sábado, 3 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25132: Carta aberta a... (19): Moura Marques, Amigo, Companheiro, Camarada, Irmão de solidariedades (Paulo Salgado, ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721)

Guiné-Bissau > Região do Oio > Olossato > 2006 > Rio Olossato > O Paulo Salgado e o Moura Marques, 35 anos depois...


1. Mensagem do nosso camarada Paulo Salgado (ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), autor dos livros, "Milando ou Andanças por África""Guiné, Crónicas de Guerra e Amor" e "7 Histórias para o Xavier", com data de 1 de Fevereiro de 2024:

Caro Editor, Luís Graça e Caros Coeditores
Permiti-me que vos fale, em breves palavras de um camarada e amigo, amizade construída na guerra e continuada posteriormente – o Moura Marques, que foi cabo do meu pelotão, da CCAV 2721. Faço-o à guisa de carta aberta, que a ele dirijo.

Saudação bloguista
Paulo Salgado



Carta aberta a...

Moura Marques, Amigo, Companheiro, Camarada, Irmão de solidariedades

Devias pertencer ao grupo de autores célebres de cartas, porque elas, por mérito, encerram as tuas considerações, os teus comentários, a audácia em te meteres por leituras verdadeiramente críticas de obras que compras com sacrifício, a ternura e a frontalidade com que falas de assuntos, ora tão íntimos, ora tão objectivos. Se algumas editoras soubessem o que escreves, meu Camarada na Guerra Colonial – Olossato e Nhacra, 1970-1972 – por certo não hesitariam em publicá-las.

Camarada Moura Marques, não sorrias, por força da tua genuína simplicidade! Tenho guardadas as cartas, dezenas, mais de uma centena. Leio-as e releio-as quando me chegam às mãos.
Compras todos os meses, quase invariavelmente, um livro - livros que muitos intelectuais gostariam de ler. É verdade. A minha mulher e eu vimos estantes de tua casa carregadas de obras: de História Universal, de História de Portugal, de biografias, de ensaios. E todas leste. E continuas a ler, apesar de teres necessidade de usar uma lupa…

Fazes os teus comentários nas interessantes cartas que me escreves, e que eu gostaria de escrever. Eu, que sou um escritor.

Estou a falar de ti aos camaradas do nosso Blogue, por seres um grande homem, de carácter, vertical e de uma humanidade enorme. Na guerra e na tua vida profissional e familiar. Sei do que falo. Para além da amizade que fomos fortalecendo ao longo das décadas, sei que viste partir a tua filha, netas e genro para o Brasil. Resistes. Deste, num processo de divórcio amigável, o andar que tinhas adquirido com as tuas economias, à tua ex-mulher, para que, sofrendo ela de grave doença, pudesse subsistir. E sempre resististe. Agora, o senhorio quer despejar-te da casa… como vais resistir?

Lembro-te, companheiro, que demonstraste grande nível de humanismo ao longo da permanência no TO. E eu não resisti a inscrever-te nas crónicas de dois dos meus livros, sob nome diverso. Claro.

Na comemoração do Cinquentenário do 25 de Abril em Torre de Moncorvo (como sabes, foi publicado o programa remetido aos editores do Blogue, foi publicado, de que, com a minha mulher e o Mário Tomé nos orgulhamos de ter proposto à Câmara Municipal), tu, Moura Marques, estiveste presente, vindo de Tires, Cascais, fizeste um esforço enorme, porque algum mal trazes contigo, ainda que não te moleste, tão gravemente, por enquanto, mas que, para muitos, seria impeditivo de estar presente.

Devo lembrar-te um episódio: quando me visitaste em Bissau, a meu convite, 35 anos depois do regresso, éramos a minha mulher e eu cooperantes, fomos os três ao Olossato (já descrevi esta viagem no nosso Blogue). Lá choraste na campa do Suleiman, outro grande homem. Parece que tinhas perdido um irmão.

Olha, meu camarada, irmão de solidariedades, as tuas cartas estão guardadas. Não sei se alguém as vai ler, um dia. Talvez o meu neto Xavier, por te ter conhecido em dois ou três momentos, ou possa ter interesse, eventualmente, quando crescer, em saber algo acerca do avô. E dos amigos do avô.

Olha, vou mandar esta carta para ti. Mas aberta, para que os camaradas fiquem a conhecer um grande homem, militar à força, mas crítico, escrupulosamente crítico. E, desculpa-me repetir a tua frase, que mencionaste há uns tempos: “pensei que ia para a Guerra do Ultramar e acabei por ir para a Guerra Colonial”. Coisas diferentes. Sabemos bem.

Mereces esta modesta homenagem pública.
Até já.

Um abraço do Salgado
31 de Janeiro de 2024.

