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segunda-feira, 21 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23098: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (22): Lugares da Guiné

Carta Geral da Província da Guiné
© Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Em mensagem do dia 18 de Março de 2022, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art da CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71), lembra os locais da Guiné por onde peregrinou.


RECORDAÇÕES DA CART 2520

22 - LUGARES DA GUINÉ

A CART 2520 enquanto sediada no Xime exerceu uma grande actividade fora do arame farpado, tanto a nível de Companhia ou de pelotão e conjuntamente com a CCAÇ 12 e os Pelotões de Caçadores Nativos 52 e 54, originando para os operacionais um enorme trabalho e também um grande desgaste físico e psicológico. O 3.º pelotão a que pertenci, percorreu praticamente todos os cantos, trilhos e picadas da zona operacional. Por mero acaso fui tomando alguns apontamentos numa pequena pasta onde guardava a minha correspondência e que actualmente a conservo quase religiosamente.

A partir destes curiosos apontamentos, da minha memória e com recurso à carta do Xime e de outros locais, elaborei uma lista que vou partilhar com os camaradas da nossa Grande Tabanca, ou melhor, da Tabanca Grande, dos lugares da Guiné por onde andei, incluindo também os lugares da segunda fase da nossa passagem pelo Ultramar quando a nossa Companhia assentou arraiais em Quinhamel:

Bissau - Início da comissão em 30 de Maio de 1969, alguns dias. Em Junho e Julho de 1970 várias vezes e em Março de 1971
Brá - Primeiras dormidas na Guiné antes da partida para o Xime
Xime - Base da CART 2520 durante o 1.º ano, Junho de 1969 a Junho de 1970
Bambadinca - Um sem número de deslocações com a finalidade de alguns reabastecimentos, ir buscar e levar correio e outros serviços
Mansambo - Primeiras 3 semanas para o treino operacional com o 3.º pelotão
Bafatá - Várias idas com a finalidade do Vaguemestre comprar vacas para nossa alimentação
Ponte Rio Udunduma - Por inúmeras vezes como mini destacamento e de passagem para Bambadinca
Enxalé - Mais de dois meses como destacamento e para segurança da população
Finete - Patrulhamento até ao Enxalé
Mato de Cão - Patrulhamento a partir de Finete até ao Enxalé
Mato Madeira - No percurso entre Finete e Enxalé
Malandim - Zona do Enxalé, patrulhamento
Gambana - Nas proximidades do Enxalé, patrulhamento
Madina Colhido - Inúmeros patrulhamentos e montagem de emboscadas e de seguranças aos barcos que passavam no rio Geba
Ponta Varela - Em operações
Ponta do Inglês - Três passagens em Operações
Foz do Corubal - Uma passagem em Operação
Ponta Coli - Dezenas de seguranças para a passagem de colunas da nossa Companhia e de outros militares
Ponta Luís Dias - Passagem durante Operação
Mouricanhe - Em Operação
Chacali - Em patrulhamento
Chicamiel - Em Operação
Poidon - Em patrulhamentos
Háfio - Em operações
Darsalame/Baio - Em Operações
Buruntoni - Em Operações
Colicumbel - Em patrulhamentos
Lantar - Proximidades do Xime em patrulhamentos
S. Belchior - Em operações
Malafo - Patrulhamento
Bissilão - Em Operações
Gundagué Beafada -Em operações
Amedalai - Ponto de passagem obrigatório para colunas a Bambadinca
Samba Silate - Em patrulhamento, passando por Amedalai
Taibatá - Colunas de apoio à população
Demba Taco - Colunas de apoio à população
Quinhamel - Base da CART 2520, tendo divergido para Safim, João Landim e posteriormente para o Biombo
Safim - Base do 3.º pelotão - Junho, Julho e parte de Agosto de 1970
João Landim - Permanência de dois meses com uma secção
Nhacra - Breve passagem
Biombo/Ondame - Entre Setembro de 1970 e Março de 1971 como destacamento
Blom - Tabanca nas proximidades do Biombo
Blimblim - Tabanca nas proximidades do Biombo
Dorce - Tabanca nas proximidades do Biombo
Ponta Biombo - Patrulhamentos e momentos de descontração
Ilondé - De passagem
São Vicente da Mata - De passagem
Cais de Pigiguidi - Chegada a Bissau e "Adeus Guiné"

José Nascimento

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Nota do editor

Último poste da série de 23 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22311: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (21): Martins, o caçador de rolas

quarta-feira, 23 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22311: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (21): Martins, o caçador de rolas

Enxalé 1972 – Entrada da Tabanca
Foto: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Em mensagem do dia 17 de Junho de 2021, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art da CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71), lembra a aventura do Martins, o caçador de rolas.


RECORDAÇÕES DA CART 2520

21 - MARTINS, O CAÇADOR DE ROLAS

Os recursos alimentares no Enxalé não eram os melhores, dependíamos totalmente do Xime e eram muitas as dificuldades em transportar os escassos artigos alimentares de uma margem para outra do rio Geba, mas lá nos íamos desenrascando com o que nos chegava da Companhia, às vezes também conseguíamos um frango que comprávamos na tabanca e que o nosso "Espanhol" o assava não à moda da Guia, mas sim à moda de Barrancos de onde era natural. O local também era propício para que alguns dos nossos atiradores fazendo jus da sua pontaria, se dedicassem à caça das rolas com a melhor amiga, a G3. Foi o caso do Martins que de quando em vez lá ia arranjando uns petiscos.

Normalmente as caçadas eram efectuadas junto à bolanha virada para o lado do Geba e com poucos riscos de segurança associados. O Martins porém resolveu arriscar mais e entendeu ir à caça das rolas para a mata densa oposta à bolanha e que ficava numa zona mais perigosa e apesar dos meus avisos para que tivesse cuidado e não fosse para aquele lado do matagal, continuou a fazê-lo, mas não foi necessário ir para aquelas bandas muitas vezes para que os meus pressentimentos acontecessem.

Estava eu na área da cozinha à conversa com alguns dos nossos militares quando de repente se ouve o rebentamento de uma granada seguido de algumas rajadas de tiros. Inicialmente pareceu-me uma flagelação vinda daquela zona da mata e até pensei mandar para aquela área uma bazookada ou duas, quando alguém grita: "O Martins está no mato". Fiquei para não ter vida, lá levaram o Martins pensei. De imediato peço para 7 ou 8 elementos me acompanharem numa tentativa de localizar o Martins e possivelmente resgatá-lo. Havíamos percorrido umas duas centenas de metros, na nossa rectaguarda um elemento do nosso pelotão faz um disparo para nos alertar e grita que o Martins está no quartel.

