sábado, 2 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20933: Tabanca dos Emiratos (4): Viagem até ao emirato de Fujairah - Parte II: O museu (Jorge Araújo)


Geografia dos Emirados Árabes Unidos [UAE] com indicação dos seus sete Emirados: Abu Dhabi, Dubai, Sharjah, Ajman, Umm al Quwain, Ra's al Khaimah e Fujairah.


Foto 1 > Emiratos Árabes Unidos > Março de 2020)  > Atravessando as «Montanhas Hajar» a caminho de Fujairah


Foto 3 – Emiratos Árabes Unidos > Março de 2020 > Entrada do «Museu de Fujairah»


Foto 4 > Emiratos Árabes Unidos > Março de 2020 > Painel na entrada do «Museu de Fujairah» inaugurado em 1991




Fotos (e legenda): © Jorge Araújo (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]






Jorge Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1972/1974); um homem das Arábias... doutorado pela Universidade de León (Espanha) (2009), em Ciências da Actividade Física e do Desporto; professor universitário, no ISMAT (Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes), Portimão, Grupo Lusófona; vive entre entre Almada e Abu Dhabi; autor da série "(D)o outro lado do combate"; nosso coeditor.


IDA AO EMIRADO DE FUJAIRAH (FUJEIRA)
UMA VISITA PARA PARTILHAR
- O MUSEU DE FUJAIRAH (PARTE II)
1.  – INTRODUÇÃO

O aparecimento dos primeiros casos de infectados com o «COVID-19», levaram as autoridades locais a lançar o alerta junto dos seus residentes, propondo algumas alterações no seu comportamento social de modo a reduzir as fontes de contágio.

A primeira medida tomada, logo no início de Março, foi o encerramento de todos os estabelecimentos de ensino, desde o pré-escolar ao ensino superior. Nessa altura ainda não era possível antever o que, decorridos mais alguns dias, passou a ser inevitável – o "isolamento social" – com recolhimento no domicílio.

Foi neste quadro factual em evolução, onde a mobilidade interna ainda não contemplava restrições, que aproveitámos para nos deslocar de carro ao Emirato de Fujairah (Fujeira), situado a três centenas de quilómetros, na costa leste, banhada pelo Golfo de Omã, como aliás demos conta no P20818.

Continuando a partilhar esta viagem convosco, eis o segundo fragmento.  (*)    

2.  – OS EMIRADOS ÁRABES UNIDOS [EAU]


Situado no sudeste da Península Arábica, no Médio Oriente, o território dos Emirados Árabes Unidos [EAU ou UAE] faz fronteira com Omã (a leste), com o Qatar e Golfo Pérsico (a norte) e com a Arábia Saudita (a sul e a oeste).

Formado por uma confederação de monarquias árabes, chamados «EMIRADOS», estabelecida oficialmente em 02 de Dezembro de 1971, cada um dos sete emirados possui total soberania sobre os assuntos internos. Localizados na entrada do Golfo Pérsico, os sete emirados que constituem o país são: Abu Dhabi, Dubai, Sharjah, Ajman, Umm al Quawain, Ra's al Khaimah (a oeste) e Fujairah (a leste). A capital é Abu Dhabi, a segunda maior cidade dos Emirado Árabes Unidos (Vd. infografia acima).


3.   – O EMIRADO DE FUJAIRAH (FUJEIRA)

O Emirado de Fujairah está separado do resto do país pela linha irregular das «Montanhas Hajar», constituídas numa cordilheira situada entre o leste dos Emirados Árabes Unidos e o nordeste de Omã, sendo considerada a maior cadeia de montanhas no leste da península Arábica (Vd. foto nº 1, acima).

Em termos de superfície, Fujairah é o quinto maior entre os sete emirados dos EAU, e o único que está localizado no Golfo de Omã, ao contrário dos outros, que estão situados ao longo do Golfo Pérsico.

3.1 – O MUSEU DE FUJAIRAH (FUJEIRA)

O Emirado de Fujairah possui um dos museus mais importantes dos Emirados Árabes Unidos que regista a história e o património ancestrais através das antiguidades encontradas pelas missões de escavação e arqueólogos.

