado da fronteira. 

Na manhã de 15, iniciaram-se as observações, ainda o cacimbo (nevoeiro) flutuava por cima do capim e o rio em maré baixa deixava emergir do seu leito vastos bancos de areia, permitindo alguns deles o acesso fácil ao outro lado da fronteira.

Talvez por inexperiência e desconhecimento da realidade ou por simples espírito de aventura, continua Verdasca, o furriel Guimarães, apesar de ser advertido pelos seus soldados africanos dos perigos em que ia incorrer, decidiu percorrer um dos bancos de areia que se estendia até à outra margem, tendo mesmo pisado território tanzaniano.

Inesperadamente e perante a angústia dos companheiros, ouvem-se dois tiros de arma de precisão e o corpo do Guimarães tombou de imediato, ficando inerte. 

Alguns dos elementos do grupo iniciam os preparativos para resgatar o corpo, mas, advertidos pelos mais experientes de que seriam, certamente, alvos, também da emboscada do atirador que os esperava, decidem não avançar e comunicar com o destacamento de Nhica do Rovuma que, consciente da gravidade da situação, decide enviar para o local um novo Grupo de Combate comandado pelo furriel Pinto para coordenar as ações no terreno. 

Foi decidido, relata o Verdasca, pedir apoio aéreo para proteger e apoiar o grupo de resgate do corpo do Guimarães. O comando do destacamento de Mueda negou esse apoio, sob o pretexto de se poder vir a abrir um conflito internacional com um país vizinho.

O corpo permaneceu no local e, no dia seguinte, 16 de novembro (de 1972), o soldado que estava de sentinela,  alertou os restantes, informando que o corpo do furriel já não se encontrava no local.

A convicção de todos é que o corpo do Guimarães teria sido levado pelos tanzanianos, facto corroborado por um dos GEs da aldeia de Nhica do Rovuma que disse ter ouvido no seu rádio um comunicado difundido por uma rádio tanzaniana em dialeto Swahili,  segundo o qual "as nossas forças fronteiriças abateram e capturaram um mercenário branco, de farda negra e armado de G3, que tentava penetrar no nosso espaço territorial".

Conclui que, com aquela informação oficial, o corpo do furriel Guimarães tinha sido retirado do local por quem o abateu, sendo mais tarde sepultado em território tanzaniano, local que ainda hoje se desconhece, mas provavelmente nas imediações da aldeia mais próxima do local, ou seja, na aldeia tanzaniana de Kytaia.

Insurge-se 
ainda pelo facto de o seu nome não constar na lista inscrita no Monumento Nacional aos Mortos da Guerra Colonial, erigido em Belém e insiste no dever de Portugal em recuperar ainda os seus mortos sepultados e dispersos por vários locais do continente africano. (**)

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Guiné 61/74 - P25892: Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar: uma visão pessoal (Excertos) (Jaime Silva) - Parte VII: Depoimento 4. Furriel Mota dá sangue diretamente ao seu camarada e salva-o.

 


Guião do BCAÇ 1930 (Angola, 1967/70)- 



SILVA, Jaime Bonifácio da - Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar : uma visão pessoal.

In:  Artur Ferreira Coimbra... [et al.]; "O concelho de Fafe e a Guerra Colonial : 1961-1974 : contributos para a sua história". [Fafe] : Núcleo de Artes e Letras de Fafe, 2014, pp. 23-84.


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Jaime Bonifácio Marques da Silva (n. 1946): 

(i) foi alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72); (ii) tem uma cruz de guerra por feitos em combate; (iii) viveu em Angola até 1974; (iv) licenciatura em Ciências do Desporto (UTL/ISEF) e pós-graduação em Envelhecimento, Atividade Física e Autonomia Funcional (UL/FMH); (v) professor de educação física reformado, no ensino secundário e no ensino superior ; (vi) autarca em Fafe, em dois mandatos (1987/97), com o pelouro de desporto e cultura; (vii) vive atualmente entre a Lourinhã, donde é natural, e o Norte; (viii) é membro da nossa Tabanca Grande desde 31/1/2014; (ix) tem 85 referências no nosso blogue.

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1. Estamos a reproduzir, por cortesia do autor (e com algumas correções de pormenor), excertos do extenso estudo do nosso camarada e amigo Jaime Silva, sobre os 41 mortos do concelho de Fafe, na guerra do ultramar / guerra colonial. A última parte do capítulo é dedicada a testemunhpos e depoimentos recolhos pelo autor (pp. 67/82).


Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar – Uma visão pessoal [Excertos] (pág. 75)


Parte VIII: Depoimento 4. Furriel Mota dá sangue diretamente ao seu camarada e salva-o



O António Mota, ex-furriel miliciano, incorporado na CCAÇ 1782,  destacada no Luvo, Norte de Angola, e pertencente ao BCAÇ 1930 (1967 /70), contou um episódio de grande coragem e solidariedade da sua parte.

A companhia sofreu uma emboscada nos morros do Matombo na Canga, resultando dois feridos graves. Um morreu no local e o outro “safou-se”. 

Perante o desespero de todos que viam o seu camarada a esvair-se em sangue, o furriel Mota ofereceu-se para dar sangue diretamente ao amigo e camarada, na tentativa de o salvar da morte.

Colocou-se em cima do Unimog, o colega deitado em baixo na picada e o enfermeiro fez uma ligação direta do braço do Mota para o braço do ferido, escorrendo o sangue por gravidade de um para outro. 

Salvou o amigo e, hoje, ainda ostenta um talo no braço direito em consequência da entrada da agulha.

"Nem sabíamos o tipo de sangue um do outro. Qual compatibilidade!"

A guerra também era isto, comento eu! …

(Revisão / fixação de texto: LG)

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terça-feira, 20 de agosto de 2024

Guiné 61/74 - P25861: Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar : uma visão pessoal (Excertos) (Jaime Silva) - Parte VI: faltosos, refratários, desertores e... os do "sangue, suor e lágrimas"...




Emblema do BCAÇ 381 ("Diabos") (Angola, 1962/64), a que pertencia a CCAÇ 390 e o ex-1º cabo radiotelegrafista Francisco Manuel Ferreira de Sousa, que resgatou o corpo de um camarada, gravemente ferido em combate, nos Dembos, e  cujo depoimento se reproduz mais abaixo.

Emblema da excecional  coleção de brasóes, guiões e carchás de Carlos Coutinho / Portal UTW . Dos Veteranos da Guerra dfo Ultramar (com a devida vémia...)



 SILVA, Jaime Bonifácio da - Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar : uma visão pessoal- In:  Artur Ferreira Coimbra... [et al.]; "O concelho de Fafe e a Guerra Colonial : 1961-1974 : contributos para a sua história". [Fafe] : Núcleo de Artes e Letras de Fafe, 2014, pp. 23-84.



1. Estamos a reproduzir, por cortesia do autor (e com algumas correções de pormenor), excertos do extenso estudo do nosso camarada e amigo Jaime Silva, sobre os 41 mortos do concelho de Fafe, na guerra do ultramar / guerra colonial. A última parte do capítulo é dedicada  é dedicada a testemunhpos e depoimentos recolhos pelo autor (pp. 67/72).





Contributo para o estudo da participação dos militares de Fafe na Guerra do Ultramar – Uma visão pessoal [Excertos] 

Parte VI:  faltosos, refratários, desertores e... os do "sangue, suor e lágrimas"...  
(pp. 67/72)





Jaime Bonifácio Marques da Silva (n. 1946): (i)  foi alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72); (ii)  tem uma cruz de guerra por feitos em combate; (iii)  viveu em Angola até 1974; (iv)  licenciatura em Ciências do Desporto (UTL/ISEF) e pós-graduação em Envelhecimento, Atividade Física e Autonomia Funcional (UL/FMH); (v)  professor de educação física reformado, no ensino secundário e no ensino superior ; (vi) autarca em Fafe, em dois mandatos (1987/97), com o pelouro de desporto e cultura; (vii) vive atualmente entre a Lourinhã, donde é natural, e o Norte;  (viii) é membro da nossa Tabanca Grande desde 31/1/2014; (ix) tem 85 referências no nosso blogue.



8. Testemunhos de ex-combatentes de Fafe participantes na Guerra (pp. 67/72)


Consegui recolher alguns depoimentos de ex-combatentes de Fafe que, após serem mobilizados e terem decidido não dar o “salto” para França, acabaram por cumprir uma Comissão de Serviço num dos três teatros de operações em África. 

É meu objetivo tentar contextualizar e responder às questões que levantei no número cinco do ponto seis deste texto, ou seja, através do seu testemunho, tentar perceber qual o enquadramento e envolvimento pessoal de cada um na orgânica e dinâmica das ações levadas a cabo pelas Unidades Militares onde estiveram destacados.