Foi um alívio para mim, mas não acalmou logo a minha ira, nem sequer quis ouvir qualquer justificação do referido militar, só passados dois ou três dias fiquei a saber do que aconteceu. Depois de ter feito um disparo e quando se preparava para recolher uma ave abatida, o Martins ouve algumas vozes e apercebe-se que são alguns guerrilheiros, que possivelmente se preparavam para o agarrar. O Martins não perdeu a calma e instintivamente saca de uma granada de mão que tinha pendurada à cintura e atira-a na direcção de onde havia avistado os seus presumíveis captores e de imediato corre à procura de abrigo no quartel, estes fazem-lhe umas rajadas mas sem lhe acertar e assim o Martins salva-se de ser caçado e de eventualmente fazer um passeio até à Guiné-Conacri, ou de vir numa caixa de pinho até a Metrópole.

Um grande abraço para o pessoal da nossa Tabanca Grande.
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE AGOSTO DE 2020 > Guiné 61/74 - P21269: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (20): O sargento da milícia de Amedalai

sábado, 2 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21727: In Memoriam (380): Domingos Fernandes (1946-2020), ex-fur mil at art, CART 2520 (Xime e Quinhamel, 1969/70): membro, nº 825, da Tabanca Grande, a título póstumo



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Xime > CART 2520 (Xime e Quinhamel, 1969/71) > c. 1970 >  Furríéis milicianos.  Da esquerda para a direita: Domingos Fernandes (1946-2020), José Nascimento, Oliveira e Renato Monteiro.

Foto (e legenda): © José Nascimento (2016). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Xime) > Madina Colhido >  Op Boga Destemida  >   9 de Fevereiro de 1970, "segunda feira de Carnaval" > Helievacuação de feridos graves, na sequência da violenta emboscasda de que foram vítimas as NT (CART 2520, Pel CAç Nat 63 e CCAÇ 12), em Gundagé Beafada.  (*)

Foto (e legenda): © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso amigo e camarada algarvio José Nascimento (ex-fur mil art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71), membro da nossa Tabanca Grande, com 43 referências no nosso blogue, sendo o elemento mais ativo da CART 2520, a par do Renato Monteiro (que antes pertencia à CART 11);


Data: quarta, 30/12/2020 à(s) 18:36
Assunto: Falecimento do camarada Domingos Fernandes

Camaradas:

Faleceu no dia 28/12/2020 o nosso amigo e camarada de armas da CART 2520, o Domingos Fernandes.

Furriel do 4º. Grupo de Combate, foi um elemento de grande valor, pois este grupo dispunha apenas de dois furriéis, o que sobrecarregava os outros elementos.

Quando da chegada da CART 2520 ao Xime, foi destacado para Galomaro por vários meses, local do seu treino operacional.

Creio ter participado na Operação Boga Destemida no dia 9 de Fevereiro de 1970, quando a nossa Companhia sofreu uma emboscada, tendo falecido um dos elementos do seu pelotão. (*)

Muito estimado por todos os elementos do seu pelotão, atribuíram-lhe a alcunha do "Furriel Pistolas".

Afável, discreto, brincalhão, sempre bem disposto, este grande camarada, mereceu por todos nós uma grande consideração. (**)

Descansa em paz, grande camarada,  Domingos Fernandes. 

Um grande abraço a todos os camaradas da Tabanca Grande 

José Nascimento

PS - Junto foto: O Fernandes é o  1º. à esquerda. 

2. Comentário do nosso editor LG:

Zé,  é mais dos nossos bravos da zona leste que nos deixa.  É mais uma notícia triste ao findar do "annus horribilis" de 2020. Não sabia da alcunha dele, "furriel pistolas", mas lembrava-me da cara. De resto, partimos juntos no T/T Niassa, em 24/5/1969, a vossa CART 2520 e a nossa CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12). E regressámos juntos, no T/T Uíge, em 17/3/1971. E estivemos um ano juntos no Sector L1, para o melhor e para o pior. 

De ti e do Monteiro, vou tendo notícias, felizmente... Do Oliveira, o que é feito dele ? E do vosso capitão Maltez ? Vê se confirmas o ano de nascimento do Domingos Fernandes, ele era de 1946, como tu e o Monteiro, não ?! 

Gostei da maneira simples mas afectuosa como o descreveste. Convivi pouco com ele, uma vez que ele esteve algum tempo  destacado em Galomaro. Mas faço questão de o integrar na nossa Tabanca Grande, a título póstumo. Bastava o facto de termos feito essa dura operação em conjunta, a Op Boga Destemida. Quem é que a vai esquecer ? Essa e outras que fizemos em conjunto. 

Peço-te que transmitas à família, se puderes, a nossa solidariedade na dor. O Domingos Fernandes não ficará na vala comum do esquecimento: será lembrado pelos seus camaradas da Guiné, passando a estar, em espírito,  connosco, à sombra do nosso simbólico poilão, no lugar nº 825.

3. Ficha da unidade > CART 2520

Companhia de Artilharia n.º 2520
Identificação: CArt 2520
Unidade:  Mob: GACA 2 - Torres Novas
Crndt: Cap Mil Art António dos Santos Maltez
Divisa: "O Céu, a Terra e as Ondas Atroando"
Partida: Embarque em 24Mai69; desembarque em 29Mai69
Regresso: Embarque em 17Mar71

Síntese da Actividade Operacional

Em 2Jun69, seguiu para Xime, a fim de render a CArt 1746 no referido subsector, sendo integrada no dispositivo e manobra do BCaç 2852 e guarnecendo, por períodos variáveis sucessivos destacamentos na zona de acção, em Mansambo, Ponte do rio Udunduma, Cansamba, Galomaro e outros e, a partir
de 290ut69, com um pelotão destacado em Enxalé, após transferência desta área para o subsector.

Em 1 e 7Jun70, foi substituída, por escalões, no subsector de Xime pela CArt 2715 e seguiu para o subsector de Quinhámel, com destacamentos em Ome, Ondame, Ponta Vicente da Mata e Ilondé e ainda um pelotão no subsector de Nhacra (este até 7Set70 e instalado em Safim e João Landim e entretanto
transferido para o subsector de Brá, por reajustamento dos subsectores), onde rendeu a CCaç 2572, ficando integrada no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área, sob responsabilidade do COMBIS.

Em 1Mar71, foi rendida no subsector de Quinhámel pela CCaç 2617 e recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações
Tem História da Unidade (Caixa n." 121 - 2.a Div/4ª. Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas de unidade: Tomo II - Guiné - (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002), pág. 470.

___________________

(**) 19 de novembro de  2016 > Guiné 63/74 - P16737: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (10): A música das nossas vidas: "Isabelle Isabelle Isabelle Isabelle Isabelle Isabelle Isabelle, mon amour"... ou o braço de ferro entre o fur mil Renato Monteiro e o nosso primeiro Vaz, cuja amada esposa se chamava Isabel e vivia a 5 mil km de distância, em Vila Real, Portugal...

