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segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27174: Felizmente que ainda há verão em 2025 (29): Olha que não, Rosinha, olha que não... Sempre houve incêndios florestais no Portugal Mediterrânico... Mas há quem proponha que se corte as mãos aos incendiários...


edição de 9 de setembro de 1966. Reportagem de Joaquim Letria e Pedro Rafael Santos


1. Trágica efeméride: d
aqui a dias cumprem-se 59 anos sobre o incêndio que devastou 5 mil hectares (cerca de um terço da área plantada)  na Serra de Sintra e causou a morte a 25 militares do Regimento de Artilharia Antiaérea Fixa de Queluz.

Cinco mil hectares. Esta foi a área aproximada que ardeu no trágico incêndio que deflagrou na Serra de Sintra em setembro de 1966, um dos maiores e mais devastadores incêndios florestais da história da região.

O fogo, que teve início a 6 de setembro de 1966, lavrou durante vários dias, consumindo uma vasta mancha florestal, estimada em cerca de um terço da área arborizada da serra na altura. As chamas, impulsionadas por ventos fortes, alastraram rapidamente, ameaçando a vila de Sintra e marcos históricos e naturais.

Para além da imensa perda a nível de património natural, o incêndio de 1966 na Serra de Sintra ficou marcado, para sempre,  pela morte de 25 militares do Regimento de Artilharia Antiaérea Fixa de Queluz, que perderam a vida enquanto combatiam as chamas.

A tragédia teve um profundo impacto no país e levou a uma maior consciencialização sobre a necessidade de prevenção e combate a incêndios florestais em Portugal.

2. Disse o Fernando Ribeiro, em comentário ao poste P27166(*):

Antº Rosinha, em Portugal sempre existiram incêndios e sempre existirão, porque são uma forma de a Natureza se renovar. Não há volta a dar-lhe. 

O que não existia, era tantos eucaliptos e tantos pinheiros bravos, que ardem como palha, nem tanto despovoamento do interior. 

Em 1966, concretamente, morreram 25 militares no combate a um incêndio ocorrido na serra de Sintra. 

Durante as muitas caminhadas que fiz na serra de Sintra, aos fins de semana, estive mais do que uma vez no local onde eles morreram, que se situa perto do convento dos Capuchos. O local está assinalado por uma cruz e uma placa de mármore com os nomes das vítimas, e o terreno em volta estava totalmente desmatado. 

Para lá se chegar, sai-se de uma encruzihada próxima dos Capuchos, onde confluem as estradas para o palácio da Pena, para o convento dos Capuchos, para o Pé da Serra e para a Peninha. Sobe-se por uma "picada" que sai dessa encruzilhada no sentido do Monge (um túmulo pré-histórico) e que acaba por desembocar perto da Peninha. 

Os pormenores do trágico incêndio podem ser lidos aqui: 


3. De facto, sempre houve fogos florestais em Portugal ao longo dos séculos, não é só um fenómeno exclusivo da atualidade... 

Só por populismo, demagogia ou ignorância histórica se pode afirmar o contrário, nomeadamente nas redes sociais,  procurando-se tirar partido, emocional e politico-partidariamente, da tragédia que são sempre, todos os anos, os incêndios em Portugal e demais países de clima mediterrânico (Espanha, Sul de França, Itália, Grécia, etc.).

Mas em breve voltaremos à barbárie: cortem-se as mãos aos incendiários, já se ouve por aí... Ou, então, acabem-se com os isqueiros e as caixas de fósforos em Portugal. E até mais: encerrem-se as gasolineiras...

A afirmação
 de que sempre houve incêndios florestais em Portugal ao longo do séc. XX acaba por ser uma realidade histórica inegável. 

O que mudou, e muito,  foi perceção pública e a escala dos incêndios  nas últimas décadas. Estamos de acordo o Fernando Ribeiro.

E depois, é bom não esquecer (!),  havia quem, até aos 25 de Abril de 1974,  decidisse por nós, cidadãos de 2ª classe,  o que podíamos ler ou não nos jornais, ouvir ou não na rádio, ver ou não na televisão...

Os registos históricos confirmam que o fogo foi um elemento recorrente e transformador das paisagens rurais e florestais portuguesas durante todo o século passado e séculos anteriores.

Uma conjugação de fatores, desde políticas de florestação a profundas alterações socioeconómicas, moldou a história dos incêndios no país.

Os incêndios florestais em Portugal têm raízes históricas profundas e são resultado tanto de processos naturais quanto de atividades humanas de gestão do território ao longo dos séculos. 

Se olharmos para registos históricos, relatos de cronistas, arquivos municipais e até estudos de paleobotânica, vemos que os incêndios rurais e florestais existiram sempre, de Norte a Sul do país, associados a vários fatores.

(i) Registos históricos de incêndios florestais

Existem indicações de uso e ocorrência de fogos florestais que remontam a milhares de anos, detetados por depósitos de carvão com mais de 11 mil  na Serra da Estrela, associados a grandes incêndios ligados à ocupação humana e gestão agropastoril.

Desde a Idade do Bronze e do Ferro, o fogo foi utilizado para desflorestação e construção de novas áreas agrícolas, o que provocava incêndios regulares.

