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sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25112: Notas de leitura (1661): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (9) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Janeiro de 2024:

Queridos amigos,
Aqui se refere a crescente importância do apoio internacional ao PAIGC, nesta fase eram os países comunistas os grandes doadores, tanto de armamento, como militares e pessoal de saúde, o apoio escandinavo virá mais tarde; a chegada de sistemas de defesa antiaérea trouxe sérios desafios à FAP, e mais inquietante quando esse sistema foi posicionado na margem sul do Geba, na região de Gã Formoso; daí o relato da importante Operação Barracuda, com um dispositivo de aeronaves como nunca se vira, sincronizados os ataques aéreos com os paraquedistas no solo, os objetivos foram totalmente alcançados, capturou-se uma metralhadora e voar perto de Bissalanca deixou de ter perigos, e certamente que a Operação Barracuda afetou temporariamente o moral dos guerrilheiros do PAIGC na região Sul - afinal a defesa antiaérea era altamente vulnerável.

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (9)


Mário Beja Santos

Deste segundo volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados na sua aquisição: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/.

Capítulo 3: “Eram eles ou nós”

O Governador e Comandante-chefe Arnaldo Schulz estava gradualmente a ser confrontado com maiores meios do PAIGC, decorrentes do apoio internacional que os sucessos da luta armada ajudavam a granjear. Primeiro, logo nos primeiros meses da luta, preparação militar na China, depois armas ligeiras e granadas, depois minas antipessoal, morteiros e bazucas, depois minas anticarro, e dentro deste encadeamento chegou-se ao sistema antiaéreo; além de terem aparecido os cubanos, outras nações do Bloco Leste forneceram armas, conhecimentos táticos e técnicos e armamento mais sofisticado – foi o caso da URSS, da China, RDA, Checoslováquia, Roménia, Bulgária, Coreia do Norte e Vietname do Norte. Em 1965, a URSS até mandou construir um centro de treino em Perevalnoe, na península da Crimeia, especificamente para membros do PAIGC e outros movimentos de libertação africanos, a instrução militar centrava-se no manejo de artilharia, minas e explosivos, mas também armas de defesa aérea, especialmente aquelas que estavam projetadas para atingir alvos voando baixo. Nessa altura, a OUA (Organização de Unidade Africana) já tinha decidido canalizar todo o seu apoio ao PAIGC e o Senegal, sob pressão da OUA, abriu o seu território às bases do PAIGC e rotas de abastecimento, em 1966.

A chegada de novos equipamentos e a aquisição de novas competências exigiu ao PAIGC mudanças organizacionais – e o seu corpo antiaéreo não foi exceção. Como resumiu Amílcar Cabral em abril de 1966, “Durante muito tempo lutámos contra aviões inimigos apenas com armas ligeiras, mas estamos progressivamente a equipar as nossas unidades e bases militares com armas adequadas para o combate antiaéreo e formámos combatentes especializados em lidar com essas armas.”

Em meados de 1966, os aviadores portugueses começaram a informar os comandos de que havia uma mudança de qualidade na guerrilha, tinham aparecido sistemas de defesa antiaérea, “armas dispersas aleatoriamente, envoltas em vegetação”. Em contraste, em 1967, as posições da defesa aérea de guerrilheiros adquiriram um ar mais robustecido e convencional, com armas de maior calibre implantadas em espaldões em espiral (revestimentos de terra), implantados em áreas relativamente abertas. Esta forma de atuar permitia aos guerrilheiros alguma proteção contra explosões e estilhaços, dando ao mesmo tempo aos artilheiros do PAIGC a oportunidade de concentrar rapidamente fogo em qualquer direção; em contrapartida limitavam a sua mobilidade, tornavam as suas posições muito mais fáceis de detetar. Esta transição decorria do objetivo político de reforçar as posições do PAIGC nas chamadas zonas libertadas, caso do Como e do Quitafine.

Impunha-se uma resposta da FAP. Os aviadores portugueses desenvolveram rapidamente métodos eficazes para se confrontar com essas novas armas. O ataque ideal começou com um mergulho de 45 a 60 graus a partir de 8 mil pés, então o piloto libertava 50 kg ou 200 kg de bombas de fragmentação a aproximadamente 4 mil pés, e mergulhava para se afastar. Quando transportavam napalm, os Fiat lançavam de 100 pés, estes eram ataques que surgiam a partir da direção do Sol com o intuito de atrasar a deteção visual e minimizar o fogo (ataques idealmente praticados por volta das 9h30 ou 15h00). Mas a qualquer hora do dia este sistema embrionário aéreo beneficiava do aviso prévio do ataque, havia um grande interesse da guerrilha nas operações aéreas a partir da base de Bissalanca, o seu sistema de informações procurava recolher dados que contribuíssem para que os artilheiros estivessem sobre o aviso. E ficou comprovado que estes sistemas de defesa antiaérea abriam fogo imediatamente após o início do ataque aéreo, apesar dos esforços da FAP para obter surpresa total.

O novo arsenal de aeronaves e armas da FAP foi colocado pela primeira vez à prova na região de Quínara. Um pouco depois do novo comandante da Zona Aérea, Coronel Costa Cesário, ter chegado em janeiro de 1967, estava comprovada uma atividade intensificada do PAIGC no Quínara – diretamente do outro lado do rio Geba, em frente a Bissau, e foi esse elemento que trouxe preocupação em Bissalanca. Por exemplo, um par de Fiat onde voavam o Tenente-coronel Damásio e o Tenente Egídio Lopes foi surpreendido por fogo antiaéreo num banco a Sul do Geba, isto na aproximação inicial para Bissalanca. Para eliminar esta ameaça às aeronaves que voavam perto da sua base principal, a Zona Aérea concebeu a Operação Barracuda, um dia de ofensiva aérea e de paraquedistas em fevereiro de 1967. A ordem de missão dada ao grupo operacional 1201 foi: neutralizar a ameaça antiaérea na região do Quínara; preparar um ataque terrestre a Gã Formoso; transportar paraquedistas de helicóptero para a área de operações, em conjunto com desembarques navais quase em simultâneo; interditar movimentos do inimigo em zona de ação; e fornecer logística e apoio de fogo. Uma ordem de operações suplementar orientava os paraquedistas, quando saltassem para o solo a procurar os objetivos atribuídos para desmantelamento na zona de Gã Formoso. O BCP 12 também foi especificamente encarregue de descobrir e apreender pelo menos uma das áreas antiaéreas mais valiosas do PAIGC – um feito ainda sem precedentes para as armas portuguesas na Guiné.

