sábado, 1 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10747: Blogues da nossa blogosfera (60): Memórias de Outros Tempos - A Estadia no HM 241, no Blogue Coisas da Vida (Jorge Teixeira - Portojo)

1. O nosso camarada Jorge Teixeira (Portojo), (ex-Fur Mil do Pelotão de Canhões S/R 2054, Catió, 1968/70), enviou-nos este seu trabalho publicado no Blogue Coisas da Vida de que é autor e administrador, onde recorda a sua estadia no HM 241 de Bissau:









Memórias de Outros Tempos - A Estadia no HM 241

Faz 43 anos que abandonei o Hospital Militar depois de uma estadia de cerca de 30 dias com guia de marcha para a minha zona de residência, Catió.
Tudo começou meses antes, talvez em Junho, quando os dentes começaram a chatear. Consegui a consulta externa e em finais de Agosto arranjaram-me lugar num DO e lá fui até à cidade do Faz de Conta, que era Bissau.


Dias após consegui a vaga para me serem arrancados dois dentes. Que me deram cabo do juízo antes, durante e após as extrações. Apanhei o jeitinho de trincar os dentes.
Como andava a sentir-me mal do estômago e aproveitando a estadia, pedi uma consulta médica. Não demorou muito tempo a ser atendido pelo Dr. Maximino Cunha (agradeço ao Albino Silva ter-me informado do nome do médico) que era do meu tempo, incorporado no Batalhão de Chaves. Não sei qual era, mas sei que era também o dos meus amigos Cancela e Mano Velho Carvalho. Só há pouco mais de quatro anos conheci estes bronqueiros.
Disse-me o médico para esquecer o estômago e irmos ver os pulmões. Mas isso só com internamento. Imaginem como fiquei.


O internamento demorou muito tempo e então matava-o de qualquer maneira. De manhã ia-me apresentar aos Adidos, passava no Hospital para ver se havia vagas; as refeições e as dormidas eram no Quartel General, numa grande caserna, com beliches duplos, suja que nem pocilga.

 

As tardes eram passadas entre a Piscina do Quartel General ou os cafés da Cidade. Ao domingo eram os jogos de futebol. Para experimentar também fiz um serviço de patrulhamento nocturno com dois soldados, dentro de um Unimog salta-pocinhas, entre os Adidos e o Aeroporto. Quer dizer, a certa altura o condutor estacionou a viatura num local qualquer e ferramos a "galhada" até às 5 da manhã, hora de recolher. Ele é que sabia como era.


Finalmente consegui uma vaga na primeira enfermaria do lado esquerdo, com varanda e tudo.
A próxima consulta foi ainda com o Doutor Maximino - que acabou por ser o meu médico até ao fim - para além dos RX, receitou-me comprimidos e uma injecção diária que era de ir aos arames. O líquido, mais ou menos da cor de jeropiga, quando entrava pareciam vidros. Ainda por cima o bruto do cabo enfermeiro, lá porque era pegador de touros, não fazia carinhos nenhuns. Fiquei com tanta raiva ao homem que só não veio da varanda abaixo porque não tinha cabedal para ele. Consegui ao fim de poucos dias que as injecções fossem substituídas por comprimidos. Passei a tomar 16 diários, aumentados às quintas-feiras com o quinino e as vitaminas.

Ora um internamento requer pijama e chinelos. Como não os tinha, alguém me arranjou, originários provavelmente do caixote do lixo mas lavados, um casaco só com um botão, quase branco. Umas calças quase azul-bebé, sem elástico na cinta, cuja braguilha fechava em parte com um alfinete dama, ou bebé, como cá em cima lhe chamamos. Os chinelos, um de cada cor, eram daqueles que tinham uma borrachinha mais ou menos a meio e o dedão ia para um lado e o resto dos dedos para o outro. Num dos chinelos, de tão coçado, a dita borrachinha só segurava de vez em quando, mas usava sempre um clip de prender papeis.
Li há dias que esses chinelos foram inventados por um brasileiro e se chamam havanezas ou haitianas ou coisa parecida. Para o caso não interessa nada.


Tinha conseguido no dormitório do Q.G. umas feridas na cara que demoraram muito tempo a cicatrizar. Portanto, não fazia a barba o que tornava o meu conjunto visual por demais ridículo, do qual a malta "tainava" forte e feio. Coisa que não me preocupava, diga-se de passagem. Já cá cantavam quase 18 meses.
Na enfermaria foram meus companheiros o Sargento Carvalho das Daimler, também de Catió, mas por pouco tempo; e dois rapazes já em adiantado tempo de comissão. Um tinha sido operado de urgência, não me lembro agora se por doença se por ferimentos. O outro, chegamos à conclusão que já nos conhecíamos telefonicamente por motivos profissionais. Ele trabalhava no Turismo da Nazaré e eu na gráfica que lhes fornecia o material de propaganda. Era fadista amador, mais tarde tornou-se profissional e cheguei a vê-lo actuar na RTP. Foi ele que em Abril do ano seguinte me levou, e às malas, ao barco, no jipe emprestado por um major, pai da sua namorada.

Chegou à enfermaria um novo inquilino, velho conhecido de Catió, o Fidalgo de Montalegre, da CCS do BART 2865. Para arrancar dentes. Era um contador de estórias muito interessante. Recordo uma "a da tentativa de abatimento de um avião planador pelos guardas espanhóis, quando atravessou a fronteira pilotando o dito cujo".
Certo dia fomos visitados pelo Brigadeiro creio que se chamava Nascimento e, se também não estou em erro, era o Cmdt. Militar da Guiné. Depois de uma conversa a saber do estado de saúde da rapaziada, olhou para o Fidalgo que de boca aberta dormia e disse:
- Este sim, está muito mal.

Na realidade o aspecto do Fidalgo era terrível. De manhã tinha tirado mais alguns dentes, estava com a boca desdentada e meio ensanguentada. Dormia, talvez, ainda por causa da anestesia. Mereceu o comentário.