Registos escritos de municípios portugueses já no século XIV documentam preocupações e legislação para evitar incêndios em matas, particularmente zonas de sobreiros e azinheiras.

(ii) Incêndios notáveis nos séculos XIX e XX

No Pinhal de Leiria, registaram-se grandes incêndios, como os de 1806, 1814, 1818, 1824 (cerca de 4.000 ha), 1825 (cerca de 5.000 ha) e 1875 (cerca de 300 ha).

No séc. XIX, já se encontravam em vigor portarias e legislação para proteção florestal e combate às queimadas.

Desde a década de 1960, os incêndios passaram a ser mais frequentes, intensos e recorrentes.  

Tornam-se mais comuns a partir dos anos 1970 devido a profundas transformações sociais, demográficas e económicas (guerra do ultramar, emigração, expansão de áreas florestais, sobretudo de eucalipto, abandono rural, industrialização e urbanização do país, etc.).

Repare-se nestes dados:

1930 > Censo da população > 6 825 883 habitantes (Continente e Ilhas). Só 1 em cada cinco portugueses (19%) residia em cidades (594 mil em Lisboa, 232 mil no Porto e 485 mil nas restantes);

1950 > População activa: 3.2 milhões (50% no sector primário, 24% no sector secundário e 26% no sector terciário); por outro lado, mais de quarenta anos depois da instalação, por Alfredo da Silva, das primeiras fábricas de produtos químicos nos terrenos de aluvião da Margem Sul do Tejo, o complexo químico-industrial do Barreiro ocupava então uma área de 21 hectares; o maior grupo económico português era constituído por centena e meia de empresas e 10 mil trabalhadores.

1951 > Inauguração da barragem de Castelo de Bode, uma obra emblemática do Estado Novo e elemento-chave do plano de electrificação de 1944, e da industrialização do país; inaugurada, também nesse ano,  a ponte de Vila Franca de Xira, permitindo uma mais rápida ligação Norte-Sul.

(iii) O fogo como fenómeno mediterrânico natural

O fogo é considerado um fenómeno natural nos países do Mediterrâneo, tendo papel importante na dinâmica ecológica e na sucessão de algumas espécies vegetais. Factos a destacar:
  • o uso tradicional do fogo para renovação de pastagens e controle de vegetação sempre esteve presente na paisagem portuguesa e mediterrânica;
  • os pastores eram recorrentemente acusados de "incendiários";
  • clima mediterrânico. verões longos, quentes e secos,  favorecem a propagação do fogo;
  • práticas agrícolas tradicionais, como as queimadas para renovação de pastagens ou limpeza de terrenos, que muitas vezes saía fora de controlo;
  • trovoadas secas (factor a não negligenciar como causador de incêndios, tal como na Guiné);
  • descuidos e acidentes: desde tempos medievais há relatos de incêndios ligados a fogueiras,  produção de carvão, cal, forjas, etc. ou até relâmpagos;
  • estrutura da vegetação: matos, pinhais, sobreirais, giestais e eucaliptais (mais recentes) sempre foram combustíveis disponíveis; todavia, o coberto mediterrânico, com sobreiros, azinheiras e castanheiros é mais resistente ao fiogo.
Refira-se que o eucalipto foi introduzido em Portugal em meados do séc. XIX:  os  primeiros exemplares plantados em jardins e hortos botânicos destinavam-se a  fins... terapêuticos e científicos.

 Planta exótica, acabou por se tornar uma praga:  as plantações comerciais iniciaram na década de 1880, invadindo propriedades privadas e Matas Nacionais. 

 O Eucalyptus globulus tornou-se a espécie dominante (devido à sua boa adaptação ao nosso clima e ao seu rápido crescimento). (Passemos por cima do seu peso na economia portuguesa, na estrutura do emprego, etc.)

A diferença em relação ao passado, e no que diz respeito aos incêndios florestais,  é a escala, a frequência e o impacto socioeconómico:

  • antes, os fogos eram mais localizados, porque a floresta estava mais fragmentada entre campos agrícolas, baldios e áreas de pastoreio;
  • nos nossos dias, com o abandono rural, a continuidade de matos e florestas densas e a expansão do eucalipto e do pinheiro, o fogo alastra de forma muito mais rápida e devastadora.

Portanto, dizer que "só há incêndios hoje" é, de facto, uma mistificação histórica. O que mudou foi o contexto social, económico e ambiental, que faz com que os fogos atuais sejam mais extensos e difíceis de combater.
 
Aqui vão alguns exemplos documentados que ajudam a perceber que os incêndios florestais fazem parte da história de Portugal muito antes do século XX:

 
(iv) Portugal a ferro e fogo... Da Idade Média à Época Moderna

Séc. XIV

Nas Ordenações Afonsinas já aparecem normas para punir quem fizesse queimadas descuidadas que levassem a incêndios em montes e matos.

Séc. XV-XVI 

Há registos em cronistas e câmaras municipais de incêndios em pinhais e matos, sobretudo ligados à preparação de terras para agricultura ou pastoreio.