A Operação Barracuda começou pelas 6 horas do dia 4 de fevereiro. 25 aeronaves (6 Fiat, 11 T-6, 7 Alouette III e 1 DO-27 configurado para PCV) partiram de Bissalanca, com intervalos mínimos de descolagem, para aumentar a probabilidade de surpresa. Tendo atravessado o Geba, os Fiat descarregaram as suas bombas de 50 kg em duas posições antiaéreas na região de Gã Formoso, silenciando uma delas; seguidamente, os T-6 atingiram alvos adjacentes na floresta com bombas de 15 e 50 kg, foguetes de 37 mm e tiros de metralhadora. Pelas 6h20, o primeiro pelotão de paraquedistas saltou em terra de 6 Alouette III, vinham acompanhados de um helicanhão, uma segunda leva pousou às 6h30; entretanto, outros paraquedistas chegaram a bordo de lanchas, em Ganduá Porto, na margem sul do Geba, apoiados por 2 T-6 e um helicanhão. Pelas 9 horas, os grupos de paraquedistas uniram-se e iniciaram a sua limpeza pela floresta de Gã Formoso, pondo em debandada os guerrilheiros. Tendo alcançado os seus objetivos terrestres em capturar uma metralhadora antiaérea DShK de 12,7 mm, que era o objetivo fundamental da operação, os paraquedistas retiraram-se para Ganduá Porto sob a proteção de 2 T-6 e 1 helicanhão e um DO-27 armado com foguete. Uma análise posterior veio a descrever a Operação Barracuda como uma operação perfeitamente executada e sem baixas, nenhuma aeronave foi atingida e apreendera-se uma arma antiaérea. E também se entendia que a operação quebrara o prestígio e a arrogância do inimigo na área. As perdas de guerrilheiros não foram espetaculares, mas ficava a nu a vulnerabilidade destas armas, e restaurava-se a total liberdade de ação da força aérea em Gã Formoso. Sabia-se que se tratava de resultados transitórios, que tinham sido utilizados praticamente todas as aeronaves à sua disposição, gastaram-se 4200 kg de bombas, mas também muitos foguetes, projéteis de canhão e cartuchos. A Operação Barracuda demonstrou também o valor da fotografia de baixa altitude graças às missões de reconhecimento realizadas pelos Fiat, que revelaram informações detalhadas sobre a localização e disposição no terreno das posições antiaéreas do PAIGC.

Ação da Operação Barracuda (Matthew M. Hurley)
Posições de metralhadoras DShK próxima de um aldeamento, imagem tirada durante a Operação Barracuda (Arquivo da Defesa Nacional)
Operações helitransportadas entre maio e dezembro de 1967 (Matthew M. Hurley)
Um Alouette III numa operação contra o PAIGC (Coleção Serrano Rosa)

(continua)

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Nota do editor

Post anterior de 19 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25088: Notas de leitura (1659): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (8) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 22 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25100: Notas de leitura (1660): "Os três rostos da Igreja Católica na Guiné" (1) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24987: Notas de leitura (1651): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (4) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Dezembro de 2023:

Queridos amigos,
Os autores descrevem a viragem introduzida pelo Fiat e pelo Alouette III sobretudo na vida operacional. O texto é minucioso sobre a natureza dos armamentos usados e das alterações registadas em 1966 na reorganização de Bissalanca, relevam igualmente o acréscimo trazido ao poder operacional pelas forças paraquedistas que irão em 1970 conhecer modificações, quando o BCP12 se transformou na CCP121, 122 e 123. O poder bélico intensificou-se mas concomitantemente cresceu a área de intervenção do PAIGC, operando densamente no Sul, no Corubal, no Boé, na região do Morés, fortalecendo-se nas regiões transfronteiriças do Senegal e Guiné-Conacri. Mas em 1966, ainda havia a esperança no comando-chefe que as novas potencialidades de meios aéreos iriam desencadear o recuo do PAIGC, o que de modo algum aconteceu.

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (4)


Mário Beja Santos

Deste segundo volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados na sua aquisição: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/.

Capítulo 1: Um Comando “Desconfortável”

Como se fez referência no texto anterior, o equipamento aéreo da Guiné vai conhecer em 1966 uma alteração de tomo: chegou um caça que se irá tornar temível e prontamente colaborantes nas atividades operacionais e de bombardeamento, o Fiat, e o helicóptero Alouette III, de maior capacidade que o seu antecessor, que se irá revelar altamente prestante na atividade operacional, na evacuação de feridos e nos mais diferentes tipos de transporte.

Oficiais portugueses observadores das operações argelinas, durante o final da década de 1950, depuseram que “a utilização de helicópteros no caso particular da guerra subversiva, oferece excecionais possibilidades. Isto era especialmente verdade nas operações de assalto, ofereciam às tropas francesas surpresa e superioridade e mobilidade no combate face a um adversário que operava num terreno praticamente inacessível.”

Todos estes depoimentos motivaram o General Venâncio Deslandes, do Secretariado-Geral para a Defesa Nacional a recomendar o emprego de helicópteros nas forças de intervenção, logo em 1963. Como se referiu anteriormente, o Alouette III só apareceu em novembro de 1965, chegaram a Bissalanca seis de uma encomenda de 21 helicópteros. Foi momento afortunado, concomitantemente chegaram os G.91 e entraram também ao serviço. Como observou o historiador militar Luís Alves Fraga, a conjugação destes dois meios aéreos garantia precisão quando havia limitações de tempo, ganhava-se no efeito surpresa, bombardeava-se por um lado e os helicópteros depositavam ou recolhiam as tropas envolvidas na operação. Com um alto grau de sincronização, o desembarque de forças operacionais era precedido pro um ataque de Fiat e/ou T-6, de maneira que a última bomba a cair no solo explodia imediatamente antes do primeiro homem saltar do helicóptero, era assim que se procurava manter o inimigo paralisado e garantir a proteção à força atacante.

