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segunda-feira, 12 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22098: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte V: Destino: Xime.... E um levantamento de rancho que acabou à bofetada...


Foto nº 1 >  O alf mil Crisóstomo, em primeiro plano...

Foto nº 2 > Regresso de um patrulhamento no subsetor do Xime...

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Guiné > Região de Bafatá > Sector L1  (Bambadinca) > Xime > CCAÇ 1439 (1965/67) > Agosto de 1965 >  O primeiro contacto com as terras do Xime...


Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



1. Continuação da publicação da série CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) (*)



CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque)


Parte V - Destino: Xime...


A viagem do Funchal para a Guiné decorreu sem grandes problemas . A CCaç 1439 embarcou no navio Niassa no dia 2 de Agosto de 1965 . A nossa Companhia era de rendição individual e talvez por isso o nosso comandante, Capitão Pires, tinha saido mais cedo para " preparar a nossa chegada”.

Por razões burocráticas,  que nunca cheguei a compreender,  foi-me dado o comando da CCaç 1439 , até que chegássemos a Bissau onde nos esperava o verdadeiro Comandante da Companhia, o  Capitão Amandio Pires .

Embora estivesse mentalmente preparado "para todas as situações", não deixei de ficar surpreendido pelas condições em que o pessoal estava viajando no Niassa. Os “quadros” viajavam em condições aceitáveis, mas custava-me ver os meus soldados nos andares inferiores do barco, quase uns em cima dos outros em beliches que de conforto pouco ofereciam. 

E logo na primeira noite, baixei e fui ter com eles, para lhes dar um pouco de ânimo. Parece que apreciaram verem o seu "comandante temporário" com eles e passado algum tempo começamos a cantar … E cedo era toda a companhia que cantava, até parecia que o nosso destino não era um teatro de guerra , mas sim alguma romaria. 

 Mas a CCaç  1439 não era a única companhia no barco; cedo me apercebi que membros de outras companhias achavam estranho a euforia "daqueles madeirenses" e queriam dormir, pelo que logo decidi não continuar com a cantarolice e regressei ao andar superior.

Mas na noite seguinte repeti. Desci mais cedo, para evitar ser apupado ou incomodar ninguém, ainda pensando que o cantar um pouco antes de dormir ajudaria a moral de toda a gente. Não foi o caso. Desta vez houve queixa mais a sério; quando a companhia estava já toda empolgada a cantar , fui chamado ao comandante do barco. Que admirava muito a manifestação do patriotismo dos madeirenses, mas que havia outras companhias e nem todos gostavam de ser serenados…

Recordo-me vagamente da nossa chegada a Bissau e da transferência imediata para um barco muito chato que eu nunca tinha visto nem ouvido falar. Não me vão faltar surpresas, pensei eu. E logo seguimos Rio Geba acima, esperando que não fossemos atacados mesmo no meio do rio. É que iamos sózinhos... e eu pensava que pelo menos teríamos uma escolta até chegar ao nosso destino em terra, onde quer que isso fosse.

Por volta das 17.00 PM, (segundo um “relatório oficial’ de que não tinha conhecimento e que o Alferes Freitas me amavelmente me facilitou) finalmente paramos: à nossa frente havia um “ cais improvisado” e logo a seguir "meia dúzia de palhotas”. Era o Xime.

Não me recordo das instalações nem das condições… estava pronto para tudo, nada me ia surpreender. Recordo-me, sim, de sermos informados da existência de uma cantina e das facilidades de adquirir uísque e outras coisas a um preço muito barato. E logo na primeira noite, eu estava entre os que tiraram partido dessas “facilidades', comprando a minha primeira garrafa de Drambuie…

Por outro lado também aprendemos depressa a habituarmo-nos à ementa de feijão frade com bacalhau, salada de grão de bico com bacalhau,  feijão frade com bacalhau, grão de bico… e vira o disco e toca o mesmo. E isso estava a causar mau estar em toda a companhia. 

Um dia começaram a manifestar esse descontentamento na hora do rancho, fazendo barulho com as mamitas, utensílios metálicos,  meio pratos meio caixas . Eu estava de oficial de dia; tinha fama , dizem-me, de ser "de bons modos” e querer ajudar . E talvez por isso pensaram que eu pudesse fazer alguma coisa para remediar a situação. O que não era o caso. Não havia outro remédio senão aguentar até que chegasse nova entrega de víveres; e isso não dependia de ninguém na companhia. 

 Por isso pus a companhia "em sentido” e expliquei que compreendia a frustração de todos, que era a minha também; mas que o fazer barulho com os pratos não ia ajudar ninguém. E pus a companhia "à vontade” para começar a distribuição do rancho, talvez fosse outra vez feijão frade com bacalhau, não me lembro.

O que sei é que o barulho das marmitas embora menos intenso,  recomeçou. E eu imediatamente pus de novo a companhia em sentido e disse que não ia tolerar mais qualquer tipo de barulho como estava a acontecer pela segunda vez. E disse "vamos ficar em sentido um ou dois minutos para que todos tenham tempo de resfriar um pouco esse entusiasmo, antes de começarmos o rancho". 

E virei-me de costas para eles; mas logo ouvi atras de mim o que me parecia serem uns sorrisos de troça ; virei-me de repente e mesmo atras de mim deparei com um soldado, o S..., m posição de "à vontade” e a rir numa manifesta posição de galhofa para todos verem.

Sou e sempre fui um pequenitotes, mas no momento nem tive tempo para pensar: de repente espetei-lhe a maior bofetada que jamais pensava ser capaz de dar na minha vida.

Surpreso,  com esta minha reação, ele tentou desviar-se e pareceu-me que ia cair e eu então com a mão esquerda dei-lhe uma segunda no lado contrário para ele não cair. E foi um silêncio completo; mandei recomeçar o rancho, que não teve mais problemas. 

 O S... tinha fama de ser o homem mais forte da companhia e, de vez em quando, “para medir forças”,   desafiava um outro soldado, a quem todos chamavam “o chinês” pela sua força e aparência, a levantarem um pipo que ninguém mais era capaz de mexer. 

 Logo pensei que "um dia destes vou apanhar murro dele e vou aparecer morto em qualquer lado… ou então será talvez no mato… sou capaz de apanhar mesmo um tiro pelas costas” … E era pensamento que de vez em quando me vinha à mente. "Mas nada há a fazer", pensava. "E a verdade é que ele não devia fazer o que fez” .

Passados muitos meses,   um dia deparei com ele mesmo a meu lado no meio duma bolanha que estávamos a atravessar com água pelos joelhos , como por vezes sucedia . E reparei que ele tinha um sorriso, mas que me pareceu um sorriso amigável. E fui eu que puxei a conversa. "Olha, S..., ainda hoje me custa o que sucedeu no Xime"… E ele não me deixou dizer mais nada, pôs-me o braço no meu ombro e só disse : "Ó meu alferes,  tinha razão”! e senti a pressão do braço dele no meu ombro como para me dizer que o assunto estava esquecido. 

A verdade é que nunca mais tive receio de apanhar um tiro pelas costas no meio de alguma operação no mato!

Não me lembro em que dia foi a nossa primeira patrulha/deslocamento a Bambadinca. Mas menciono-a por não esquecer a minha surpresa quando nos disseram que tínhamos de "picar a estrada por causa das minas”.