Pinhais de Leiria (plantados desde o reinado de D. Afonso III e expandidos por D. Dinis) sofreram incêndios várias vezes nos séculos XVI e XVII; há referências a fogo “que ardeu muitos pinheiros” e necessidade de reflorestação.

Séc. XVIII

O Terramoto de 1755 originou também incêndios urbanos e rurais que se estenderam a zonas florestais próximas de Lisboa e outras zonas atingidas.

Em 1792, um alvará régio regulava o uso do fogo em baldios e pastagens, por causa dos “grandes danos dos fogos desmandados que frequentemente incendeiam os matos e arvoredos”.

Séc. XIX

Há várias notícias em jornais da época sobre incêndios em pinhais, matas e serras. Por exemplo:

1824: referência a incêndios no Pinhal de Leiria; criação da AGMR (Administração Geral das Matas do Reino).

1843: notícia no Diário do Governo sobre fogos em matas nacionais.

1853: grandes incêndios em Trás-os-Montes e Beiras são relatados como “desgraças repetidas”;

1876: grandes incêndios no Alentejo;
 
1882/83:  grandes incêndios na Mata do Buçaco.

Desde o início do século XIX, existiam preocupações institucionais e técnicas sobre a gestão florestal e a prevenção de incêndios, especialmente com a criação em 1824 da AGMR e os trabalhos de campo e científicos de silvicultores como:

  • José Bonifácio de Andrada e Silva (fim do século XVIII / início do XIX); 
  • Bernardino António de Barros Gomes (1839–1910);
  • Adolfo Möller (formado na Alemanha, responsável pela arborização de margens do rio Mondego, na década de 1860).

Em resumo: podemos afirmar com segurança que os incêndios florestais sempre existiram em Portugal. 

O que acontece nos séc. XX e XXI é que, com o êxodo rural, a continuidade do coberto vegetal e a monocultura florestal (eucalipto), os fogos passaram a ser mais extensos e mais frequentes. E as preocupações com a sua prevenção já são não de agora.

 
(v) Incêndios florestais: uma constante na paisagem portuguesa do Séc. XX 

Embora a sistematização de dados sobre áreas ardidas só se tenha tornado mais rigorosa a partir da década de 1980, é possível delinear uma cronologia de eventos significativos que marcaram o século XX.

No início do século, os incêndios eram frequentes, mas muitas vezes de menor dimensão e mais ligados a práticas agrícolas e pastoris. 

A gestão do fogo fazia parte do quotidiano rural, sendo utilizado para a renovação de pastagens e limpeza de terrenos. No entanto, a falta de controlo resultava frequentemente em incêndios de maior escala.

A partir da década de 1960, a frequência e a dimensão dos grandes incêndios florestais começaram a aumentar de forma notória.

 Eventos como os incêndios em Vale do Rio/Figueiró dos Vinhos e Viana do Castelo (1961), na Serra de Sintra (1966) (que resultou na morte trágica de 25 militares) e na Serra de Monchique (1966), evidenciaram uma nova e mais perigosa realidade.

As décadas seguintes foram marcadas por uma escalada no número de ocorrências e na área ardida. 

O ano de 1986 assinala um marco sombrio, com o primeiro incêndio a ultrapassar os 10 mil  hectares. 

A partir daí, os "mega-incêndios" tornaram-se uma preocupação crescente, culminando em anos de extrema severidade já no final do séc. XX e no início do séc. XXI.


(vi) As Raízes do problema: causas e consequências

A omnipresença dos incêndios florestais em Portugal no séc. XX pode ser atribuída a um complexo de causas interligadas:
  • Políticas de Florestação: 
No Estado Novo nacionalizou baldios e implementou uma vasta campanha de florestação, com o objetivo de combater a erosão dos solos e aumentar a riqueza florestal do país. 

No entanto, a aposta em monoculturas de espécies de rápido crescimento e elevada inflamabilidade, como o pinheiro-bravo e, mais tarde, o eucalipto, criou vastas áreas contínuas de combustível, propícias à propagação de grandes incêndios.

  • O Êxodo rural e o abandono de terras: 
A partir de meados do século, a intensificação do êxodo rural para os centros urbanos e para o estrangeiro provocou uma profunda alteração na paisagem e na estrutura social do interior do país. 

O abandono de terras agrícolas e de práticas tradicionais de gestão do território levou à acumulação de matos e outro material combustível, tornando as florestas mais densas e perigosas.

  • Declínio da agricultura e pastorícia tradicionais: 
A diminuição da pastorícia extensiva (incluindo a transumância)  e da agricultura de subsistência, que anteriormente garantiam a limpeza de vastas áreas de mato, contribuiu significativamente para o aumento da carga de combustível nas florestas.

  • Fatores humanos: 
A esmagadora maioria das ignições teve origem humana, seja por negligência (queimadas mal controladas, fogueiras, foguetes lançados em festas e romarias, etc.) ou por ação intencional (fogo posto, piromaníacos, incendiários). 

A falta de sensibilização e de fiscalização foram fatores que potenciaram este problema ao longo de décadas.


(vii) A evolução (lenta) da prevenção e do combate

A resposta do Estado, das empresas e da sociedade aos incêndios florestais evoluiu de forma lenta e reativa ao longo do século XX.