Muitas vezes era indispensável uma proteção adicional. Os helicópteros eram alvos tentadores para o fogo dos guerrilheiros, especialmente durante o pouso e desembarque, era um momento de maior vulnerabilidade para as nossas forças operacionais, como lembrou o general aposentado António Bispo, lembrando que em 30 de março de 1966, um helicóptero fora imobilizado pelo fogo inimigo durante a Operação Narceja. A Zona Aérea procurou os meios de conjugar vigilância e apoio de fogo durante as operações aerotransportadas. Inicialmente, militares armados com espingardas de caça foram colocados a bordo de alguns helicópteros para fazer fogo supressivo. Nenhum expediente se mostrou suficientemente dissuasor, houve testes iniciais com a metralhadora MG-42 montada em tripé, rapidamente se abandonou o seu uso pelo difícil manuseio da arma e pela trajetória irregular do fogo; montou-se depois uma Browining M3 na porta lateral do Alouette III, mostrou-se inconveniente devido ao tamanho da arma, ao seu peso e às vibrações durante os disparos. Encontrou-se finalmente uma resposta instalando um canhão montado num sistema giratório na porta do helicóptero. Em 1965-1966, a FAP testou o canhão Matra MG-151 20mm no campo de tiro de Alcochete, os resultados foram satisfatórios e em dezembro de 1966 chegaram a Bissalanca os primeiros canhões MG-151. O emparelhamento destas armas com o Alouette III resultou no helicanhão, conhecido na gíria como lobo mau. Alimentado por dois cintos de munição de 200 cartuchos e disparando munições altamente explosivas ou incendiárias em grande quantidade por minuto, revelou-se “uma arma de extraordinária eficácia”, como contou o veterano da Guiné, General José Brochado de Miranda. Embora os canhões e a suas munições reduzissem a quantidade de carga do Alouette III, o emprego do helicanhão revelou-se determinante nas fases mais delicadas de operações de assalto com helicópteros.

A crescente frota de helicópteros Alouette III também passou a realizar as missões de apoio anteriormente operadas pelo Alouette II: transporte, observação e evacuação de feridos. “Milhares de vidas foram salvas pelos esforços abnegados de centenas de pilotos e tripulantes, com risco de vida e muitas vezes sob fogo inimigo, tudo para salvar a vida dos outros. Na Zona Aérea, os Alouette III transportaram mais de mil vítimas em missões de evacuação em 1967 e 1968, o que representou 37% de todas as evacuações realizadas neste período, aliviando os DO-27. Apenas o Alouette III poderias resgatar o pessoal ferido em zonas de combate em áreas inacessíveis. A integração dos Alouette III e dos G.21 coincidiu com mudanças organizacionais importantes na Base Aérea 12, a principal instalação da FAP na Guiné e sede da Zona Aérea. Anteriormente conhecida como Aeródromo-Base 2, a expansão contínua que vinha ocorrendo desde 1961 resultou na redesignação de Bissalanca como principal base nacional em maio de 1965. A Esquadra Operacional também teve um crescimento significativo tornando-se no Grupo Operacional 1201 composto por três esquadras: Esquadra 121, responsável pelo ataque, apoio de fogo, comando e controlo aerotransportado, eram os Fiats (os Tigres), os T-6 (Roncos) e DO-27 (Cafeteiras); Esquadra 122, incorporando todos os helicópteros, tanto os desarmados (os Canibais) como os apetrechados com canhões (Lobo Mau); a Esquadra 123, destinado ao transporte aéreo, observação e ligação com a legenda “Tudo Alcança”, composto por Dakotas".

Os Fiat e os Alouette III eram informalmente agrupados em esquadras de intervenção que se ativavam para apoiar operações aerotransportadas, que começaram a aumentar em frequência a partir de 1966. Para equipar adequadamente estas operações aerotransportadas, a FAP enviou paraquedistas adicionais. Em 1963 havia um único pelotão de paraquedistas, esse número foi crescendo nos anos subsequentes, primeiro uma companhia, depois um batalhão. Em 20 de outubro de 1966 foi criado o Batalhão de Caçadores Paraquedistas 12 e em julho de 1970 este batalhão passou a ter três Companhias de Caçadores Paraquedistas; CCP 121, 122 e 123. O helicóptero continua a ser o “principal veículo de ataque principal”. Deu-se outra mudança na aviação militar portuguesa na Guiné: a fusão dos Comandos da Zona Aérea e da Base Aérea 12 em Bissalanca, que anteriormente tinha dois oficiais distintos, o que se revelou suscetível de atritos. O Coronel Abecasis criticou especialmente “a incompetência dos sucessivos comandantes da Zona sem qualquer serviço anterior no voo, esquadrão ou ao nível de operações”, que inevitavelmente tentaram esconder a sua competência intrometendo-se constantemente nos assuntos da unidade, coisa que devia ficar ao cuidado dos seus subordinados. “Vítimas de uma mistura de vaidade e rancor” concluiu ele, tais comandantes “foram a origem do mal-estar e dos problemas supérfluos”. Após a redesignação de Bissalanca como Base Aérea 12, as funções da Zona Aérea combinaram-se com o Comando da Base, e Abecasis assumiu o Comando em junho de 1965.
Fiat da Esquadra 121, maio de 1966 (Arquivo Histórica da Força Aérea)
Raio de ação do G.91 (Matthew Hurley, baseado no Secretariado-Geral da Defesa Nacional), novembro de 1967
O número de operações do G.91 esteve restringido devido a numerosas questões técnicas e logísticas durante os primeiros cinco meses de serviço na Guiné (Arquivo Histórico da Força Aérea)
O Fiat e o diferente tipo de munições que podia utilizar (Coleção Egílio Lopes)
Material de combate usado pelo G.91 (Matthew Hurley, baseado no “Relatório da missão à Alemanha relativa ao Projeto Feierbend”, março de 1966)