Eu esperava algum aparato sofisticado, como se usa para detecção de metais, mas em vez disso eram meia dúzia de paus com um bico de ferro na ponta com que se picava o chão esperançadamente para sem as rebentar , detectar alguma mina que tivesse sido posta …

(Continua)

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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22097: Guiné 61/74 - P22051: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte IV: Composição orgânica: na sua maioria, praças naturais da Madeira, e oficiais e sargentos do Continente

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17092: Convívios (780): Encontro do 50º aniversário do regresso da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : Caldas da Rainha, 29 de abril de 2017... Missa de ação de graças, concelebrada pelo padre Vitor Melícias e pelo capelão da Escola de Sargentos do Exército (ESE)

1. Mensagem do nosso camarada e amigo João Crisóstomo:



[Foto à esquerda: João Crisóstomo, residente em Queens, Nova Iorque; ex-alf mil, CCAÇ 1439 , Enxalé, Porto Gole, Missirá, 1965/67; ativista de causas sociais; natural de A-dos-Cunhados, Torres Vedras; nosso grã-tabanqueiro]:

Data: 28 de fevereiro de 2017 às 12:46
Assunto: Encontro do 50º  aniversário do regresso da  CCAÇ 1439


Caro Luís Graça,

Aqui vai o que já tinha preparado para te enviar, quando a Helena [Carvalho] me mandou finalmente o "convite" onde também vem toda a informação. Mando os dois.

Abraço grande, João

PS - Amanhã, não te esqueças,  faz anos a "minha Vilma"!


 2. Convívio > Dia 29 de abril de 2017 > Caldas da Rainha > 50º aniversário do regresso da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67)


Programa:

12.00— Missa  no Auditório da ESE - Escola de Sargentos do Exército ( Quartel das Caldas, antigo RI 5)

13.30—Almoço no restaurante "Lareira"

Rua da Lareira, Alto do Nobre,2500-593
Caldas da Rainha (tel: 262 823 432)


A Missa será celebrada pelo Sr. Padre Vitor Melícias [, conterrâneo e amigo pessoal de João Crisóstomo,] em concelebração com Sr. Padre Luis Morondo, capelão do quartel das Caldas. O comandante deste quartel, coronel Lino Gonçalves,  um gesto que muito agradecemos, facilita a entrada de viaturas para este evento e autorizou que o bar/café fique acessível para quem o quiser usar.
.
Apesar de todos os anos se ter realizado um encontro desta companhia, esta é a primeira vez que este encontro é precedido por uma missa. Será no dizer dos organizadores uma missa de dupla intenção: de Acção de Graças mas também de sufrágio pelos que na Guiné deram a sua vida
e pelos que depois de voltar já faleceram.

Esta companhia é uma companhia de madeirenses, embora os "quadros" fossem na maioria "do Continente". Porém o oficial "mais velho", António Freitas, é madeirense e vem com alguns outros membros desta companhia para estar presente nesta data celebração. Os outros oficiais que já confirmaram a sua presença são o Alferes Francisco Viamonte Sousa, de Famalicão; Henrique Matos, de Faro [, foi o 1º comandante do Pel Caç Nat 52 (1966/68)],  e João Crisóstomo, que vem de Nova Iorque.

Presente também o dr. Francisco Pinho da Costa que,como médico do Batalhão a que esteve adido esta companhia, teve de voltar para Portugal depois de uma mina com emboscada em que foi vítima.

O comandante desta Companhia, capitão Amândio Pires,  faleceu já anos atrás, Fazia também parte desta companhia o já falecido bem conhecido ator [Luís] Zagallo de Matos, o "herói dos povos do Cuor e do Enxalé".

De salientar ainda a presença da Helena Carvalho, agora residente nas Caldas da Rainha, cuja antiga residência no Enxalé serviu de quartel para esta "companhia de madeirenses", durante a estadia desta na Guiné-Bissau.

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Nota do editor:

Último poste da série > 23 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17077: Convívios (779): Convívio do pessoal do BART 1913 (Guiné, 1967/69), a levar a efeito no próximo dia 27 de Maio de 2017, em Viana do Castelo (Fernando Cepa)

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9073: In memoriam (97): Daniel Matos, ex-Fur Mil da CCAÇ 3518 (Gadamael, 1972/74), falecido no dia 13 de Novembro de 2011

1. A propósito do comentário aposto por um anónimo no Poste 6351 que dizia:  

Agora que o Daniel Matos nos deixou, traído pela doença que o minou, curvemo-nos perante a memória de UM GRANDE HOMEM E UM GRANDE CARÁCTER.

O nosso camarada José Martins acaba de nos mandar este mail com a confirmação da triste notícia:

Boa tarde
Também li o comentário a que te referes.
Procurei obter um contacto, e apenas tinha o mail que referia SITAVA.
É um sindicato ligado à aviação e, assim, telefonei de imediato para o sindicato que, infelizmente, confirmou que o Daniel Matos partiu em 13 de Novembro último, após doença prolongada.

Mais um no Batalhão Celestial, menos um no Batalhão Terreno.

Certamente foi mais cedo para preparar a nossa chegada.

José Martins


2. Comentário de CV:

Foi com enorme pesar que recebemos a confirmação do falecimento do nosso camarada Daniel Matos*. Quando se perde um amigo, um pouco de nós que vai com ele.

Infelizmente, cada vez mais, estas notícias fazem parte do nosso dia a dia e, como afirma o nosso diligente camarada José Martins, estamos todos, aos poucos, a mudar de Unidade, deixando o Batalhão Terrestre a caminho do outro, onde iremos seguramente ter uma comissão de serviço bem mais prolongada.

À família do nosso camarada Daniel Matos apresentamos as nossas mais sentidas condolências pelo infausto acontecimento.
Para nós continuará sempre presente, e a sua colaboração neste blogue é a prova de que podemos morrer, mas a nossa obra fica.

Caro Daniel, até um dia destes.

Pela tertúlia
Carlos Vinhal
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Notas de CV:

- Daniel Matos foi Fur Mil na CCaç 3518 - "Os Marados de Gadamael" - que esteve em Gadamael nos anos de 1971 a 1974. A madeirense CCAÇ 3518, independente, foi mobilizada pelo BII 19, partiu para a Guiné em 20/12/1971 e regressou  a 28/3/974.... Dois anos e três meses de comissão!... Esteve em Gadamael, Brá e Bafatá. Comandante: Cap Mil Inf Manuel  Nunes de Sousa.

- Para consultar o espólio deixado pelo nosso camarada Daniel Matos no nosso Blogue, utilizar os marcadores Daniel Matos e/ou CCAÇ 3518.

(*) Vd. poste 12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5981: Tabanca Grande (208): Daniel Matos, ex-Fur Mil da CCAÇ 3518 (Gadamael, 1972/74)

Vd. último poste da série de 17 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9054: In memoriam (96): Dia 17 de Novembro de 1967, data tão distante, ainda hoje lembrada (Felismina Costa)

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7239: Memória dos lugares (110): BII 19, Funchal (José Vermelho, ex-Fur Mil, CCAÇ 3520, Cacine; CCAÇ 6, Bedanda; CIM, Bolama, 1972/74)








Região Autónoma da Madeira > Funchal > Alguns dos belos painéis de azulejos que existem espalhados pela cidade. Estas são imagens de 2005...Em contrapartida, não tenho nenhuma do BII 19, unidade mobilizadora de muitas companhias (ditas madeirenses) que estiveram no TO da Guiné. Faltam-nos memórias do BII 19 (e do Funchal)... Convidam-se os nossos camaradas que por lá passaram a colmatar estas lacunas... Felizmente temos agora o J.L. Mendes Gomes a evocar os tempos, já longínquos (1963), em que por lá passou... Mas também o José Vermelho (1971).

Fotos: © Luís Graça (2005). Todos os direitos reservados. 



1. Comentário (*) do nosso camarada José Vermelho (que aqui reproduzo, enquanto aguardo a concretização do meu convite pessoal para ele integrar a nossa Tabanca Grande; na foto à esquerda, ele está de T-shirt às riscas, com o seu e nosso camarada Vasco Santos, em convívio recente do pessoal da CCAÇ 6, Bedanda)

Caro Mendes Gomes: Que delícia de relato. Mais uma vez reavivas as memórias que guardo das 2 vezes que aportei à Madeira a bordo do paquete Funchal. 