  • Testemunho 1

Quantos ficaram “aptos para todo o serviço militar” ou “livres do Serviço Militar” na sequência das “Inspeções Sanitárias”, por doença crónica ou “grande cunha”?



Não sabemos. Conhecemos, no entanto, um caso paradigmático de uma “grande cunha”. Trata-se de Albino Marinho Mota, à data defesa central do Sporting Clube de Fafe, 1.90 cm de altura, e aprovado nas provas para ingresso na Academia Militar, da qual veio a desistir. 

De acordo com o depoimento que recolhi em 29 de outubro de 2013, através do irmão, António Amável Marinho Mota, ex-furriel em Angola, o seu irmão Albino, jovem cheio de saúde, ficou livre de todo o serviço militar por “falta de robustez”, graças à “grande cunha” do Padre Albino, pároco de Antime, junto do médico,  seu amigo e responsável pelas Inspeção Militar em Fafe naquele ano. 

O médico era de Famalicão, local onde, anteriormente, o Padre Albino tinha exercido o sacerdócio.

  • Testemunho 2

Quantos decidiram “dar o salto” para o estrangeiro para fugirem à Guerra, antes de irem às inspeções, após serem “apurados para todo o serviço militar” ou depois de saberem que tinham sido mobilizados para o Ultramar?



Segundo António Mota e Fernando Ribeiro testemunharam na mesma data, havia em Fafe um grupo de cidadãos que deve ter “safado da tropa“ muita gente. Neste grupo integravam-se, entre outros, ,ajor Miguel Ferreira (Major do Ribeiro), brigadeiro da Cera, tenente José Campos e António Saldanha.

Fernando Ribeiro contou, ainda, que um tio dele, chamado Armindo Ribeiro e caseiro do major do Ribeiro, foi “safo da tropa” por ele. 

Disse, ainda, que acompanhou um amigo a Chaves, que tinha medo de ir sozinho, para levar um outro amigo até à fronteira para fugir a “salto” à tropa (não se lembra já do nome). Tem cinco cunhados e todos eles foram “a salto” para França, incluindo um com 17 anos para fugir à tropa e um outro que já tinha feito a tropa na Guiné.

Confirmaram os dois que o António Augusto Saldanha fazia do seu Café Avenida o centro de acolhimento aos fugitivos à tropa, dando ajuda e transportando-os no seu Ford até à fronteira.

  • Testemunho 3

Quantos viveram o drama de verem um seu camarada morrer, transportaram às costas um camarada morto, ferido ou estropiado, ou deram sangue no local para o salvar na sequência de uma emboscada ou rebentamento de mina?


  • Depoimento 1.

Testemunho recolhido em outubro de 2013 na casa do ex-combatente Francisco Manuel Ferreira de Sousa, em Regadas, e na presença da esposa.

O Francisco Manuel Ferreira de Sousa é natural de Felgueiras, Margaride. Após terminar o serviço militar casou e veio viver para Regadas, terra da esposa. Esteve emigrado durante quatro anos em França e, ao regressar a Portugal, empregou-se na fábrica da Bouça, em Felgueiras, onde trabalhou 27 anos, sendo, hoje, reformado.

Cumpriu uma comissão de serviço em Angola, com o posto de 1.º cabo e a especialidade de telegrafista condutor. Pertenceu ao Batalhão n.º 381, constituído pelas Companhias n.º 388, 389 e 390. Fez parte da 1.ª Companhia, a n.º 390, inserido no pelotão de transmissões que esteve sediado, primeiro, no Norte, em Pamgo Aluguen, desde 9 de dezembro 1962 e, depois, a partir de outubro de 1963, no Leste, em Vila Teixeira de Sousa (zonas onde atuei com o meu pelotão em 1971). 

Finda a Comissão, o seu Batalhão embarcou no Lobito a 21 de fevereiro de 1965 e chegou a Lisboa a 2 de março de 1965.

A sua companhia sofreu duas emboscadas graves:

(i)  A primeira em 29 de janeiro de 1963, na picada entre Pamgo Aluguen e o Úcua, resultando a morte de seis camaradas seus e a captura pelo inimigo de mais dois militares portugueses. As cabeças destes, disse, foram descobertas mais tarde pelas nossas tropas espetadas num pau (foram encontradas por acaso numa operação) e a um dos mortos, também encontrado, os “turras” esquartejaram-no.

(ii) A segunda emboscada ocorreu a 19 de agosto de 1963 e é sobre esse acontecimento que o Francisco Sousa escreveu um texto em 1965, tendo entregue uma cópia, talvez no ano 2000, na Delegação de Fafe da APVG. 