Este pequeno museu foi criado como parte da biblioteca geral Khalid IBN Waleed em 1969 e foi supervisionado directamente pelo Amiri Diwan, incluindo armas, cerâmica, moedas e ferramentas agrícolas.

Devido à expansão das descobertas exploratórias e arqueológicas, Sua Alteza Sheikh Hamad bin Mohammed Al Sharqi, Membro Supremo do Conselho e governante de Fujairah, emitiu um decreto em 27 de Maio de 1991 para a criação de um Departamento de Património e Antiguidades especializado na preservação do meio ambiente, herança do emirado que inclui castelos, fortes, mesquitas antigas, bem como a manutenção do museu e a supervisão de explorações de monumentos históricos no Emirado.

Com base nesse decreto, o Departamento de Antiguidades e Património reorganizou-se e construiu o «Museu Fujairah» para acomodar o grande número de artefactos descobertos em diferentes partes do Emirado. (Vd. fotos nºs 2 e 3, acima).

Em 30 de novembro de 1991, Sua Alteza, Governante de Fujairah, inaugurou oficialmente o «Museu de Fujairah», que consistia num único grande salão de antiguidades. Em 1998 o mesmo Departamento finalizou os planos de expansão do museu que incluíam dois amplos salões para antiguidades e três grandes salões para património, incluindo, também, uma secção para reformas, um laboratório e uma secção para escavações arqueológicas.
► Espaço Histórico

O primeiro salão exibe as ocupações conhecidas na região, como agricultura, pesca e comércio, além de meios para extrair água potável (Al Yazrah), bem como as actividades tradicionais, como a indústria de tecelagem e cerâmica.

O segundo salão inclui armas antigas usadas pela população local, vários trajes antigos que eram populares na região, além de utensílios usados no passado e entre as armas exibidas nesta sala, Om Fateela, Al Sawmaa e Al Roomeya, juntamente com um rifle antigo (arma portátil de cano longo) chamado Khedewi, fabricado em 1916. Existe, ainda, uma casa antiga feita de folhas de palmeira.

O terceiro salão corresponde à antiga loja de especiarias e souq.

► Salão de Antiguidades

O salão de antiguidades inclui diversos artefactos que foram descobertos em vários locais, incluindo vasos de esteatite (pedra de talco ou pedra-sabão) de clorito (mineral filossilicato), além de itens de latão e louça e conjuntos de canecas e xícaras antigas de várias formas e usos.
        FOTOGALERIA (PARTE II)










Seleção de fotos dos conteúdos do museu


Principal fonte de consulta:
Desdobrável do Fujairah Tourism & Antiquities Authority
Fujairah Fort
Tradução e adaptação do Inglês.



Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Continuem vigilantes… e não facilitem… o "COVID-19" não passará!
Com um forte abraço (virtual).    (**)
Jorge Araújo.
14ABR2020
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Notas do editor:

(*) Vd. poste amterior > 5 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20818: Tabanca dos Emiratos (2): Viagem até ao emirato de Fujairah - Parte I: o forte (Jorge Araújo)

(**) Último poste da série > 11 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20842: Tabanca dos Emiratos (3): Cacei aqui, em Abu Dhabi, às 14h15, de ontem, mais um número redondo, os 10 milhões de acessos ao nosso blogue... Votos de Santa Páscoa para a Tabanca Grande (Jorge Araújo)

Guiné 61/74 - P20932: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (9): “Operação Confinamento II"

1. Em mensagem do dia 27 de Abril de 2020, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta Boa memória da sua paz, dedicada ainda ao confinamento.


BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ - 8

Op Confinamento II

Aparentemente, pouca gente terá lido a minha reportagem anterior (Op. Confinamento). No entanto, logo fui alertado de que os Bandalhos mais afastados, também vivem momentos difíceis (e estranhos) no combate à pandemia. Vou tentar informar o que se passa com eles, mas sem indicar os nomes, claro. Além disso, vou informar o que alguns continuam a fazer.

O caso mais grave parece ser o do Diniz Goa da Costa que, sabendo das dificuldades dos seus amigos do norte, devido à falta do prometido material sanitário, apanhou algumas máscaras (de vários tipos), arrancou os ventiladores das suas WC e fez-se à estrada.