Há, no entanto, uma diferença bem grande no que diz respeito ao BII 19. Estive lá de Julho a Dezembro de 1971 e, felizmente, não o conheci com as instalações que descreves mas sim já com novas instalações, perfeitamente adequadas ao fim militar a que se destinavam. Ficava a meia encosta e estava rodeado por campos e bananais.

Voltei lá no ano passado, 38 anos volvidos, para o Almoço anual da minha companhia e que decorreu no quartel. Tivemos honras de 2º Comandante, toques militares, e uma 2ª Sargenta (?), mestre de cerimónias e de refeitório (mas que senhora militar...No nosso tempo não havia Sargentos daqueles). Que emoções!

Afinal desviei-me do tema. Era só para dizer que os campos e os bananais à volta do BII19... desapareceram!!! Agora é só casas e mais casas a toda a volta.

Ah! e desculpa lá, mas o espada preto e o atum gaiado dispensava-os bem, na altura.

Espero novos textos teus. Um abraço para ti, extensivo a todos os camaradas

José Vermelho

Ex-Fur Milº
CCaç 3520 - Cacine
CCaç 6 - Bedanda
CIM - Bolama

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de  8 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7238: Cartas, para os netos, de um futuro Palmeirim de Catió (J. L. Mendes Gomes) (4): O Funchal era uma festa...

terça-feira, 29 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6653: In Memoriam (46): Luís Zagallo de Matos, herói do Cuor (Beja Santos)


Luis Zagallo de Matos, ex-alf mil CCAÇ 1439 (1965/67)


1.
  Mensagem do Mário Beja Santos, com data de ontem:


Queridos amigos, Não tenho coragem de telefonar ao Mamadu Camará, ao Queta ou ao Abudu e dizer-lhes que o herói do Cuor abandonou a cena, ainda andou lá pelo firmamento, com garrulice, a despedir-se das gentes que guardam o seu nome. Ali, entre os regulados do Enxalé e do Cuor, ele foi herói, irã e deus da guerra. Coisa curiosa, colou-se à minha pele porque era o nome mais admirado nas gentes que eu comandei. Também por isso me curvo respeitosamente pela sua memória. Um abraço do Mário


Lembranças do Luís Zagallo de Matos (*)
por Beja Santos


Algures, por meados de Maio de 1968, foi-nos comunicado no Regimento de Infantaria nº 1 que o BCaç 2851, de que eu fazia parte, ia seguir para a Guiné, em Julho. Conversando com a Cristina, ela pediu-me insistentemente: "Fala já com o Luís Zagallo, ele veio da Guiné, seguramente que te pode informar do que é que vocês lá vão encontrar. Tens aqui o telefone. Ele trabalha com a família ali para os lados de Santos".


A Cristina fizera amizade com ele na Faculdade de Letras e depois no respectivo grupo cénico, já nessa altura o Luís Zagallo revelara a sua garra de artista e o seu pendor para as artes da encenação. Não fui muito feliz na conversa ao telefone. Disse-me abruptamente que a Guiné era um livro fechado, que pretendia esquecer tudo, era sítio que não recomendava a ninguém, e por aí adiante. Confesso que achei toda esta conversa desprimorosa, havia outros pretextos para não chegarmos à fala, já que era exclusivamente a Guiné o assunto a deslindar. E esqueci o encontro que não chegou a ter lugar.


E em Agosto chego a Missirá. Duas ou três noites depois de lá viver, nas rondas, em conversas com as sentinelas, um nome se foi impondo nas lembranças dos soldados: alfero Zagallo (foto à esquerda), da companhia dos madeirenses [,CCAÇ 1439, Enxalé, 1965/67,], era esta a permanente referência do heroísmo puro, o militar de peito feito, em África ou se ama o guerreiro imortal ou se esquece rapidamente o homem comum.

Toda esta aura entre o mitológico e sobrenatural levou-me a perguntar ao Saiegh: "Quem é este alferes Zagallo que anda na boca do mundo, este semi-deus do heroísmo incomparável?"


E a verdade irrompeu como bomba: estávamos a falar de Luís Zagallo de Matos (foto acima), o mesmo que tinha estagiado em Paris e no Teatro Nacional D. Maria II. Daí as cartas que lhe enviei, algumas não obtiveram resposta, outras trouxeram as fotografias que os soldados pediam, vieram notícias inócuas, muitos cumprimentos, numa dessas cartas (aqui está a arte de bem representar) o Luís chegava ao cúmulo de prometer voltar a Missirá e ao Enxalé. O teor das cartas que lhe enviei e de que guardei lembrança, vêm nos meus dois livros sobre a minha comissão na Guiné (**).

O resto está escrito no blogue, era uma morte anunciada. O astro definhara depois de um brutal AVC, recusava ver amigos e conhecidos. Afugentou-me do seu quarto, na Casa do Artista. Depois fui lá com o João Crisóstomo, aceitou ver-me. Levava decorada a mensagem, saiu-me de um só jacto, era a minha vez de me pôr no palco: "Luís, os nossos soldados nunca o esqueceram. O seu nome é sempre lembrado em Missirá e no Enxalé. O Luís é o destemido condutor de homens que eles recordaram com grande saudade. Veja se melhora e cumpre a promessa de lá voltar".


Com um nó na garganta, acabei a prédica em frente daquele homem acamado que dava contínuos sinais de desalento para a vida. Sorriu-me, virou-me a cara, a conversa findara.


No dia seguinte, na reunião em Coruche, ele foi recordado. No domingo passado, a minha filha telefonou-me ao princípio da tarde, o Luís tinha partido. Claro que não partiu, anda a parodiar nos céus do Cuor, se fosse uma personagem do Jorge Amado emborcava cachaça, metia-se num jipe de madrugada e ia de Enxalé até Missirá a afugentar os demónios, cantarolando. Mas não, ele esvoaçou por aqueles céus e recordou, na plenitude, as amizades que ali fez, cumpriu a promessa visitando as gentes que nunca o esqueceram. Agora descansa em paz, tem direito à representação final. 


Mário Beja Santos


[ Fixação de texto / Bold a cores: L.G.]
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Notas de L.G.:


 (*) Vd. poste de 27 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6646: In Memoriam (45): Luís Zagallo (1940-2010), actor e encenador, ex-Alf Mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, 1965/67)


(**) Vd. 30 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1637: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (40): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (2)


Carta para Luís Zagalo Matos

(...) "Estimado Luís Zagalo:

"Obrigado pela sua carta. Li-a aos homens de Missirá, riam e batiam as palmas de contentamento por saber que não esqueceu este povo. Vou tirar fotografias e mandar-lhe. Tenho aqui um soldado que insistiu em contar-me as suas façanhas, ele estava de sentinela e durante horas ouvi falar de si, arrumando ideias sobre o princípio da guerra e o seu desenvolvimento até hoje.



"Os meus soldados estavam em Enxalé ao tempo em que aqui havia uma companhia, a que V. pertencia. O pelotão 54 estava em Porto Gole, o 52 acabava de chegar a Enxalé. V. estava destacado em Missirá e fazia frequentemente o percurso com dois Unimogs e um jipe, reabastecia-se no Enxalé. Até ao dia em que uma mina anticarro mudou tudo, na curva de Canturé em ligação com a estrada ao pé de Gambana.