Nas primeiras décadas, o combate aos incêndios era rudimentar, dependendo largamente da mobilização de populares, com meios escassos e pouco eficazes. 

A estrutura de bombeiros voluntários, embora fundamental, debatia-se com a falta de formação e de equipamentos adequados para fazer face a grandes incêndios florestais.

A tragédia da Serra de Sintra em 1966 foi um ponto de viragem que expôs as fragilidades do sistema de combate e alertou para  a necessidade de uma estrutura mais bem organizada. 

No entanto, só nas últimas décadas do século se assistiu a uma aposta mais significativa na:

  • profissionalização dos bombeiros;
  • criação de corpos especializados;
  • aquisição de meios terrestres e aéreos mais sofisticados.

As políticas de prevenção também tardaram em ser implementadas de forma eficaz. A aposta centrou-se durante muito tempo no combate, em detrimento de uma gestão florestal integrada que promovesse a descontinuidade dos combustíveis e a criação de mosaicos agrícolas e florestais mais resilientes ao fogo.

Em suma, a história dos incêndios florestais em Portugal no século XX é a crónica de uma paisagem em transformação, marcada por decisões políticas, mudanças sociais profundas e uma crescente vulnerabilidade ao fogo, agravadas pelas alterações climáticas. 

A afirmação de que "sempre houve incêndios" é, portanto, um ponto de partida para a compreensão de um problema complexo e multifacetado que continua a desafiar o país no presente e no futuro imediato. (**)


(Pesquisa: LG | Assistente de IA / ChatGPT, Gemini, Perplexity)

(Revisão / fixação de texto, negritos e itálicos: LG)
________________

Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 30 de agosto de 2025 Guiné 61/74 - P27166: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (9): Secas e fomes levaram ao longo do séc. XX à morte de mais de 100 mil pessoas

terça-feira, 6 de agosto de 2024

Guiné 61/74 - P25811: (De) Caras (216): "Da minha varanda continuo a ver o mundo" - II (e última) Parte (Valdemar Queiroz, DPOC, Rua de Colaride, Agualva-Cacém, Sintra)


Foto nº 11


Foto nº 12



Foto nº 13



Foto nº 14


Foto nº 15


Foto nº 16


Foto nº 17


Foto nº 18


Foto nº 19



Foto nº 20


Foto nº 21

Sintra > Agualva-Cacém > Rua de Colaride > Julho de 2024> "Da minha varanda continuo a ver o mundo"...  São vizinhos do Valdemar que ele conhece e que estima, e que eles também o conhecem e estimam... E nenhum deles é identificável... São fotos tiradas ao longe e de perfil...

Mas podemos comentar: 
  • De como o telemóvel se tornou o novo grande órgão do corpo humano no séc. XXI... 
  • Ou de como estam0s todos a ficar autistas sociais... 
  • Ou de como a Rua de Coloride está mais bonita... e colorida;
  • Ou de com0 esta é a varanda do afeto contra a solidão...

Leitor: complementa a(s) legenda(s)... Mesmo que a imagem possa valer mais do que mil palavras...


Fotos (e legenda): © Valdemar Queiroz (2024). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Valdemar Queiroz: (i) minhoto de Afife, Viana do Castelo, por criação, lisboeta por eleição (ou necessidade, teve que se fazer à estrada e ir ganhar a vida, começando a trabalhar na idade da puberdade); 

(ii) ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70 (aqui por obrigação, em foto, tirada em Contuboel, 1969): 


(iv) estivemos juntos no CIM de Contuboel de 2 de junho a 18 de julho de 1969; 

(v) ele foi um dos instrutores da recruta das 100 praças do recrutamento local, que fomos receber para fazer a guerra, a CCAÇ 2590, futura CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, junho de 1969 / março de 1971);  
(vi)  tem mais de 180 referências no nosso blogue, de que é um leitor e comentador assíduo; 

(vii) é portador de uma DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica), 
que o impede saír à rua...



1. Mais umas "fotos" tiradas pelo telemóvel do Valdemar Queiroz, o mais famoso (e bem humorado e resiliente e apaixonado pela vida) fotógrafo da Rua de Colaride, Agualva-Cacém, Sintra...

(...) "Eu, agarrado a oxigénio, cá estou na minha varanda a ver passar a nova vizinhança de cabo- verdianos e guineenses e um ou outro dos antigos vizinhos já muito raros. Anexo umas fotos tiradas da varanda e ver os vizinhos passar." (*) (...)

 
Lembremos o que aqui escreveu, há um ano atrás, o Valdemar, a respeito do "bairro" ou "urbanização" onde mora desde o início dos anos 70 (**):

(...) Vi nascer toda a urbanização da zona do prédio da minha casa. Passaram 50 anos, os casadinhos de fresco inauguraram os prédios da urbanização e com o andar dos anos os filhos foram crescendo e arranjaram outros locais para morar.

Os mais velhos, como eu, alguns ficaram, mas a maioria também saiu para outros lados. Agora, há cerca de 6-7 anos, os prédios começaram a ser habitados por outra gente, na maioria famílias de cabo-verdianos, mas também guineenses e angolanos.