Porém, como exibia a bandeira da Restauração, foi detido perto de Alcoentre, onde está preso numa das celas dos 2000 criminosos que, entretanto, foram libertados. Por mais que diga que aquela bandeira não é a do FCP, ninguém acredita. Será, porventura, por obsessão de alguém fanático, avesso ao azul e branco do F. C. Porto?


Quando soube deste incidente, o vizinho Duque da Amadora avançou em seu auxílio. Depois de manifestar a sua revolta, ele que é um Homem da Paz, foi submetido a um infame e rigoroso interrogatório, até o incriminarem. Imaginem a causa da sua prisão: trazer vestida, como camisola interior, uma T-shirt dos Super Dragões, que um seu familiar lhe havia dado como prenda.


Curioso é o confinamento em Gestosa de Boticas, nas encostas da Serra do Barroso. O José Bandalho Pires, que é o Morgado e dono de quase toda a aldeia, impôs-lhe o seu total isolamento (mais rigoroso que em tempos de grande nevão). Todavia, obriga ao convívio diário de todos os seus 9 habitantes. Desde então, as lareiras têm funcionado continuamente, com as respectivas panelas de ferro ao lume, consumindo os artigos de fumeiro com que ornamentam as cozinhas.


Quando o convívio é bom,
Merece o fabrico do pão!

Desenterraram o “vinho dos mortos” para as tainadas, que têm sido contínuas, pois já ninguém trabalha (fora da cozinha…) e reina por lá uma certa desorientação em atinar com o sítio onde dormir.

Preocupante, continua a ser o comportamento dos Maiatos.

O Alberto, cavou um abrigo junto do anexo, onde se isolou. Tem um buraco tapado com o fundo de um bidão. Deixam-lhe a comida por perto, mas não aceita quaisquer contactos. Nem “telelé”, nem “net”, nem televisão. Isolamento total!
Outro, o Galã, está detido, em casa. E ainda bem, porque quando ele anda fora, é uma grande confusão com as suas admiradoras. Anda preocupado com os alarmes de guerra que um seu cunhado anda a espalhar no meio familiar.

Os primos de Crestuma foram afastados pelas mulheres que os levaram; um foi para Gaia e outro para Lever. Este vive sacrificado, pagando bem caro os custos pela conquista da sua jovem mulher. Está incumbido de tratar cuidadosa e amorosamente a sua gentil sogra.
O outro, anda sempre desenfiado. Não alinha nas “redes sociais”, nem aparece com facilidade. Por um acaso, recentemente descobrimos onde passa grande parte do seu imenso tempo livre. Se não estiver no Dragão ou no Centro de Estágio de Crestuma/Olival, deve estar a preparar uns “cachorrinhos” especiais na cozinha do café da vizinha.

Quem está mal é o Augusto de Lamego. O tal amigalhaço que vive muito dos abraços. Ganhou aquele vício quando conviveu de perto, com alguns colegas artistas, no filme da Ferreirinha, sob a orientação do Manoel de Oliveira. Com as ruas desertas de gente (e a falta de abraços), ele sente mais a nossa falta. Ainda bem, porque quando ele vem cá abaixo (poucas vezes), leva abraços para meio ano. Vá lá que o Moreno tem passado por sua casa, a dar-lhe as mesinhas necessárias, para se manter em forma.

Do Brasil, também temos notícias “abandalhadas”.
A Luci está muito feliz com a família, lá para os lados da Baía. Sempre na farra, até parece muito crédula com as orientações governamentais.

A Elci, de Goiás, mais ligada ao mundo da saúde, por profissão, não perde a oportunidade de vincar teimosamente a sua opinião. Ainda bem, porque o Brasil pode vir a sofrer um bom bocado.


Do casal Carmenzita, nem uma palavra. Pela Junta de Freguesia de Touguinhó, soubemos que se refugiaram nas margens do Rio Leste, perto dum acampamento de imigrantes subsídio-dependentes que aguardam a justa e digna habitação. Vivem à base de caracóis dos grandes, perninhas de rã, agriões, escalos fritos e grilos salteados. Moram na tenda assinalada com uma bandeira encarnada com o n.º 37.

Homem aos grilos - Foto captado por “zoom”, pelos serviços exteriores do Gabinete de Crise Covid-19, da autarquia Touguinhense.