"Este meu soldado, de nome Queta, contou-me que um furriel ficou tão despedaçado que foram buscar as pernas a uma árvore. Para este povo V. é um herói porque conhecia toda esta região, era destemido e amigo de ajudar. O Queta não é para intrigas, baixou a voz e disse-me "Nosso alfero, Zagalo ia a toda a parte mas tinha medo de ir ao Gambiel, pois naquela altura as tropas portuguesas abandonaram os quartéis em Mansomine e Joladu, só ficou Geba". Como não lhe quero tirar os méritos, estou inteiramente à sua disposição para o levar ao Gambiel, se este episódio for importante para que o seu nome se torne numa lenda.

"Por aqui, chegou a minha vez de ter o quartel incendiado e de estar a viver as maiores dificuldades. Mas não vou incomodá-lo mais com esta guerra, fico feliz por saber que V. foi colega da Cristina. Como não irei a Portugal tão cedo, e se for possível ajudar-me peço-lhe que lhe telefone e lhe fale desta guerra, desdramatizando o que é possível desdramatizar.

"Prometo mandar-lhe as fotografias em breve, não espero ir ao Enxalé mas vou mandar fotografias do Geba e dos palmeirais à hora do pôr do Sol. Se lhe for possível, na resposta mande-em uma fotografia sua para eu entregar ao régulo. Só fiquei triste em saber que V. nunca mais teve um sono completo e que tem pesadelos quando se lembra dos momentos trágicos que passou. Desejo que recupere e peço-lhe por tudo que me dê companhia, pois os amigos de Missirá meus amigos são. Até breve" (...).

domingo, 2 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6297: Controvérsias (71): Contemos as nossas experiências e deixemos as especulações para quem não esteve lá (Carlos Vinhal)

3.º Pelotão da madeirense CART 2732



Comentário de Carlos Vinhal*, ex-Fur Mil, CART 2732 (Madeirense), Mansabá, 1970/72, na qualidade de tertuliano:

Alguns considerandos em relação ao poste 6292** de hoje, 2 de Maio de 2010

Camaradas
Este blogue está a deixar-me deprimido.

Julgava eu que nós, os portugueses, somos um povo de brandos costumes, hospitaleiros, afáveis, amantes da paz, amigos dos vizinhos, etc., e afinal somos (ou fomos) um bando de assassinos na guerra colonial. Posso excluir-me? Muito obrigado.


1. Escreveu em tempos o Alberto Nascimento, que foi só e apenas Soldado Condutor Auto, logo menos interventivo em operações de grande envergadura:

Contar com pormenor o que se passou no decorrer da operação é impossível, já que fui colocado num posto de onde só podia abarcar uma pequena parte da povoação, que ocupava uma área enorme, mas o constante matraquear das auto-metralhadoras e G3 deixavam antever um morticínio.

Quando a meio da tarde o Comando deu por terminada a operação é que fui, pelo caminho, vendo a destruição provocada pelos lança-chamas, auto-metralhadoras e G3. Samba Silate estava, na sua maior parte, destruída. Num largo da povoação estavam concentrados um grande número de prisioneiros, um dos quais, talvez movido pelo desespero e terror, intentou a fuga, tendo sido abatido. Os outros foram divididos entre Bafatá e Bambadinca, de onde poucos ou nenhuns saíram.


Posso ajudar o Nascimento com umas contas rápidas para calcular o tal morticínio.
Se 20 militares levarem cada um, uma G3 com 5 carregadores e se aproveitar uma em cada quatro munições disparadas, matar-se-ão ali num intantinho... vamos lá ver:

20 militares X 5 carregadores X 20 munições = 2000 munições X 1/4 = 500 mortos.

Estamos ainda a desprezar a metralhadora de fita (MG47), mais eficaz, o lança granadas e o lança-chamas. Isto sim, é morticínio, nem o Shelltox mataria com tal eficácia.

Nascimento, afinal quantos mortos viste quando chegaste ao local da operação?


2. Quanto ao Armandino, que em comentário, diz o seguinte:

Quando cheguei a Bissau em Outubro de 66 comentava-se que houve uma Companhia de Madeirenses que teve que ser embarcada à força, pois eles recusavam-se a embarcar para a Metrópole. Diziam que tabanca por onde eles passassem deixava de existir. O lema deles era que quanto menos pretos houvessem mais depressa acabava a guerra.
Não faço a mínima ideia que companhia era mas sei que regressou em fins de 66


Vamos lá ver Armandino.

As primeiras Companhias insulares a irem para a Guiné, tirando as Berlengas, foram:

Do BII17 – Angra do Heroísmo - Açores - a CCAÇ 1438 que chegou à Guiné no dia 18 de Agosto de 1965 e regressou a 18 de Abril de 1967. Em Outubro de 1966 estava em Quinhamel.

Do BII19 – Funchal – Madeira - a CCAÇ 1439 que chegou à Guiné a 02 de Agosto de 1965 e regressou a 18 de Abril de 1967. Em Outubro de 1966 estaria em Enxalé.

Podes precisar?

Diga-se em abono da verdade que qualquer Companhia que se prezasse não aceitaria vir embora antes de terminado o tempo normal de comissão, ainda por cima sendo madeirense e gostando de matar. É de homem.

Caro Armandino, recentemente, cerca da 1 hora da madrugada, fiz com outro amigo, o percurso entre a Sé e o Casino do Funchal (alguns quilómetros) e não fomos atacados por nenhum madeirense, nem vimos cadáveres na berma da estrada. No Funchal vive-se lindamente, anda-se de noite com mais segurança do que no Porto ou em Lisboa.

Já agora uma achega, não seria uma Companhia de algarvios, ou alentejanos, ou transmontanos, ou de militares dos arredores do Porto, gente que até apedreja os autocarros do Benfica?

É conveniente não se meterem rótulos nas embalagens de que não se conhece o conteúdo, olha o que aconteceu no Hospital de Santa Maria, de Lisboa.

Não esqueças Armandino que as Companhias madeirenses e açorianas tinham no seu Comando Oficiais e Sargentos oriundos do Continente, e um ou outro insular, que também os havia e bons.

Não podemos dizer que não cometemos proezas de que nos envergonhemos hoje, mas alimentar morticínios por estimativa, e alegar que houve uma Companhia daqui ou dali que fez isto ou aquilo segundo se ouviu dizer, é pura especulação e não é importante para a história que aqui queremos deixar.

Matar e morrer faz parte da guerra. Contemos os factos que vivemos, e mesmo assim esperemos que alguém, na mesma hora e no mesmo lugar, tenha visto o filme doutra maneira diferente da nossa.

OBS:-Negritos da minha responsabilidade

CV
__________

Notas de CV:

(*) Vd. último poste de 20 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6194: Convívios (133): Encontro comemorativo da ida da CART 2732 para a Guiné, Funchal 10 de Abril de 2010 (Inácio Silva/Carlos Vinhal)

(**) Vd. poste de 2 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6292: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/ Mai 71) (10): Samba Silate

Vd. último poste da série de 27 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6261: Controvérsias (70): Os peões das Nicas (Mário G. R. Pinto)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5392: Em busca de... (104): Luís Zagallo (ex-Alf Mil, CCAÇ 1439) - Um pedido de ajuda do João Crisóstomo (EUA) que me encheu de lágrimas (Beja Santos)




1. O nosso tertuliano Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), enviou-nos, em mensagem datada de 27 de Novembro de 2009, esta troca de mensagens:





i - De: João Crisóstomo
crisostomo.joao2@gmail.com
Data: 27 de Novembro de 2009
Assunto: pedido de ajuda ....

Prezada Sra. Rosa Clemente,
(Pelo endereço do mail assumo ser este o seu nome..)

O meu nome é João Crisóstomo. Vivo em Nova Iorque. Encontrei (na véspera do meu regresso aos USA) depois de breve estadia em Portugal um livro que despertou a minha curiosidade. Nele vim a encontrar o nome de uma pessoa de quem era amigo, mas cujo contacto perdi há quarenta e dois anos. Depreendo ser amigo do autor e venho pedir-lhe o favor muito especial de encaminhar a mensagem que segue ao autor deste livro, na esperança de poder reencontrar este meu amigo.

