Lourinhã > Igreja de Samta Maria do Castelo (Séc. XIV). Gravura de autor desconhecido.n Fonte; Jornal "Alvorada", quinzenário regionalista, Lourinhã, 13 de setembro de 1964.
Poema à Igreja do Castelo
por Luís Graça
Em tuas pedras
Habitam os deuses assimetricamente
Ressuscitam os cavaleiros andantes
Que em ti prolongaram o Eterno.
Tuas naves albergam vagos sibilos
Símbolos escondidos
Pássaros noturnos
E recortam a harmoniosa dimensão do espaço
Em que as palavras se quebram
De encontro ao silêncio das colunas.
Adornaste os teus capitéis
Com as algas do mar
Extraíste das conchas as pérolas
Para o rendilhado das tuas rosáceas
E fabricaste
Com as linhas paralelas dos limos
A tua própria austeridade.
E do alto da tua torre
Como do mastro de um navio
Contemplas a imagem perturbante dos moinhos
E persegues as gaivotas
Até onde o mar tem fronteiras de neblina.
Luís Graça (1964)
Publicado originalmente no jornal Jornal "Alvorada", quinzenário regionalista, Lourinhã, 13 de setembro de 1964.
Lourinhã > Igreja de Santa Maria do Castelo (Séc. XIV) > Vista interior. Fotógrafo: Mário Novais, 1899-1967. Orientador científico: Mário Tavares Chicó, 1905-1966. Data aproximada da produção da fotografia original: 1954.[CFT015.236.ic].
Publicado no jornal "Alvorada". Há 60 anos. Foi aqui, no jornal "Alvorada", que comecei a publicar os meus primeiros poemas. A escrever as ,minahs primeiras peças jornalísticas (notícias, reportagens...).
Foi aqui que tive a minha primeira atividade remunerada como jornalista, embora sem carteira profissional. Foi, aliás, esta a profissão que dei para a tropa, quando aos 20 anos fui à inspeção militar, em 1967. Também dava explicações a alunos do ensino secundário (português, francês, geografia, história...).
__________________Comecei por estar ligado, à criação de uma secção, ou de uma página, a que chamámos "Alvorada Juvenil", com outros jovens da terra, estudantes (e outros, já a trabalhar), com destaque para os meus amigos e colegas de escola primária, os saudosos Álvaro Andrade de Carvalho, mais tarde psiquiatra (Lourinhã, 1948 - Lisboa, 2017) e o Rui Tovar de Carvalho (Lourinhã, 1948-Lisboa, 2014), que haveria, depois, de fazer carreira no jornalismo desportivo. (O Álvaro faria hoje an0s, 76, se fosse vivo.)
Criámos a seguir um secção dedicada ao "correio dos soldados do ultramar", e mais uma outra onde demos voz aos nossos emigrantes (maioritariamennte em França e na Alermanha, ams também no "Novo Mundo", Brasil, EUA, Canadá).
Criámos a seguir um secção dedicada ao "correio dos soldados do ultramar", e mais uma outra onde demos voz aos nossos emigrantes (maioritariamennte em França e na Alermanha, ams também no "Novo Mundo", Brasil, EUA, Canadá).
No "Alvorada Juvenil", abrimos um inquérito aos jovens lourinhanenses e alimentámos o "cantinho dos poetas"...
Havia da nossa parte alguma irreverência, inquietação e inconformismo, próprias da idade e das circunstâncias da época. Acabei por exercer as funções de redator-coordenador deste jornal, quinzenário regionalista, que ainda hoje se publica. E que era propriedade do Patriarcado de Lisboa. Com0o muit0s outros...
Foi fundado ao em 1960, pelo padre António Pereira Escudeiro (Tomar, 1917-Lisboa, 1994), um homem a quem a Lourinhã muito deve e que fez uma aposta forte na formação das elites locais, ou seja, na educação, para além do apostolado e do mister sacerdotal. Equipou o concelho com diversas igrejas novas, construídas de raiz: Seixal, Atalaia, Ribamar, Toxofal...
Foi o fundador e o primeiro diretor do Externato Dom Lourenço, que a partir de 1958 permitiu aos jovens do concelho da Lourinhã prosseguir os seus estudos depois do ensino obrigatório (que era apenas de 4 anos no meu tempo).