Por intermédio da filha Andreia que, aflita, nos procurou, soubemos que o luso-brasileiro de Fornelos, enfiou o camuflado, equipou-se com armas brancas e fugiu de Gaia, atravessando ilegalmente, os concelhos de Espinho, Feira, Arouca, Castelo de Paiva e Cinfães. A Andreia quer saber, através dos “Bandalhos”, se estamos ao corrente da ingrata situação. É que as armas que transporta, além de infectadas pela matança recente de ratazanas doentes, elas estão bastante enferrujadas e podem ser perigosas, no caso de alguém se espetar nelas.


Julgo que este assunto deveria ter a maior atenção do nosso “Presidente dos Bandalhos” que, independentemente da azáfama reinante nas nossas Forças Armadas, muito preocupadas com as festividades do 25 de Abril, teria uma boa oportunidade de lhes dar alguma ocupação.

Mandaram-nos uma foto, obtida há dias, numa espreitadela ao anexo da vizinha, ali perto de Rio de Moinhos. Tudo normal e corriqueiro. Só que a senhora vincou repetidamente:
- Olhe que, quem cabritos come e cabras não tem, nem quero pensar donde aquilo vem!


A insinuação é forte e é por isso que eu nem os nomes sei dizer.

Da Quinta Srª da Graça, propriedade do famoso casal Bandalho Luísa e Zé Manel, fomos informados de que as coisas não correm lá muito bem. Ele, sempre preocupado com a linha do “corpinho Danone” (engordou 226gr), já não come os mal-empregados petiscos que a mulher lhe faz, e não trabalha, alegando… fraqueza física.



Com tais petiscos da Quinta da Senhora da Graça, quem é que ficava fraco para trabalhar?

Temos fotos chocantes da sacrificada senhora a sulfatar a vinha, enquanto ele faz “selfies” tendo como fundo a paisagem duriense. Com a mania de que é mais esquerdista que os outros 93% dos portugueses que dizem que também são, queria ir à Assembleia da República, festejar o 46.º aniversário do 25 de Abril, mas foi rejeitado porque aquilo é mais para a elite que, “heroicamente”, não foi à guerra.


Recebemos uma mensagem, com foto, dando-nos a conhecer que o Tarzan Travesso, de Medas, ocupa agora, também, os galhos do 2.º Piso da Árvore n.º 3 da Rua do Loureiro, 4515-370 Medas - Gondomar

Reina uma tristeza enorme na Rua da Alegria. O bondoso Bandalho Jotex, que era conhecido por levar restinhos de pão-de-ló, para os cãezinhos da D. Vergília, não sai da cama. Inactivo, engordou de tal forma que, só sairá de casa pela janela grande, pendurado de um forte guindaste. A família, envergonhada, já fez constar que ele sofre dos joelhos, dos joanetes e... tal… e tal… No entanto, sabemos também, que está sob forte regime de dieta, a fim de recuperar a indispensável mobilidade, aliás exigível ao detentor do mais alto cargo da nossa hierarquia “bandalhada”.

Existem vários outros “Bandalhos” (uns com as quotas em dia e outros não), cuja inactividade recente, não dá para perder tempo atrás deles. O seu isolamento envergonhado (ou não), leva-nos a pensar que devem ser eles a dar sinais de vida.
Entre eles, devemos enaltecer o caso de um dos primeiros “Bandalhos”, o Grandalhão, que foi atleta do FCP e que, mesmo reformado da PJ, se mudou para a capital, oferecendo os seus serviços, em “pro bono”, no intuito de arranjar maneira de salvar o Rui Pinto, o tal jovem denunciante da corrupção em Portugal.
De resto, confirmamos que os “Bandalhos” se estão a safar bem nesta luta inglória, o que nos dá grande satisfação.