Como ontem foi o começo "oficial" das festas natalícias nos USA, depreendo que aí em Portugal deve suceder o mesmo e portanto, com os meus antecipados agradecimentos pelo favor que acabo de pedir, queira aceitar também os meus melhores votos para a época festiva que agora começa: Um Natal e Ano Novo portador de bem estar, sucesso e felicidades.

João Crisóstomo


ii - A mensagem que João Crisóstomo pedia para encaminhar, era esta:

Caro Senhor Mário Beja Santos,
Na ânsia de poder ver e ler algo sobre a Guiné, procurei e encontrei numa livraria em Lisboa o seu Diário da Guiné1968-1969 Na Terra dos Soncó, livro que agora devoro com uma sofreguidão esfomeada de dezenas de anos de espera...

Pelo que estou lendo acredito que até vai compreender e acreditar que por vezes tenho sido obrigado a interromper a leitura, que a emoção e as lágrimas me obrigam a parar, ao reviver os meus tempos na Guiné também, tempos que agora também eu lembro com uma emoção mista de muita dor e saudade.

Tanto mais que os seus relatos e as suas experiências são na grande maioria um prosseguimento (ainda mais profundo e doloroso, assim me parece, senão pela intensidade pelo menos pela mais amiudada frequência de acontecimentos que relata) do que eu aí passei.

Fui um dos alferes da Companhia de Caçadores 1439, desembarcada no Xime em 1964; dois meses depois fomos para Bambadinca onde ficámos vários meses antes de seguirmos para Enxalé... Porto Gole. Mato Cão, Finete, Missirá....

E de repente vejo o nome do Luís Zagalo, meu colega, que relembro com muita saudade mas cujo contacto perdi. Só este ano, (42 depois) vim a encontrar pela primeira vez alguns meus colegas-irmãos, (pois vejo que também para si esta guerra foi forjadora de laços literalmente de sangue que nada poderá apagar e esquecer). Do Zagalo não sei nada. Fui eu e o meu pelotão, reforçado por voluntários de cozinheiros a padeiros, condutores e milícias que de Enxalé, onde exaustos tínhamos acabado de chegar também duma operação, corremos desalmadamente ansiosos ao seu encontro, pois nada mais sabíamos a não ser que tinha sofrido uma mina perto de Mato-Cão e havia casualidades.

Já tinha decidido quando fosse a Portugal na próxima vez (talvez para fins de Fevereiro-Março 2010) tentar procurar o Sr. Beja Santos: queria conhecê-lo pessoalmente... não preciso dizer mais com certeza pois, acredito, sabe o que sinto.

Mas agora que verifico que conhece bem o Zagalo, pode-me fazer o favor de lhe falar no João Crisóstomo? Que o quer de novo ver e abraçar? Vou tentar até reunir-me com outros aí em Portugal (a maioria dos nossos soldados era madeirense, mas os "quadros" excepto pelo alferes Freitas eram da Metrópole) em reunião de revivência e saudade. Oxalá ele possa e queira participar. Mas se tal não for possível (e eu respeito muito que outros tenham motivos para pensar e agir de maneira diferente da minha) diga-lhe que, como a um irmão que pensei ter perdido mas que agora soube estar vivo e sonho poder reencontrar, que com os outros ou a sós o quero de novo abraçar.

Fico aguardando com muita antecipação o favor duma resposta. Até lá, os meus antecipados agradecimentos por tudo; por este favor que agora peço, pelo livro maravilhoso que escreveu... pelas muitas horas de saudade e emoção que tal me tem proporcionado... e os meus melhores votos para a época festiva que agora começa.

Saudações amigas e respeitosos cumprimentos do
João Crisóstomo


iii - Mário Beja Santos respondia assim a João Crisóstomo:

Meu estimado João Crisóstomo,
Abro a caixa do correio e chega o assombro da tua mensagem. Em camaradagem, viajei imediatamente contigo até ao Geba, e subi a Missirá.

Vou procurar ajudar-te a encontrar o Luís Zagallo, de nome completo Luís Manuel de Mello Carneiro Zagallo de Matos. É uma cara familiar para o público português, no teatro, no cinema e na televisão. Estudou bailado em Paris, teve os seus primeiros pequenos papéis na Comédie Française. Fez parte do Teatro Universitário e mais tarde da Companhia de Amélia Rey Colaço, no Teatro Nacional D. Maria II. Em 1964, partiu contigo para a Guiné, foi condecorado com uma cruz de guerra e diversos louvores.

Como vives em Nova Iorque, não sabes o que significa a série "Zé Gato" e contracenou com nomes como Maria de Medeiros, Eunice Muñoz e Ruy de Carvalho. Participou também como actor convidado em várias séries de televisão como "Nico de Obra" ou "Camilo e Filho". No teatro, foi uma presença constante na novela "Morangos com Açúcar". É cacilhense, falei agora mesmo para a Sociedade Portuguesa de Autores, ele também é sócio, todas as tuas mensagens para o Luís Zagallo devem ser dirigidas para o email atendimento@spautores.pt.

Vais ver como o Luís te vai responder em breve. Não há maior comoção para um autor que receber uma carta como a tua. Os meus livros foram inicialmente publicados no blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné (http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/), recomendo-te que mates algumas das tuas saudades convivendo regularmente connosco. E, se puderes, faz-te tertuliano.

O Luís Zagallo era o herói dos povos do Cuor e do Enxalé. Vou pôr-te hoje em contacto com o Henrique Matos Francisco, que é o primeiro comandante do Pelotão de Caçadores Nativos n.º 52.

Logo que chegues a Lisboa, contacta-me, por favor. Vou pedir no blogue que se dê publicidade a este momento de alegria e confraternização. A Guiné nunca saiu da minha vida. Não pode sair das nossas vidas, se não tu não terias escrito o que escreveste. Fazendo-me chorar. Estou agora a acabar a Mindjer Garandi, é um regresso à Guiné, se não to der em Lisboa, tu dás-me hospedagem em Nova Iorque e eu levo-te o livro.

Um grande abraço e uma comoção muito grande pela surpresa que me trouxeste,
Mário Beja Santos


iv - Finalmente o agradecimento de João Crisóstomo a Rosa Clemente, Relações Públicas do Círculo de Leitores/Temas & Debates:

Obrigado, Sra. Rosa Clemente,  pelo favor tão prontamente concedido, que me proporcionou já inesperada jorrada de emoções. Obrigado, muito.

Obrigado,  meu caro Beja Santos. Sinto que arranjei mais um irmão. Na minha casa (bem modesta mas, dizem, acolhedora) te espero de coração e braços abertos, tão logo me possa dar essa grande satisfação.

João Crisóstomo


Foto 1 > Na messe: 1 - Cap Mil Pires, Cmdt da Companhia [CCAÇ 1439]; 2 - Alf Mil Sousa; 3 - Alf Mil Zagalo; 4 - Médico do Batalhão; 5 - eu; 6 - Alf Mil Marchand, Cmdt do Pel Caç Nat 54; 7 - Fur Mil Antunes, falecido em combate; 8 e 9 - Fur Mil Monteiro e Altino, do meu Pelotão.

Foto do Fur Mil Viegas, do PelCaç Nat 54.


Foto 2 > Na enfermaria > Copos com pessoal da Companhia: de camuflado o Alf Mil Crisóstomo, ao lado estou eu de cigarro nos dedos (para variar); por trás do Crisóstomo, está o Alf Mil Freitas.
Foto do Leiria, Condutor da CCAÇ 1439.