A enfermaria estava localizada num ponto estratégico. Permitia-nos ver o heliporto e a chegada de evacuados. Certo dia lá chegou mais um heli e descarregou um barbudo. Dissemos para nós mais um fuza que se f..d...
Mais tarde viemos a saber que era um cubano mercenário, o Capitão Peralta.
O Hospital ficou cheio de comandos e o homem ficou num quarto com sentinelas à porta. Esta foto correu mundo e já foi identificada. Não me lembro agora se pelo Dinis Dias ou pelo Pinto, que se reconheceu no meio dos dois outros maqueiros.

Durante a estadia, fiz algumas visitas (rondas) nocturnas a enfermarias acompanhado pelo camarada Quintino da CART 2410, que entretanto tinha passado aos auxiliares e começou a peluda mais cedo nos serviços do Hospital. Vi coisas horríveis. Nos africanos a causa maior das doenças eram a blenorreia e impressionava aqueles tamanhões de pénis a desfazerem-se.


Não havia entretenimentos, mas aos domingos deixavam-nos sair. Também a um domingo o Duo Ouro Negro, apenas com as suas violas, foram-nos dar um belo espectáculo.

Voltando às minhas doenças, os pulmões estavam um pouco estragados por uma bronquite crónica e não só por causa do clima. O Dr. Maximino recomendou-me deixar de fumar, ou no pior dos casos fumar charuto. Não havia charutos mas as célebres Timparillos, que passei a fumar. Depois novamente no mato não me estava a ver a andar com a cigarrilha na boca à Fidel, embora as comprasse no Bar de Catió e abusei delas uns bons tempos ainda.
Estava por resolver o caso do meu estômago, que depois de tomar a horrível papa, foi-me diagnosticada uma gastrite aguda.

Quero com isto dizer que passei a dieta. Peixe era a comida e normalmente o Espada. Coisa horrorosa, que trocava com os sulistas amantes de peixe por uma comida decente, embora seja um aforismo dizer comida decente. Mas pouco comia, a não ser o pequeno almoço e o lanche, por causa do pão. No intervalo eram as bolachas que tinha na mesinha de cabeceira. Claro que havia os dias de excepção, quando o prato não-dieta era feijoada. A troca era certa e tanto quanto me lembro não era má e sempre iam umas garfadas com mais prazer.

Havia em frente ao Hospital, mais ou menos, não me lembro bem, um bairro com um restaurante lá no meio que servia bifes (um insulto aos ditos, mas enfim...) e frango de churrasco. Como nos eram proibidas saídas nocturnas e a segurança tinha sido reforçada por causa do Peralta, o Quintino arranjou-nos umas divisas ou galões (?) de alferes e capitão que usávamos para sair disfarçados. Eu, o fadista e o operado passamos a realizar operações nocturnas ao tal restaurante para matar a fome e esquecer os padecimentos. Com direito a continência com grande batimento de pés e arma em sentido do sentinela à porta do hospital.


Descobri que havia uma biblioteca no Hospital. Embora a minha figura continuasse com muito mau aspecto geral, conversava muito com a Bibliotecária, uma senhora ainda jovem esposa de um militar. Descobri a Gabriela, do Jorge Amado e a Selva de Ferreira de Castro. Os dois livros marcaram-me pelas particularidades, de um e outro, muito comuns à Guiné: clima, cultura, geografia, colonialismo. Não me cansei, nem canso, de publicitar estes dois livros. O (A) Gabriela que hoje possuo, deve ser o meu quarto volume, pois os outros sumiram depois de emprestados.
O primeiro que comprei foi em Catió após o meu regresso do Hospital, na Loja de um senhor sírio, cujo nome esqueci, (o querido camarada Condeço chegou a enviar-me fotos nossas em casa dele, mas perdi-as numa das lavagens do PC), e meu fornecedor habitual de livros, discos, gravadores, máquinas fotográficas, recordações. E por lá ficou.


Faria trinta dias de internamento em breve e o médico quis preparar a minha evacuação para a metrópole. Disse-lhe que não queria e me desse alta. No horizonte previa o regresso em Janeiro, no primeiro barco. O último do ano já chegara a Bissau e levaria os mais velhos. Portanto, ficavam como velhinhos os que tinham embarcado em 1 de Maio de 1968, nos quais me incluía. Em Janeiro teríamos 20 meses de comissão. Já há muito que andava com a medalha ao peito. A célebre Barreta, verde e vermelha.
Lembrava-me do meu pessoal de quem estava afastado há 3 meses. Como era o único sargento e responsável pelo pelotão (o Oliveira aos 16 meses foi fazer um curso de artilharia em troca comigo e só o voltei a ver próximo do dia do embarque em Abril) tinha a obrigação de tratar das burocracias. Sempre eram mais de 30 homens e tinha um mês para isso. Os meus palpites não bateram certo, mas isso são outras estórias.
O médico, contrariado, notei, deu-me alta e muitos conselhos. Não me chamou burro mas subentendi. Enfim, médicos...

Aguardei no hospital que houvesse transporte aéreo para Catió, o que aconteceu no dia 4 de Dezembro, dia de Santa Bárbara e da Artilharia. A minha rapaziada recebeu-me com carinho e à espera de matar a sede, que a água da bolanha andava muito salgada.
Mas vamos à vida que o próximo barco é o nosso.


Fui-me informar como andavam as coisas por Catió e cheguei à GMC, Berliet ou lá que era, a viatura que tinha ido meio pelo ar numa mina. Estava à mercê da ferrugem.

Um pequeno convívio com rapaziada da CCS do BART 2865. Furriéis Mecânico, Transmissões e Armamento. Gente muito boa.

Um novo posto de transmissões que o Eduardo Monteiro (Dadinho para os amigos de infância) mandou construir. Naquele quartel já não se capinava.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10735: Blogues da nossa blogosfera (59): Reabertura do Blogue Lapland to Key West da Tabanca da Lapónia (José Belo)

Guiné 63/74 - P10746: Tabanca Grande (369): Mário Ferreira de Oliveira, 1º Cabo Condutor de Máquinas (na situação de reforma), Vedeta de Fiscalização Bellatrix, 1961/63, grã-tabanqueiro nº 589


NRP Sal - Foto enviada pelo nosso camarada Manuel Lema Santos (MLS),  com a seguinte nota datada de 27 de novembro último: "Para que nada falte mesmo ao camarada (Cabo de Manobra) que escreveu o artigo que li, aqui envio o navio-patrulha Sal, P584. Aliás, bela imagem que sugiro ser enviada ao autor do artigo. É uma imagem oficial, cedência da Revista da Armada".