José Ferreira
(Silva da Cart 1689)
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Nota do editor

Último poste da série de 25 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20903: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (8): “Covidando” com os meus botões ou “Covidando” com o confinamento

Guiné 61/74 - P20931: Os nossos seres, saberes e lazeres (388): Em frente ao Vesúvio, passeando por Herculano e Ravello (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Outubro de 2019:

Queridos amigos,
Os itinerários da semana napolitana andam um tanto aos baldões da sorte, numa folha escreveu-se o que é imprescindível ver, ou quase, quanto ao mais a ordem dos fatores é arbitrária. É o que se passa nesta digressão. Anda-se pelo casco histórico e impacta-se com o inacreditável, é bem verdade que quem não sabe é como quem não vê, e o que se está a ver não é decifrável, será um amável tipógrafo que irá mostrando paredes, pasme-se, restos do teatro romano, talvez do tempo dos Antoninos.
E prossegue-se à ligeira, entra-se no metro, tão publicitado pelos seus arrojos, o que é bem verdade. Suspira-se por ir a um grande museu, talvez à Cartuxa, está escrito que é do Castelo de Sant'Elmo que há as mais belas vistas de Nápoles, mas toma-se a decisão de apanhar comboio para visitar Caserta, há um vídeo que corre mundo com o seu esplendor, em Nápoles tem que se ser napolitano, ao menos visita-se um palácio real com mil e duzentos quartos, circundado de belos jardins.
Amanhã haverá mais, como reza a exaltação turística, Nápoles é apaixonante, confusa, histórica, vibrante e com personalidade. E é mesmo.

Um abraço do
Mário


Em frente ao Vesúvio, passeando por Herculano e Ravello (2)

Beja Santos

O viandante guardou um suplemento do Diário de Notícias, do ano de 2017, dedicado a 48 horas em Nápoles, não é demérito aqui recordar algumas das sugestões entusiastas que alguém escreveu. Diz-se que Nápoles é apaixonante, confusa, histórica, vibrante. Há a pizza napolitana, recorda-se que o tenor Enrico Caruso e a atriz Sophia Loren aqui nasceram. E, pasme-se, há duas glórias futebolísticas inesquecíveis: o mítico guardião Dino Zoff e Diego Maradona. Para essas 48 horas, o pequeno guia propõe que se comece pela rua que corta a cidade, Spaccanapoli, que é na realidade uma sucessão de três ruas, a parte estreita, com dois quilómetros, atravessa o centro histórico. É recomendado que se visite o Palácio Real, hoje Museu Nacional Capodimonte, a Ópera de São Carlos (por curiosidade, o nosso Teatro Nacional de São Carlos tem impressionantes semelhanças), Pompeia, as catacumbas, as belezas do Metro, a Igreja de Gesùnuovo, que faz lembrar a Casa dos Bicos, onde hoje está a Fundação José Saramago, o Castelo Sant’Elmo, de onde se divisam panorâmicas únicas, cá em baixo, na baía, o Castel dell’Ovo. Claro está, tudo pode começar na Catedral. Pois foi aí que o viandante encetou viagem, já se apresentou a catedral, lá dentro é obrigatório visitar Santa Restituta, houve aqui basílica paleocristã, é de uma beleza impressionante, talvez as imagens seguintes falem por palavras que o viandante não possui, até chegarmos ao lindo mosaico Madonna e os Santos Gennaro e Restitua, uma obra executada em 1322 por Lello da Orvieto, que imenso tesouro artístico.



De novo no centro histórico, como quem não sabe é como quem não vê, neste caso o que se está a ver não dá para saber, fala-se num dístico que é entrada de um teatro romano, entra-se numa tipografia para perguntar onde é que está o teatro, só se veem edifícios à volta, é felizmente um napolitano paciente que vai apontando para paredes e arcos e referindo a utilidade que tinham enquanto estiveram incorporados, talvez há mais de dois mil anos, num centro de diversão e cultura que agora não se pode imaginar como funcionava e que dimensões tinha. Ora vejam.




Nápoles tem galerias a dar com um pau, numa deambulação para ir até ao Museu Arqueológico entrou-se na Galeria do Príncipe de Nápoles, construída em 1883, é a mais antiga galeria de Nápoles, faz parte de um tempo em que se pretendia ter uma área comercial luxuosa com ares apalaçados, com requinte e a segurança de um teto que resistisse às clemências de chuvas e nevões. Pelo que foi dado a perceber, a galeria já teve dias melhores, convém não esquecer que têm havido muitas revoluções comerciais, a massificação privilegia as catedrais que gozam do nome de centros comerciais, e depois há aquelas ruas que gozam do aparato do luxo, que podem dar pelo nome de Via Veneto ou New Bond Street. Procure-se intuir o que esta galeria terá tido de impressionante, há mais de 125 anos.


