1. O nosso camarada Luís Guerreiro (ex-Fur Mil da CART 2410 , Gadamael e Ganturé, e Pel Caç Nat 65, Piche, Buruntuma e Bajocunda, 1968/70), enviou-nos a seguinte mensagem.
Pel Caç Na 65
Camarada Luís,
Ultimamente tem-se falado sobre Buruntuma e Tabassi/Tabassai.
O Pel Caç Nat 65 encontrou-se nesses dois locais em 1970.
Estacionados em Piche na sede do BArt 2857, fomos para Buruntuma em 27 de Fevereiro de 1970, para tomar parte na operação do ataque a Kandica. Constou que o 65 seria armado com armamento igual ao do PAIGC e iria fazer o assalto a essa base, mas finalmente fizemos a protecção ao Pel Art 12 e às peças 11.4, em Camajabá.
Depois do ataque fomos para Buruntuma, para reforçar a guarnição, chegamos ao anoitecer, e tudo já se encontrava muito calmo.
Permanecemos até ao dia 23 de Abril de 1970. Buruntuma era uma povoação algo distante, mas as condições e as instalações eram razoáveis.
Durante o tempo que ali permanecemos não houve nenhum problema, a actividade operacional foi somente de patrulhamentos e emboscadas nocturnas. A camaradagem era excelente por parte de sargentos e oficiais da companhia, e dos dois funcionários da DGS [, Direcção Geral de Segurança], e também um comerciante continental, de nome Mota, que nos convidou diversas vezes para almoçar em sua casa.
Buruntuma, 1970 > Rua principal
Buruntuma, 1970 > Aspecto geral da tabanca
Buruntuma > Tabanca queimada no ataque do PAIGC de 24 de Fevereiro de 1970, que deu origem ao ataque à base de Kandica
Nota, de mil e cinco mil francos, da Guiné-Conacri, que foram apanhadas depois do ataque a Kandica, talvez por indivíduo da população e que me foram oferecidas por um soldado nativo do meu pelotão.
Em seguida fomos destacados para Bajocunda, dizia-se que íamos para descansar pois a zona na altura estava calma e circulava-se relativamente à vontade, e assim aconteceu nos dois primeiros meses.
A actividade operacional, resumia-se a colunas a Nova Lamego e a Copá, e fazer protecção à noite na tabanca de Tabassai.
Bajocunda, 1970
Bajocunda, 1970
Bajocunda, 1970 > Comandos africanos da companhia do capitão João Bacar Jaló
Bajocunda, 1970 > Obus de 10.5 cm fazendo fogo
Bajocunda, 1970 > Visita do general Spínola
A partir do mês de Julho a situação começou a deteriorar-se, como já foi referido por mim no poste P4919 de 8/9/2009, a emboscada à coluna de civis e comandos africanos na estrada de Pirada para Bajocunda, no dia 4 de Julho de 1970.
E a partir daí a actividade do PAIGC começou a ser mais constante, especialmente mais para os lados de Pirada, aonde durante a noite algumas tabancas foram atacadas e incendiadas.
E foi neste contexto, que fomos uma semana fazer a segurança a Tabassai. Ficamos instalados com uma tenda de campanha, a povoação constava de uma fiada de arame farpado e como defesa tinha várias escavações de cerca de 3x2 metros áà volta do perímetro.
Tabassai, 1970 > Estrada para Bajocunda
Tabassai, 1970 > Bolanha
Tabassai, 1970 > Uma bajuda
Quanto à população, eu não tinha muita confiança_ um dia tendo eu ido a Bajocunda tomar um bom duche, andou um nativo a olhar para as nossas posições e a perguntar qual era o pessoal que lá ficava instalado. Quando cheguei e fiquei ao corrente do sucedido fui à sua procura mas o indivíduo já tinha desaparecido, o que me levou a crer que era um informador espia.
A decisão foi que nessa noite podíamos dormir descansados. No dia seguinte, 23 de Julho, mudamos algumas das posições e também o pessoal, e por volta das 21 horas, como se tinha previsto, fomos atacados.
Este foi o primeiro ataque efectuado pelo PAIGC à tabanca de Tabassai, o inimigo com um grande efectivo e grande potencial de fogo, fizeram o ataque do lado errado pois pensavam que era o certo, tudo durou cerca de 30 minutos sem problemas da nossa parte, retiraram com baixas e feridos e deixando algum material. Segundo em informações, tiveram 9 mortos. Da parte da população houve uma mulher e uma criança que faleceram devido a uma granada de RPG.
Pessoal do Pel Caç Nat 65
No dia seguinte foi o meu dia de sorte e também do condutor, tendo ido a Bajocunda para trazer mais munições, passamos duas vezes a um palmo de uma mina A/C, que de certeza tinha sido instalada antes do ataque, e foi localizada a uns 500 metros da tabanca por um soldado do 65. Tdo isto aconteceu, duas semanas antes de terminar a minha comissão, pois o meu substituto já se encontrava em Bissau.
No dia 8 de Agosto de 1970, dia do meu aniversário, recebi como prenda uma viagem de avioneta até Bissau, para esperar transporte para Lisboa, mas como não havia barco nos tempos próximos, no dia 25 de Agosto apanhei o avião e regressei a casa.
Ainda hoje tenho estes soldados nativos no coração. Apesar de serem grandes combatentes, foram grandes amigos, pois quando me despedi vi alguns com a lágrima no canto do olho, e outros a pedirem para ficar mais um tempo.
Por hoje é tudo um forte abraço para toda a equipa.
Luís Guerreiro
Fur Mil da CART 2410 e Pel Caç Nat 65
Fotos e legendas: © Luís Guerreiro (2012). Todos os direitos reservados.