Até então e desde 1953, havia um colégio particular, Dom Luís de Ataíde (fundado em 1953 pelo dr. Piçarra, que era do concelho vizinho do Bombarral). Funcionava num vivenda. Umas escassas dezenas de rapazes e raparigas da Lourinhã puderam então estudar até ao 5º ano. O 7º ano só nas capitais de distrito (Leiria, a norte, Lisboa, a sul).
O padre António Escudeiro fora igualmente fundador do jornal "Redes e Moinhos" (1954-1960) (donde fui encontrar, por exemplo, vário sonetos da Luiza Neto Jorge, 1939-1989, que em jovem vinha passar o verão à Praia da Areia Branca.)
Antes de vir para a Lourinhã como pároco, em 1953, o padre Escudeiro estivera em Alcanena, terra ribatejana da indústria dos curtumes, onde fundara o jornal quinzenário "O Alviela". Será entretanto suspenso pela censura por ousar publicar um artigo sob o título "A fome em Alcanena" (onde se criticava a banca pelos juros usurários que, no pós-guerra, levavam à falência das empresas locais, ao desemprego e à fome)...
Estava-se em plena campanha eleitoral do general Norton de Matos. "O Alviela" retomaria a publicação depois de, mediante requerimento, ser expressamente autorizado a versar também "assuntos sociais" (sic).
Mas a verdade é que o padre Escudeiro ficou com ficha na PIDE.
À frente do "Alvorada", como redator-coordenador, durante mais de très anos (de 1964 a 1966), "fiz-me esquecido" e deixei de mandar o jornal à censura... A entrada de jovens fora uma pedrada do charco da pasmaceira e do conformismo em que se vivia nesta terra do oeste estremenho. A última do concelho do distrito de Lisboa. Tinha então 3 médficos, e um pequeno hospital da misericórida. Sem enfermagem, sem bloco operatório, sem banco de sangue. Mas onde se fazia já alguma cirurgia ambulatória... pro médicos que vinham de Lisboa ou Coimbra.
Estava-se em plena guerra do ultramar / guerra colonial mas já na fase de fim de ciclo da história..."Cadáver adiado", o regime do Estado Novo ainda estrebuchava e metia medo a muitos. Não admirava que o diretor do jornal tenha recebido um intimidatório ofício da direcção geral de censura a perguntar por que é que se permitia o luxo de ultrapassar a lei...
Metade do ofício, que era apenas de duas linhas, correspondia a uma assinatura em letra garrafal, símbolo máximo da arrogância de quem se sentia dono e senhor deste país... A assinatura, ilegível, seguia-se à fórmula, obrigatória, no tempo do Estado Novo (1926-1974), "A bem da Nação, com que terminavam todos os ofícios (e todas as demais comunicações escritas, internas, incluindo discursos, requerimentos, petições, etc.)
O pobre do "senhor vigário" (como a gente o tratava), lá teve que arranjar uma desculpa esfarrapada aos senhores coronéis da censura e, a mim, puxou-me as orelhas... Doravante, tínhamos que mandar os artigos em duplicado para a tipografia, sita em Torres Novas, que por sua vez mandava uma cópia para a censura... E no entanto nunca nenhum de nós escreveu o que que fosse que pudesse pôr em causa a sagrada tríade "Deus, Pátria e Família"!...
Eu acho que os censores embirraram sobretudo com os nossos jovens poetas. Não entendiam nada da poesia moderna e receavam à brava que os jovens lourinhanenses e outros, que colaboravam connosco, escrevessem também nas "entrelinhas", mandassem em código, entre si, perigosas, subversivas e dissolventes mensagens...
Nunca se sabe o que se passa no coração dos poetas nem muito menos na cabeça dos censores...
Havia da nossa parte alguma irreverência, inquietação e inconformismo, próprias da idade e das circunstâncias da época. Acabei por exercer as funções de redator-coordenador deste jornal, quinzenário regionalista, que ainda hoje se publica. E que era propriedade do Patriarcado de Lisboa. Com0o muit0s outros...
Foi fundado ao em 1960, pelo padre António Pereira Escudeiro (Tomar, 1917-Lisboa, 1994), um homem a quem a Lourinhã muito deve e que fez uma aposta forte na formação das elites locais, ou seja, na educação, para além do apostolado e do mister sacerdotal. Equipou o concelho com diversas igrejas novas, construídas de raiz: Seixal, Atalaia, Ribamar, Toxofal...
