Foto do artista quando jovem. Fonte: Página oficial do Facebook de MarcoPaulo, com a devida vénia. |
1. Morreu hoje, aos 79 anos, o popular cançonetista (e apresentador de televisão) Marco Paulo (1945-2024), depois de um longa e corajosa luta contra o cancro.
Não é habitual pronunciarmo-nos aqui sobre a atualidade noticiosa, seja social, desportiva, política, etc. Somos um simples blogue de antigos combatentes da Guiné. Morrem todos os dias poetas, escritores, artistas, músicos, cientistas, investigadores, médicos, enfermeiros, políticos, gestores, empresários, militares, desportistas, etc., gente de maior ou menor talento, mais conhecida ou menos conhecida, etc.. Mas todos, eles, portugueses, homens e mulheres, merecedores de um simples ou mais elaborado RIP (Requiescant in Pace).
Não somos um jornal noticioso, e a dar notícias necrológicas temos que nos cingir aos amigos e camaradas da Guiné que animam (ou animaram em tempos) este blogue.
(...) "É com profunda tristeza que a família informa o falecimento de Marco Paulo, que partiu pacificamente, hoje, dia 24 na companhia dos seus entes queridos. Aos 79 anos terminou a sua batalha contra o cancro, em paz e rodeado de todos os cuidados e o amor da família, amigos e fãs.
"Hoje, despedimo-nos do homem lutador, sorridente e generoso, que ao longo de 58 anos marcou gerações e milhares de pessoas, tornando-se um nome incontornável da música portuguesa.
"A sua voz inconfundível e o seu talento permanecerão para sempre na memória daqueles que o acompanharam ao longo dos anos.
(i) esteve na tropa em Beja, Leiria e Estremoz: "tive muito más notas na recruta, sempre fui mau aluno, distraía-me tanto a cantar, já na tropa era a mesma coisa, estava na tropa e distraía-me muito, estava sempre a cantar";
(ii) quanto à experiência na Guiné, "não foi traumatizante para mim, porque nunca cheguei a estar no mato, fiquei sempre na cidade"; esteva na Amura, "no escritório a tratar de papéis"; "cantava nos aniversários dos meus camaradas, de qualquer festa, convidavam-me"; era reconhecido como figura pública: "já tinha discos, já passava na rádio, já era o Marco Paulo, já não era o João Simão”.
(ix) em 1967 participou no Festival RTP da Canção (canção "Sou Tão Feliz" de António Sousa Freitas e Nóbrega e Sousa);
(...) Dezembro 1968 . Tinha vindo a Bissau ao hospital fazer uma desintoxicação de Gandembel.
Fiquei urso, mas os rapazes até tinham razão e lá abotoámos os botões. Chegados aos Correios, no meio da barafunda total, estava um esganiçado e aperaltado 1º cabo, com a camisa desabotoada até ao umbigo.
Depois do que me acontecera pouco antes, aquela situação caía como sopa no mel... Afiando as garras, tivemos este diálogo:
– Ó nosso cabo, ouça lá!
– Ó nosso cabo não, meu Alferes, sou o Marco Paulo... (Desconhecia em absoluto quem era semelhante personalidade.)
– Marco Paulo, uma merda, ou abotoa esses botões todos ou temos chatice! – respondi eu.
Claro que o obriguei a estar em sentido até acabar o castigo e comecei a aperceber-me duns sorrisos à socapa dos camaradas que estavam por ali….
Satisfeito com a minha façanha do dia, viemos para fora e só então fiquei a saber que tive muita sorte por ele não ter dito nada…..senão ainda levava uma porrada e era enviado pra Gandembel, aliás para onde regressei passados 2 ou 3 dias depois.
Ao longo dos anos ainda sorrio quando me lembro desta estória …de Natal. (...)
Aceitei o convite e o Alfaro foi-me apresentar aos donos do 'Nazareno'. Ali fiz muitas noites de sábado, tendo como companhia alguns amigos leceiros [. de Leça da Palmeira...], que me iam ajudar a passar o tempo.
"Bairro Alto com seus amores tão dedicado
Quis um dia dar nas vistas
E saiu com os trovadores mais o fado
P'ra fazer suas conquistas." (...)
– Recordo-me de ter pedido a todos os santos para não ir, acima de tudo porque eu sabia que se fosse para a Guiné possivelmente quando regressasse já não podia dar seguimento à minha carreira.
– Chegou a sentir medo?
– Quando cheguei à Guiné não foi fácil. Pensei: “Olha, vou para o mato. Levo lá um tiro na cabeça e pronto!”...
– Compreendeu, à época, as motivações daquela guerra?
– Eu não estava por dentro dos assuntos da política. Disseram-me que Guiné era Portugal e eu acreditei. Hoje, olhando para trás, vejo que foram dois anos perdidos. (...)
(...) " LO: Voltando um pouco atrás. Onde cumpriu o serviço militar?
MP: Na Guiné. Quando fui para a guerra, já tinha gravado dois ou três discos, discos sem grandes sucesso mas que passavam na rádio e que já vendiam alguma coisa.
LO: Recorda o dia em que partiu para a guerra?
MP: Muito bem. No fundo, não sabia para onde ia. Foram dias muito inquietantes, mas por sorte acabei por ir parar a Bissau. Os meus pais choraram quando se despediram de mim, choraram tanto como eu.
LO: O estatuto de cantor beneficiou-o de alguma forma durante a Guerra Colonial?
MP: De forma nenhuma. Por sorte, não estive nos sítios onde se vivia a guerra, limitei-me a estar numa zona mais resguardada. Fui obrigado a ir. Estava numa secção de escritório a fazer cartas, para mim foram quase umas férias.
(...) "Findo este trabalho, o capitão deu folga a todo o pessoal para conhecer a cidade. Logo na primeira noite, juntei-me a um pequeno grupo para irmos dar uma volta, para conhecermos um pouco da noite guineense.
Nota de L.G:
Último poste da série > 19 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26059: In Memoriam (514): José Luiz Gomes Soares Fonseca (1949 - †2024), ex-Fur Mil TRMS da CCAV 3366 / BCAB 3846 (Susana e Varela, 1971/73)