Os guias recomendam a todos que vêm a Nápoles que usem o metropolitano e o funicular. O viandante obedeceu, comprou um bilhete de 3,5€ que lhe deu direito às viagens do dia. Um dos guias recomendava vivamente que se visitasse a estação de Toledo, dando-a como uma das mais belas do mundo. Bela é, mas sejamos francos, nada que o viandante tenha visto rivaliza com o metro de Moscovo. Mas Toledo tem grandiosidade, sugere que caminhemos para o império celeste, em dada altura até se cria a ilusão de que podemos ser engolidos, sabe-se lá para chegar à constelação de Oríon.



Há outra grande surpresa na estação de Toledo, os painéis do artista sul-africano William Kentridge, muitíssimo originais, suscita fusões entre o passado e o quase presente, tira, cola e repõe, perceciona-se facilmente que há mensagem política nas suas montagens de manipulação cronológica. Os seus trabalhos para o Metro de Toledo são altamente sugestivos, podemos entendê-los como uma caminhada da humanidade à procura da justiça e da paz.





Agora, o viandante toma o metro até à estação de Garibaldi, transfere-se para uma linha ferroviária que tem um nome muito bonito, a Circumvesuviana, viaja-se até Caserta, onde há palácio real concebido pelo arquiteto Vanvitelli, preparem-se para o esplendor de apartamentos reais, da sala do trono, das escadarias, estamos em pleno século XVIII, os Bourbons não se coibiram a gastar fortunas num edifício gigantesco, maciço, impressionante por fora e por dentro, Caserta é tão obrigatório como Amalfi, Sorrento ou Capri.
Ora vejam.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 25 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20901: Os nossos seres, saberes e lazeres (387): Em frente ao Vesúvio, passeando por Herculano e Ravello (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20930: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (10): Deliciosas sandochas de salmão, "curado, não fumado" (José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia)





As típicas sandes de salmão (...curado,  não fumado: em sueco:  "gravlax", salmão curado)


Fotos (e legenda): © José Belo (2020). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  Fotos enviadas em 24 do corrente, pelo José Belo:

(i) ex-alf mil inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70;

(ii) manteve-se no ativo, no exército português, durante uma década; 

(iii) está reformado como capitão de infantaria  do exército português:

(iv) jurista, vive entre Estocolmo, Suécia, nem como nas imediações de Abisco, Kiruna, Lapónia, no círculo polar ártico, já próximo da fronteira com a Finlândia, mas também Key-West, Florida, EUA;

(v) é o único régulo da tabanca de um homem só, a Tabanca da Lapónia  (, mas sempre bem acompanhado das suas renas, dos seus cães e dos seus ursos)

Manda-nos umas deliciosas sandochas de salmão... O José Belo, que vive na terra do salmão, faz questão de sublinhar que é "salmão curado,  não fumada"... Uma iguaria, que também não consta do cardápio do "Chef" São Pedro...

Uma boa receita do régulo da Tabanca da Lapónia contra o virus,  "enviada com amizade a todos os velhinhos isolados", está disponíel no blogue da Tabanca do Centro. SKÅL!
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sexta-feira, 1 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20929: Esboços para um romance - I (Mário Beja Santos): Peço a Deus que tu regresses são e salvo (5)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Março de 2020:

Queridos amigos,
A perda de uma grande amiga, a madrinha da minha filha mais nova, contristou-me tanto que me levou a uma romagem de saudade àqueles meses que vivi na Ilha de São Miguel, daqui embarquei para formar batalhão no RI 1, na Amadora, de onde fui expelido por ser "ideologicamente inapto para a guerra de contra-guerrilha, mormente no Ultramar Português", e por obra do destino passei para o CTIG, lançaram-me no Cuor, aqui vivi 17 meses e fui alvo de um dos maiores desafios da minha vida, Missirá completamente incendiada, houve que a reconstruir em tempo recorde, o que aconteceu.
O tempo açoriano passou veloz, cimentei amizades, as duas recrutas passaram num ápice, enamorei-me da terra, da sua cultura, da sua religiosidade tão sentida. Daí este testemunho, um penhor de gratidão a todos que me fizeram tanto bem e que me ajudaram a perceber que há um momento na vida em que saímos de casa dos pais para começar a obra nossa.