E, agora, na rua só se vê gente de origem africana, talvez os de cá, já poucos, prefiram sair só de carro.

Eu, com o tempo mais quente, vou para a varanda e vejo passar gente que me faz lembrar a Guiné e sempre vou tirando umas chapas apanhando pessoas descontraídas." (...)

(...) Os arruamentos, zonas verdes e prédios têm um bom aspecto devido tratar-se de propriedade horizontal a grande maioria e como tal havido uma boa conservação.

Os prédios nasceram em 1972/73, no caminho de uma vacaria e moinhos de vento, ainda quase todos para alugar, a receber casados de fresco vindos de Lisboa, com a estação dos comboios a 10 minutos, e a meia hora do Rossio.

Levou alguns anos a ficar tudo arranjadinho como agora se vê, e os novos habitantes, principalmente as mulheres, fazem grande motivo de vaidade por viver no 2.º andar, que até dá para estender a roupa a secar. E até me dizem 'o vizinho está melhor?' (...)


Valdemar Queiroz


2. O poste anterior teve já cerca de um quarteirão de comentários (*)... Selecionámos alguns:


(i) Eduardo Estrela (Cacela):


Obrigado, Valdemar,  pela partilha das fotos do mundo que a tua Rua de Colaride encerra. Daqui de Cacela vai um abraço fraterno acompanhado com uma malga de verde tinto. A imaginação e o querer fazem milagres e este brinde ninguém nos tira.

4 de agosto de 2024 às 09:20



(ii) João Crisóstomo (Nova Iorque):


"A imaginação e o querer fazem milagres e este brinde ninguém nos tira." diz e bem o Eduardo Estrela.

Há indivíduos que, mesmo no meio de grandes adversidades, qual ouro purificado no cadinho, nos espantam pela força da sua coragem que a todos serve de motivação e inspiração. Tu és um destes gigantes, um poderoso farol num mar imenso a espalhar luz a navegantes perdidos que têm a sorte de estarem dentro do teu radar.

É reconfortante verificar a admiração de todos, eu, o Luis Graça, o Eduardo... todos aqueles a quem os teus comentários, as tuas fotos, a tua vida impressionam de tal maneira que quase sentimos inveja pelas qualidades sobre-humanas de que dás provas cada dia.

Se um dia eu puder não deixarei de voltar à tua rua; e se um abraço real não for possível, quero pelo menos mesmo à distancia"beber" ( como ainda recenrenmente o papa Francisco dizia) da tua força e do teu legado.


Por este teu exemplo te estamos incomensuravelmente gratos.

4 de agosto de 2024 às 11:17


(iii) Antº Rosinha:

Aquelas plantas de jardim, quase parecem cajueiros. Tudo muito parecido com Bissau, para não esquecer o antigamente. Boa saúde.

4 de agosto de 2024 às 11:35


(iv) Carlos Vinhal:


O nosso mundo pode ser tão grande quanto a nossa imaginação permita.
Caro Valdemar, não podes ir ao mundo, vem o mundo até ti.
Continuação de boa disposição e a melhor saúde possível.
Um abraço do meio minhoto Carlos Vinhal

4 de agosto de 2024 às 11:5


(v) António José Pereira da Costa


Força, Valdemar! Tás a fotografar umas coisas em grande!

4 de agosto de 2024 às 13:42


(vi) Manuel Luís Lomba:

Aceita as minhas felicitações: não só superas a tua debilidade física, como demonstras a sua resiliência psíquica, à combatente: ainda vês o mundo e... ainda atentas nos seres humanos "de anca larga" - Eça de Queiroz dixit - e nas suas curvaturas anatómicas.

Obrigado pelo teu exemplo. Aquele abraço e sombra e frescura.

4 de agosto de 2024 às 13:57


(vii) Virgínio Briote:

Caro Valdemar!

Passei por aqui para te dar um abraço. Quando vi Afife, veio-me logo à lembrança Viana, Caminha, a magnífica Cerveira, Valença... que terras e que gentes, meu Deus!

Abraço e desejos de ver novas da tua rua.

4 de agosto de 2024 às 14:36

(viii) Abílio Duarte:


Espero que estejas bem, dentro do possível.

Eu quando falo com a família e amigos, sobre os meus tempos de exilio na Guiné, recordo somente os bons momentos que passamos. Principalmente Contuboel... a instrução aos fulas, as idas ao banho no Geba, os nossos almoços no Transmontano em Bafatá, e em Sonaco, os nossos mergulhos na piscina da dita. A nossa amizade, já ultrapassou mais de 5 décadas, e cá vamos andando.

4 de agosto de 2024 às 15:13

(ix) Fernando Ribeiro:

O nosso amigo Valdemar é como o poilão, que em Angola é chamado mafumeira. Suporta os mais violentos temporais, raios e coriscos, furacões e chuvas diluvianas, e mesmo assim permanece sempre de pé. Tal como o poilão, o Valdemar pode ficar com cicatrizes, como a sua horrível DPOC, mas enfrenta as adversidades com uma invejável disposição. Que nunca falte a seiva ao Valdemar.