(continua)
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Notas do editor:

Poste anterior de 15 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24960: Notas de leitura (1649): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 18 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24971: Notas de leitura (1650): "Comandante Pedro Pires, Memórias da luta anticolonial em Guiné-Bissau e da construção da República de Cabo Verde - Entrevista a Celso Castro, Thais Blank e Diana Sichel"; FGV Editora, Brasil, 2021 (2) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Guiné 61/74 - P24618: Notas de leitura (1612): Guiné, Operação Irã (maio de 1965) e Operação Hermínia (março de 1966), no fascículo 2 de "As Grandes Operações da Guerra Colonial", textos de Manuel Catarino; edição Presselivre, Imprensa Livre S.A. (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Outubro de 2021:

Queridos amigos,
É meritório, há que o reconhecer, a divulgação em fascículos, com acesso ao grande público, e numa linguagem acessível, de acontecimentos relevantes como foram grandes operações da guerra colonial. Quando me atirei à tarefa de estudar com um pouco de minúcia os acontecimentos que antecederam a chamada luta armada e depois a luta armada propriamente dita, entre 1963 e 1965, isto num projeto editorial que teve como base a história do BCAV  490 feita por um poeta popular, e assim chegámos os dois à feitura do livro "Nunca Digas Adeus às Armas", Húmus Edições, 2020, detetei que a generalidade da historiografia sobre a guerra da Guiné passa como gato pelas brasas pelos aspetos fulcrais tanto da atividade operacional desenvolvida no período como no contexto dessa luta armada, os dois comandantes-chefes, e nomeadamente Arnaldo Schulz, lançaram as bases da ação psicológica, da formação de milícias e companhias de Caçadores, projetos de desenvolvimento e algo mais que merecia o respeito e consideração por quem estuda a guerra.

Mas o mantra é muito superior à realidade e quem escreve que a guerra se agravou entre 1963 e 1968 e mais adiante dirá que a partir de 1970 a guerra nunca mais deixou de se agravar não dá pelas injustiças que profere, uma delas até é cometida com tiros no pé, como esta "Operação Irã", de maio de 1965, e esta "Operação Hermínia", de março de 1966, que desdizem cabalmente de que não se respondia taco a taco, enfrentando o inimigo. Bem curiosamente, há agora quem escreva que mesmo no período da governação Spínola a tropa dos aquartelamentos limitava-se a andar ali à volta, quem verdadeiramente tinha atividade operacional eram as tropas especiais, outro mantra, falando por mim, não me ofende quem quer, na chamada zona libertada do Cuor eu percorria quatro quintos a qualquer hora do dia e se a mais não me afoitava era por não dispor de recursos, com aquelas operações de tabancas em autodefesa fui sendo sangrado de várias secções de pelotões de milícia, em vão protestei. Mas isso é uma história que a historiografia nem se preocupa em estudar, a precariedade dos meios.

Um abraço do
Mário



Guiné, Operação Irã (maio de 1965) e Operação Hermínia (março de 1966)

Mário Beja Santos

A série "As Grandes Operações da Guerra Colonial", surgida na década de 2010, vendia-se nas papelarias e quiosques sob a forma de fascículos, os textos pertencem a Manuel Catarino, edição Presselivre, Imprensa Livre S.A. Este fascículo 2 é uma reedição, é uma miscelânea onde para além destas duas operações a que nos iremos referir juntar-se-ão outras informações, acrescendo a descrição da Operação Tridente, acontecimentos que envolveram paraquedistas em Guilege ou que viveram dificuldades no decurso de uma operação em Cassebeche. O valor do texto é muito discutível. Dizer que a Operação Irã é uma investida das tropas portuguesas no Morés onde nunca elas se tinham aventurado é desconhecer inteiramente de operações no Morés em 1963 e 1964. Sim, o Morés era uma região de mata densa, aí se sediavam pequenas bases móveis, improvisadas infraestruturas, importantes depósitos de material. E o texto lança logo o mantra de que tudo foi agravamento do conflito desde janeiro de 1963 até 1968, é o velho e estafado refrão de que os Altos Comandos anteriores a Spínola andaram aos bonés e revelaram-se incapazes de travar a progressão da guerrilha.

Quem lê a resenha das campanhas de África, no que tange à Guiné, e é este período, ficará seguramente atónito com o texto das diretivas de comando e as ordens de batalha dos dois comandantes-chefes anteriores a Spínola, e sobretudo ao conjunto de operações efetuadas, ao seu desenlace, e à sinceridade posta nos quadros de situação, é uma linguagem que não deixa margem a equívocos de que era inteiramente possível fazer melhor com os meios disponíveis. O autor dá uma no cravo e outra na ferradura, sempre que pode deslustra quer Louro de Sousa quer Schulz e chega a dizer enormidades como:
“Schulz era um militar clássico e, como seria de esperar, respondeu classicamente à manobra do PAIGC”. O que desdiz completamente o que Schulz escreveu para os chefes de Estado-Maior General das Forças Armadas, o mesmo é dizer que chegou ao conhecimento do governo. Louro de Sousa apanhou a fase da implantação do PAIGC, tinha efetivos humildes, o sistema de informações era mais do que precário, a operação de investida no Sul tinha sido estrategicamente calculada, revelou-se fulminante, passou-se para o outro lado do Corubal, foi-se consolidando na região do Morés. Havia que prontamente responder apoiando as populações que se revelavam afetas à soberania portuguesa e à atividade operacional que foi contínua, apareceram as milícias, as tabancas em autodefesa, as tropas especiais.