Guardei cópia do texto e em novembro de 2013, nas vésperas da minha comunicação, procurei-o na sua casa em Regadas, tendo-me confirmado o seu conteúdo e relatado, ainda, outros momentos marcantes da sua comissão em Angola. Esteve na Biblioteca Municipal onde, durante a minha comunicação, relatei a história na sua presença.

Pelo realismo e riqueza da descrição da ação, transcrevo o texto escrito pelo radiotelegrafista Francisco de Sousa, com sua autorização, tendo procedido a pequenos cortes devido à sua extensão, mas unicamente nas partes em que, por vezes, repete a mesma ideia.


“Um certo dia em Angola... 
Entre Rainha Santa e St.º António, Dembos"

por Francisco Manuel  Ferreira de Sousa 
(ex-1º cabo radiotelegrafista, 
CCAÇ 390 / BCAÇ 381, Angola, 1962/64)


A operação realiza-se a 19 de dezembro de 1963, na zona dos Dembos, no norte de Angola, entre as fazendas de café da Rainha Santa e de St.º António.

Por entre a espessa mata de uma das regiões do Norte de Angola, prosseguia em missão de serviço um grupo de homens composto por trinta e cinco soldados, entre os quais dois alferes e três sargentos, além do enfermeiro e telegrafista. (…)

O calor perturbava-os, a sede atacava-os, os assobios estranhos de certa ave desconhecida preocupava-os, (…) mas estes bravos homens nunca souberam perder a calma. Confiavam em si próprios e na sua melhor companhia, a “arma”. (…) 

A caminhada prossegue agora mais espinhosa! Teremos de alcançar o cimo deste morro” (…). 

Atingiram o cimo do morro à distância de cinquenta metros. A sede fazia-os desesperar. Descido o morro do lado oposto, o guia “preto” que os acompanhava disse,  a um por um, “menino tropa ter cuidado, mandioca ser bandido", e apontava com o indicador uma lavra de mandioca e milho, com cafeeiros. Estes eram os primeiros vestígios que se nos deparavam. (…) 

Quando deram por ela estavam no fim da descida. Deram todo um ai de alívio ao depararem com água, dizendo baixinho: "graças a Deus"! 

Mas ninguém tocou na água sem ordem, era turva e pantanosa, mas ninguém a recusou. Uns mergulharam a boca na água, outros enchiam e bebiam pelos quicos, ou seja, “bonés”, a sede era irresistível. 

Após terem apagado a sede, alguém falou, dizendo que preferia morrer do que voltar a sofrer a sede. E as lágrimas corriam-lhe pelas faces. Já estavam perto, já se pisava terreno da lavra e a escassos metros o início do objetivo.


“Vinte minutos de agonia sangrenta“


Atravessaram a lavra e encontraram a picada, que dava diretamente ao objetivo. O palpitar de um dos presentes era certo, não estava enganado, já não era a primeira vez que ali passava e alguém já tinha ali perto ficado ferido com um tiro de “canhangulo”. 

Caminhavam serenamente, quando surgiu a sombra negra. Um tiro isolado quebrou o silêncio, automaticamente todos se deitaram no solo. Ouve-se um segundo tiro e o silêncio voltou, os homens da primeira secção deviam estar em perigo. Meu dito meu feito, um terceiro tiro voltou a quebrar o silêncio, seguido de gritos de agonia. Era verdade que alguém estava ferido! 

As armas vomitavam rajadas contínuas! Ouve-se uma voz chamando pelo enfermeiro. O guia preto (Cunha) foi atingido num quadril e conseguiu recuar para a retaguarda dizendo: “está menino tropa ferido, deita sangue muito mesmo”. 

Soaram vozes provocando o inimigo com palavras impróprias, ouve-se um estrondo da primeira granada que rebentou, e o silêncio voltou. Mais dois estrondos de mais duas granadas lançadas. Com a arma tirada das mãos do ferido, ele ficou indefeso.

A desorientação era grande, os homens da frente recuaram e o ferido ficou só na zona de fogo. É preciso ir buscá-lo, alguém falou. Olharam-se, mas ninguém se decide, até que um mais corajoso, chamado Sanção, empunhou a sua arma e correu por entre o capim para buscar o ferido e, passados escassos momentos, chegou até nós com ele às costas. 