4 de agosto de 2024 às 15:41


(x) Cherno Baldé (Bissau);

Caro Valdemar Embaló,


Eguê, a minha avó paterna, bem que dizia: "a velhice é uma m...da". Hoje estás confinado à tua janela, roendo lembranças de Gabu e da tua linda e educada lavadeira ou daquele improvável golpe de judó em Canquelifã contra o teu amigo Duarte. A vida sempre nos guarda surpresas, e agora passas o dia a fotografar passantes, sem saber se um deles será ou não originário de Piche ou Guiró-Iero-Bocar.

Vê lá se me envias o teu contacto, que eu recomendo ao meu sobrinho para uma visita surpresa pois Agualva Cacém e toda a linha de Sintra é uma região que já conquistamos aos Mouros do Ribatejo.

4 de agosto de 2024 às 16:32

(xi) Valdemar Queiroz:

Das minhas traseiras, 1º andar, ainda vejo o Palácio da Pena por cima de uns prédios, mas na parte mais alta desta zona, a cerca de cem metros temos uma vista extraordinário sobre todo a baixo Cacém e a Serra de Sintra. Alto de Colaride, mesmo à frente da minha varanda, faz parte do maciço da Serra da Carregueira.

4 de agosto de 2024 às 18:24


(xii) Joaquim Costa:

Tenho andado arredado das redes sociais, mas felizmente ainda vim a tempo de te dar um abraço. Ainda mantenho de pé a promessa de levar a montanha a Maomé! Os meu netos alfacinhas cada vez mais me arrastam para essa cidade grande. A minha casa, agora, é demasiado grande para uma pessoa só.


És uma força da natureza. Um grande abraço deste Minhoto que te estima.


(xiii) Carvalho de Mampatá:


Sou um 'piriquito' à tua beira (de 72/74) mas atrevo-me a falar contigo por esta via, para te dizer, graças ao nosso blog, como admiro a tua força e a força da mensagem que nos deixas. Vivo cá para cima, num recanto ainda rural de Gondomar, longe desse mundo da periferia de Lisboa cada vez mais rico na diversidade cultural que eu muito aprecio e que tu nos dás o prazer de registar com primor.

Um grande abraço com votos de que melhores dessa aborrecida DPOC.


4 de agosto de 2024 às 20:05

(xiv) Hélder Sousa:


Também, se me permites, aqui deixo um pequeno comentário, na senda do muito que se encontra nos antecedentes.

É de louvar a tua persistência em não te deixares dominar pelas dificuldades e conseguires encontrar motivos de ocupação, física e principalmente mental. É assim mesmo que se devem encarar e enfrentar as adversidades, pois só assim elas ficam reduzidas a uma menor dimensão.


Observar a "fauna humana" que circula pelas tuas redondezas (e também a flora...), acompanhado por raciocínios mais ou menos especulativos sobre os seus destinos, as suas vivências, anseios, dificuldades, etc. é um exercício que manterá os teu neurónios em funcionamento e não te deixarão "afundar".


Continua assim. É bom para ti e também para nós que sempre podemos usufruir dos teus comentários, da tua perspicácia e, porque não, da tua resposta pronta para "enquadramentos menos sérios",

4 de agosto de 2024 às 23:07


(xv) Paulo Santiago:


Grande resiliente. Abraço forte

5 de agosto de 2024 às 01:10


(xvi) Francisco Baptista:


Que a medicina te ajude e que continues a ter essa a resistência e vontade de viver que continuas a demonstrar. Bem sei que as tuas limitações são muitas mas tu tens inteligência e sabedoria para viveres com o pouco que a vida te proporciona.


5 de agosto de 2024 às 10:29


(Seleção, edição de fotos, revisão / fixação de texto: LG)

sábado, 29 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25701: Os nossos seres, saberes e lazeres (634): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (159): Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve Paço Real, estamos perto da Venda Seca - 2 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Março de 2024:

Queridos amigos,
Para falar francamente, não voltei a Belas só à cata dos fofos, a especialidade doceira da terra; depois da minha querida irmã ter sido vitimada por um AVC e viver num lar, procurava proporcionar-lhe passeios nas proximidades de Lisboa que lhe dessem satisfação, ela fora sempre uma andarilha, visitava amigas, adorava comboios e autocarros, o importante era sair de manhã e regressar a casa à noite. Já combalida, o cerimonial começava nos fofos de Belas com um galão, lá íamos de braço dado até à Quinta da Senhora da Assunção, havendo de bom tempo percorríamos lentamente o jardim. Em sua homenagem, da doce lembrança que dela guardo, por aqui andei em itinerância e do muito que gostei de ver achei que não era despiciendo partilhar convosco.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (159):
Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve paço real, estamos perto da Venda Seca – 2