A Operação Irã ocorreu em maio de 1965, foi um golpe de mão à base do PAIGC de Iracunda. Lê-se no relatório: “A CART nº 730 saiu de Bissorã em 2 de maio e no dia seguinte montou uma rede de emboscadas em proteção à CART nº 566 que executou o ataque à base central do Morés. Pelas 5h50 de 3 de maio vinte elementos vindos do Morés caíram na zona de morte, interrogado um prisioneiro deu informações sobre a base de Iracunda para onde a CART n.º 730 logo seguiu. Esta unidade seguiu prontamente para Iracunda e capturaram material, havia aqui uma escola, a CART n.º 730 sofreu duas fortes ações de fogo sem consequências”. Depois o autor escreve outro êxito, o do BCAÇ 2879, em agosto de 1969, segue-se um texto sobre os Diabólicos, o grupo de Comandos que executou a primeira ação helitransportada na Guiné, a Operação Hermínia, que ocorreu em março de 1966. O objetivo era tomar de assalto uma base de guerrilha em Jabadá. Nesta altura havia melhores meios, já tinham chegado os helicópteros Alouette III, já existiam quatro grupos de Comandos, os Diabólicos (comandados pelo alferes Virgínio Briote), os Vampiros (comandados pelo alferes António Pereira Vilaça), os Centuriões (comandados pelo alferes Luís Almeida Rainha) e os Apaches (comandados pelo alferes António Neves da Silva).
Narra o autor que a operação se iniciou à uma da tarde de 6 de março de 1966, seis helicópteros descolaram de Bissalanca em direção ao objetivo, não mais de 20 minutos de voo, a formação de seis helicópteros dividiu-se, três largaram os atacantes nas moranças a norte, enquanto os outros três foram lançados nas moranças mais a Sul. A operação durou cerca de três horas e meia, perdeu a vida o soldado António Alves Maria da Silva. O PAIGC teve baixas, fizeram-se oito prisioneiros, foram destruídos meios de abastecimento. Seguidamente Manuel Catarino descreve o aparecimento dos Comandos na Guiné, dá-nos uma tábua cronológica do país e a guerra do ano 1962, e entra-se na reedição da Operação Tridente, minuciosamente descrita, é mencionada a Operação Grifo, que decorreu em 28 de abril de 1966 e em que foi morto o capitão Tinoco de Faria que ia à frente de um pelotão de paraquedistas que saiu do aquartelamento de Mejo com a missão de montar emboscadas no corredor de Guilege. Haverá depois a descrição da Operação Ciclone II, que aconteceu no dia 25 de fevereiro de 1968, o Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º 12 executou uma ação no Cantanhez.

Em vagas sucessivas de helicópteros, os paraquedistas foram lançados nas bolanhas de Cafal e Cafine, e tomaram de assalto as bases do PAIGC depois de combates encarniçados. Os paraquedistas sofreram cinco feridos, três com gravidade, aniquilaram um bi-grupo e aprisionaram 19 homens. O texto sobre a Operação Ciclone II é igualmente detalhado, segue-se depois um texto sobre Spínola na Guiné, os seus primeiros textos enviados para Lisboa dizendo que as tropas portuguesas estavam à beira da derrota, o autor menciona as alterações estratégicas e termina o texto com uma frase mirabolante, contrariando tudo o que disse anteriormente: “A partir de 1970, a situação militar nunca mais deixou de piorar”.

Voltamos agora a uma área específica, o Quitafine, onde o PAIGC implantara metralhadoras antiaéreas de quatro canos – as ZPU-4. Foi num voo de reconhecimento sobre este ponto do Cantanhez que se descobriu este potencial antiaéreo e logo foi dada a missão ao Batalhão de Caçadores Paraquedistas 12 para destruir o ninho de metralhadoras antiaéreas – a Operação Vulcano. Tudo começou na tarde de 7 de março de 1969, duas companhias de paraquedistas prepararam-se para atacar as posições do PAIGC em Cassebeche. Os grupos do PAIGC deram resistência e forçaram à retirada dos paras, estes tiveram que abandonar o local, depois de combater denodadamente. Mais tarde, a Força Aérea Portuguesa pulverizou estes ninhos de metralhadoras antiaéreas.

No termo deste n.º 2 de "As Grandes Operações da Guerra Colonial", faz-se uma síntese dos acontecimentos da guerra na Guiné, o desempenho de Spínola, é referida a máquina de propaganda que o cercava, fala-se na tentativa de reviravolta logo em 1968, o esforço de Spínola para negociar com Senghor e a recusa de Caetano e o papel desempenhado pelo livro que abalou o regime, "Portugal e o Futuro".

Militares num dos rios da Guiné no decurso de uma operação. Imagem extraída do blogue Capeia Arraiana, com a devida vénia
Lanchas de fiscalização "Daneb" e "Canópus" em proteção ao desembarque na ilha de Como. Imagem do livro AFONSO, Aniceto; GOMES, Carlos de Matos Gomes. Guerra Colonial. Edição: Editorial Notícias, abril de 2000
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Nota do editor

Último post da série de 1 DE SETEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24608: Notas de leitura (1611): "Cabo Verde, Abolição da Escravatura, Subsídios Para o Estudo", por João Lopes Filho; Spleen Edições, 2006 (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P23995: Guidaje, Guileje, Gadamael, maio/junho de 1973: foi há meio século... Alguém ainda se lembra? (15): Humilhados e ofendidos... (Victor Tavares, ex-1º cabo paraquedista, CCP 121 / BCP 12, 1972/74, natural de Águeda)


Victor Tavares

1. O Victor Tavares, natural de Águeda, conterrâmeo e amigo do nosso Paulo Santiago (outro dos nossos "históricos"),  antigo presidente da junta de freguesia de Recardães, sua terra natal, não foi um "tipo qualquer"... Foi um grande combatente e um dos melhores do melhores: ex-1.º cabo paraquedista, da CCP 121 / BCP 12 (Bissalanca, 1972/74),  Tem cerca de meia centena de referências no nosso blogue. Integra a Tabanca Grande desde 6 de outubro de 2006. É, portanto, um dos nossos "veteranos".