Ninguém falava. Ouviam-se gemidos de dor. Desabotoámo-lo. O sangue empoçava nas roupas. Os pensos individuais não eram o suficiente e o enfermeiro nada podia fazer. Estavam certos que aquele mártir morreria.

Alguém olhou em redor e nada via, a não ser o infeliz e mais quatro colegas. Os outros teriam recuado para a mata que ficava a uma dezena de metros. A coragem daqueles quatro aumentava! 

O telegrafista estava presente e, ajudado por outro, enlaçou o ferido, transportando-o cerca de vinte e poucos metros, mas o infeliz não podia mais, a sombra da morte aproximava-se dizendo: “Não posso mais, mas peço-vos que não me deixem aqui! Sei que vou morrer, mas paciência!” ,

Os quatro presentes tentavam animá-lo, mas nada resultava. Ele voltava a dizer: “Não me estejam a iludir, porque sei que morro! Mas não me deixem aqui! Falta-me o ar!” E nunca mais falou.

Novamente o telegrafista, olhando os seus colegas, disse: “Tenham calma! Ele aqui não ficará.” A vítima, olhando-o, tentou sorrir ao sentir-se confiante. Alguém
 [o Francisco, relatou-me]  correu imediatamente e, atravessando a alta lavra, encontrou o resto do grupo deitado, completamente desorientado. 

Os nervos aumentaram-lhe e disse: “Que cobardia é esta?! É preciso ir buscar o ferido ou então passaremos todos por cobardes.” 

Alguém se levantou, foram dois e com as lágrimas nos olhos disseram: “Tens razão. Deixemo-nos de ser cobardes!” E deram a correr como doidos e foram buscá-lo.

Entretanto, o alferes disse: “Ligar o rádio!” Mas o telegrafista respondeu: “Aqui é impossível. Tratemos primeiro em sair desta zona e depois será possível.” E ele concordou. 

Já se encontrava no meio de todos a vítima, ainda com vida, mas pouco tinha para durar! Não falava mais, ouvia, duas injeções para tentar vedar o sangue, mais pensos, mas nada resultou! O ferimento perfurou os pulmões. Todos os esforços eram insuficientes para lhe salvar a vida! Estava no fim! E com o último sorriso ao de leve, deu um suspiro, morrendo, assim, nos braços dos seus colegas! 

Pragas foram rogadas ao inimigo: “Aqueles malditos”, que nem se chegaram a ver! Eram só desabafos. “Não podemos ficar aqui, temos de seguir, mas agora em sentido contrário!” 

O problema maior era transportar o falecido, mas um outro maior ainda: tinham perdido a carta topográfica e não sabiam qual a direção a tomar. 

Fez-se uma maca com os camuflados e dois paus, e assim se transportou o falecido. Uma ideia: subir ao morro e no alto fazer ligação com o rádio. “Chegamos por volta das quatro horas, ter pronto helicóptero ou ambulância K. Entrem em contacto de quinze em quinze minutos”. 

Perguntaram: «Informem se há Maikes ou Foxtrotes” [Mortos ou Feridos]  ». Estavam mais à vontade por estarem em contacto, mas na verdade a preocupação ainda não tinha acabado, pois não sabiam qual a direção a tomar. 

Tomaram-se várias opiniões, mas ninguém tinha a certeza do que dizia, até que, por fim, por entre uma pequena clareira, avistaram ao longe uns morros carecas. Eram os de Stª Clara. Era precisamente o que interessava. No sopé dos mesmos existia o aquartelamento e a fazenda de Stª Clara. 

Todos se sentiram mais tranquilos, e alguém apontou, dizendo: “Sempre em frente!” Obedecendo à ordem, colocaram-se todos em fila indiana e retomaram a marcha, e todos com receio de voltarem a ser atacados.

O caminho tornava-se difícil. O calor aumentava, e o sangue coalhado nas roupas do falecido começou a cheirar. Uns viraram a cara, para não verem a vítima, outros enchiam-se de coragem, e era o que valia àqueles que a não tinham.

E assim após dez horas de caminhada, debaixo de sol escaldante, onde a sede era grande e o sofrimento incomparável, chegaram ao fim de mais um dos muitos dias de sofrimento. Paz à alma dos que morreram inocentes! Felizes aqueles que se libertaram do perigo! 

Tudo isto foi real, e para mim será inesquecível.

(Continua)

Próximo depoimento: Osvaldo de Fafe atira-se ao rio Tombar, na Guiné, para salvar um camarada da Lourinhã

(Seleção, revisão / fixação de texto, título, negritos, parênteses retos: LG)

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