(***) Último poste da série > 1 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21723: In Memoriam (379): as minhas manas freiras, franciscanas hospitaleiras, Maria Augusta Crisóstomo e Emília de Jesus Bárbara Crisóstomo, que acabam de morrer em Portugal, vítimas de Covid-19, e cujas vidas foram uma grande história de amor a Deus, aos pais e ao próximo (João Crisóstomo, Nova Iorque)

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21269: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (20): O sargento da milícia de Amedalai

Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca)  > Subsector do Xime > Amedalai (tabanca em autofesa e destacamento de milícias) >  Junho de 1970 > José Nascimento.


1. Mensagem do nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) com data de 14 de Julho de 2020:


O sargento da milícia de Amedalai

A zona operacional do Xime abrangia as tabancas de Amedalai, Taibatá e Dembataco que estavam em auto defesa. Amedalai ficava no percurso do Xime para Bambadinca, sede do Batalhão 2852 e quando por qualquer motivo a CART 2520 fazia deslocações a Bambadinca era normal fazer-se uma pequena paragem junta a esta tabanca, costumávamos transportar alguns elementos da população até Bambadinca e vice-versa. Esta pequena aldeia guineense era defendida por uma secção de milícias comandada por um sargento de milícia africano.

Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca > Subsector do Xime > Carta do Xime (1955) > Escala 1/50 mil > O traçado a vermelho indica a antiga estrada Xime-Bambadinca, passando por Taliuara, Ponta Coli, Amedalai, Ponte do Rio Udunduma.

Com alguma frequência para receber instruções do capitão da Companhia esta secção deslocava-se ao Xime e certa vez ao cruzar-me com o sargento da milícia este pediu-me emprestados 100 "pesos" (100 escudos) que me pagaria logo que possível. Acedi e passado algum tempo o sargento cumpriu o prometido e liquidou o empréstimo. Por algumas vezes a situação repetiu-se e o comandante da milícia não ficou a dever nada ao suposto primo da Dona Branca.

Acontece que no decurso duma operação executada pela CART 2520 tivemos de pernoitar na tabanca de Amedalai. A tropa manda desenrascar e cada um assim o fez, o pessoal ficou instalado em redor da pequena aldeia indígena. Quando me preparava para passar o noite o melhor possível, apareceu-me o sargento da milícia que pediu-me para o seguir, levou-me para uma morança com quarto e cama a que não faltava um mosquiteiro e que tinha um conforto razoável para a circunstância, durante a noite mosquito foi picar para outro lado. Foi a prova de gratidão deste camarada africano. Espero que depois da independência não tenha sido importunado pelo PAIGC.

Na manhã do dia seguinte e devidamente recomposto do percurso do dia anterior, seguimos rumo a Samba Silate e depois junto à margem do rio Geba, regressámos à nossa base no Xime.

Para todos os camaradas da nossa aventura africana, um grande abraço.
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de julho de 2020 > Guiné 61/74 - P21174: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (19): Uma desditosa criança do Biombo

quinta-feira, 16 de julho de 2020

Guiné 61/74 - P21174: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (19): Uma desditosa criança do Biombo

Biombo >  Destacamentio de Ondame > Aula de condução
© José Nascimento


1. Mensagem do nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) com data de 14 de Julho de 2020:


UMA DESDITOSA CRIANÇA DO BIOMBO

A tranquilidade daquela manhã no nosso pequeno destacamento do Biombo foi interrompida por um africano, que com grande ansiedade nos pedia ajuda, "menino muito doente" exclamou.

Dou pressa ao cabo enfermeiro (O Pastilhas) e com a brevidade possível dirigimo-nos para a tabanca de Ondame no "burrinho de mato" que eu próprio conduzo.
Chegados ao local deparámos com uma criança prostrada sobre uma enxerga, assim que o nosso enfermeiro se debruçou sobre o rapazinho verificou que as hipóteses de o salvar eram muito poucas ou nulas, respirava com grande dificuldade. O cabo enfermeiro ainda tentou encontrar-lhe uma veia para lhe dar soro, fez o melhor que sabia e o que estava ao seu alcance, mas os seus esforços foram em vão, a criança sucumbiria de seguida.

- Meu furriel está morto - sussurrou o enfermeiro, mais nada havia a fazer.

Estivemos mais alguns minutos no local, até que dissemos às pessoas que nos rodeavam, que o menino tinha falecido. Imediatamente as mulheres que estavam em nosso redor desataram a carpir, como é tradicional na cultura guineense e nós afastámo-nos do local com uma enorme frustração, por ter sido em vão o nosso esforço para não deixar morrer a infeliz criança.

O tempo passa, meio século já lá vai, mas ainda guardo com alguma mágoa no meu baú de memórias a imagem do desditoso rapazinho africano.

Um abraço para todos os camaradas da Tabanca Grande
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21070: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (18): Um pequeno desentendimento

sexta-feira, 12 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21070: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (18): Um pequeno desentendimento

Xime - 1.º Sargento Vaz à direita, depois Furriéis Nascimento e Soares


1. Em mensagem do dia 9 de Junho de 2020, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) manda-nos mais uma recordação da sua CART, hoje a estória de um pequeno desentendimento com um 1.º Sargento da sua Companhia.


RECORDAÇÕES DA CART 2520

UM PEQUENO DESENTENDIMENTO

Durante as nossas refeições na messe de sargentos no Xime, várias das nossas conversas originavam acesos debates sobre qualquer assunto que viesse à baila. Normalmente o 1.º Sargento Vaz como pessoa mais velha e mais "sabida" queria ter sempre razão em qualquer tema que eventualmente gerasse alguma controvérsia.

E, como era habitual, num certo dia à hora de almoço houve uma acesa das nossas conversas. Concluída a minha refeição saio para ir equipar-me para fazer uma coluna a Bambadinca, dou a volta ao edifício e vou mandar uma bocas pela janela que dava para o interior da nossa messe, mas o 1.º Sargento Vaz num gesto algo maldoso ou irreflectido atira com um copo de vinho através da rede mosquiteira que vem tingir de tinto a minha camisa.

A minha reacção foi imediata, corro para a nossa casa de banho, encho um balde de água que servia de autoclismo no nosso sanitário, dirijo-me à janela, que do exterior não dava para vislumbrar quem estava dentro e zás lá vai disto.

Dirijo-me de imediato para os meus aposentos e já à esquina do edifício ouço o 1.º Sargento enfurecido berrar:
-  Nosso furriel, vá você comer a sopa. - Voltei-me, vejo-o e dá para perceber que está pior que pólvora.

Equipado e pronto, vou cumprir a minha missão da qual voltaria ao fim do dia. Durante este tempo não deixei de pensar no assunto, com receio de que o 1.º Vaz pudesse fazer alguma participação ao Capitão Maltez e eu ficasse em maus lençóis. Chegado ao Xime os meus camaradas tentaram me infernizar com um "tás lixado", para não dizer outra coisa.