Um abraço do
Mário


Peço a Deus que tu regresses são e salvo (5)

Mário Beja Santos

Nestes cerca de cinquenta anos de saudade latente, estou feliz porque quem ganhou mais foram os açorianos, não eu. Quando ali arribei, naquele ponto minúsculo do oceano havia escassíssimo turismo, uma indústria conserveira que tinha escassa difusão nacional, a indústria tabaqueira era de cunho local, tal como as cervejas e refrigerantes, o chá era mal conhecido, se mal comíamos laticínios no continente seguramente que os laticínios açorianos não apareciam no mercado continental, onde hoje estão em plena vanguarda, havia águas minerais como as Lombadas, que depois desapareceram, não me lembro de ver licores em Portugal Continental, na altura não se falava nos vinhos, era um requinte beber o Verdelho do Pico, carnes e enchidos açorianos não eram conhecidos aqui, o artesanato tinha escassa difusão como as compotas e mel, só o ananás é que aparecia nos mercados continentais, espero não estar a cometer um pecado por omissão.

Imagem da indústria conserveira açoriana

Como tudo mudou! Na Expo 98, a Região dos Açores apresentou-se garbosamente, adquiri uma caixa de brochuras sobre produtos dos Açores, como felizmente ia visitando regularmente belezas naturais que sempre me tocaram o que li só confirmava como os Açores estavam a conhecer em várias frentes um grande desenvolvimento. Logo o turismo, uma indústria que prosperara, bastava visitar São Miguel, Terceira ou Flores, e não era um turismo de alternativos, tratava-se de um compósito de visitantes com posses e turismo de massas, num doseamento que não punha em risco a identidade e a caraterização dos patrimónios. As conservas são conhecidas em vários continentes e entre nós altamente apreciadas, como altamente apreciados são os charutos de fabrico local. No meu tempo já se bebia a cerveja Melo Abreu, hoje a gama de produtos estende-se aos refrigerantes de maracujá e às águas tónicas e os chás da Gorreana e de Chá Porto Formoso asseguram infusões leves e muito aromáticas.

Plantação de chá na Ilha de S. Miguel

É desta beleza natural que vêm os gostosos laticínios açorianos

Lembro-me de ter comido queijo de S. Jorge muito antes de viver em S. Miguel. Mas a indústria de laticínios local tinha modesta dimensão. Hoje sentimos o seu peso nos escaparates dos supermercados: as manteigas, os queijos de bola e fatiados e em barra, há o queijo de S. Jorge e do Pico, predomina a denominação de origem Açores. E guardo saudade daquele tempo em que no Café Nacional, enquanto comensal, podia começar a refeição com queijo fresco acompanhado de pimenta da terra e ter à sobremesa uma rodela de ananás. E veio-me à memória o dia em que no Café Gil ouvi pedir um licor do Ezequiel, curioso pedi também para mim, nem deu para estranhar, entranhou-se logo, é digestivo de que não perco oportunidade, nos bons e maus momentos. Estes licores são feitos com ananás e maracujá sobretudo, mas também se encontram feitos à base de amora, tangerina, banana e anis, tudo feito com segredo, bem entendido. O meu “maracujá do Ezequiel” é preparado a partir de polpa fresca de maracujá roxo, é um licor de 26 graus, foi uma das maiores aquisições de bebida que importei da minha jornada micaelense.


Em 1967, vinho para mim nos Açores era o Verdelho do Pico, nada barato, o que acompanhava as refeições eram vinhos continentais de modesto valor. Pois foi precisamente em 1964 que se iniciou o plano da reconversão vitivinícola dos Açores, dava-se primazia às castas nobres Verdelho dos Açores, Arinto e Terrantez do Pico, vinte anos depois criavam-se zonas demarcadas da Graciosa, Terceira e Pico, habituei-me a acompanhar um bravo de peixe boca-negra ou filetes de abrótea com vinhos de mesa, só recordo inicialmente as marcas Basalto e Terras de Lava. Pequenas produções, é certo, mas são vinhos de estalo. Hoje há mesmo confrarias, há o Museu de Vinho dos Biscoitos, a confraria é a do vinho Verdelho dos Biscoitos.