1. Mensagem do nosso novo grã-tabanqueiro, Mário Ferreira de Oliveira, em dia de grande significado histórico e patriótica que hoje comemoramos (e continuaremos a comemorar, com ou sem feriado nacional):

De: Mário Oliveira
Data: 1 de Dezembro de 2012 10:09
Assunto: pedido de adesão á Tabanca Grande

Nhô Luis Graça! Home Grande,
Corpo di bó stá bom?
Bó casa tudo stá bom?
Tabanca Grandi stá bom?
Amim fala mantanhas pra bó e pra bó casa e pra camaradas di Tabanca Grandi.


Isto foi só um pequeno teste ao crioulo, em que, in ilo tempore, dava um jeito, mas agora dou é barraca.

Agradeço a tua rápida resposta e peço desculpa pelo meu atraso em responder, mas acontece que em informática sou um nabo e tive de esperar que o meu filho estivesse disponível para me ensinar a digitalizar e a enviar por email as fotos.

Espero ter aprendido e que este histórico email chegue em boas condições.

Solicito a todos os camaradas do Grande Fórum de Camaradagem que é a Tabanca Grande, que me seja concedida a Subida Honra de ser um de vós. Para o efeito junto as duas fotos da "praxe".

Sou natural de Cantanhede, onde nasci em 13-10-1936, casado com a Maria Fernanda, também de Cantanhede, sou pai de dois filhos, a Margarida, arquiteta, e o Paulo, técnico de eletrónica naval, e  resido em Vale de Milhaços, Seixal.

A minha comissão de serviço na Guiné teve a duração de 28 meses, e foi cumprida em 61/63 na Vedeta de Fiscalização "Bellatrix" onde para além de "pau para toda a obra" fui fogueiro-motorista, eram assim designados naquele tempo os actuais CM [. Cabos de Manobra]..

Quanto à minha expressão "infeliz" capitão G3,  utilizei-a porque o tristemente lendário fuzileiro, conhecido entre outros epítetos nada abonatórios por capitão G3, na Guiné, tendo como pano de fundo operações militares, onde diariamente militares dos três ramos faziam inimagináveis sacrifícios e de armas na mão morriam e matavam, o tal G3 passou-se para o IN, levando com ele conhecimentos e técnicas de combate, que lhe valeram a promoção a oficial e um posto de comando. Mas a infelicidade dele não se ficou por aqui: enviado com outros guerrilheiros para a Argélia, frequentar um curso que daria (se não fosse entretanto caçado) promoção quem sabe a general, teve a infelicidade de ver a carreira interrompida por um golpe de Estado de sinal contrário.

Tempos depois, isto para abreviar o que se sabe, responde em tribunal militar, e cumpriu a pena a que foi condenado. Não deve portanto nada à sociedade. Tem direito à sua privacidade, e fazer da sua vida o que entender. Que na madrugada libertadora que foi o 25 de Abril tenha finalmente encontrado a paz e a felicidade que não teve nos tempos conturbados do fascismo.

Agradeço a foto do NRP Sal, e irei retribuir com uma foto da proa do Sal, rasgando as vagas de uma enorme tempestade no dia 25 de dezembro de 1960, que há Natais inesquecíveis, ai isso há, até para os homens do mar!

Para todos um abraço amigo, do grato
Mário Oliveira

2. Comentário do L.G.:

Mário:
A tua juventude e jovialidade não passam despercebidas, são dignas de registo e de regozijo. O teu pedido de adesão já tinha sido aceite pelo régulo e adjuntos da Tabanca Grande [vd,. poste P10728]. Espero agora que os muitos e dignos representantes, na nossa Tabanca Grande, dos três ramos das forças armadas que bateram com os quatro costados na Guiné, de 1961 a 1974, abram alas e te recebam com ramos de palma em arco, festivamente...

Toma boa nota: és o grã-tabanqueiro (ou membro da Tabanca Grande) nº 589 (*)... Não és o grã-tabanqueiro mais velho, à tua frente e com quase 98 aninhos vai a nossa decana Clara Schwarz...De qualquer modo, rapazes da tua boa colheita de 1936 não temos muitos, e para mais marinheiros, dos bravos, como tu. Felizmente que venceste a barreira da "literacia" informática. com a ajuda do teu filho. Estás de parabéns, guarda esse mail, histórico, para mostrares aos teus filhos, netos e bisnetos.

A honra é toda nossa, a tua presença é também é uma recompensa para aqueles de nós, grã-tabanqueiros, amigos e camaradas da Guiné, que fazemos  todos os dias este blogue, desde 23 de abril de 2004, e que já ultrapassou os 4,3 milhões de visualizações. O mês passado tivemos 116 mil visitas, o que dá uma média diária de 3850... Vê estes números também como uma oportunidade para comunicares com esta vasta comunidade virtual (e real) que vai de Portugal ao Brasil, e de Cabo Verde à Lapónia... A rapaziada está por todo o lado, e ainda mexe como tu as falanges, falanginhas, falangetas, pernas, pernetas, neurónios...

Quanto ao teu crioulo, pá!, bate a bota com a perdigota: só mostra que os anos que constam do teu BI ou CU,  podem ser de calendário (manga de luas, as tuas) mas não são anos  mentais... Neste annus horribilis de 2012 alegra-nos e honra-nos a tua jovial presença sob o nosso mágico, secular, frondoso e fraterno poilão da Tabanca Grande!...

PS - A história do tal capitão G3, o ex-fuzileiro António Tavares Trindade,  já aqui foi evocada pelo nosso camarada Mário Pinto (**).

Por outro lado, saiu há dias um livro autobiográfico do António Tavares Trindade, com o título O homem a quem chamaram G3.

Vd. aqui, no Sítio do Livro, da editora Vírgula, a referência à obra e ao autor (nascido em 1944, em Lisboa).