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Nota do editor

Último post da série de 23 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23809: Carta aberta a... (18): Ministros da Cultura e da Defesa.... Portugal pode e deve recuperar os restos das estátuas, abandonadas no forte do Cacheu, dos nossos Teixeira Pinto (séc. XX), Nuno Tristão (séc. XV) e Diogo Gomes (séc. XV-XVI) (António J. Pereira da Costa, cor art ref / Mário Beja Santos, ex-Alf Mil Inf)

Guiné 61/74 - P25131: Os nossos seres, saberes e lazeres (612): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (140): Férias em região duriense, uma rota de aldeias vinhateiras (9) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Com o passeio num troço do rio Douro, caminhou-se para o término destes dias de deslumbramento em lugares vinhateiros que totalmente desconhecia. O que prende a atenção em primeiro lugar é a afeição no acolhimento dos grupos que chegam, a sentida satisfação em mostrar o património, desde monumentos nacionais a lugares pitorescos, a vislumbres do passado, ver mulheres vindimadeiras a acenar com alegria a nossa passagem; e compreender como aqueles solos xistosos, declivosos, são esmeradamente tratados para dar vinho fino ou licoroso ou de mesa, é a região demarcada mais antiga e é vendo que se percebe porquê; e há os monumentos paisagísticos, inigualáveis que só o Douro dá permissão. Do pouco que vi, fica agora o desejo de alargar as vistas, há aqui uma gente muito gentil que nos toca o coração, não posso pois deixar de recomendar que façam romagem até estas paragens.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (140):
Férias em região duriense, uma rota de aldeias vinhateiras (9)


Mário Beja Santos

Estamos no Pinhão, é dia de passeio de barco pelo rio Douro, o tal rio de quem Miguel Torga proferiu esta sentença: “Nenhum outro caudal nosso tem tais estremecimentos, tais lutas, tão denodado pelejar em todo o curso; nenhuma outra nesga de terra possui mortórios tão vastos, tão estéreis e tão malditos.” Parece blasfémia, é uma observação lúcida à chusma de contradições que o Douro e o seu rio oferecem, a aridez do xisto e de uma terra que parece queimada, rio de sinuosidades que abre inusitadas plataformas coloridas, surpreendentes. Do perto ao longe vemos serras nuas a perder de vista, e dentro da aridez o verde quase todo o ano, dado pelas videiras, terra declivosa e nós a contemplar aquelas titânicas escadarias ou socalcos. Tudo isto é avistado a partir do Pinhão.
Houve que preparar algum conhecimento sobre o Douro e as suas terras, houve que reler de bom grado o Miguel Torga e Araújo Correia, este médico na Régua. Antes de partir para este Douro de aldeias vinhateiras tirei da estante o álbum Os mais belos rios de Portugal, texto de João Conde Veiga e fotografia de Augusto Cabrita, anotei num caderninho algo que me ajudou a fazer a leitura do rio e da paisagem: “O Douro é talvez a região mais trabalheira de Portugal. A terra áspera e íngreme, onde pela disposição nenhum mecanismo agrícola pode ser empregado, é toda laborada a aço e a pulso. O homem duriense, mal descobre na ilharga de um monte dois palmos de terra xistosa, sobranceiro ao rio, que lhe pareça propícia ao fabrico de um ou dois geios, aí está ele com a picareta e o ferro do monte a esfarelar, a erguer o socalco e a espetar no custoso degrau duas dúzias bacelos, que serão o seu melhor cuidado, até à morte, como se fosse as mais finas roseiras.”

É esta a paisagem que se desfruta, nesta manhã de sol esplendoroso.