Mário Beja Santos

Já aqui se referiu que a vila de Belas foi realenga, possuiu nos seus arredores importantes vestígios do passado romano e árabe, foi sede de concelho e este faz parte da União das Freguesias de Queluz e Belas, o seu interior possuiu um eixo diário com um tráfego intenso, andar pelos estreitos passeios requer extrema cautela. Quando se fala em vila realenga, os fundamentos são sólidos. Respigo de um artigo que encontrei na net o seguinte, tem a ver com uma notícia publicada em 23 de setembro de 1728 na Gazeta de Lisboa: "A Rainha Nossa Senhora, foi ontem a Belas com a Senhora Infanta D. Francisca ver o Senhor Infante D. Carlos". Tratava-se da Rainha D. Maria Ana de Áustria, mulher de D. João V. O infante D. Carlos, seu filho, encontrava-se doente e procurava alívio, no ambiente saudável de Belas. Faleceu em 1730, com 14 anos. O infante D. Manuel de Portugal, irmão de D. João V, nascido em 1696, viveu alguns anos em Belas onde faleceu em 1766, reinando D. José I, que o visitava com regularidade. Foi cabeça de Marquesado e Condado, adstritos aos Senhores de Pombeiro e Castelo Branco. D. Manuel I, aquando Duque de Beja, doou os rendimentos da igreja de Belas às freiras do convento daquela povoação.
É neste espaço cheio de história que se vai dar uma passeata.

Igreja Matriz de Belas, mais um templo religioso que conheceu transformações umas atrás das outras, do período manuelino resta a sua porta principal
Interior da Igreja Matriz de Belas, de uma só nave
Moradia a carecer de obras, mas guarda uma certa imponência que convinha que não se perdesse na requalificação. Eram assim as casas de férias ou de habitação permanente em tempos que já lá vão, quando a cidade ainda parecia longe, a região era considerada de ar puro e Sintra não está longe.
Em contraste, numa das artérias de maior trânsito em Belas, vemos como se reconstrói mantendo o traçado genuíno de muitas décadas atrás, virando à direita, como parece ser a direção daquele carro, pode-se caminhar para a Venda Seca ou para a Rinchoa. Fico especado a pensar que a Rinchoa tem uma bela casa-museu, a de Leal da Câmara, onde me apetece voltar.
Esta é uma das entradas da Quinta do Senhora da Serra, construção heterogénea, mas cheia de pergaminhos, é uma propriedade que remonta à fundação da nacionalidade, há ali marcas do gótico e arcarias ogivais, aí pelo século XIV, a Quinta, que também foi designada por Paço Real, era usada pela família real. As obras e transformações sucederam-se, desde o reinado de D. Manuel até ao século XVIII, os jardins aprimoraram-se. A Quinta é hoje propriedade particular, uma prestigiada agência imobiliária mostra um pequeno filme para quem quiser comprar estes muito hectares e a construção histórica.
Pormenores do interior da Quinta do Senhor da Serra, imagens retiradas do site promocional da Porta da Frente, a propriedade está à venda por 14 milhões
Um pormenor do muro que fala dos tempos muito idos
Outro pormenor da Quinta do Senhora da Serra, o casarão ao fundo é também de tempos muito idos
Um pormenor do muro da Quinta, possui um património florestal valioso, custa ver como todo este magnífico espaço sofre da poluição sonora do corrupio do trânsito, a CREL está lá ao fundo, todas estas vias que acedem ao interior do termo de Sintra são fustigadas por viaturas de toda a espécies, andar nas ruas estreitas de Belas não é convite para ninguém. Mas já estamos habituados a tudo, veja-se o que se passa com um troço importante do Palácio de Queluz, com o IC 19 à porta.
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Notas do editor:

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Último post da série de 20 DE JUNHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25663: Os nossos seres, saberes e lazeres (633): viagem à China, de 1 a 12 de setembro próximo, com um cicerone de luxo, o nosso camarada António Graça de Abreu

sábado, 15 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25642: Os nossos seres, saberes e lazeres (632): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (158): Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve Paço Real, estamos perto da Venda Seca - 1 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Março de 2024:

Queridos amigos,
Houve inicialmente o intento de visitar a Casa Museu Leal da Câmara, na Rinchoa, o apetite por uma doçaria foi mais forte, avançou-se para um estabelecimento onde se vendem os fofos de Belas, é uma sensação estranhíssima andar por aquelas ruas estreitas, não é só a barulheira da CREL, o trânsito não dá tréguas, percorrem-se os passeios sempre a olhar para a rua, mais não seja para não levar com um espelho retrovisor no ombro. Satisfeita a guloseima, voltou-se à Quinta Nova da Assunção, visitada anos atrás, estava então de cara lavada, um miminho de cores, um recanto romântico seguramente idealizado por um comerciante com posses que partiu para as estrelas antes de ver tudo de pé e bem ajardinado; o jardim é um bálsamo, deve faltar dinheiro ou patrocínios para continuar os trabalhos de renovação e até de manutenção, aquela azulejaria que adorna os bancos de pedra corre riscos graves de perda irremediável. Há muito a visitar em Belas e nas redondezas, muita gente vinha fazer férias daqui até onde hoje fica Mira-Sintra, restam casas restauradas e outras na agonia. Belas teve marquesado, por aqui andou gente das famílias reais, resta a Quinta do Senhor da Serra, também conhecido por Paço Real, pelo que foi dado pesquisar na net aqui se celebram casamentos e batizados e eventos que tais.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (158):
Na vila realenga de Belas, no termo de Sintra, já houve paço real, estamos perto da Venda Seca – 1


