O mugido das vacas
Na hora suave da tarde se ouve e ressoa na aldeia o mugido lactente das vacas.
É a hora da ordenha.
Se põem de cócoras por debaixo e lhe espremem as tetas.
Escorre quente o leite.
Depressa, ficam cheios os potes.
Pela manhã, de cântaro à cabeça, a lavradeira corre as veredas da aldeia.
Aqui, um quartilho, ali uma canada, conforme as bocas.
É seu ganha-pão com a bênção dos pastos.
Bendita a sorte que a Natureza, de graça, nos dá.
Só é preciso semear e colher.
Louvado seja o Senhor…
Mafra, 24 de Maio de 2020
10h32m
Jlmg
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Amarelo e bolorento
Espalhado pelo chão, apodreceu amarelo e bolorento.
Restos duma vida mal vivida.
Repassada de angústia.
Crestada de desilusões.
Sonhos que se desfizeram no amanhecer.
Armas que derreteram na madrugada do combate.
Amarras que se desfizeram presas às muralhas do porto de abrigo.
Gaivotas amarguradas com o rigor das ventanias.
Restos da saliva amarga que amargou os sonhos de aventura.
Ocasos desfeitos num horizonte de promessas e de amargas desilusões.
Esperanças vãs que se desfizeram para sempre…
Mafra, 28 de Maio de 2020
12h35m
Jlmg
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Vamos voltar a sorrir
A onda vai passar.
Vamos voltar a sorrir.
Timidamente, primeiro.
Depois, às gargalhadas.
Vamos duvidar se, de facto, aconteceu o que passou.
Atordoados.
Nunca ninguém previu tal humilhação.
Tudo ficou remexido.
Ninguém escapou a este vendaval.
Como a água que chega a todo o lado,
Não há um palácio ou um castelo imune.
Os presidentes andam desvairados.
Fogem do vírus como o diabo foge da cruz.
Alguns já sucumbiram.
Os outros mudam de quarto de dormir em cada noite.
Oxalá aprendam com esta lição tão cara…
Mafra, 28 de Maio de 2020
Jlmg
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Nota do editor
Último poste da série de 24 de Maio de 2020 > Guiné 61/74 - P21005: Blogpoesia (677): "Nossas amarras", "O cesteiro das Idanhas" e "Disponibilidade das pétalas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728
2 comentários:
Mendes Gomes
Mais três belos poemas.
Pois:
'Ninguém escapou a este vendaval'
'Não há um palácio ou um castelo imune'
mas, parece, que o vírus só sabe fazer uma simples média matemática, mais ou menos como aquela de dois comerem um frango e que dá meio frango a cada um, mas afinal um só comeu uma asinha.
Quanto a quartilhos e canadas, este quartilho é interessante.
No Douro um almude de vinho são 25 litros ou 12 canadas, e como o quartilho é a quarta parte da canada, quer dizer que um quartilho é meio litro bem medido.
Mas, parece que em Lisboa a canada era outra.
Ab. e saúde da boa
Valdemar Queiroz
Grande abraço, amigo Valdemar.
Joaquim
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