Tomo um banho tropical reparador, descanso um bocado e é chegada a hora de jantar. Dirijo-me à minha mesa, os lugares normalmente eram os mesmos, sento-me para tomar a minha refeição, até que chega o representante máximo da classe de Sargentos. Fico na expectativa, mas da sua boca não saiu uma palavra sobre o assunto. Confesso que o homem foi impecável, voltámo-nos a dar bem como se nada tivesse passado.

Depois do serviço militar nunca mais voltei a encontrar-me com o 1.º Sargento Vaz, gostava de lhe ter dado um abraço e também de lhe pedir desculpas pelas garrafas vazias que atirava para cima do telhado dos seus aposentos, quando às tantas da noite voltava duma ronda ou vagueava pelo aquartelamento. Sei que já partiu para outra jornada.

José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20920: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (17): Um condutor zeloso e cumpridor do seu dever

quarta-feira, 29 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20920: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento, ex-Fur Mil Art) (17): Um condutor zeloso e cumpridor do seu dever

1. Em mensagem do dia 23 de Abril de 2020, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) manda-nos mais uma recordação da sua CART, hoje o exemplo de "Um condutor zeloso e cumpridor do seu dever".


RECORDAÇÕES DA CART 2520

Um condutor zeloso e cumpridor do seu dever

Uma das missões da CART 2520 era manter a segurança da estrada Xime/Bambadinca às colunas de viaturas militares que desembarcavam no Xime vindos de Bissau pelo rio Geba e seguiam depois para o interior da Guiné, ou vice-versa. A segurança da estrada consistia na picagem do itinerário até à Ponta Coli e uma vez aí chegados emboscávamos à beira da estrada, normalmente junto às árvores existentes e eventualmente junto aos chamados "baga-baga". Também montávamos o nossa própria segurança quando era necessário deslocarmo-nos a Bambadinca ao Batalhão 2852 e a Bafatá para a compra de víveres. Normalmente assim que as colunas de viaturas passavam, regressávamos à nossa base.

Certa tarde o Capitão Maltez, à falta do Alferes Marques, ordena-me para ir fazer uma segurança à Ponta Coli, iria desembarcar no Xime e seguir para Bambadinca uma coluna militar. E lá vamos nós cumprir a nossa missão com o pelotão bastante desfalcado, Furriel Monteiro "cá tem", estava no Enxalé; Furriel Soares "cá tem", estava nos reordenamentos em Nhabijões com outro militar do nosso pelotão. Como seria normal nestas ocasiões deveria seguir também um elemento de transmissões e um enfermeiro, mas como era para voltar de seguida, o capitão entendeu que estes elementos ficariam no quartel.

Estrada Xime-Ponta Coli-Bambadinca
Infogravura Luís Graça & Camaradas da Guiné

Instalados e emboscados no local a segurança está montada e passados alguns minutos as viaturas começam a passar. Uma, duas... até que uma das viaturas que seguia rebocada por outra, fica imobilizada em virtude de ser partido o cabo de reboque. Esta viatura tinha a mobilidade bastante reduzida porque creio eu, tinha sofrido um acidente ou se tinha incendiado. Feitas algumas tentativas em vão para seguir percurso, um dos responsáveis pela coluna pergunta-me se posso ficar ali mais algum tempo a fazer a segurança enquanto iriam a Bambadinca, voltariam muito breve para rebocar a viatura sinistrada, ao que eu acedi. Ficou junto a nós o militar condutor responsável pela viatura.

O tempo passa e a noite começa a cair sem que se vislumbre o regresso dos militares para fazer o necessário reboque. Dou indicações aos meus elementos para que se juntem mais, devido ao dia começar a escurecer e a visão entre os operacionais ser menor. Na minha cabeça começa a pairar o panorama ter de permanecer no local durante a noite sem estarmos preparados para tal, sem alimentação, com munições em quantidade mínima para a ocasião, sem enfermeiro e com a impossibilidade de comunicar com o nosso quartel por falta do operador de rádio e iria pôr em risco a vida de mais de 20 operacionais.

Uma ideia que me ocorreu foi regressar ao Xime e aí chegados, o Capitão Maltez decidisse o que fazer, mesmo que fossemos nós a voltar ao local, mas devidamente preparados para permanecermos naquele lugar extremamente perigoso durante uma noite, de guarda a uma viatura assucatada. Dirijo-me então ao condutor e digo-lhe o que pretendo fazer, ao que perentoriamente me responde: - Eu não abandono a viatura!
Fico a ferver de raiva, o que fazer com este gajo? - pergunto a mim mesmo. Levá-lo obrigado era completamente impossível e abandoná-lo junto à viatura, nunca o iríamos fazer, era impensável. Faço várias tentativas de o persuadir, mas em vão, a sua recusa em sair do local é determinante.

Esperamos, esperamos, a noite já havia caído, a nossa ansiedade aumentava a cada minuto, quando do lado de Bambadinca se ouve o barulho característico dos motores das viaturas a trabalhar, são os elementos que vêm proceder ao reboque da teimosa viatura e recolher o bravo e determinado condutor de que nada o demoveu de cumprir a sua missão como militar português. A salientar que as viaturas já vinham de luzes acesas o que não era muito aconselhável para a situação, talvez por desconhecimento da zona. Regressamos enfim, à nossa base, chegados ao nosso Xime já o sol tinha ido iluminar outras paragens havia mais de uma hora.

Para todos os camaradas desta Tabanca Grande um abraço.
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 24 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20768: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (16): O Furriel Pestana

sexta-feira, 27 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20780: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (120): A COVID-19 não passará!... Felizes reencontros de 3 camaradas, que estão à distância de um clique... mas fisicamente separados e agora confinados... Falamos de: (i) José Joaquim Pestana, gravemente ferido em combate em 9/3/1970, no Xime, quando era fur mil da CART 2520, e que vive em Torre de Moncorvo, sua terra natal; (ii) José Nascimento (em Faro, a 671 km, de carro); e (iii) Paulo Salgado, amigo de infância e vizinho do Pestana, a 400 metros da sua porta...


CART 2520 > c. abril/maio 1969 > Campo Militar de Santa Margarida > Santa Margarida - José Joaquim Pestana é o segundo de pé a partir da esquerda. O José Nascimemto é o primeiro da esquerda, na primeira fila. O pessoal da CART 2520 (Xime e Quinhamel, 1969/71) partiu para o CTIG, no T/T Niassa, em 24/5/1969.



Guiné > Regiaão de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca > Xime > O Fur Mil Pestana, sentado num heli AL III.