(**) Vd. poste de 19 de janeiro de 201o > Guiné 63/74 – P5678: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (34): O turra branco "Capitão G3" (Mário G R Pinto)

Guiné 63/74 - P10745: Notas de leitura (434): "Amílcar Cabral Revolutionary leadership and people's war", por Patrick Chabal (1) (Francisco Henriques da Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70), ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999, com data de 28 de Novembro de 2012:

Meus caros amigos,
Junto vos remeto uma recensão crítica dividida em duas partes do livro de Patrick Chabal, intitulado “Amílcar Cabral: revolutionary leadership and people's war”, Cambridge University Press, 1983, reeditado em 2003.
A obra, cujo conteúdo é bem conhecido, é uma das mais conhecidas biografias sobre o fundador do PAIGC, de que faz um retrato tão fiel quanto possível como homem e como líder político, muito embora não apresente grandes novidades.
É claro que o leitor tem de ficar de sobreaviso pois, a meu ver, trata-se do retrato de um marxista heterodoxo e pragmático que, por um lado, não obedece a cartilhas pré-concebidas e, por outro, um cabo-verdiano, de cultura portuguesa que, de algum modo, descobre e desenvolve a sua "africanidade" ao longo da vida, retrato feito por Chabal, cuja formação é igualmente marxista e que não esconde a sua simpatia pelas ideias e "praxis" de Cabral.
O livro assume particularmente importância pois divulga para o mundo de expressão anglófona, ou seja para um universo que não se restringe apenas aos luso-falantes, a figura e obra de Cabral.

Com os meus cordiais cumprimentos
Francisco Henriques da Silva
(ex-alf. mil- de infantaria da C.Caç 2402)


Amílcar Cabral – o líder revolucionário (1/2)

O especialista francês em temas da África lusófona, Patrick Chabal, do King’s College de Londres, publicou uma das biografias mais conhecidas e mais divulgadas de Amílcar Cabral, sobretudo nos meios académicos internacionais. A obra intitula-se “Amílcar Cabral: Revolutionary leadership and people’s war” (Cambridge University Press, Cambridge, 1983). Existe também uma reedição da mesma obra, mais recente, datada de 2003, e beneficiando de uma nova introdução.

Trata-se da biografia política do lendário e carismático fundador do PAIGC que se veio a transformar num dos líderes mais importantes do continente africano, sobretudo pelas suas ideias revolucionárias adaptadas pragmaticamente a um contexto específico de luta armada: a Guiné Portuguesa, depois da sua morte designada por Guiné-Bissau.

Cabral averba duas décadas de vida política activa visando conferir um sentido de unidade aos guineenses e conduzi-los a um êxito militar e político contra o Poder colonial português, cujo desfecho ele, todavia, não chegaria a testemunhar, visto ter sido assassinado meses antes da proclamação unilateral da independência e do posterior reconhecimento formal por Portugal desse acto.

No fundo, como se pode ler no livro de Patrick Chabal, Amílcar Cabral é um marxista convicto, mas heterodoxo, sem ideias ou esquemas mentais pré-concebidos, guiado por um instinto político apurado e em estreita ligação com o sentimento profundo das populações, sobretudo das populações rurais. Como salienta Chabal, estamos perante um pensador que “respeita os direitos humanos e cuja ambição consiste em estabelecer uma estrutura estatal que prosseguirá políticas socialistas sem recurso à opressão política” (v. p. 2). Estamos, pois, perante um revolucionário não espartilhado pelas orientações, chavões e frases feitas vindas de Moscovo ou de Pequim, que patenteava alguma flexibilidade e que analisou, com a devida minúcia, os factores políticos, económicos e sociais de um território como era a Guiné Portuguesa dos meados do século passado. Por outro lado, não só as suas qualidades de liderança política são objectivamente de salientar, mas igualmente os seus atributos de diplomata exímio, o que o tornava uma figura singular no grupo dos não-alinhados.

Em nosso entender, muitas das características descritas são reconhecíveis, outras porém sê-lo-ão menos, mas mister é reconhecer que morreu sem ter concretizado as suas aspirações mais profundas – neste caso concreto, a independência. Por outro lado, Cabral enfermava, a nosso ver, de dois pecados originais, descritos na obra, como pedras angulares do seu pensamento: a inquebrantável unidade Guiné-Cabo Verde e o seu conceito próprio do papel da pequena burguesia na luta revolucionária. O autor limita-se a referir-se, acriticamente, à unidade Guiné-Cabo Verde, dando-a como ponto assente da cartilha cabralina, sem embargo da obra ter sido publicada em 1983, 3 anos após o inevitável divórcio. Por outro lado, o papel da pequena burguesia (colonial, entenda-se) que para Cabral era dilemático - ou traía a causa revolucionária ou suicidava-se como classe - não merece qualquer comentário importante por parte de Patrick Chabal. Finalmente, afigura-se-nos que, logo no primeiro capítulo, ao referir-se ao domínio colonial na Guiné e em Cabo Verde (Colonial rule in Guinea and Cape Verde, pp. 16 a 28) o autor é demasiado sucinto e superficial, e muito embora aluda, não só nesse capítulo, mas ao longo da obra, inúmeras vezes, à colonização epidérmica da Guiné (passe a expressão), ou seja ao facto da Guiné não ser uma colónia na verdadeira acepção do termo, não se detém na análise rigorosa deste conceito, isto é como território que nunca foi verdadeiramente colonizado como tal, como o foram, por exemplo, Angola ou Cabo Verde. Ora este circunstancialismo de facto teve, a nosso ver, consequências muito importantes, não só para a luta armada, mas para a própria formação do Estado. Relativamente à respectiva formação cultural, intelectual e académica, Amílcar Cabral é um cabo-verdiano de cultura portuguesa. Chabal sublinha, a justo título, “o que emerge ...é que Amílcar Cabral era claramente um jovem cabo-verdiano” (p. 33)...”educado em Portugal e totalmente assimilado à história e à cultura portuguesas” (p. 168). O leit-motiv das suas preocupações não estavam, porém, em Portugal e nos problemas do regime de então, mas, sim, na libertação de África. É no decurso da sua estada em Lisboa que Cabral, como sublinha mais uma vez o autor, que “era realmente um cabo-verdiano, passou a considerar-se a si próprio como africano e a olhar para África como o seu lar” (p. 42).