Justifica-se, por muitas razões,  a reprodução deste excerto de um poste já muito antigo (*): o Victor dá-nos aqui o retrato do abandono e da humilhação, a que foram sujeitos, em Cacine, os militares que, sob as ordens do comandante do COP 5, major Coutinho e Lima (1945-2022), abandondaram Guileje, em 22 de Maio de 1973, chegando a Gadamael, também fortemente atacada pelo PAIGC, a seguir a Guileje, e salva pelos pára-quedistas e a Marinha -, refugiando-se depois em Cacine. 

A "batalha dos 3 G" foi há 50 anos  (**)... Ainda há gente que se lembra, e participou nos acontecimentos, em Guidaje, em Guileje, em Gadamael... O Vitor Tavares esteve lá,  em todas... Este texto, que voltamos a reproduzir, é também uma forma de ele "fazer a prova de vida"... Andou há tempos atrapalhado com sérios problemas de saúde... Felizmente, superou-os, está melhor, já voltou ao seu Facebook... 

Um abraço fraterno para ele. LG


Gadamel Porto, o outro inferno a sul

por Victor Tavares



Depois de regressada do inferno de Guidaje (***), a Companhia de Caçadores Paraquedista (CCP) 121 encontrava-se estacionada em Bissalanca [Base Aérea n.º 12], gozando um curto período de descanso, após a desgastante acção que tivera no norte da província.

Daí o Comando Chefe entender que os 4 a 5 dias de descanso concedidos já eram demais e ser necessário o reforço das nossas tropas aquarteladas em Gadamael por se encontrarem em grandes dificuldades. Acaba, por isso, por dar ordens para rumarmos a Gadamael, para onde partimos a 12 de Junho de 1973.

Partindo de Bissau em LDG [Lancha de Desembarque Grande] com destino a Cacine, onde chegámos a meio da tarde deste mesmo dia. Como a lancha que nos transportava, não conseguia atracar ao cais por falta de fundo, fomos fazendo o transbordo por várias vezes em LDM [Lanchas de Desembarque Médias] para aquela localidade.

Foi então, logo na primeira abordagem da lancha, que me apercebi que na mesma estava um indivíduo que pela cara me pareceu familiar. No entanto, como o mesmo se encontrava vestido à civil,  calções, camisa aos quadradinhos toda colorida e sandálias de plástico transparente - pensei ser porventura algum civil que andaria por ali no meio da tropa, o que seria natural e podia eu estar errado.

Depois de toda a tropa estar desembarcada, indicaram-nos o local onde iríamos ficar, num terreno frente ao quartel de Cacine. Instalámo-nos e de seguida fomos dar uma volta pelas redondezas, até que no regresso deparo com a mesma criatura, sentada no cais com ar triste e pensativo, típico da pessoa a quem a vida não corre bem. 

Eu vinha acompanhado do paraquedista Vela, meu conterrâneo – e hoje meu compadre. Perguntei-lhe:

Ouve lá, aquele tipo ali não é nosso conterrâneo?

Responde ele:

− Sei lá, pá, isto é só homens.

 "Gadamael ?!... Vocês vão lá morrer todos!"

Por ali estivemos na conversa mais algum tempo, até que tomei a iniciativa de me dirigir ao fulano uma vez que ele continuava no mesmo sítio. Acercando-me dele, perguntei-lhe:

  
 Diz-me lá, camarada, por acaso tu não és de Águeda ?

Responde-me ele:

 −  Sou.
E pergunta-me de seguida:

 E, você, não é de Recardães?

Digo-lhe que sim, cumprimentamo-nos e vai daí perguntei-lhe o que é que ele estava ali a fazer, porque de militar não tinha nada. Respondeu-me que não sabia o que estava ali a fazer, de uma forma triste e ao mesmo tempo em tom desesperado e desanimado.

Entretanto com o desenrolar da conversa, ele perguntou o que estávamos ali a fazer, eu respondi que na madrugada seguinte íamos para Gadamael Porto... Qual não é o meu espanto quando ele põe as mãos à cabeça, desesperado e desorientado, e me diz:

− Não vão, porque vocês morrem lá todos!

Tentei acalmá-lo, dizendo-lhe para estar descansado que nada de grave ia acontecer, pedi-lhe para me contar o que se passava, vai daí, começa ele a relatar o que tinha passado em Guileje e Gadamael até chegar a Cacine. Na verdade depois de o ouvir, não me restaram dúvidas que ele tinha mais do que sobejas razões para estar no estado psicológico aterrador em que se encontrava .


Os militares portugueses que abandonaram Guileje, 
foram tratados como desertores e traidores à Pátria

Entretanto, informa-me da sua situação militar daquele momento tal como a de outros camaradas que abandonaram Guileje. Neste grupo estava também outro meu conterrâneo, que o primeiro foi chamar, vindo este a confirmar tudo.

O que mais me chocou foi a forma desumana como estes militares foram tratados, depois da sua chegada a Cacine, sendo considerados como desertores e cobardes, quando, em meu entender, se alguém tinha que assumir a responsabilidade dessa situação, seriam os seus superiores e nunca por nunca os soldados.

Estes homens foram humilhados por muitos dos nossos superiores  
 que eram uns grandes heróis de secretária!  , foram proibidos de entrar no aquartelamento, não lhes davam alimentação, o que comiam era nas Tabancas junto com a população. 

As primeiras refeições quentes que já há longos dias não tomavam, foram feitas por estes dois homens juntamente com os paraquedistas, porque o solicitei junto do meu Comandante de Companhia, capitão paraquedista Almeida Martins – hoje tenente general na reserva   ao qual apresentei os dois camaradas do exército que lhe contaram tudo por que passaram.


Os dois desgraçados de Guileje eram meu conterrâneos: 
o Carlos e o Victor Correia

Solicitei ao meu comandante para eles fazerem as refeições junto com o nosso pessoal, prontificando-me eu a pagar as suas diárias, se fosse necessário. Ele autorizou os mesmos a fazerem as refeições connosco enquanto não tivessem a sua situação resolvida e a nossa cozinha que dava apoio ao bigrupo que estava de reserva, ali se mantivesse.

O meu comandante expôs o problema destes homens ao comandante do aquartelamento do exército, solicitando que o mesmo fosse resolvido com o máximo de brevidade uma vez que a situação não era nada dignificante para a instituição militar.

É de salientar que estes dois homens já não escreviam aos seus familiares há mais de um mês, porque não tinham nada com que o fazer. Fui eu que lhes dei aerogramas para o fazerem e os obriguei a escrever, porque o seu moral estava de rastos e a vida daqueles militares já não fazia sentido. Dormiam debaixo dos avançados das Tabancas enrolados em mantas de cor verde, não tendo mais nada para vestir a não ser o camuflado.

Estes meus dois conterrâneos que atrás refiro eram o Carlos (que infelizmente já faleceu, natural do lugar de Perrães, Oliveira do Bairro) e o Victor Correia (de Aguada de Baixo, Águeda, e que hoje sofre imenso de stresse pós-traumático de guerra) (****)

[ Selecção / Revisão e fixação de texto / Substítulos / Parênteses retos / Negritos, para efeitos de edição deste poste: LG]
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Notas dos editores:

(*) Vd. postes de:


(**) Ultimo poste da série > 21 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23903: Guidaje, Guileje, Gadamael, maio/junho de 1973: foi há meio século... Alguém ainda se lembra? (14): "Cobarde num dia, herói no outro" (João Seabra, ex-alf mil, CCav 8350, 1972/74)

(***) Vd. postes de:

25 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1212: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (1): A morte do Lourenço, do Victoriano e do Peixoto

9 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1260: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (2): o dia mais triste da minha vida

(****) Estes camaradas devem ter pertencido à CCAV 8350 (ou a subunidades adidas, os "Piratas de Guileje" foram os últimos a deixar Guileje, por ordem do comandante do COP 5, o então major Coutinho e Lima (*****).  

Recorde-se que, de 18 a 22 de Maio de 1973, o aquartelamento de Guileje foi cercado pelas forças do PAIGC (Op Amílcar Cabral), obrigando as NT a abandoná-lo (juntamente com algumas centenas de civis)

(i) 2 grupos de combate da CCAÇ 4743 (unidade de quadrícula de Gadamael) (incluindo o seu comandante); 

(ii) CCAV 8350 (unidade de quadrícula de Guileje) (incluindo o comandate do COP 5, major Coutinho e Lima);

(iii) Pelotão de Artilharia, comandado pelo Al Mil Pinto dos Santos (já falecido); 

(iv) Pel Cav Reconhecimento Fox (reduzido, havendo apenas duas Fox); e

(v) Pelotão de milícias local...

 A Companhia Independente de Cavalaria 8350/72 foi a unidade de quadrícula de Guileje entre outubro de 1972 e maio de 1973. Viu morrer em combate nove dos seus homens, entre algumas dezenas de feridos. Foi seu Comandante o Cap Mil Abel dos Santos Quelhas Quintas,  também ferido.

sábado, 14 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P23982: Blogues da nossa blogosfera (171): Cerca de metade dos nossos "favoritos" de há uns anos atrás já não existem ou mudaram de URL



Guiné >Região do Oio > Morés > Op Jaguar Vermelho > 9/6/1970 >  Criança encontrada pelos "páras" no mato, os quais tomaram conta dela, dando-lhe pão, e uma "kalash" (para a foto). Pela foto devia ter uma idade semelhante ao que a CCAÇ 13 também encontrou noutra ocasião.


Guiné >Região do Oio > Morés > Operação Jaguar Vermelho > 9/6/1970 > Uma escola

Fotos de César Dias ex-furriel do BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71), as quais lhe foram dadas por um furriel dos paraquedistas sediados em Mansabá. Disponíveis em:


Fotos (e legendas): © Carlos Fortunato (2003). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Tínhamos uma lista de cento e poucos blogues e outras páginas na Net  (c. 110) que faziam parte da nossa blogosfera... e constavam / constam da coluna estática do nosso blogue, no lado esquerdo. Há anos que não era atualizada.   

Fomos hoje fazer uma verificação, dos nomes,  de A a C (n=54) , e metade dessas páginas já não existem, foram descontinuadas, mudaram de URL.  É o preço que se paga por uma existência virtual, que é sempre precária, dependente da boa vontade ou dos caprichos dos servidores... 

Os blogues e outras páginas que deixaram de estar "on line" vêm assinalados, em baixo, com um asterico (*). Nalguns casos têm novos endereços. Alguns destes "sítios" poderão ser recuperados através do Arquivo.pt , caso por exemplo da página da CCAÇ 13, Os Leões Negros, que estava alojada no Sapo... (O Serviço de Alojamento Gratuito de Páginas Pessoais do SAPO foi descontinuado em dezembro de 2012.)

Endereço antigo: 
 
http://leoesnegros.com.sapo.pt/index.html

URL recuperada (em 1 de julho de 2011): 

https://arquivo.pt/wayback/20110701044300/http://leoesnegros.com.sapo.pt/index.html


Blogues, páginas do Facebook e outros sítios da nossa Blogosfera (camaradas e amigos da Guiné) 

Variações da Perda (poesia, Companhia das Ilhas, 2020).
Há rios que não desaguam a jusante (romance, Companhia das Ilhas, 2018).
Na luz inclinada (poesia, Companhia das Ilhas, 2014).
Uma paisagem na Web (poesia, & etc, 2013).
Elegias de Cronos (poesia, Artefacto Edições, 2012).
O papel de prata, o reflexo e outros contos pelo meio (Companhia das Ilhas, 2012).
Pedro e Inês. Dolce Stil Nuovo (poesia, Edições Sempre-em-Pé, 2011).
K3 (poema, & etc, 2011).
Uma flor de chuva (poesia, Escola Portuguesa de Moçambique, Maputo, 2011).
Londres (poema, & etc, 2010).
Dispersão – Poesia reunida (Edições Sempre-em-Pé, 2008).