Foto 3 > Encontro, 42 anos depois, no Entroncamento com o Crisóstomo. Da esquerda para a direita: Fur Mil Geraldes (Enfermeiro) e Farinha; Crisóstomo; Teixeira, também ex-Fur Mil; eu; Pimentel e Carvalho, Condutores da 1439.

Fotos enviadas e legendadas: © Henrique Matos (2009). Direitos reservados



2. Comentário de CV:

Caro João Crisóstomo, reforçando o convite do camarada Mário Beja Santos, estou a sugerir que aderiras à nossa Tabanca Grande, como é conhecido o nosso Blogue, e a colaborares connosco na feitura desta memória colectiva. Todas as histórias dos ex-combatentes da Guiné são preciosidades que queremos dar a conhecer aos mais novos.

Escreve uns textos com as tuas memórias, junta as tuas fotos e manda-nos para que seja publicado.

Em nome da tertúlia deixo-te um abraço e votos de que a vida te corra pelo melhor aí nos Estados Unidos.
_________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 2 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5390: Postais ilustrados (15): Postais Antigos da Guiné, de João Loureiro - Uma relíquia (Beja Santos)

Vd. último poste da série de 22 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5314: Em busca de... (103): Procuro informações sobre Camaradas que estiveram em Nhacra - 1972/74 (Firmino Ruas Mendes)

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5282: Gabriel Telo e José Carlos Machado, CCAÇ 3518, Guidaje, 1973: Presentes ! (Juvenal Candeias)




1. Mensagem do Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cacine, Guileje, Cameconde, 1971/74, membro da nossa Tabanca Grande desde Maio último (*)


Caros amigos,

O passado sábado, no Monumento aos Mortos do Ultramar, foi de muita emoção com a chegada dos restos mortais do Gabriel Telo e do José Carlos Machado (**), que pertenceram a uma companhia - CCaç 3518 - "irmã gémea" da minha - CCaç 3520.

Formámos as companhias no BII 19, no Funchal, donde saímos para a Guiné na madrugada do dia 20 de Dezembro de 1971, no Angra do Heroísmo.

Depois da IAO no Cumeré, viajámos novamente juntos para o Sul, eles com destino a Gadamael, nós a Cacine.

Estava também presente na cerimónia alguém que eu não via desde a Guiné. O Daniel Matos, Furriel Miliciano da CCaç 3518, que estava no mesmo abrigo em que o Telo e o Machado morreram. Foi ele que tratou de todo o trabalho fúnebre seguinte! Naturalmente que ele estava ainda mais emocionado e não conseguiu suster as lágrimas.

Desculpem lá este assunto, mas tinha que desabafar com alguém!

Assim sendo, hoje não há história com tiros e flagelações! (***)

Vai [, depois,] uma história breve e soft para desanuviar! E podem gozar-me à vontade! Eu quero é que vocês riam e sejam felizes! Nem que seja à minha custa!

Um grande abraço.

Juvenal Candeias

_____________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 6 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4294: Tabanca Grande (136): Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cacine, Cameconde (1972/74)

(...) Como eu já tinha dito ao Luís, os meus textos têm normalmente algumas especificações desnecessárias para os antigos combatentes, mas a realidade é que eu os escrevo, primeiro que tudo para os meus filhos e a seu pedido! Portanto, se quiseres corrigir... estás à vontade! (...)

(**) Vd. poste de 14 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5272: Efemérides (31): Regressaram os restos mortais de mais três heróis de Guidaje, Maio de 1973 (José Martins)

(...) (ii) 1º Cabo GABRIEL FERREIRA TELO, mobilizado no Batalhão Independente de Infantaria nº 19, no Funchal, integrando a Companhia de Caçadores nº 3518, solteiro, filho de João de Jesus Telo e Maria Flora Ferreira Telo, natural da freguesia de Paul do Mar, concelho de Calheta - Madeira:

Morreu em Guidaje em 25 de Maio de 1973, vítima de ferimentos em combate durante um ataque inimigo ao aquartelamento. Foi sepultado no cemitério de Guidaje.

(iii) Furriel miliciano JOSÉ CARLOS MOREIRA MACHADO, mobilizado no Batalhão Independente de Infantaria nº 19, no Funchal, integrando a Companhia de Caçadores nº 3518, solteiro, filho de Manuel achado e Delta de Jesus Moreira, natural de freguesia de Ervões, concelho de Valpaços:

Morreu em Guidaje em 25 de Maio de 1973, vítima de ferimentos em combate durante um ataque inimigo ao aquartelamento. Foi sepultado no cemitério de Guidaje. (...)


Vd. também os postes de:

22 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2785: Ninguém Fica Para Trás: Grande Reportagem SIC/Visão (3): Sabemos ao menos quem foram e onde estão ? (Luís Graça)

24 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1546: Lembrando a CCAÇ 3518, os Marados de Gadamael, retidos no inferno de Guidaje (Daniel de Matos)

(...)Como estive 22 dias cercado em Guidaje (Maio/Junho de 1973), gostaria de deixar também um testemunho. Tal como o posto de transmissões, nas fotos referidas também não aparece o abrigo do obus, destruído a 25 de Maio, onde me encontrava no momento do rebentamento da morteirada, com mais 15 camaradas, metade dos quais que ali se refugiaram durante um ataque do IN. Desses, morreram logo 6 (que dias mais tarde fui incumbido de enterrar nas imediações) e apenas eu não fui ferido (todos os outros se feriram com diferentes gravidades).

A maioria pertencia à minha companhia, independente - a CCAÇ 3518, Marados de Gadamael - que ali viu retidos 2 pelotões durante um abastecimento de cibe vindo de Bissau, fazendo segurança à coluna que inicialmente se destinava apenas a Farim.

Não percebo por que razão esta Companhia nunca aparece referenciada nos acontecimentos de Guidaje e nos efectivos que lá permaneceram nesses dias fatídicos. Aliás, o número de mortos em combate que muitas vezes é mencionado, parece-me incorrecto. Lembro-me de enterrar camaradas envoltos em lençóis, por já se terem esgotado os caixões...

Cordiais saudações
Daniel de Matos
(ex-Furriel Miliciano) (...)


(***) Vd. postes da série Histórias de Juvenal Candeias:

16 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5113: Histórias de Juvenal Candeias (5): Vicente, o Piu

16 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4961: Histórias de Juvenal Candeias (4): Há periquitos no Quitafine

1 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4623: Histórias de Juvenal Candeias (3): Um Manjaco em chão Nalú

12 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4323: Histórias de Juvenal Candeias (2): Incêndio no Rio Cacine

7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4299: Histórias de Juvenal Candeias (1): Pirofobia ou a mina que não rebentou por simpatia

sábado, 29 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4880: História da CCAÇ 2679 (24): Emboscada na estrada Pirada-Bajocunda e mazelas (José Manuel M. Dinis)

1. Mensagem de José Manuel M. Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, com data de 25 de Agosto de 2009:

Carlos,
Anexo mais um pedaço da lenga-lenga que reporta algumas passagens da 2679 por terras do leste da Guiné. Já assentámos em Bajocunda, onde os dias tranquilos só esporadicamente serão interrompidos por acções do IN, na forma de flagelações aos aquartelamentos, na colocação de minas, e fazendo emboscadas. Das eventuais emboscadas só uma foi concretizada, e foi a CCA que teve o privilégio de a apanhar. Das restantes duas conhecidas, ambas dedicadas ao Foxtrot, a seu tempo darei notícia do que aconteceu.

História da CCAÇ 2679 - 24

Emboscada na estrada Pirada-Bajocunda


A Companhia de Comandos Africanos ainda permanecia em Bajocunda, dando, naturalmente, apoio operacional. Por esta altura a 2679 estava mais vocacionada para as tarefas da quadrícula e todas as noites enviava um Gr Comb para Tabassi, onde a autodefesa era uma miragem. Por outro lado, mantinha outro destacado em Copá. Os patrulhamentos e emboscadas nocturnas competiam, maioritariamente, aos Comandos. No que respeitava às deslocações em colunas, a 2679 garantia a maior parte delas.