Fotos (e legendas): © José Nascimemto (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Paulo Cordeiro Salgado [ex-Alf Mil Op Esp, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), autor do livro (, o mais recente,) "Milando ou Andanças por África" (Torre de Moncorvo: Lema d'Origem, 2019); vive em Vila Nova de Gaia; está neste momento na sua casa de Torre de Moncorcvo, donde é natural;

Date: quarta, 25/03/2020 à(s) 22:31

Subject: O caso do furriel miliciano Pestana

Meus Caros Camaradas editores,

Abaixo o que me parece ser razoável, neste momento, sobre o texto do José Nascimento. Um bom e sentido texto. Acabei de ligar ao Zé Pestana. Como ele não bloga, li-lhe o texto. Ficou admirado...e decerto a pensar que há amigos que se recordam de nós...

Junto abaixo.

Um abraço e coragem perante esta guerra...

____________________

José Pestana - um amigo

Pois é: o texto que o camarada José Nascimento escreveu (*) a falar do José Joaquim Pestana, furriel miliciano da CART 2520, despertou em mim um desejo de partilhar algo sobre este meu amigo. Apreciei a forma como o Nascimento aborda o tema. Obrigado, camarada.

Vamos por partes.

1.º - O Zé – assim o passo a designar – foi meu condiscípulo desde a 3.ª classe até ao 5.º ano liceal, aqui na nossa Vila de Torre de Moncorvo; nas brincadeiras de garotos e já adolescentes, uma amizade sã. Há fotografias que atestam esta fase da nossa vida.

2.ª – Desde jovem, o Zé foi um apaixonado pela viola; ele e o irmão (o Manel, que esteve em Angola, logo em 1961, onde viveu intensamente as "bernardas" iniciais naquela colónia, eufemisticamente chamada província…) fazem um duo de viola e guitarra de grande estilo; ainda hoje tocam quando convidados; eu próprio já me "servi" da sua disponibilidade autêntica e sã aquando da apresentação de um dos meus livros – Milando ou Andanças por África. Mas noutras oportunidades também. Imagino como ele terá sido importante com a sua viola, no Xime…Há fotografias nossas.

3.ª – Fui encontrá-lo em Bissau, em 1970 e ainda um pouco em 1971, por acaso, estando eu de passagem para o Olossato, e logo fizemos algumas almoçaradas de ostras e camarões no Pelicano e noutros restaurantes de Bissau. E conversámos…Apoiou-me logisticamente, pois ele já estava em serviços auxiliares, mas sempre prestando grandes serviços nas novas funções, após ter sido ferido em combate. Há fotografias que atestam estes momentos.

4.º - Vive em Moncorvo e onde eu, actualmente, paro mais vezes; e é tempo de voltarmos a conviver. Acabei de lhe telefonar dando conta do texto e fotos que estão no nosso blogue e ele ficou emocionado – oh, o Nascimento! – referiu.

Infelizmente, estamos confinados por causa deste maldito vírus. Só pelo telefone, apesar de as nossas casas distarem 400 metros, aproximadamente. (**)

Um abraço ao Nascimento.

Paulo Salgado

2. Comentário do José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71), que vive em Faro:


26 mar 2020 15:21




Caro Luís,

Agora sou eu a dizer: Oh, o Pestana?!

Fiquei deveras emocionado com o que acabei de ler.

Estas coisas não se esquecem.

Um abraço para o Paulo Salgado e também para ti, Luís

Nascimento
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 24 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20768: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (16): O Furriel Pestana

terça-feira, 24 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20768: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (16): O Furriel Pestana

O Fur Mil Pestana no Xime


1. Em mensagem do dia 24 de Julho de 2019, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) fala-nos do "Reguila", o 1.º Cabo Cordeiro do 3. Pelotão da 2520.


RECORDAÇÕES DA CART 2520

O FURRIEL PESTANA

José Joaquim Pestana, assim se chamava um dos furriéis do 2.º pelotão da CART 2520 que esteve no Xime. Fez a sua formação como Atirador de Artilharia no 2.º ciclo do 1.º turno de 1968 na Escola Prática de Artilharia de Vendas Novas. Era muito bem disposto e brincalhão e até me chamava de imberbe devido ao meu aspecto jovem em relação à idade que eu tinha. Sabia tocar guitarra e ensinou outros elementos da Companhia a fazê-lo, pelo que normalmente, sempre que as condições permitiam, às noites se organizavam pequenos concertos de música.


 Santa Margarida - José Joaquim Pestana é o segundo de pé a partir da esquerda.

Mas, para infelicidade do Pestana, no dia 9 de Março de 1970, a música foi outra. Já de regresso duma operação nas matas do Xime, o inimigo comandado por um "maestro" cubano, monta uma emboscada à CART 2520. A cerca de cinco ou seis quilómetros de distância e no destacamento do Enxalé, ouço o "cantar" das costureirinhas e o som das "baterias", neste caso dos RPG7 e também das nossas G3, que passados alguns minutos se calam.

Peço ao operador de rádio para entrar em contacto com a sede da Companhia e somos informados que a situação é grave, há um morto e vários feridos da parte das nossas tropas. Ao fim de algum tempo ouve-se ao longe o som característico das pás dos hélis, que procedem à evacuação dos nossos feridos para Bissau e outros para o Xime.

Pensando que poderia ser útil, solicito para me virem buscar à margem do Geba oposta ao Xime e assim com mais dois ou três elementos do meu pelotão faço a travessia da bolanha e também da sempre arriscada cambança do rio, ao mínimo percalço poderíamos servir de apetitosa refeição a um qualquer jacaré.

Apressadamente dirijo-me à nossa enfermaria, onde os nossos azougados enfermeiros, comandados pelo Furriel Enfermeiro Costa, fazem o que podem para tratar dos feridos.
Assim que me vê, o Costa diz-me:
- Nascimento, ajuda-me aqui.
Apresso-me a ajudá-lo e o ferido que estava a ser tratado era o Furriel Pestana. Tinha um buraco nas costas onde cabia um punho cerrado. Fiquei impressionado com o ferimento que vi, foi feito o melhor tratamento possível, ou seja o que estava ao alcance dos nossos enfermeiros, tanto o Pestana como alguns dos feridos são de seguida evacuados para Bissau.

Ainda no mesmo dia regressei ao Enxalé consciente de que havia cumprido a minha obrigação. Não mais voltei a ver o camarada Pestana porque ele não mais regressaria à Companhia, recuperou mas ficou com algumas mazelas.

Passados alguns anos, e depois vasculhadas várias listas telefónicas, consigo aceder a um número de telefone que me pareceu ser a do antigo camarada de armas. Depois de discar os números e de ouvir o toque de chamada sou atendido por um familiar, peço que me passem o telefone ao Pestana e depois de me identificar ouço do outro lado da linha num tom de voz verdadeiramente comovida:
- Ah, és tu Nascimento?