Vinha açoriana, imagem retirada da revista Visão, com a devida vénia

Voltando a 1967, interessei-me em saber que águas minerais existiam, bebi a água das Lombadas, não quis outra. Vinha da nascente das Lombadas, a norte da Lagoa do Fogo. Quando lera Gaspar Frutuoso e as suas Saudades da Terra, encontrei referência às águas minerais. Nos meus regressos sucessivos, estranhei a falta das Lombadas, disseram-me ter havido um problema de poluição, depois bebi a água Glória Patri e Serra do Trigo mas a nostalgia pesa muito, beberia de bom grado aquela aguinha gaseificada com um gosto ligeiramente férreo, uma boa companheira.


Recordo o artesanato, os trabalhos com as escamas de peixe, a partir do osso da mandíbula do cachalote ou dos seus dentes, os trabalhos em madeira aproveitando o cedro, o jacarandá e o mogno, mas também os bordados extremosos, os bonecos de palha de milho, as colchas. Não me poupei a viver acompanhado deste artesanato. Tinha visto um belíssimo trabalho artesanal de registo do Senhor Santo Cristo dos Milagres, a minha amiga Cremilde Tapia informou-me que a Graça Páscoa era possuidora de um talento único, levou-me a sua casa, e no meu escritório guardo um trabalho seu primoroso, paro várias vezes diante dele para contemplar a finura das escamas do papel recortado, do jogo de cores até chegarmos à figura central daquele Cristo sofredor indumentado em toda a sua glória.

Centro de Artes Contemporâneas, S. Miguel

Imagens do basalto açoriano

O basalto era omnipresente, dei conta dele mal desembarquei. Pegando na brochura distribuída na Expo 98, vale a pena reproduzir alguns elementos: “Nome de uma pedra de tom cinzento-claro, de origem vulcânica. Em S. Miguel, área de exploração de basalto, fica no concelho de Ribeira Grande. Os seus mantos lávicos foram originados há mais de cinco mil anos, no decurso da erupção do vulcão do complexo do Fogo. Assente na grande área de junção das placas da Europa e África, a Ilha Terceira tem como principal zona de exploração uma escarpa de 120 metros de altura e mais de um quilómetro de comprido na sua superfície, resultado do assentamento do vulcão Guilherme Moniz. O basalto é largamente utilizado na arquitectura regional, tanto na construção civil como na decoração de fachadas. A pedra trabalhada tem uma vasta gama de aplicações, como pavimentos, alvenaria, cantonaria ou decoração de interiores – mesas, lareiras ou bancos”.



Chegou a hora da despedida, o rogo de minha mãe cumpriu-se, vim são e salvo. A estadia açoriana, é minha profunda convicção, foi crucial na minha preparação para lides belicosas, inseriu-se na minha identidade, visito-a quer com carinho de peregrino quer como membro da terra, aquelas atmosferas, odores, amenidade de vida, património construído, os poentes deslumbrantes, estarrecedores, tudo me pertence. Para que o adeus seja imenso, irrepetível, aqui se deixam as imagens do local onde entre 1967 e 1968 apanhava transporte para os Arrifes, belíssimo local este Largo 2 de Março, tão bem tratado, mostrando o palácio onde vivia o governador civil, o representante do Estado Novo. O troço da SCUT é a imagem de uma transformação, um dos índices do desenvolvimento, e que são muitos: na saúde e na educação, na investigação científica, nas atividades económicas. Fiz bem em ir buscar uma caixa dos produtos açorianos apresentados na Expo 98. Tenho sido observador de todas essas transformações e posso dizer sem hesitação que vim são e salvo mas se há parcela do nosso terrunho que mais se desenvolveu e beneficiou do quadro democrático foi este rincão de onde parti e cheguei são e salvo.
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Nota do editor

Último poste da série d e24 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20897: Esboços para um romance - I (Mário Beja Santos): Peço a Deus que tu regresses são e salvo (4)