Mário Beja Santos

Há uma doçaria que faz muita gente viajar até Belas, que já foi concelho, que tem importantes ruínas pré-históricas e até romanas nas redondezas; povoação onde assentou alguma aristocracia, a residência dos marqueses de Belas, aqui conhecida por Paço Real ou Quinta do Senhor da Serra, esta é belíssima com os seus plátanos, teixos e buxos dentro de um enorme muro, num contraste brutal com a barulheira que vem da CREL, contudo Belas é irresistível para itinerâncias. Primeiro, ali no centro da vila, uma doçaria aprazível e com um descomunal tráfego incessante mesmo à porta, ali se manjam os fofos e se pode adquirir demais doçaria para pequenos-almoços, almoços, lanches e jantares. Depois, segue-se, sempre a fugir do ruidoso trânsito, desde autocarros a motocicletas, para a Quinta Nova da Assunção, um interessantíssimo projeto de um comerciante endinheirado que aqui construiu casa apalaçada, habitações para trabalhadores quinteiros e visitas e esplêndidos jardins, isto no século XIX. No gradeamento pode ler-se: “A Quinta Nova da Assunção foi mandada edificar por José Maria da Silva Rego, nos terrenos herdados do seu tio Gregório da Silva Rego (comerciante que fez fortuna no Brasil). A sua mulher (está lá escrito esposa, linguagem de mestre de obras, sempre se falou em mulher e marido), Maria da Assunção Vieira, deu nome à quinta inaugurada em 15 de agosto de 1863, dia da celebração da Nossa Senhora da Assunção. José Maria da Silva Rego viria a morrer um ano depois, antes do término das obras. Trata-se de um conjunto arquitetónico que compreende um palacete residencial, uma casa de fresco, lagos, fontes e estruturas de apoio ao enorme jardim. Em toda a propriedade tentou-se criar um ambiente eclético de harmonização entre o neoclassicismo e o romantismo. Esta simbiose é evidente sobretudo no excesso decorativo do interior do palacete, onde as pinturas a fresco, os estuques e a azulejaria preenchem os espaços com motivos zoomórficos-vegetalistas, exotismos orientalistas, temáticas pompeianas e mitológicas, bem assim como as iniciais do proprietário.”

A Quinta Nova da Assunção tem esta fonte decorativa restaurada, temos um envolvimento de lugares sentados com azulejaria primorosa, como se pretende mostrar. O jardim tem manutenção, é um encanto passear por ali, não se dirão mesmo da conservação da casa apalaçada no seu exterior e começa a haver deterioração nestes belos azulejos, fica sempre o mistério se se trata de ladroagem ou é mesmo falta de manutenção, o tempo é inclemente, responda quem souber.
Para quem gosta de estudar movimentos artísticos, o que aqui se vê é uma etapa do naturalismo, ainda não se chegou à Arte Nova, as molduras são tipicamente clássicas, já começam a desaparecer azulejos.
Um tema recorrente na época é a chinesice, a atração pelo exótico oriental, no caminhar para o fim do século ao chinesismo juntar-se-á o japonesismo, uma das linhas da Arte Nova, figurará nas artes decorativas até ao anúncio da Arte Deco, aí pelo ano 1925
O mínimo que se pode dizer é que estes assentos de pedra tão bem decorados mereciam melhor sorte, não conheço uma gama de azulejos tão enternecedores como estes neste termo de Sintra.
Haverá um dia em que este edifício com pretensões neogóticas será recuperado, talvez equipado, polo de atração, sabe-se lá se residência para artistas ou até mesmo casa-museu, custa a entender como se restaurou a casa apalaçada e se esqueceu esta dependência.
Há alguns anos, quando visitei pela primeira vez a quinta, a casa estava de cara lavada, disse-me quem a guardava que era alugada para séries televisivas, consta que tem salas maravilhosamente decoradas, o comerciante não se poupou ao trabalho de apresentar a mansão à altura dos seus proventos. O senhor que está por detrás desta porta disse gentilmente pode olhar, mas não passa daí. Não perco a esperança de lá voltar e conhecer os tesouros ali existentes.
Atendendo a que se estava no inverno, bem surpreendido fiquei com esta floração quando tudo mais está adormecido.
Foi para mim uma surpresa ver esta alameda tão bem adornada, uns belos bancos, funcionais, bem mantidos. Caminhei nos dois sentidos, mas confesso que foram estas as duas perspetivas que mais me tocaram.
Esta é a fachada principal, o senhor José Maria da Silva Rego deve ter exigido alguma imponência no traçado da casa, é bem curioso ver como tem os fundamentos deste plano inclinado, casa apalaçada de um só andar, assente numa sólida plataforma e o arquiteto encontrou solução de pôr esta escadaria com alguma nobreza. Vista a Quinta Nova da Assunção, vai-se agora cirandar por Belas, que tem muito mais coisas por ver.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 8 DE JUNHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25620: Os nossos seres, saberes e lazeres (631): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (157): Em Tavira, a Vila a Dentro, em profundo derriço com as suas imponentes muralhas (Mário Beja Santos)