(Era um dos nossos interlocutores privilegiados na Guiné-Bissau ao tempo do Pepito, cofundador e diretor executivo desta ONG; nascido em Bissau, em 1949, morreu em Lisboa, por doença, em 2012: Carlos Schwarz da Silva era engenheiro agrónomo, formado pelo ISA - Instituto Superior de Agronomia, Lisboa; tem 245 referências no nosso blogue).

(Jornalista e viajante, o Jorge Rosmaninho esteve muito  ativo entre 2006 e 2009; perdemos-lhe o rasto)


(Novo endereço: http://www.ajudaamiga.com/)


(Novo endereço: https://fmsoaresbarroso.pt/)


(Tem um novo endereço: https://apoiar-stressdeguerra.com/pt/)

(Tem um novo endereço:  https://ahm-exercito.defesa.gov.pt/)

(Tem um novo endereço: https://ahu.dglab.gov.pt/)


(Novo endereço: 

https://a25abril.pt/



(Ativo desde meados de  2009)


(Ativo desde o início de 2008)

(Ativo desde 2009 a 2016)


(Ativo de 2003 a 2013)

(Tem agora uma página no Facebook: https://www.facebook.com/BoinasVerdesEParaQuedistas/ )

(Um dos blogues mais antigos, e dos mais belos, literariamente falando: ativo de 2003 a 2020; o Manuel Bastos esteve em Moçambique)

(Um dos nossos blogues mais antigos, centrado numa só subunidade)
(Uma unidade madeirense; blogue ativo desde 2009; um dos coeditores é o nosso Carlos Vinhal)

(Ativo desde 2008, continua a ser animado pelo nosso camarada Sousa de Castro)

(Deixou de estar disponível, com pena nossa; um dos "sites" mais antigos, datando de 2003 )

(Lá vai resistindo desde 2009, sob o comando do coimbrão Fernando Barata)

(Ativo desde 2008)

(Ativo desde 2008, sob o comando do Luís Dias)

(Novo endereço: https://www.cd25a.uc.pt/pt )


(Ativo de 2010 a 2012)

(Desde 2008, com o nosso MR, sempre!)

(Tem agora página no Facebook:

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Nota do editor:

Último poste da série> 18 de deembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23890: Blogues da nossa blogosfera (170): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (75): Palavras e poesia

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23919: Facebook... ando (70): A Op Grande Empresa (reocupação do mítico Cantanhez) foi há 50 anos (Victor Tavares, ex-1º cabo ap MG 42, CCP 121/BCP 12, 1972/74)



Guiné > Região de Tombali > Rio Cumbijã > Proximidades de Caboxanque (?) > Op Grande Empresa (que começou em 11 e 12 de dezembro de 1972) LDM > Imagens do 1º cabo apontador de MG 42, Victor Tavares, CCP 121 / BCP 12, 

Foto (e legenda): © Victor  Tavares (2022).Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Escreveu o Victor Tavares, na sua página do Facebook, em 25 de dezembro de 2022, às 22:48:

Faz hoje 50 anos que a CCP 121 e o BCP 12, estavam envolvidos numa das mais arriscadas e perigosas operações executada nos trez Teatros de Operações em Africa... Operação entregue à responsabilidade do Comandante do BCP 12, Tenente Coronel Paraquedista Araujo e Sá, com dois nomes de código: "Grande Empresa", este dado pelo Comandante-Chefe, e "Tigre Perigoso", pelo BCP 12. Reocupação do Cantanhez, onde participaram outras forças do Exército, da Marinha e da Força Aérea. A mesma teve início a 12 de dezembro de 1972... E no dia de Natal comeu-se a primeira refeição quente. O pão foi substituído por bolachas de água e sal... Outros tempos, outras guerras, que alguns poucos recordam.

2. Comentário do editor LG:

Victor, há natais que nunca mais se esquecem. E menos ainda as guerras por onde andámos.  Em março de 2008 tive ocasião de conhecer o que restava do Cantanhez do teu tempo. Um verdadeiro inferno verde. Deslumbrante mas onde havia marcas de guerra. Tudo nos falavava da guerra que por ali passara, há 40 an0s, mesmo no mais recôndito da floresta onde se escondiam os irãs dos nalus... O silêncio da floresta não conseguia abafar os muitos anos de guerra e as bombas que lá foram largadas, incluindo napalm... A Op Grande Empresa foi um duríssimo golpe para o PAIGC e o orgulho de Amílcar Cabral.  Caía por terra o último dos mitos, o dos dois terços de território libertado... É claro que neste tipo de território, de extensa floresta-galeria, cruzada por míríades de cursos de água, não há áreas controladas nem libertadas... Mas a resposta do PAIGC foi a do costume: fugir para se reagrupar... A resistência das suas tropas foi fraca, não foi capaz sequer de defender a sua população... Mas também é verdade que Spínola estava a gastar os seus últimos cartuchos... E um mês depois Amílcar Cabral seria abatido como um cão pelos seus homens...  

E tudo isto, para quê, Victor? Nada disto valeu a pena, incluindo o sacrifício inútil de milhares de jovens combatentes de ambos os lados, das dezenas de milhares de mulheres, crianças e velhos da população civil, afinal as grandes vítimas do conflito... Nada, de resto, que tirasse o sono ao Amílcar Cabral ou ao Spínola ou ao Marcello Caetano...

Entende isto, Victor, como uma "reflexão de paz natalícia", e que não pretende de modo algum pôr em causa a qualidade excecional da tua subunidade (CCP 121) e da sua unidade (BCP 12) nem muito menos o grande combatente, de corpo inteiro, de grande coragem e estofo moral que tu foste. Aproveito também para fazer a "tua prova de vida"...  Quando publicares coisas do teu facebook que interessem também ao blogue, dá uma apitadela!... Um melhor ano de 2023, para ti e toda a família. Luís.
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