Tivemos uma pequena conversa sobre as nossas vivências da Guiné. Desde então ligue-lhe esporadicamente e desabafamos as nossas lamentações.

O Pestana sempre se recusou a comparecer nos convívios que a CART 2520 tem efectuado ao longo dos anos e compreende-se porquê.

Para todos os camaradas da Tabanca Grande um abraço.
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de julho de 2019 > Guiné 61/74 - P20020: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (14): "O Reguila"

sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20325: Memória dos lugares (399): destacamento de João Landim, no rio Mansoa: quem eram os " Homens de Ferro [em] Botes de Borracha", que aqui estavam, em junho/julho de 1970, com uma seção do 3º pelotão da CART 2520 (Xime e Quinhamel, 1969/71) ? Era gente dos fuzileiros especiais e do BENG 447... (José Nascimento)



Guiné > Região do Cacheu > Rio Mansoa  > João Landim >  Junho/Julho de 1970 >   O destacamento, composto por dois barracões, guarnecido na altura por 1 secção do 3º pelotão da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71), comandada elo fur mil José Nascimento.


Foto (e legenda): © José Nascimento (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Legenda complementar do autor (*):


 O que consigo ler da última foto é:

Homens de Ferro [em] Botes de Borracha

D.F.E. / A2 [ou 12 ?]
Destacamento de Fuzileiros Especiais N. A2 [12 ?}

Furriel M.L. Dias

Sinais - Vargas- Lagares
Fuz. Esp.

LDM 203

Tenentes Brito e Beijamim [Beijamim assim mesmo] [Seria o então tenente RN  Rebordão de Brito ? E o Benjamim  ? Havia um outro tenente DFE Benjamim Correia ... LG]

Guerreiro
Pinto


2. Escreve o José Nascimento, ex-fur mil, CART 2520 (Xime e Quinhamel, 1969/71) (*):

 [O destacamento de João Landim] era composto por um barracão onde nós militares do 3.º pelotão da CART 2520  havíamos de permanecer e por um outro barracão onde "moravam" os militares da Engenharia e da Marinha, responsáveis pela manobra e cambança das duas jangadas que operavam entre margens do Mansoa, para o transporte de viaturas militares e civis, bem como de população.

Aqui permaneci nos meses de Junho e Julho de 1970. Ao escurecer era posto a funcionar um pequeno gerador que nos iluminava durante a noite, mas o seu barulho era de tal forma infernal, que, passado quase meio século, parece que ainda ouço o seu roncar dentro da minha cabeça.

A casa de banho era composta por uma estrutura de madeira, com um ou dois bidões no seu cimo, que diariamente os elementos vindos de Safim os abasteciam de água potável, também nos traziam as nossas refeições que, para não variar,  quase sempre chegavam fora do horário que seria normal para o almoço ou para o jantar.

Para as necessidades fisiológicas, existia uma pequena estrutura de madeira já meio apodrecida. Quando a maré do Mansoa subia, as águas do rio exerciam as funções de estação de tratamento. Curiosamente, a algumas dezenas de quilómetros da foz, a água aqui era salgada, que quando a maré enchia, quase nos entrava pelo barracão adentro.

Apesar das enormes dificuldades foi um aliviar de tensões e  uma fuga ao perigo constante que representou a nossa estada no Xime. A noite é que era passada com alguma apreensão devido às precárias condições e ao reduzido número de militares para fazermos a nossa própria segurança.
Durante o dia controlávamos as viaturas, tanto civis como militares, que atravessavam de uma margem para outra do rio, fazendo o registo em folhas de papel próprias.

A permanência em João Landim também permitiu que algumas vezes embarcasse no "machimbombo"  que vinha de Teixeira Pinto ou de Bula com destino a Bissau. Aproveitava para ter um almoço diferente do que era habitual (bianda com bianda) e para fazer umas compras de pequenas recordações que traria até à Metrópole quando em Agosto de 1970 vim abraçar os meus familiares.
Terminava a minha pequena aventura em João Landim, para lá não voltaria mais." (...).

Temos 13 referências a João Landim no nosso blogue. Mas muitos maisa camaradas passaram por aqui e devem fotos deste lugar. (**)



Guiné > Região do Cacheu > Rio Mansoa > João Landim > Junho de 1973 > O rio Mansoa em João Landim e a jangada que fazia a sua travessia. Primeiro entravam as viaturas, depois as pessoas. Bissau ficava a cerca de quinze quilómetros e para a "peluda", o fim da comissão, faltavam, ainda quatro longos meses. A Helena regressaria mais cedo a casa, o Francisco só chegará a Lisboa a 11/10/1973, no T/T Niassa, com os seus rapazes do Pel Rec Daimler 3089.

Foto (e legenda): © Francisco Gamelas (2016). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20321: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (15): Mudança para Quinhamel

1. Em mensagem do dia 24 de Julho de 2019, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) fala-nos do "Reguila", o 1.º Cabo Cordeiro do 3. Pelotão da 2520.


RECORDAÇÕES DA CART 2520

MUDANÇA PARA QUINHAMEL

Doze meses são passados sobre a permanência da CART 2520 no Xime. É chegada a hora da abalada para Quinhamel.

Enquanto a CART 2520 esteve sediada no Xime, houve dois pelotões que estiveram fora da zona operacional da Companhia; o 3.º pelotão fez o treino operacional em Mansambo e o 4.º pelotão actuou em Galomaro por cerca de quatro meses.

O destacamento da Ponte do Udunduma, localizado entre o Xime e Bambadinca também esteve à guarda da CART 2520, bem como o destacamento do Enxalé, situado na margem direita do Geba a cerca de dois quilómetros do Xime. As tabancas de Amedalai, Taibatá e Dembataco que estavam em auto-defesa também tiveram a protecção da CART 2520.

Foi um ano de grande actividade operacional para CART 2520 com um sem número de operações militares no mato, de montagem de emboscadas e de patrulhamentos ao longo dos diversos trilhos e picadas existentes na zona. Foram montadas dezenas de seguranças aos barcos que navegavam pelo rio Geba e um elevado número de colunas do Xime a Bambadinca e também algumas deslocações a Bafatá para a compra de mantimentos, nomeadamente algum gado vacum. Estas deslocações a Bafatá também serviam para descontrair e aliviar algumas tensões acumuladas. A estrada entre Bambadinca a Bafatá já era alcatroada.