No entanto, uma ocasião calhou a um Gr Comb da CCA fazer uma coluna a Nova Lamego. Tratava-se de uma escolta a uma coluna de reabastecimento, que também incorporava viaturas civis carregadas de mercadoria para Bajocunda, prevenindo o eventual corte da estrada por efeito do crescimento das linhas de água.

Não me recordo qual dos Gr Comb teve esse incumbência, mas lembro que o Teixeira, o sagento careca que usava uma mosca proeminente, participou na viagem.

No regresso, na zona encharcada do pequeno pontão, entre Pirada e Tabassi, onde se abrandava porque o nível da água cobria a estrada e o pontão, ocorreu uma emboscada.
Não estava lá, pelo que não sei com rigor o que aconteceu. Mas ficámos a saber que as NT reagiram pronta e eficazmente, repelindo o IN que retirou em direcção ao Senegal.

Na tropa não houve baixas a registar, mas uma viatura civil Bedford, carregada de mercadoria, deve ter sido atingida por um rocket que a afectou no rodado traseiro do lado esquerdo, destruindo-o, e impedindo a continuação da marcha. Na cabine, o condutor, um guinéu, não teve oportunidade de se proteger e morreu vítima de alguns tiros disparados para a porta, perfurando-a. Obras de alguns bons atiradores do IN, que estariam a pouca distância. Nada mais foi molestado. A mercadoria foi transferida para viaturas militares e a chagada a Bajocunda aconteceu com o cair da noite.

Não houve notícia de outras baixas e, nessa noite, foi necessário montar segurança no local para salvar o destroço, encaminhando-o no dia seguinte para o aquartelamento, onde se mantinha na data do meu regresso. No auto de abate e destruição, suponho, aquela viatura estaria carregada com muito mais mercadoria do que efectivamente transportava.


As mazelas

Referi anteriormenteque o Foxtrot andava com um deficit de pessoal, em resultado de situações de incapacidade temporária, ou, mais raramente, por gozo de férias. Na verdade foram poucos os que gozaram férias durante a comissão, porque sendo o pré uma minguada importância que se esgotava numas cervejolas, poucos podiam contar com o auxílio familiar para se deslocarem à Madeira, ao Continente, ou mesmo na Guiné. Abdicando do direito às férias, o seu contributo à Pátria era maior do que seria exigido, aumentando o castigo dos mais desfavorecidos.

Entretanto, a doença alastrava. O paludismo, frequentemente, atacava um ou outro. Em Piche tive essa experiência, com febres altas e o corpo quebrado, incapaz e apático para o que fosse. Mas as injecções de Resochina (pronuncia-se resoquina) que o Vitor ministrava, retornava-nos à vida em 4/5 dias. Reincidirei em Bajocunda com novo paludismo, apesar da grande redução de mosquitos relativamente à região do Corubal, e à maior exposição consequente.

Ainda em Piche, uma ocasião, seriam 15h00, tinha regressado de uma coluna ao Gabú e estava a comer uma sopa liofilizada e restos que sobraram na messe, quando me chamaram ao Major de Operações, que tinha notícia de movimentos do IN próximo do Corubal, a SW, e era imperativo que arrancasse nessa direcção.

Foi um frete e uma correria, parecia que aumentava o peso das armas, caregadores e cantis, toc-toc, cantis que se esgotaram de água num esfregar de olho. Na passagem pela bolanha, corria o suor em bica e ressentiam-se as pernas, cavei com as mãos até encontrar lama, de que enchi o cantil e chupei através do lenço, em função de filtro, para, a seguir, voltar a enchê-lo numa água parada, sem quaisquer condições, e saciar-me da sede a que sucumbia. Estas atitudes aconteciam com a consequente ingestão de micro-organismos que nos devassavam por dentro, com o mesmo ímpeto com que os turras queriam limpar-nos o sarampo do corpinho.

Também por isto, viria a passar uma temporada no Hospital, vitima de uma amibíase, cujas amibas me beberam os glóbulos vermelhos.

Por influência de uma qualquer bactéria, apareceram alguns casos de testículos inchados, imponentes, que não só constituíam grande sucesso fotográfico, como presenteavam as vítimas com a necessária deslocação à consulta externa.

A par destas maleitas, também abundava a micose, doença típica da nossa inadaptação ao território e ao clima. As micoses são provocadas por fungos, e era nas virilhas que mais se revelavam. De facto, os nativos usavam o chamado saco de merda, que consistia nuns calções largos, fechados na cintura e nas pernas, provocando uma caixa de ar envolvente às partes genitais que garantiam alguma frescura e ligeireza. Ao contrário, nós, produtos da civilização, usávamos cuecas apertadas, que roçavam e danificavam as transpiradas virilhas, abrindo caminho aos fungos inimigos e à micose, com o prurido castigador. Disso fui grande vítima sem ganhar juízo. Nem pomadas, nem o iodo, nada me valia, só o clima seco da Europa veio tranquilizar-me.

Inesperada foi a morte do soldado Aguiar, um madeirense atinado, que teve o azar de, no remoto quartel de Bajocunda, sem médico nem meios de diagnóstico, ter sido medicamentado para paludismo, face à elevada febre e à falta de forças que apresentava, de que levou dois tratamentos sem os resultados pretendidos. Evacuado de urgência, entrou no avião combalido. Terá saído em Bissau vítima de meningite.

Esta narrativa não esgota o rol de mazelas que afectavam a tropa. As do foro psicológico também eram frequantes, com manifestações inopinadas, mas, felizmente, no Foxtrot não ocorreram para além das divertidas maluqueiras do quotidiano.

Por fim, não se tem falado muito nisso, mas alguns militares deram tratamentos desajustados às figadeiras, alguns, provavelmente, com reflexos na vida futura.
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 7 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4793: História da CCAÇ 2679 (23): Questão bicéfala (José Manuel M. Dinis)

domingo, 4 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3696: Para a história da madeirense CCAÇ 4942/72, Os Galos do Cantanhez (Vítor Negrais)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje > 2 de Março de 2008 > Monumento assinalando a passagem, por aqui, da CCAÇ 4942/72, de origem madeirense, conhecida por Os Galos do Cantanhez. Estiveram em Jemberém (os guineenses hoje dizem Iemberém) entre Março de 1973 e Fevereiro de 1974.

Fotos: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados.

1. Comentário que Vítor Negrais deixou ao poste de 8 de Janeiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2421: Em busca de... (15): Pessoal da companhia madeirense que esteve em Jemberem (1973/74) (Luís Candeias, amigo do Arsénio Puim)


Caro Luís Candeias.

Assunto: Pessoal da companhia madeirense CCAÇ 4942/72 que esteve em Jemberém.

Mesmo que tardiamente, quero contribuir para um melhor conhecimento do que foi o papel da CCAÇ 4942/72 (*).

Quero referir que a foto publicada com um membro feminino de uma ONG em Jemberem não corresponde ao deixado no local pela CCAÇ 4942/72 (**). O símbolo adoptado pela companhia foi um galo multicolor associado à designação Galos do Cantanhez.

(i) A CCAÇ 4942/72 foi formada no Funchal, no BII19.

(ii) Rumou à Guiné no Uíge que saiu de Lisboa a 27 de Dezembro de 1972, ocorrendo o seu desembarque em Bissau em 3 de Janeiro de 1973.

(iii) A companhia, como era usual na altura, rumou ao Cumuré onde fez o IAO.

(iv) Concluido este, foi para Mansoa, por um curto período de tempo, tendo colaborado na protecção da construção da estrada entre Jugudul e Bambadinca.

