Ponta do Padrão S. Jorge na Foz do Rio Zaire
1. Em mensagem do dia 18 de Maio de 2020, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta Boa memória da sua paz, a segunda relembrando os seus bons tempos vividos em Angola
BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ - 12
PEQUENOS CAPRICHOS - I
Todos os caprichos são pagos. Uns mais que outros.
Uns valem bem o que custam e outros nem por isso.
No entanto, é através deles que nos ultrapassamos, nos satisfazemos ou nos vangloriamos. Por outro lado, os caprichos são valorados conforme as suas circunstâncias e as suas possibilidades.
Adiante, que também não tenho a pretensão de filosofar.
Concurso de pesca na Foz do Rio Zaire
Desde que cheguei a Cabinda, foquei logo a pesca como tempo de lazer. Sozinho ou acompanhado pela minha Mulher, acabei por me relacionar com outros que comungavam do mesmo prazer. O grupo foi-se alargando com a mobilização para convívios. Não levou muito tempo para organizarmos concursos.
O entusiasmo dos concursos de pesca acentuou-se e tornou-se notório, chegando a merecer transmissões em directo pela rádio. (Não havia televisão…)
De sucesso em sucesso e com a colaboração da Delegação da Direcção Geral dos Desportos, fomos experimentando as praias ao longo da costa Cabindense e, até, as lagoas no interior.
Um dia, querendo ir mais além:
- Porque não irmos a Santo António do Zaire, atravessar o rio e participar lá num concurso?
Partimos de madrugada, num rebocador da firma Montez & Newman, para fazermos aqueles 60 quilómetros de costa congolesa.
Os pescadores de Cabinda foram de rebocador a Santo António do Zaire, participar/colaborar num concurso
Tudo normal, até que nos apareceu aquela corrente monstruosa vinda da foz do Rio Zaire, com o maior caudal do Mundo. Indescritível, sentirmo-nos tão pequeninos naquela diminuta “casca de noz” de 35 metros, a subir e a descer aquelas montanhas de água em movimento. Quase toda a gente vomitava, mas eu não me distraía a olhar as águas. Sentadinho na borda e bem agarrado, olhava bem para longe, seguindo a experiência de anteriores navegações. Porém, o meu amigo Carlos Guerra veio ao meu encontro, cambaleando, mas bem agarrado, sentou-se na minha frente e, já esgotado de tanto sofrimento e a afagar a barriga, diz-me:
- Estou “fodidinho” de todo. Nunca me senti tão enjoado em toda a minha vida.
Aí “explodi e sulfatei” tudo o que havia à volta. Foi uma pena, porque já não faltava muito para chegarmos.
Havia uma equipa de repórteres da Rádio Clube de Cabinda que, perante a dúvida de conseguirem entrar em directo a partir de bordo, mas com a certeza do que iria acontecer, deixaram na sede uma gravação simulando o tal “directo”. E “em cima do acontecimento”, transmitiu: “ …neste momento, a viagem está a ser difícil para as mulheres, que estão todas enjoadas e em sofrimento. Por acaso nós, os homens, estamos a saborear bem este doce embalar…”.
Padrão de S. Jorge na Ponta Padrão da Foz do Rio Zaire, assinalando a chegada de Diogo Cão, no ano de 1482. A largura do Rio Zaire, na sua foz é tão grande que não se vislumbra a outra margem. Diogo Cão flectiu para o interior, convencido de ter atingido o ponto mais a sul de África (Cabo da Boa Esperança).
Os pescadores de Cabinda não faziam ideia do tamanho dos peixes que passam pela foz do Rio Zaire.
Colocadas as canas na praia, aguardámos a subida da maré e a consequente entrada dos peixes. E, quando isso aconteceu, foram vários os pescadores que ficaram sem fio e outros sem a cana. Nem dava para lutar com os peixes. Eles levavam tudo.
Valeu-me o facto de ter um fio grosso (especial 90), com tenso de aço. Eu estava bem seguro e com o alicate cortante à mão para não ficar sem cana. Sobravam poucos metros para além das ondas e da praia. E, por isso, não podia atirar para muito longe.
Os pescadores locais, foram tirando alguns peixes: corvinas, sapudos e raias. Tudo isso dava pouca pontuação. Todos se queixaram que fora um dia de pesca para esquecer.
Diziam: - Hoje não deu nada.
Fisguei um pargo e não o larguei mais. Era relativamente pequeno (14,2Kgs) mas tinha uma pontuação elevada. E foi por isso que venci o concurso.
No final, quando vínhamos pesar o peixe, já se sabia quem ia ganhar.
Oiço o repórter, no seu directo:
- Ganhou o do costume (eu já tinha ganho 2 concursos, na altura como atleta da Rádio Clube de Cabinda). Foi aquele atleta que nos trocou pelo Clube da Câmara Municipal. Mas isto não vai ficar assim, porque a RCC ainda não recebeu o dinheiro da transferência.
Primeiro triunfo na Pesca
Quando Campeão de Cabinda, fui felicitado pelo Governador Brigadeiro Themudo Barata.
Equipa da Câmara Municipal de Cabinda com o pargo de 14,2Kg que nos deu o 1.º lugar em Santo António do Zaire
No banquete organizado/oferecido pelo Governo Civil de Santo António do Zaire, recebemos os prémios e lindos discursos assinalando o evento inédito.
Já no regresso, noto algumas ausências. Entre elas, a dos repórteres da RCC.
Perguntei por eles e informaram-me: - Ficaram tão acagaçados que preferiram ficar cá até que haja avião para Cabinda.
(Continua)
José Ferreira
(Silva da Cart 1689)
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Nota do editor
Último poste da série de 30 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P21024: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (12): Feliz em África - II (e sem filmes)