É no seu trabalho no terreno, na Guiné, entenda-se, como engenheiro agrónomo que Cabral adquire conhecimentos sobre a vida no campo e a estrutura sócio-económica rural do país. O marxismo-leninismo passava para um segundo plano porquanto o fundador do PAIGC concentrava-se no conhecimento factual e na experiência concreta da vida no campo. Em 1959, sobretudo após o massacre no Pindjiguiti, compreende que a independência só poderia ser alcançada pela força e que teria de contar com a participação dos camponeses. Em 1962, a liderança do partido chega à conclusão de que a luta armada em larga escala tem de ser desencadeada logo que possível, o que leva o PAIGC à primeira acção de envergadura: a flagelação ao quartel de Tite, no Sul, em 23 de Janeiro de 1963, que assinala o início do conflito. Aliás, Cabral concluiu muito rapidamente que seria um erro crasso pensar que o proletariado urbano em Bissau, Bolama e Bafatá poderia revoltar-se com êxito contra as autoridades coloniais. Assim, a luta só se poderia desenvolver no campo, na mata, no interior do território e, independentemente, das experiências dos países ditos socialistas que indicavam outros caminhos, na Guiné, a opção teria de ser outra.

Todavia, o PAIGC defrontava-se com várias dificuldades: o estabelecimento das bases de retaguarda, o armamento e o apoio material por parte dos países amigos e o facto da maioria dos comandantes serem analfabetos (esta questão assumia uma relevância particular na medida em que a mensagem política a favor da mobilização nacionalista a ser passada para os aldeãos tinha de ser intelegível). As mensagens teriam de ser passadas de tabanca em tabanca, a fim de granjearem a confiança da população e estruturarem o apoio suficiente para dar início à luta armada. Cabral estava ciente da dificuldade desta tarefa, até porque o domínio colonial português foi relativamente inconsequente e sem grande peso para a vida dos camponeses da Guiné, não conduzindo a grandes disparidades regionais ou étnicas. Mais ainda, a “repressão não foi nem severa nem consistente” (cfr. p. 68 e também p. 72).

Uma pequena nota de roda-pé: é curioso notar que Amílcar Cabral não previu, nem terá compreendido muito bem, a adesão maciça dos balantas à causa nacionalista, o que como se sabe, teria consequências de vulto no período pós-independência e que ainda hoje se fazem sentir com acuidade.

(continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 30 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10740: Notas de leitura (433): "Elites Militares e a Guerra de África", por Manuel Godinho Rebocho (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P10744: Memória dos lugares (200): Ponte do Saltinho no Rio Corubal: fotos do álbum do Arlindo Roda (ex-fur mil, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) (Parte II)


Foto nº 211 > O Rio Corubal no seu esplendor, visto da Ponte do Saltinho


Foto nº 209 > Uma das mais belas "piscinas naturais" do mundo...


Foto nº 204 > Luís Graça (de costas) e Tony Levezinho



Foto nº 40 > Fur mil Arlindo Rocha, na margem direita do Corubal, nos rápidos do Saltinho



Foto nº 66 > O Arlindo Roda junto ao monumento da CCAÇ 2406 (1968/70)... Este foto foi tirada em meados de 1970, depois da substituição, em Bambadinca,  do BCAÇ 2852  /1968/70) pelo PART 2917 (1970/72)


Foto nº 201 > A imponente ponte do Saltinha (chamada ponte gen Craveiro Lopes)  vista da margem direita


Foto nº 203 > Ainda e sempre a ponte e o rio, que nos fascinavam...


Foto nº 209 > Um rio (ainda) selvagem... (até quando ?)


Foto nº 205 > Outra perspetiva da ponte...


Uma cena do "paraíso terrestre"... Feliz foto do Albano Costa, o "fotógrafo de Guifões", Saltinho, novembro de 2000


Fotos: © Arlindo Roda (2010) / Blogue Luís Graça & Canaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


A. Segunda e última parte do álbum fotográfico do Arlindo Roda (ex-fur mil, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), seleção de fotos dedicadas ao Rio Corubal e à ponte do Saltinho.(*)

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Nota do editor:

(*) Vd.  último poste da série > 30 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10741: Memória dos lugares (199): Ponte do Saltinho no Rio Corubal: fotos do álbum do Arlindo Roda (ex-fur mil, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) (Parte I)

Guiné 63/74 - P10743: Do Ninho D'Águia até África (31): O Movimento Nacional Feminino em Mansoa (Tony Borié)

1. Trigésimo primeiro episódio, enviado em mensagem do dia 27 de Novembro de 2012, da narrativa "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177.


Do Ninho D'Águia até África (31)

O Movimento Nacional Feminino em Mansoa

Todos sabíamos que era domingo em Mansoa, e ia haver “manga de ronco”, com o rancho um pouco melhorado, para mais trabalho do cabo do rancho, o bom do Arroz com Pão, que logo pela manhã, andava aflito a procurar voluntários para o descasque de batatas em particular, pois tinha havido missa pela manhã, e o padre tinha dito:
- Tenho o orgulho de dizer que está presente entre nós, Sua Excelência, o Senhor Segundo Comandante do Território e a Digníssima Senhora Presidente do Movimento Nacional Feminino, nesta província.

Isso era verdade, alguns militares já tinham reparado nessas personalidades, embora a maioria deles só tivesse olhos para as filhas do Libanês, que “inundavam” toda a igreja com o seu perfume exótico!

À tarde, próximo da igreja, num palanque feito a preceito, foto em baixo, e revestido com folhas de palmeiras e de outras árvores tropicais, onde estavam presentes, estas entidades, o comandante do comando a que o Cifra pertencia, e outros comandantes das forças de intervenção que estavam estacionadas no aquartelamento em Mansoa, mais o Régulo da vila, entre outros.


Desfilaram, primeiro, alguns militares, que foram voluntários, pois nesse momento tinham roupa lavada, onde ia o furriel miliciano, a fumar um cigarro feito à mão, e que, alguns diziam que se queria mostrar às filhas do “Libanês”, também tinham pedido ao Curvas, alto e refilão para desfilar com a sua medalha Cruz de Guerra, ao que ele perguntou se era uma ordem, e dizendo-lhe que não, ele respondeu:
- Só vou no desfile, com a minha medalha Cruz de Guerra, se for com as estrelas de General nos ombros, que é para vos mandar a todos para Portugal e acabar com esta merda de guerra. - Era assim, o homem, rude na linguagem, mas directo.