(v) Após este curto período, tomou o rumo de Cadique, no Cantanhez, e esteve na abertura da estrada entre Cadique e Jemberem, localidade onde se fixou cerca de 1 ano (1 ano bem animado).

(vi) Posteriormente, em Fevereiro de 1974 a companhia foi deslocada para o Norte, para Barro mantendo um pelotão em Bigene junto do COP3.

(vi) A companhia regressou a Portugal em 9 de Setembro de 1974, depois de muitas peripécias, sem nenhuma baixa.

Cumprimentos a Luís Graça e camaradas da Guiné e parabéns pela manutenção deste espaço de convívio.

Vítor Negrais

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Vítor, por estas preciosas achegas sobre Os Galos do Cantanhez. Obrigado também pelas tuas simpáticas referências ao nosso blogue. Não te apresentaste, mas presumo que tenhas pertencido à CCAÇ 4942/72. És do continente ou da RAM ?

Se quiseres, junta-te a nós, que formamos já a maior Tabanca virtual... da Guiné. Basta leres e aceitares as nossas regras de convívio (que podes e deves ler na folha de rosto do nosso blogue, coluna do lado esquerdo: Tabanca Grande > Dez normas de conduta). Manda também as duas fotos da praxe (um do tempo da tropa e outra actual).

Gostaríamos que nos contasses mais peripécias dos teus Galos do Cantanhez. Tens tido notícias dos teus camaradas ? Presumo também que tenhas histórias e fotos da vossa permanência no Cantanhez, bem como do período do pós-25 de Abril. Estive em Março de 2008 no Cantanhez e registei em fotografia os vestígios da vossa passagem por Jemberém.

Um abraço. Desejo-te as melhores perspectivas possíveis para o ano que agora começa. Luís Graça

_____________


Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 29 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2695: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (11): Iemberém, uma luz ao fundo do túnel

(**) Há três locais e datas assinaladas no monumento: Mansoa, 3/2/73; Cadique, 27/3/73; Jemberém, 20/4/73. O brazão da companhia era constituído por um Galo, com os dizeres Cantamos de Galo. (...)
Sabemos como se chamavam os seus Grupos de Combate: Os Primitivos (1º Gr Comb); Os Descavilhados (2º Gr Comb); O Zigue-Zague (3º Gr Comb); Os Tais (4º Gr Comb).

O nosso camarada A. Marques Lopes já há tempos tinha referido, na lista das unidades que passaram por Barro, na região do Cacheu (onde ele esteve com a sua CCAÇ 3), a existência desta CCAÇ 4942/72, cuja actividade operacional era resumida nestes termos:

(i) Em princípios de Abril de 1973, seguiu para Cadique, na zona de acção do COP 4, a fim de tomar parte na operação Caminho Aberto, com vista à instalação de uma subunidade em Jemberém [hoje, Iemberém].

(ii) Em 20 de Abril de 1973, após o desembarque [em LDM ou LDG ?] e ocupação daquela área, assumiu a responsabilidade do subsector de Jemberém [ou Iemberém], então criado, iniciando a construção do respectivo aquartelamento e ficando integrada no dispositivo e manobra do COP 4 e depois do BCAÇ 4514/72, e ainda, após reformulação dos limites dos sectores, do COP 5 [ que incluía Guileje].

(iii) Foi substituída no subsector de Jemberém pela CCAÇ 4946/73.

(iv) Instalou-se em Barro, a partir de 23 de Fevereiro de 1974, a fim de efectuar a sobreposição e render a CCAÇ 3519.

(v) Em 12 de Março de 1974, assumiu a responsabilidade do respectivo subsector de Barro, ficando integrada no dispositivo e manobra do COP 3 e depois do BART 6522/72 e ainda do BART 6521/74. Destacou ainda um pelotão para Bigene, em reforço da guarnição local.

Em resumo: esta companhia - de pessoal maioritariamente madeirense - chegou até Jemberém, no coração do mítico Cantanhez, numa região que o PAIGC considerava de há muito libertada, construiu aqui, de raíz, um aquartelamento (de que não há muitos vestígios, visíveis, actualmente), e depois foi substituída por uma companhia mais nova, a CCAÇ 4946/73, em Fevereiro de 1974.


Guiné-Bissau > Região de Tomboli > Parque Nacional do Cantanhez > Jemberém (ou Iemberém, de acordo com a toponomia actual) é uma localidade onde a AD - Acção para o Desenvolvimento tem a sua base operacional (instalações de apoio aos projectos desenvolvidos no Cantanhez, inclouindo o ecoturismo). Por aqui também passou a 1ª CART do BART 6521/72 (entre Janeiro de 1973 e Abril de 1973)... Esta subunidade foi substituída pela CCAÇ 4942/72.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Guiné 63/74 - P2191: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (5): O baptismo de um periquito no Enxalé


Foto 1 > Guiné > Zona Leste > Enxalé > 1966 > O meu Baptismo no Enxalé: (i) Ali sentado no meio, de camuflado ainda novo, pelo aspecto já devia estar bem tratado, com alguns elementos da CCAÇ 1439 (Enxalé, 1965/67) que me deixaram gratas recordações, (ii) a saber da esquerda para a direita: Furriéis Milicianos Passarinho, Lopes e o nosso Futebolista, infelizmente já falecido. (iii) A seguir enchendo a caneca está um madeirense e quem domina garrafa é o Alf Mil Sousa. (iv) Ao lado está o Fur Mil Teixeira (actual Presidente da Junta de Freguesia da Sé, em Faro) e ainda a comer está um 2º Sargento que não me lembro o nome. (v) Os restantes são militares madeirenses, da CCAÇ 1439.

Foto 2 > Primeira lição no Geba, eu, periquito, com os velhinhos da CCAÇ 1439 no Sintex, que até tinha um pequeno motor fora de borda e base para metralhadora.

  Foto 3 > Batelões a descer o Rio Geba. Como curiosidade vê-se, ampliando, que o último chamava-se Lisboa. (1)


Fotos: © Henrique Matos (2007). Direitos reservados

1. Mensagem do Henrique Matos, 1º comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68) (2): Caros tertulianos: Aqui vai um pequeno episódio a que chamei Baptismo no Enxalé (3). Saídos de Bolama no final de Agosto de 66 (4) , subimos o Geba numa LDM e depois de deixar os nossos companheiros do Pel Caç Nat 53 no Xime, chegamos a um lamaçal que era o local onde se desembarcava para o Enxalé e onde já nos esperava pessoal e viaturas da CCAQÇ 1439 (madeirenses). O percurso relativamente curto foi picado e serviu para nos dar as primeiras imagens e contar algumas histórias ( pintadas de negro), sobressaindo um ataque que tinham sofrido recentemente sem grandes consequências. Com o capitão de férias, comandava a companhia o Alf Mil Freitas. A tarde ainda ia a meio e como tinhamos apanhado água durante a viagem, a primeira operação foi reunir o pessoal e proceder à limpeza do armamento. Estavamos ali sentados no chão com as G3 que nos tinham sido distribuídas em Bolama, novinhas em folha desmontadas, quando desata uma fogachada dos diabos e nós, apanhados como se costuma dizer com "as calças na mão", a correr como moscas tontas à procura dos abrigos. Assim como começou de repente, parou e era ver agora o pessoal velhinho a rir com este grande ronco. Afinal, tinham sido apenas umas rajadas já combinadas com o pessoal das guaritas, mas para nós, periquitos depenados, o som parecia amplificado e tivemos que aguentar com um risinho muito amarelo. Como é bom de ver, a festa só acabou no bar com o pessoal devidamente regado. Anexo uma foto do baptismo e outras do Enxalé. Grande abraço Henrique Matos

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 Notas dos editores: