Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 8 de janeiro de 2025
Guiné 61/74 - P26359: Parabéns a você (2343): António Murta, ex-Alf Mil Inf MA da 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513/72 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74)
Nota do editor
Último post da série de 6 de janeiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26350: Parabéns a você (2342): Paulo Santiago, ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 53 (Saltinho, 1970/72)
sexta-feira, 12 de abril de 2024
Guiné 61/74 - P25374: A 23ª hora: Memórias do consulado do Gen Bettencourt Rodrigues, Governador e Com-Chefe do CTIG (21 de setembro de 1973-26 de abril de 1974) - Parte XV: as ondas hertzianas também chegavam a Nhala, Gadamael, Pirada, Canquelifá...
António Murta, ex-alf mil, 2ª CCaç / BCaç 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74)
— Não se sabe mais nada. Houve uma revolução em Lisboa e prenderam os Pides. Não se sabe mais nada.
“...e prenderam os Pides”. O meu coração quase rebentava. A comoção perturbava-me. Chegámos ao quartel e estava tudo na maior confusão, agarrados aos rádios, mas pouco se adiantava. Quis ver e interpretar as caras das pessoas, ver as suas reacções e, de facto, elas eram diferentes, embora a generalidade estivesse radiante. Ainda era cedo para as pessoas se definirem e manifestarem, quer pela sua despolitização, quer pela incerteza dos pormenores dos acontecimentos».
A desinformação era tal, que os acontecimentos só me mereceriam nova referência em 5 de Maio, onde dou conta de ocorrências graves em Bissau: rebentamentos nas ruas, perseguições a Pides e, até, a agressão à esposa de um deles, frente ao Mercado de Bissau, em que a senhora foi completamente despida. A tropa interveio e impediu coisas certamente mais graves. Eram os rumores que iam chegando. (...) (**)
C. Martins,ex-cmdt., 15º Pel Art (Gadamael, 1972/74)
(...) Bem,eu estava em Gadamael,e após fazer a minha ronda higiénica, liguei o rádio em onda curta e percorri as ondas do "éter"..."rádio Habana, Cuba, território libre in America", nada; "rádio Moscovo", nada; "Deutchsvella", nada: "rádio Globo", nada.."BBC.. golpe militar em Portugal, general Spinola, coiso e tal"... O quê ?... Porra,.finalmente!...
Contactei o Sr. comandante H. Patrício, dizendo-lhe que estava a decorrer um golpe militar,e este pergunta se era o nosso General Spínola que estava à frente... E eu..claro que é.. (eram 7 da manhã e eu não fazia a mais pequena ideia)... Ah, sendo assim eu alinho...Boa.
Não houve a flagelação da ordem, já não saiu uma companhia para o mato e o resto continuou tudo como dantes... Apenas troca intensa de mensagens com Bissau, que pouco ou nada sabiam,ou não queriam dizer.
Foi assim o meu 25A.(***)
Joaquim Vicente da Silva, ex- 1º cabo at cav, 3ª/BCav 8323 (Pirada, set1973/set1974
(...) Vou contar a história do violento ataque que sofremos em Pirada, exactamente no dia 25 de Abril de 1974.
No dia 25 de Abril de madrugada, saímos dois pelotões, mais os sapadores. Fomos levantar algumas minas que estavam na picada em direcção a Gabu (Nova Lamego). Regressámos a Pirada por volta das dez da manhã. Participei nesta saída, tínhamos de fazer a protecção aos sapadores.
Eram mais ou menos dez e meia, eu já tinha tomado banho e estava no meu quarto, abrigo nº. 1, deitado em cima da minha cama e ouvi um pequeno estalido. Um colega que estava cá fora sentado num banco, gritou logo:
Naquele dia o PAIGG bombardeou Pirada com muitos mísseis e morteiros, alguns caíram bem perto do local onde eu me encontrava, eu não morri por sorte. A meu lado, morreram três africanos nossos colegas, um míssil caiu-lhes aos pés e cortou-os em pedaços. Nunca tinha visto nada daquilo. Fiquei horrorizado, ainda hoje mexe comigo.
Nós, soldados brancos, não morremos nenhum, porque estávamos bem agachados nas valas ou trincheiras. Vieram juntar-se a nós vários oficiais, incluindo o alferes médico que nos disse para nos espalharmos mais pelas valas porque aquilo estava a ficar feio.
Este bombardeamento durou cerca de duas horas. Nós respondemos com os morteiros 81, os nossos obuses 10.5 e o nosso obus 14 que estava junto à pista de aviação de Pirada. Bajocunda também nos deu apoio de fogo com o obus 14 deles. Foi um inferno. Só se ouviam bombas a voar, outras a assobiar e a rebentar por cima ou perto de nós.
Assim que terminou o ataque, mandaram-nos equipar para sair. Fomos patrulhar em volta de Pirada e encontrámos, para o lado do Senegal, o mato todo a arder, mas felizmente não vimos ninguém do PAIGC. Caiu um míssil na casa de um comerciante branco, de nome António Palhas, que escapou ileso, mas morreram seis africanos que estavam noutro compartimento da casa.
Nesse dia, nós, cabos e soldados, não sabíamos nada do que estava a acontecer cá na Metrópole. Só à noite, através da BBC é que tivemos conhecimento do golpe de Estado. Foi uma grande alegria para todos nós porque pensámos logo que a guerra acabava naquele dia. Festejámos com muitas cervejas.
No dia seguinte na telefonia, começámos a ouvir a Grândola, Vila Morena e outras músicas do Zeca Afonso. A guerra ia acabar, que alegria! (...) (****)
Carlos Costa, ex-fur mil, 2ªC/BCAÇ 4516 /73 (Aldeia Formosa, Mampatá, Colibuia, Canquelifá, Ilone, Canquelifá, Bissau, jul73/set74)
José Carlos Gabriel, ex-1.º Cabo Op. Cripto, 2.ª CCAÇ/BCAC 4513
Nhala, 1973/74
(**) 15 e abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12988: No 25 de abril eu estava em... (20): No mato, algures entre Nhala e Buba, emboscado, junto à estrada nova que ligava as duas povoações... (António Murta, ex-al mil, 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513, Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973-74)
(****) Vd. poste de 30 de março de 2009 > Guiné 63/74 - P4106: No 25 de Abril eu estava em... (8): Pirada, a ferro e fogo (Joaquim Vicente Silva, 3ª CCAV / BCAV 8323)
(*****) Vd. poste de 16 dr abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12993: No 25 de abril eu estava em... (21): Nhala... e nessa noite já ninguém dormiu (José Carlos Gabriel, ex-1.º Cabo Cripto, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513, Nhala, 1973/74)
segunda-feira, 18 de março de 2024
Guiné 61/74 - P25284: A 23ª hora: Memórias do consulado do Gen Inf Bettencourt Rodrigues, Governador-geral e Com-chefe do CTIG (21 de setembro de 1973-26 de abril de 1974) - Parte XI: Nhala, 23 de abril, a última visita a um quartel no mato (António Murta, ex-alf mil, 2ª C/BCAÇ 4513, Nhala, 1973/74)
Foto 8 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Formosa) > Nhala > 2ª C/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > Diálogo à porta do cmdt de companhia, com a presença de um "homem grande" que deve ser um “notável” da tabanca, mas de quem não me recordo.
(ii) História da Unidade do BCAÇ 4513:
(...) 23 de Abril de 1974, terça-feira: A visita do General.
A visita do General Bettencourt Rodrigues a Aldeia Formosa e a Nhala foi, provavelmente, a última que fez na Guiné na qualidade de Comandante-Chefe.
Nas imagens que mostrarei a seguir, “reportagem” que não é de todo exaustiva, pode notar-se uma certa ausência de tropa em Nhala, pela mesma razão da ocorrida aquando da visita da Cilinha, mas que não referi no relato que dela fiz. Essa ausência deve-se ao que a História da Unidade do BCAÇ 4513 expressa sem rodeios:
“(...) 23Abr74 – (...). Em virtude da visita de Sua Excelência o Comandante-Chefe, foi montado na estrada Aldeia Formosa-Buba um dispositivo especial de segurança, com forças da 1.ª CCAÇ, 2.ª CCAÇ, 3.ª CCAÇ/4513, CART 6250”.(...)
Como última nota referente a este dia, diz ainda o seguinte a História da Unidade:
Mas o senhor General já não ouviria o grande estouro, recatado em Bissau para onde regressou após ter almoçado em Aldeia Formosa. (...)
Foto 1 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Fomosa) > Nhala > 2ª NC/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > Chegada do gen Bettencourt Rodrigues às imediações do aquartelamento, descendo a base recente da estrada nova; na frente do jeep, preparando-se para descer, o comandante do BCAÇ 4513, ten cor Carlos Alberto Ramalheira.
Foto 2 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Fomosa) > Nhala > 2ª C/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > Depois das honras militares o general cumprimenta o cmdt de Nhala, Cap Braga da Cruz, da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513. Atrás de si, o Oficial de Dia, Alf Mil Campos Pereira.
Foto 3 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Fomosa) > Nhala > 2ª C/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > A comitiva dirige-se para o aquartelamento. À esquerda da imagem o coronel Hugo da Silva, Chefe do Estado-Maior, cumprimenta o Oficial de Dia. Em primeiro plano, de Kalashnikov, o tenente Ajudante de Campo. E guarda-costas, pareceu-me.
Foto 5 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Fomosa) > Nhala > 2ª C/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > O tenente guarda-costas (que ostenta o crachá dos cmds na boinma, e está equipado com uma Kalash), aproveita para ler uma carta chegada da Metrópole, quero crer. Porquê? Porque o envelope é debruado pelo tracejado característico do correio aéreo.
Foto 7 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Fomosa) > Nhala > 2ª C/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > Após inspecção ao depósito de géneros (com cão a sair), da responsabilidade do fur mil vagomestre Sebastião Oliveira.
Fotos 9/10 > Guiné > Região de Tombali > Sector S2 (Aldeia Fomosa) > Nhala > 2ª C/BCAÇ 4513 (Nhala, 1973/74) > 23 de Abril de 1974 > Outro homem grande chega-se à conversa, enquanto começam a aparecer as mulheres da tabanca com ar decidido, começa o ajuntamento popular movido pela curiosidade e pelo tributo de honra ao homem grande da tropa, manga de ronco; já não vai haver hipótese de reunir no gabinete; tudo irá a “despacho” ali à porta.
Notas do editor:
quinta-feira, 7 de março de 2024
Guiné 61/74 - P25245: A 23ª hora: Memórias do consulado do Gen Bettencourt Rodrigues, Governador e Com-chefe do CTIG (21 de setembro de 1973-26 de abril de 1974) - Parte IX: O adeus a Aldeia Formosa, onde também tinha um sobrinho, madeirense [Fernando Costa (1951-2018), ex-fur mil trms, e músico, CCS/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, março de 1973/ setembro de 1974)]
Guiné > Região de Quínara > Região de Tomabali > Porta de armas do aquartelamento ao tempo do Comando, CCS e 1ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (março de 1973/ setembro de 74)... As outras suas unidades orgânicas estiveram em Buba (a 1ª CCAÇ) e em Nhala (2ª CCAÇ)...
1. Mensagem do Fernando Costa (1951-2018), ex-fur mil trms, CCS/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Março de 1973/Setembro de 1974) (*), membro da nossa Tabanca Grabde desde 25/10/2009 (*):
Volto ao vosso contacto para enviar uma foto onde aparece o Cmdt das Forças Armadas da Guiné, General Bettencourt Rodrigues, naquela que foi a última visita a Aldeia Formosa.
Um forte abraço, ex-furriel mil Fernando Costa
O seu sucessor, o gen Bettencourt Rodrigues, terá ido lá, uma única vez (não nos finais de 1973 ou princípios de 1974, mas sim em 23 de abril, segundo o António Murta)... Tinha lá um sobrinho, madeirense. (***)
(**) 2 de novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5193: Memória dos lugares (50): Aldeia Formosa, BCAÇ 4513: A última visita do Gen Bettencourt Rodrigues (Fernando Costa)
sábado, 24 de fevereiro de 2024
Guiné 61/74 - P25209: Por onde andam os nossos fotógrafos? (21): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte VII: Patrulhando a estrada Buba-Nhala, em construção
Fotos (e legendas): © António Murta (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Foto 1 > O 3.º e o 4.º Grupos de combate da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 transportados em viaturas pela estrada Buba-Nhala, iniciam depois um patrulhamento apeado comandados pelo alf mil Tibério Barros e por mim, respectivamente.
Foto 2 > As viaturas regressam a Nhala. Os grupos prosseguem até se embrenharem na mata, lá mais à frente, para interceptarem o carreiro da guerrilha que cruza aquela zona. Repare-se que a estrada continua por alcatroar, tal como noutros troços, por falta de alcatrão.
Foto 3 > O meu grupo de combate aguarda que se ganhem distâncias para poder avançar. À frente vai o 3.º grupo. Em primeiro plano, de costas, o soldado Frade de Coimbra. Creio que era o único casado do grupo.
Foto 4 > Ainda na estrada, imagem agora colhida da frente da coluna, vendo-se os homens do 3.º grupo de combate.
Foto 5 > Pessoal do 3.ºgrupo, trilhando o carreiro da guerrilha.
Foto 6 > Regresso a Nhala pela velha e saudosa picada. Na imagem, homem da bazuca do 3.º grupo e, em segundo plano e à direita, o Furriel Pastor do meu grupo.
Foto 7 > Ainda do mesmo ponto de vista, em primeiro plano o radiotelegrafista Bento seguido do 1.º cabo maqueiro Baptista Custódio, ambos do meu grupo.
Foto 8 > O meu grupo de combate, quase sem baixas, a gozar o merecido descanso. Nesta imagem faltam os dois furriéis.
Foto 9 > O 3.º grupo de combate também a descansar. O alferes Barros é o do lenço azul e à sua esquerda a olhar para o fotógrafo, o furriel Félix.
terça-feira, 20 de fevereiro de 2024
Guiné 61/74 - P25190: Por onde andam os nossos fotógrafos? (20): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte VI: O Rio Grande de Buba
È um dois rios mais importantes da Guiné-Bissau. No séc. XV e XVI, quando os navegadores portugueses andaram por aqui, era conhecido apenas por Rio Grande.
É um rio navegável numa grande extensão, comunica com o Geba, passa na cidade de Buba, tem uma bacia com uma área de 285 km2. É rico em peixe. Nele vvem o peixe-boi e algunas espécies de tartarugas. É uma região (incluindo o Parque Natural das Lagoas de Cufada) de grande biodiversidade, dispondo das maiores reservas de água doce do país. Há várais ameaças sobre esta riqueza natural, incluindo a cnstrução de um porto comercial e mineiro (paar escoar a bauxite do Boé),
A sua navegabilidade deve-se a alguns características particulares: (i) é relativamente profundo e pouco propenso a assoreamento; (ii) o seu leito, assente em base laterítica, é estável. (Fonte: Wikipedia).
[Seleção e reedição de fotos, revisão / fixação de texto para efeitos de edição neste blogue, itálicos e negritos: LG]
(*) Vd. postes de:
domingo, 11 de fevereiro de 2024
Guiné 61/74 - P25157: Por onde andam os nossos fotógrafos? (19): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte V: A visita da "Cilinha" a Nhala a um mês e meio do 25 de Abril de 1974
Foto nº 3
Foto nº 4
Foto nº 5
Foto nº 6
Foto nº 7
Foto nº 8
Foto nº 9
Sobretudo esta visita, trouxe uma animação inusitada às tropas de Nhala – e do Sector -, mas não se pode dizer que tivesse, também, quebrado a monotonia e a rotina, simplesmente porque naquela época, o que tínhamos menos era monotonia e rotina, tal era a actividade operacional.(...)
Não precisa de grandes apresentações porque sobre ela quase tudo já foi dito. Muito antes de a ter conhecido em Nhala, já tinha por ela uma elevada consideração e um grande respeito, pela sua coragem, tenacidade e coerência.
Durante treze anos, de 1961 a 1974, foi presidente do MNF que ela fundou, tendo em vista acções de sensibilização da sociedade portuguesa para a defesa das colónias ultramarinas, o seu Ultramar.
Era por ser assim, e não pelos seus objectivos, que a admirava e a minha consideração elevou-se depois de a ter conhecido. Porque, sendo coerente com as suas convicções, saiu do seu confortável cantinho e dos salões solenes e elegantes, e veio para o terreno com o seu camuflado pôr na prática aquilo em que acreditava, correndo riscos e sofrendo privações.
E via-se que gostava do que fazia, exibindo uma alegria contagiante e uma disponibilidade total, atributos que passavam para quem a via e ouvia, por a reconhecerem como “um deles”. Politicamente, eu estava nos antípodas. Para mim, a Cilinha, pelas suas ideias e acções e pela sua proximidade (intimidade) com o Regime, representava o Regime.
Politicamente, portanto, eu era contra a sua filosofia de manutenção das colónias, contra tudo o que dizia e fazia nesse sentido, que era, um pouco do que já fizera na sua juventude em prol da caridadezinha.
Paradoxo, incoerência da minha parte? Não. Repito que, como pessoa, tinha por ela o meu maior respeito e consideração. Aliás, soube já depois da sua morte que, nesse aspecto de respeitar o “outro” mesmo não concordando com “ele”, ela não era muito diferente de mim.
Dois exemplos: foi sempre amiga, desde a infância, da Sofia de Mello Breyner, mesmo estando em campos políticos opostos; uma vez disse, revelando nobreza de carácter: “Admiro Cunhal pela sua coerência”.
Para terminar, lamento que, após o 25 de Abril e até à sua morte, tenha sido desprezada pela esquerda e ostracizada pelos seus correligionários de direita. Tudo apanágios de gente de baixa índole. Sei que nunca foi hostilizada, ainda assim, merecera mais consideração.
À chegada a Nhala, a Cilinha foi alvo de calorosa recepção por parte da tropa e de alguma população, sobretudo crianças. Mais pelo inédito da situação e pela curiosidade por esta mulher branca que se aventurava no mato para chegar perto deles, com estímulos e uma palavra amiga.
Almoçou na messe de oficiais após uns descontraídos aperitivos, mais para pôr a conversa em dia. Vinha acompanhada pelo Comandante do Batalhão, Ten Cor Carlos Alberto Ramalheira e por um séquito de outros oficiais que foi arrastando por onde passou.
Após o almoço (ou antes?) houve tempo para falar aos soldados, cantar o fado e, até, dançar com alguns. Depois partiu rumo a Mampatá, após demoradas e sentidas despedidas.
Vd. tanbém poste de 15 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21361: (De)Caras (160): Cecília Supico Pinto (1921-2011)... "Cilinha, uma mulher que aprendi a admirar e a respeitar, mesmo discordando dos seus objetivos políticos" (António Murta, autor de uma belíssima reportagem fotográfica da visita da histórica líder do MNF a Nhala, em 10/3/1974, e que ela nunca viu em vida)