Em seguida desfilaram os “Homens Grandes”, das aldeias próximas da vila, alguns com cinco e seis mulheres, foto ao lado, com o Cifra, e quando passaram em frente à tribuna, olharam as entidades por segundos, desviando o seu olhar para as referidas mulheres, para que continuassem juntas, querendo mostrar às entidades presentes que as mesmas eram sua propriedade. Depois desfilou um rapaz africano, com um corpo de “campeão de pesos pesados”, foto em cima, quase nu, a soprar num corno, emitindo um ruído que obrigava a tapar os ouvidos, a seguir vem a multidão, que eram os curiosos, como por exemplo o Cifra, o Setúbal e o Curvas, alto e refilão, alguns naturais, uns descalços, e só com um farrapo a tapar-lhe os órgãos genitais, com algumas pulseiras de missanga nos braços e nas pernas, outros com uma vestimenta branca a cobrir-lhe todo o corpo, e com um gorro de lã na cabeça, algumas crianças, também descalças, algumas com o dedo na boca e o ranho no nariz, e mulheres com bebés amarrados com uma fita de pano nas costas. Também desfilaram alguns naturais que ajudavam os militares, servindo de guias tradutores, fotos em baixo, com o Cifra.


O Curvas, alto e refilão, primeiro dizia que queria ser general e mandar tudo para Portugal e acabar com a guerra, e agora não parava de dizer:
- Isto é tudo fachada! Estão aqui muitos guerrilheiros disfarçados, no meio de toda esta gente. Segurem-me, se não ainda vou buscar a G-3!

Todos nós sabíamos que só saíam bazófias da sua boca, mas adiante, vamos continuar, foram buscar o carro da Psico com a sua aparelhagem sonora, houve discurso a preceito, fotografias, e no final distribuição de lembranças, como por exemplo, lâminas para a barba, cigarros, aerogramas, isqueiros, uns santinhos com a imagem de Nossa Senhora de Fátima em cima de uma árvore e os pastorinhos de joelhos, com o terço na mão, muito tristes a olharem para ela, que alguns militares passaram a usar no capacete quando saíam em patrulha, e que o Mister Hóstia, gravura ao lado, se encarregou de distribuir, umas carteiras em plástico, com um buraquinho, para se aplicar um fio, e pendurar ao pescoço, para guardar os documentos de identificação para os naturais, com o escudo de Portugal, onde se lia, a letras douradas, “Território Português - Província da Guiné”.

Quase ao acabar toda esta cerimónia, uma das senhoras presentes, talvez porque o Cifra andasse por ali, talvez informada, ou única e simplesmente se recordasse da cara do Cifra, porque este, antes lhe tinha pedido um isqueiro para o Curvas, alto e refilão, que andava sempre a “pedir lume” a toda a gente, chama-o e entrega-lhe um embrulho com umas centenas de aerogramas, e alguns isqueiros, dizendo-lhe:
- Por favor leva isto, e distribui pelos militares no aquartelamento.

O Cifra, gravura à esquerda, com a ajuda do Setúbal e do Curvas, alto e refilão, trouxe o embrulho para o aquartelamento, e tal como a senhora lhe tinha pedido, começou a distribuir os aerogramas e os isqueiros a outros militares. Correndo o boato, no aquartelamento, que o Cifra tinha aerogramas do Movimento Nacional Feminino para distribuir, foi distribuindo, até não haver mais.

Quando se acabaram, ninguém acreditava que o Cifra não tinha mais, daí começou novamente o boato que o Cifra era o representante do Movimento Nacional Feminino, que tinha muitos aerogramas e isqueiros, mas que não queria distribuí-los.

Teve o comandante que interferir e colocar uma folha oficial, no refeitório, para todos lerem, em abono da verdade, que o Cifra não tinha mais aerogramas nem isqueiros.

Desses aerogramas, que eram de cor amarela, o Cifra não usou nenhum, só começou a usar aerogramas, quando vieram uns novos com uma cor de azul esbatido. Assim como com os isqueiros, pois o Cifra tinha um, que uma madrinha de guerra de Espanha, lhe tinha mandado com o emblema da ONU, que conservou até final da comissão.

Quando alguém interpelava o Cifra, a respeito dos aerogramas, e o Curvas, alto e refilão, estava presente, ele logo dizia:
- Filho da p....! És pobre e mal agradecido, ainda vais levar com este isqueiro no focinho, se voltas a insultar o Cifra!


Ao outro dia, o Cifra passa na altura em que desmanchavam o palanque e vê dezenas de santinhos pelo chão, pois possivelmente os tinham distribuído aos naturais, foto em cima, que não sabiam o que aquilo era, que o Cifra apanhou, juntou e, como se fosse um baralho de cartas, levou para o Mister Hóstia, que emocionado lhe disse:
- Já vejo que te estás a aproximar de Jesus Cristo, pois tanto tu, como o Setúbal e o Curvas, alto e refilão, já não têm alma, andam em pecado mortal há muito tempo!

(Texto, ilustrações e fotos: © Tony Borié (2012). Direitos reservados)  
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Nota de CV:

Vd. os últimos 10 postes da série de:

27 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10578: Do Ninho D'Águia até África (21): O Tabaco, para alguns (Tony Borié)

30 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10594: Do Ninho D'Águia até África (22): Uma história de amor em pleno conflito (Tony Borié)

3 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10611: Do Ninho D'Águia até África (23): O maldito dente (Tony Borié)

6 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10627: Do Ninho D'Águia até África (24): O nosso Cabo Reis (Tony Borié)

10 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10646: Do Ninho D'Águia até África (25): O comboio das seis e meia (Tony Borié)

13 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10661: Do Ninho D'Águia até África (26): Raízes de agricultor (Tony Borié)

17 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10683: Do Ninho D'Águia até África (27): O perfume exótico das filhas do Libanês (Tony Borié)

20 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10699: Do Ninho D'Águia até África (28): A avioneta do correio (Tony Borié)