Assim que souberam que a mudança ia acontecer, os "músicos" da Companhia fizeram uma canção dedicada a Quinhamel baseada numa música do Duo Ouro Negro e que versava ou rimava mais ou menos assim:

Dizem que vou pra Quinhamel
Uma praia bonita pra me banhar
Pra Quinhamel pra Quinhamel
Pra Quinhamel eu vou lá ficar

Pra Quinhamel pra Quinhamel
Pra Quinhamel eu vou lá ficar
E à noitinha quando o sol se pôr
Do Pelicano ou do Grande Hotel eu vou voltar

 Preparando a recepção aos periquitos

Rio Geba - Adeus Xime

Mas, quando chegados a Quinhamel os operacionais foram apanhados por algumas surpresas. Os pelotões seriam dispersos por vários destacamentos; Biombo, Ilondé, Ome e Safim. Só um pelotão e mais alguns atiradores é que tiveram o privilégio de permanecer o tempo restante da comissão em Quinhamel, além dos elementos da chamada Formação, condutores, mecânicos e outras especialidades.

Safim coube ao 3.º pelotão e lá vamos nós, nem tivemos tempo de saborear o belo clima e a praia de Quinhamel. Chegados a Safim ainda havia outra surpresa, um pequeno destacamento que dava pelo nome de João Landim situado na margem esquerda do rio Mansoa. O comando deste sub-destacamento era feito por um furriel, a nível de secção.
Mal tínhamos postos os pés em Safim e sabendo da necessidade de avançar com uma secção para outro destino, o alferes Marques diz-me:
- Nascimento, vais tu - depositando em mim a sua confiança.
- Só vou com voluntários - respondi-lhe.

De seguida perguntei quem queria ir comigo para o desconhecido. Avançaram os elementos necessários, pouco depois estávamos a caminho.

E assim eis-nos chegados a João Landim à beira do Rio Mansoa plantado.

 João Landim depois de uma tempestade - Junho/Julho de 1970

 João Landim - Jangada no Rio Mansoa - Foto obtida em plena noite com o flash de um relâmpago

João Landim - Junho/Julho de 1970 - Visto do Rio Mansoa

Era composto por um barracão onde nós militares do 3.º pelotão da CART 2520 havíamos de permanecer e por um outro barracão onde "moravam" os militares da Engenharia e da Marinha, responsáveis pela manobra e cambança das duas jangadas que operavam entre margens do Mansoa, para o transporte de viaturas militares e civis, bem como de população.

Aqui permaneci nos meses de Junho e Julho de 1970. Ao escurecer era posto a funcionar um pequeno gerador que nos iluminava durante a noite, mas o seu barulho era de tal forma infernal, que passado quase meio século, parece que ainda ouço o seu roncar dentro da minha cabeça.
A casa de banho era composta por uma estrutura de madeira, com um ou dois bidons no seu cimo, que diariamente os elementos vindos de Safim os abasteciam de água potável, também nos traziam as nossas refeições, que para não variar quase sempre chegavam fora do horário que seria normal para o almoço ou para o jantar. Para as necessidades fisiológicas, existia uma pequena estrutura de madeira já meio apodrecida. Quando a maré do Mansoa subia, as águas do rio exerciam as funções de estação de tratamentos. Curiosamente, a algumas dezenas de quilómetros da foz, a água aqui era salgada, que quando a maré enchia, quase nos entrava pelo barracão adentro.

Apesar das enormes dificuldades foi um aliviar de tensões e uma fuga ao perigo constante que representou a nossa estada no Xime. A noite é que era passada com alguma apreensão devido às precárias condições e ao reduzido número de militares para fazermos a nossa própria segurança.
Durante o dia controlávamos as viaturas, tanto civis como militares, que atravessavam de uma margem para outra do rio, fazendo o registo em folhas de papel próprias.
A permanência em João Landim também permitiu que algumas vezes embarcasse no "machimbombo" que vinha de Teixeira Pinto ou de Bula com destino a Bissau. Aproveitava para ter um almoço diferente do que era habitual (bianda com bianda) e para fazer umas compras de pequenas recordações que traria até à Metrópole quando em Agosto de 1970 vim abraçar os meus familiares. Terminava a minha pequena aventura em João Landim, para lá não voltaria mais.

Em João Landim recordo um pequeno episódio, quando o militar que estava de controle chegou ao pé de mim e me disse que havia um nativo que ia para Bissau e não tinha documento de transporte de alguns produtos hortícolas que levava para venda e me perguntou o que havia de fazer. Eu respondi-lhe para o deixar seguir. Passados alguns minutos, para surpresa minha apareceu-me o militar com um ananás como gratidão, oferecido pelo nativo. Soube a pouco.

Para todos os camaradas da Tabanca Grande aqui vai um grande abraço.
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de julho de 2019 > Guiné 61/74 - P20020: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (14): "O Reguila"

terça-feira, 20 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20078: In Memoriam (346): José Manuel Vitória Cordeiro, ex-1.º Cabo At Art.ª do 3.º Pelotão da CART 2520 (José Nascimento, ex-Fur Mil Art)

1.º Cabo José Manuel Vitória Cordeiro (o Reguila)
3.º Pelotão da CART 2520


1. Em mensagem do dia 19 de Agosto de 2019, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) dá notícia do falecimento do 1.º Cabo José Manuel Vitória Cordeiro, "Reguila" do 3. Pelotão da CART 2520.

Camaradas da Tabanca Grande,
Acabo de receber a triste notícia do falecimento dum elemento do 3.º pelotão da CART 2520, trata-se do 1.º Cabo José Manuel Vitória Cordeiro, detentor da alcunha do Reguila a quem há pouco tempo dediquei uma pequena história na nossa Tabanca Grande[1].

Era natural de Muge e desde há longos anos a residir em Mira de Aire, onde também exercia a sua actividade profissional no ramo das mobílias.
Foi um dos grandes símbolos da nossa Companhia, dedicado, amigo do seu amigo, granjeava da amizade e o respeito de todos nós, foi um dos principais impulsionadores dos nossos convívios anuais, inclusive do último, o dos 50 anos da nossa partida para a Guiné e que decorreu em Torres Novas, com a visita às instalações do que foi a nossa unidade mobilizadora, o antigo GACA 2[2].

Descansa em paz Cordeiro, descansa em paz Reguila.
José Nascimento


 O "Reguila" em Santa Margarida. É o primeiro à esquerda.
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Notas do editor:

À família enlutada e aos seus camaradas e amigos da CART 2520, a tertúlia da Tabanca Grande endereça as suas mais sentidas condolências.

[1] - Vd. poste de 30 de julho de 2019 > Guiné 61/74 - P20020: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (14): "O Reguila"

[2] - Vd. poste de 29 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19839: Convívios (896): Cinquentenário da partida da CART 2520 para o CTIG, em 24 de Maio de 1969... Comemorado em Torres Novas, a 25 do corrente (José Nascimento)

Último poste da série de 11 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20049: In Memoriam (345): Pedro Martinho de Lima Alves Martins, que comandou a CART 6554/73, "Os Intemeratos" (Angola, 1973/75). Era irmão do nosso camarada João Martins. O funeral é amanhã, em São Martinho do Porto, Alcobaça

terça-feira, 30 de julho de 2019

Guiné 61/74 - P20020: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (14): "O Reguila"

1. Em mensagem do dia 24 de Julho de 2019, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) fala-nos do "Reguila", o 1.º Cabo Cordeiro do 3. Pelotão da 2520.


"O Reguila"

Esta é uma pequena história dedicada a um dos elementos do 3.º Pelotão da CART 2520 que me acompanharam nos quartéis e destacamentos por onde eu andei na Guiné, de seu nome completo:
- José Manuel Vitória Cordeiro
-  Posto: 1.º Cabo
- Especialidade: Apontador de morteiro
- "O Reguila" - alcunha adquirida durante a instrução de combate em Torres Novas.

"O Reguila" também viria a ser o seu nome de guerra durante a sua comissão na Guiné. De estatura mediana, mais rijo do que o próprio aço do morteiro 60, que manejava com destreza, colocava uma granada com precisão em qualquer alvo que estivesse à vista.
Não sabia o que era o medo, não voltava a cara à luta e dizia-se preparado para combater em qualquer lugar da Guiné.

Desde sempre integrado no 3.º Grupo de Combate da CART 2520, esteve no Xime e Mansambo durante o treino operacional, Enxalé, João Landim e Biombo.

Para o futebol também tinha alguma habilidade e no Biombo entrava nas peladinhas que habitualmente se disputavam no "relvado" existente mesmo ali em frente do destacamento.
Numa certa tarde a partida de futebol foi disputada com uma equipa do 2.º Pelotão que havia sido convidada para um jogo amigável, a contar para o campeonato do nada. Integrado na equipa visitante vinha o "Boxeur", nome de guerra de um dos elementos do 2.º Pelotão, mas que de pugilista pouco tinha a não ser o seu ar de rufia.

A assistência muito reduzida era composta por vários militares e por alguns nativos que passavam e atiravam um olhar para o "relvado". Por motivos de força maior o encontro não foi transmitido pela televisão, nem sequer teve direito a ser difundido pela rádio.

Como perder era proibido, o encontro foi disputado com garra, o que originou a que a luta pela posse de bola entre o "Reguila" e o "Boxeur" descambasse para alguma violência, até que se envolveram fisicamente. Do jogo de futebol, num ápice passou-se para outra modalidade, a de pugilismo, apesar de não haver ringue de boxe. No frente a frente o "Reguila" puxa a culatra atrás, melhor dizendo, o seu punho esquerdo cerrado e lá vai disto, acertando em cheio no queixo do adversário que com a força do murro, mais forte que coice de cavalo selvagem, foi projectado ao chão. Reagindo, o "Boxeur" agarra as pernas do "Reguila" atirando-o ao solo. Com os dois deitados no relvado, ou melhor no pelado, o "Boxeur" atirou um ou dois murros ao "Reguila", mas sem lhe causar qualquer efeito. Foi nesse momento que o Furriel Nascimento que também gostava de dar uns pontapés no esférico e fazia parte da equipa da casa, mas devido às circunstâncias do momento, feito árbitro, interrompeu a cena de pugilato e também a jogatana de futebol.

O embate entre pelotões terminou empatado com um nulo, mas o mini combate de boxe terminou com "um justo vencedor aos pontos" que neste caso foi ... "O REGUILA".

Para todos os amigos tabanqueiros um grande abraço.
José Nascimento

 O "Reguila" em Santa Margarida. É o primeiro à esquerda.

O "Reguila" no Biombo. É primeiro da direita, de pé.
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19847: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (13): ingenuidade ou inexperiência do cap mil Maltez

sábado, 1 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19847: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (13): ingenuidade ou inexperiência do cap mil Maltez


 Foto nº 1 > Xime, CART 2520 (1969/70) >  O José Nascimentro junto ao obus 10.5


Foto nº 3 > Xime > CART 2520 (1969/70> Quartel do inimigo, ma mata do Xime


Foto nº 2 > Xime > CART 2520 (1969/70) > Depois deum ataque ao quartel


1. Mensagem do José Nascimento [ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71], membro da nossa Tabanca Grande (*):

Data - 30/05/2019, 15:21

Assunto -  Ingenuidade ou inexperiência do capitão Maltez

Xime, c. 1969/70, cap mil António dos Santos Maltez.
Foto Renato Monteiro (2006) (*)


As forças militares portuguesas representadas pela CART 2520 e comandadas pelo Capitão [miliciano] Maltez caminhavam há algumas horas pelos trilhos das matas do Xime quando a determinado momento se começa a ouvir algumas batidas parecidas com o trabalhar de um machado. Tomadas as devidas precauções os nossas tropas começam a fazer a aproximação da direcção de onde vinha o som dessas batidas.

E, com os cuidados devidos, a tropa portuguesa chega a uma distância de cerca de cinquenta metros do local, numa clareira existente na mata. A esta distância deu para perceber que eram dois elementos do PAIGC, um deles com um lança-roquetes às costas e outro com uma Kalashnikov, estavam a cortar ramagens de palmeiras com uma catana ou uma ferramenta artesanal.

Após uma rápida análise da situação, o Capitão Maltez tomou a decisão de tentar apanhar à mão (vivos) aqueles guerrilheiros inimigos

É iniciado um cerco aos dois guerrilheiros, o que demora alguns minutos e as condições da mata não eram as melhores. Então o inesperado acontece, num movimento involuntário ou talvez não, um dos guias da nossa tropa tropeça num ramo da floresta, provocando um pequeno ruído, mas o suficiente para chegar aos ouvidos apurados dos guerrilheiros inimigos, que num ápice e mais velozes do que um raio desapareceram no interior da mata.

É retomado o caminho pelo trilho e muito mais depressa do que seria de esperar, os elementos que haviam fugido montam uma pequena emboscada e atiram um ou mais rokets sobre a tropa da CART 2520. Os nossos militares reagem e imediatamente respondem com algumas rajadas, fazendo com que aqueles elementos do PAIGC dispersassem de seguida. Uma das granadas atiradas contra os militares portugueses explodiu a escassos metros da fila do pirilau, provocando ligeiros ferimentos nas costas do soldado João Parrinha e de outros dois dos nossos combatentes, o Bárbara e o Setério, que de imediato foram assistidos pelo Cabo enfermeiro Silva.

Feitos de novo ao caminho, a nossa tropa cumpriu o percurso préviamente traçado, chegando já ao cair da noite à nossa base sem mais incidentes.

Para todos os camaradas da Tabanca Grande aqui vai um enorme abraço.

José Nascimento

Anexo:

Foto 1 - Xime, junto ao obus 10,5

Foto 2 - Xime, depois de um ataque inimigo

Foto 3 - Mata do Xime, quartel do inimigo

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Notas de leitura:



23 de junho de 2006 > Guiné 63/74 - P899: Diga se me ouve, escuto! (Renato Monteiro)