Foi o fundador e o primeiro diretor do Externato Dom Lourenço, que a partir de 1958 permitiu aos jovens do concelho da Lourinhã prosseguir os seus estudos depois do ensino obrigatório (que era apenas de 4 anos no meu tempo).
Até então e desde 1953, havia um colégio particular, Dom Luís de Ataíde (fundado em 1953 pelo dr. Piçarra, que era do concelho vizinho do Bombarral). Funcionava num vivenda. Umas escassas dezenas de rapazes e raparigas da Lourinhã puderam então estudar até ao 5º ano. O 7º ano só nas capitais de distrito (Leiria, a norte, Lisboa, a sul).
O padre António Escudeiro fora igualmente fundador do jornal "Redes e Moinhos" (1954-1960) (donde fui encontrar, por exemplo, vário sonetos da Luiza Neto Jorge, 1939-1989, que em jovem vinha passar o verão à Praia da Areia Branca.)
Antes de vir para a Lourinhã como pároco, em 1953, o padre Escudeiro estivera em Alcanena, terra ribatejana da indústria dos curtumes, onde fundara o jornal quinzenário "O Alviela". Será entretanto suspenso pela censura por ousar publicar um artigo sob o título "A fome em Alcanena" (onde se criticava a banca pelos juros usurários que, no pós-guerra, levavam à falência das empresas locais, ao desemprego e à fome)...
Estava-se em plena campanha eleitoral do general Norton de Matos. "O Alviela" retomaria a publicação depois de, mediante requerimento, ser expressamente autorizado a versar também "assuntos sociais" (sic).
Mas a verdade é que o padre Escudeiro ficou com ficha na PIDE.
À frente do "Alvorada", como redator-coordenador, durante mais de très anos (de 1964 a 1966), "fiz-me esquecido" e deixei de mandar o jornal à censura... A entrada de jovens fora uma pedrada do charco da pasmaceira e do conformismo em que se vivia nesta terra do oeste estremenho. A última do concelho do distrito de Lisboa. Tinha então 3 médficos, e um pequeno hospital da misericórida. Sem enfermagem, sem bloco operatório, sem banco de sangue. Mas onde se fazia já alguma cirurgia ambulatória... pro médicos que vinham de Lisboa ou Coimbra.
Estava-se em plena guerra do ultramar / guerra colonial mas já na fase de fim de ciclo da história..."Cadáver adiado", o regime do Estado Novo ainda estrebuchava e metia medo a muitos. Não admirava que o diretor do jornal tenha recebido um intimidatório ofício da direcção geral de censura a perguntar por que é que se permitia o luxo de ultrapassar a lei...
Metade do ofício, que era apenas de duas linhas, correspondia a uma assinatura em letra garrafal, símbolo máximo da arrogância de quem se sentia dono e senhor deste país... A assinatura, ilegível, seguia-se à fórmula, obrigatória, no tempo do Estado Novo (1926-1974), "A bem da Nação, com que terminavam todos os ofícios (e todas as demais comunicações escritas, internas, incluindo discursos, requerimentos, petições, etc.)
O pobre do "senhor vigário" (como a gente o tratava), lá teve que arranjar uma desculpa esfarrapada aos senhores coronéis da censura e, a mim, puxou-me as orelhas... Doravante, tínhamos que mandar os artigos em duplicado para a tipografia, sita em Torres Novas, que por sua vez mandava uma cópia para a censura... E no entanto nunca nenhum de nós escreveu o que que fosse que pudesse pôr em causa a sagrada tríade "Deus, Pátria e Família"!...
Eu acho que os censores embirraram sobretudo com os nossos jovens poetas. Não entendiam nada da poesia moderna e receavam à brava que os jovens lourinhanenses e outros, que colaboravam connosco, escrevessem também nas "entrelinhas", mandassem em código, entre si, perigosas, subversivas e dissolventes mensagens...
Nunca se sabe o que se passa no coração dos poetas nem muito menos na cabeça dos censores...
Nota do editor:
Último poste da série > 13 de agosto de 2024 > Guiné 61/74 - P25837: Verão 2024: olá, nós por cá todos bem! (2): O novo livro de Joaquim Costa, "Crónicas de Paz e de Guerra" (Rio Tinto, Lugar da Palavra Ed., 2024, 221 pp.): "A sorte a Guiné ditou,/ Estúpida guerra enfrentou, / Três gritos por quem lá ficou, / Pelo povo se emocionou"