24 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10716: Do Ninho D'Águia até África (29): Maldita matacanha (Tony Borié)
e
27 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10729: Do Ninho D'Águia até África (30): As lavadeiras (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P10742: Parabéns a você (502): Carlos Schwarz (Pepito), dirigente da ONG AD e Ernestino Caniço, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Rec Daimler 2208 (Guiné, 1969/71)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10725: Parabéns a você (501): Jorge Teixeira, ex-Fur Mil da CART 2412 (Guiné, 1968/70)

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Guiné 63/74 - P10741: Memória dos lugares (199): Ponte do Saltinho no Rio Corubal: fotos do álbum do Arlindo Roda (ex-fur mil, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) (Parte I)


Foto nº 202 - A > Aspeto do tabuleiro da ponte do Saltinho (batisada como ponte gen Craveiro Lopes), com militares da CCAÇ 12 em passeio (possivelmente no final do tempo das chuvas, no 3º ou 4º trimestre de 1969)


Foto nº 202 > Aspecto geral da ponte


Foto nº 5 > Aspeto geral da ponte, vista do lado do aquartelamento do Saltinho... Em primeiro plano, o Humberto Reis e o "Alfredo" (, ambos do 2º Gr Comb da CCAÇ 12, 1969/71... No canto superior esquerdo vêem-se os fios elétricos do sistema de iluminação da ponte


Foto nº 5 - A  > Eu, Luís Graça, de costas..


Foto nº 206 > O Tony Levezinho, ex-fur mil, at inf, 2º Gr Comb, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)


Foto nº 203 > Ponte do Saltinho, vista da margem direita... Em cima dos arcos, pessoal da CCAÇ 12.


Foto nº 19 > Fur mil ati inf Arlindo Roda, 3º Gr Comb, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)... Por detrás do Arlindo, nota-se um poste dos holofotes que iluminavam a ponte (, foto possivelmente tirada já em 1970, na época seca)


Foto nº 45 > Arlindo Roda

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Foto nº 57 > Arlindo Roda, no início da ponte (margem direita)


Foto nº 57 - A > Pormenor da placa, em bronze, evocativa da visita do gen Craveiro Lopes, em 1955, aquando da construção da ponte. Em baixo, na base em cimento, O nº, pintado à mão da CART 1646, que estava no Xitole e devia ter um pelotão destacado na ponte do Saltinho.

Sobre a CART 1646:/BART 1904: (i) mobilizada pelo RAP2, partiu para a Guiné, em 11/1/67, e regressou 31/10/68; (ii) passou por Bissau, Fá Mandinga. Xitole, Fá Mandinga e Bissau; (iii) comandante: cap art Manuel José Meirinhos; (iv) o BART 1904 esteve esteve sediado em Bambadinca, sendo comandado pelo ten cor art Fernando da Silva Branco; restantes unidades de quadrícula: CART 1647 (Bissau, Quinhamel, Bissau, Binar, Bissau); e CART 1648 (Bissau, Nhacra, Binta, Bissau).


Guiné-Bissau > Saltinho > Ponte General Craveiro Lopes > Novembro de 2000 > Lápide, em bronze, evocativa da "visita, durante a construção" do então Chefe do Estado Português, general Francisco Higino Craveiro Lopes, acompanhado do Ministro do Ultramar, Capitão de Mar e Guerra Sarmento Rodrigues, em 8 de Maio de 1955. Era Governador Geral da Província Portuguesa da Guiné (tinha deixado de ser colónia em 1951, tal como os outros territórios ultramarinos...) o Capitão de Fragata Diogo de Melo e Alvim... Craveiro Lopes nasceu em 1894 e morreu 1964. Foi presidente da República entre 1951 e 1958 (substituído então pelo Almirante Américo Tomás). Foto do "turista" Albano Costa, nosso camarada, que lá passou em novembro de 2000.

Foto: © Albano M. Costa (2006). Todos os direitos reservados


Foto nº  198 > Humberto Reis, fur mil op esp, 2º Gr Comb, CCAÇ 12

Guiné > Zona leste > Setor L5 (Galomaro) > Saltinho > Ponte > Pessoal da CCAÇ 12, passeia pela ponte depois de chegada, a "bom porto", de mais uma colunas logística (Bambadinca-Mansambo- Ponte dos Fulas - Xitole - Saltinho)... Passeio descontraído, sem armas... Alguns, inclusive, foram dar um mergulho nas águas límpidas do Rio Corubal...Vê-se que as fotos são de épocas diferentes, ou de estações diferentes, por causa do caudal do rio e das ervas na ponte: fim da época das chuvas (3º ou 4º trimestre de 1969) (5, 202, 203, 2006),  época seca, 1970 (as restantes)...

Fotos: © Arlindo Roda (2010). Todos os direitos reservados


1. Mensagem, de ontem, do Paulo Santiago (*):

Luís:

Boas fotos. Foram tiradas em épocas diferentes. Assim, as 206 e 203,mostram um elevado caudal do rio que submerge a ponte submersível (passe a redundância). Corresponderão a uma data a seguir à época das chuvas.Também as ervas espontâneas,verdes em algumas fotos,secas noutras,denotam diferenças de estação.

A ponte tinha uns holofotes, notam-se na foto nº 19, a meio da viga que liga os dois últimos arcos e na foto nº 5 vê-se à esquerda os fios que alimentavam aquele dispositivo de iluminação.

Faziam-se patrulhamentos na margem esquerda,com frequência até ao rio Mabia, zona onde um Gr Comb comandado pelo Alf Mota, no último dia do Ramadão de 71, deu de caras com um grupo do PAIGC que vinha flagelar o quartel. O Mota ficou gravemente ferido.

Durante a minha permanência no Saltinho,  nunca houve ataques ao quartel,e a última flagelação ocorrera ainda na altura da presença de um pelotão do Xitole (66/67 ???).

Contabane pertencia a Aldeia Formosa, passei por lá uma vez numa operação com uma companhia independente (madeirense ou açoreana) que antecedeu a CCAÇ 18.

Um dia, já com o reordenamento meio construído, chegou uma info A2 (?) prevendo um ataque para essa noite. Não houve ataque, mas os obuses 14 de Aldeia meteram-me em respeito. Ao cair da noite,o meu grupo ocupou a vala do reordenamento e preparou o 82 B 10 [, canhão s/r, russo,]; e preparámo-nos para reagir. Havia uma carta de fogo com pontos a bater pela Artilharia, e o [cap] Clemente [, da CCAÇ 2701,] pediu para esses pontos serem batidos, só que eu não sabia. Aquelas "ameixas" de obus a caírem umas dezenas de metros à nossa frente impressionavam, e houve uns estilhaços (estilhações) que arrancaram chapas das casas já construídas.

Abraço, Paulo


2. Mensagem, de ontem, do António Levezinho

Amigos

Lamento mas não tenho qualquer contributo a dar a propósito daquele local. Afinal, íamos lá sempre num saltinho e com a preocupação da viagem de regresso na mente.

Um abraço,
Tony Levezinho


Guiné > Mapa da província (1961) > Escala 1/500 mil > Pormenor da zona leste (região de Bafatá) > Setores L1 (Bambadinca) e L5 (Galomaro), com os itinerários alternativos para se chegar ao Saltinho, no Rio Corubal: (i) Bambadinca - Mansambo - Xitole - Saltinho; (ii) Bambadinca (ou Bafatá) - Galomaro - Dulombi - Quirafo - Saltinho.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2012)


3. Comentário de L.G.:

No 2º semestre de 1969, para se chegar a qualquer uma das unidades de quadrícula do Setor L1, a sul de Bambadinca (Mansambo, Xitole e Saltinho, embora esta já pertencesse ao sector de Galomaro, o L5) não havia nenhuma alternativa a não a ser a terrestre: a estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole-Saltinho, que terminava justamente na ponte do Saltinho, estando interdita a partir daí. (Tirando o helicóptero, claro...).

A estrada de Bambadinca (ou Bafatá) - Galomaro-Dulombi - Quirafo - Saltinho às vezes também ficava interdita, a partir da Galomaro e/ou Dulombi, devido às chuvas e à acção do PAIGC, pelo que as NT ali colocadas também dependiam do abastecimento feito a partir de Bambadinca (o eixo Xime-Bambadinca-Bafatá  era a grande porta de entrada de toda a zona leste, do Xime até Buruntuma).

A própria estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole estivera interdita entre Novembro de 1968 e Agosto de 1969. O Op Belo Dia, a 4 de Agosto, já aqui sumariamente descrita, destinou-se justamente a reabrir esse troço fundamental para as ligações do comando do Setor L1 com as suas unidades a sul Um mês e tal depois, ainda em época das chuvas, fez-se uma segunda operação para novo reabastecimento, patrulhamento ofensivo e reconhecimento. (**)

Por fim, a 14 de Novembro de 1969, a CCAÇ 12 efectuaria a última coluna logística para Xitole/Saltinho, integrada numa operação. Após o regresso, os Gr Comb das unidades em quadrícula na área, empenhados na segurança da estrada Mansambo-Xitole, executariam um patrulhamento ofensivo entre os Rios Timinco e Buba, não tendo sido detectados quaisquer vestígios IN (Op Corça Encarnada).

A partir dessa data (e até ao final da comissão, em março de 1971, para os quadros metropolitanos da CCAÇ 12), estas colunas de reabastecimento das NT em unidades de quadrícula, aquarteladas em Mansambo, Xitole e Saltinho, tomariam um carácter de quase rotina, passando a realizar-se periodicamente (duas vezes por mês, em média), e com viaturas civis, escoltadas por forças da CCAÇ 12

A segurança ao longo do itinerário, essa, continuava, no entanto, a movimentar seis Gr Comb das unidades em quadrícula de Mansambo, Xitole e Saltinho. Na prática, isto significava que o abastecimento das NT nestas três unidades implicava a mobilização de forças equivalentes a um batalhão (3 companhias). No tempo seco, o inferno, para além das minas, era o pó, o terrível pó que cobria tudo e todos...

O Saltinho, embora passasse a depender operacionalmente do Setor L5 (Galomaro), a partir da data em que as NT evacuaram Quirafo (, julho de 1969,s e não me engano), continuava no entanto ligada ao Setor L1 para efeitos logísticos, uma vez que a estrada Galomaro-Saltinho se mantinha parcialmente interdita desde o início das chuvas devido à actividade do IN na região. (**)

A respeito das "acessibilidades" do setor L5, diz o nosso camarada Luís Dias, ex-alf mil da CCAÇ 3491 (Dlombi, 1971/74)

(...) "O principal itinerário da companhia era a estrada Dulombi-Galomaro/Galomaro-Bafatá ou Bambadinca, em que se transitava com alguma facilidade (terra batida até ao cruzamento para Bafatá ou Bambadinca, porque depois já eram estradas alcatroadas), com excepção da época das chuvas em que a bolanha do Rio Fanharé (entre Dulombi e Galomaro) a tornava de difícil transposição. Os outros itinerários eram as estradas Dulombi-Jifim-Galanjo(A), difícil na época seca e impraticável na época das chuvas e Dulombi-Quirafo que era impraticável na época das chuvas e cheio de capim devido à sua pouca utilização na época seca (nunca foi utilizado após a emboscada efectuada no Quirafo contra elementos da CCAÇ 3490, em Abril de 1972)" (...).
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 29 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10739: Memória dos lugares (198): A ponte do Saltinho e o ninho da metralhadora Breda (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53, 1970/72 / Luís Graça, CCAÇ 12, 1969/71)

(**) Sobre as colunas logísticas até ao Xitole e Saltinho,  vd. postes de:

8 de dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7401: A minha CCAÇ 12 (10): O inferno das colunas logísticas Bambadinca - Mansambo - Xitole - Saltinho, na época das chuvas, 2º semestre de 1969 (Luís Graça)

28 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7354: A minha CCAÇ 12 (9): 18 de Setembro de 1969, uma GMC com 3 toneladas de arroz destruída por mina anticarro (Luís Graça)

7 de setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6948: A minha CCAÇ 12 (6): Agosto de 1969: As desventuras de Malan Mané e de Mamadu Indjai nas matas do Rio Biesse... (Luís Graça)