O Pinhão e a sua ponte, o povoado na margem direita, a riqueza vinícola na esquerda
A vegetação a beijar o rio, o arvoredo a suster as terras, as videiras alinhadas, ao longe tudo parece pintado, entre o azul e o verde
Não chegaremos a Barca D’Alva, pouco importa, o olhar enriquece-se com todo este contraste, parecem águas oleosas, graças à luz do céu, veja-se o encarpado das margens, volto a pensar no Miguel Torga: “Socalcos são passadas de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor, pintor ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limites plausíveis da visão. Um poema geológico. A beleza absoluta.” E o rio sulcado por embarcações turísticas, nas duas direções.
Sabe-se lá porquê, enquanto via esta árida encosta e o casario nela encimado recordei-me do primeiro filme de Manoel de Oliveira, “Douro, Faina Fluvial”, não propriamente um filme, mas um documentário, não passado aqui, mas na zona ribeirinha, e deu-me para questionar quão inusitado é este espetáculo e tão diametralmente diferente do Douro que atravessa o Porto e Gaia. Um escritor já completamente esquecido, Sousa Costa, falava do odor das uvas derramado no ar, em afagos capitosos, nos cânticos das mulheres e os gritos dos carregadores, registando a mancha movediça das vindimadeiras a arrancar os cachos maduros, eles cantando em coro estribilhos de canções populares, também tenho direito a deixar correr o pensamento e a imaginar que na curva seguinte vou presenciar, na plenitude, as vindimas nesta terra quente, e até avistar barcos rabelos…
Vamos voltar ao Pinhão, que já foi o embarcadouro das pipas de vinho fino a caminho das caves de Gaia, acenou-se ao comboio a caminho da Régua, não se avistaram vindimas e não há rabeleiros cheios de pipas, não o odor das uvas, só estes montes pintados, e então deu-me para pensar em Eça de Queiroz e numa observação dele em “A Cidade e as Serras”:
“Olha para o rio! Rolávamos na vertente de uma serra, sobre penhascos que desabavam até largos socalcos cultivados de vinhedo. Em baixo, numa esplanada, branquejava uma casa nobre, de opulento repouso, com a capelinha muito caiada entre um laranjal maduro. Pelo rio, onde a água turva e tarda nem se quebrava contra as rochas, descia, com a vela cheia, um barco lento carregado de pipas. Para além, outros socalcos, de um verde-pálido de reseda, com oliveiras apoucadas pela amplidão dos montes, subiam até outras penedias que se embebeciam, todas brancas e assoalhadas, na fina abundância do azul. Jacinto acariciava os pelos corredios do bigode: - O Douro, hein?... É interessante, tem grandeza.”

É a hora da despedida, estamos prestes a aportar no Pinhão. É nisto que recordo que ainda não se fez uma saudação ao vinho fino, para o vulgo vinho do Porto, socorro-me novamente de João Conde Veiga: “Mama, na sua nascença, nas fráguas de xisto, que acobertam a raiz do calor, depois é o sol que, numa estranha alquimia, se condensa no açucarado das uvas, e daí vai ser engarrafado em vinho como se fosse o próprio astro quente e brilhante que mandássemos aquecer os país das brumas.” Um passeio que me regalou. Vamos amesendar em Tabuaço, como sempre acontece, haverá um passeio derradeiro, o autocarro partirá depois à desfilada por horas, até nos largar em Sete Rios, bem perto do Jardim Zoológico.
Vagueando por Tabuaço, detive-me em frente a uma bica, muito gostei do conjunto azulejar, lá vão os campónios rumando para as alturas, não se sabe quais, para o caso não interessa, estamos a centenas e centenas de metros acima do nível do mar, é só mais uma escalada, porventura ali cultivam para a subsistência e tratam primorosamente as suas videiras, oxalá que ainda hoje assim seja.
Fica-nos a impressão que em termos turísticos Tabuaço é de pouca permanência, mas sabe bem ver quem aposta num modelo turístico não hoteleiro, provoca sempre agrado ver intervenções sérias como esta aparenta.
É a despedida, voltando atrás, àquela manhã em que fomos a Barcos, inequivocamente aldeia vinhateira, prendeu-nos a atenção este casarão que já conheceu melhores dias, mas guarda imponência ali junto à igreja matriz, que é de suprema excelência, para que conste.
Porquê voltar a falar de S. Pedro das Águias, um tesouro do românico, que não se visitou? Se é verdade que a viagem nunca acaba, há que criar argumentos para voltar, o Douro vinhateiro é imenso, e o último traço de memória que registo é o orgulho destas gentes pela sua ancestralidade e pela comunicação afetiva gerada pelo Douro que corre lá em baixo e por este xisto abençoado da terra quente onde medra um dos pais gostosos vinhos do mundo.
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Nota do editor

Pos anterior de 27 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25114: Os nossos seres, saberes e lazeres (611): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (139): Férias em região duriense, uma rota de aldeias vinhateiras (8) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25130: A 23ª hora: Memórias do consulado do Gen Bettencourt Rodrigues, Governador e Com-chefe do CTIG (21 de setembro de 1973-26 de abril de 1974) - Parte I: A visita do CEME, Gen Paiva Brandão, em finais de janeiro de 1974


Guiné > s/l > s/d > c- 1973/74 > O gen Bettencourt Rodrigues graduando um milícia  (Fonte: CECA, 2015,  pág. 341)  (imagem reeditada, LG).


Guiné >Região do Gabu > Boé > Madina do Boé > 16 de novembro de 1973 > O jornalista alemão, da Reuters,  Joachim  Raffelberg, e o Gen Bettencourt Rodrigues, governador-geral e com-chefe que, a partir de 21/9/1973, substituiu o carismático Gen António Spínola.

Fonte: página do Facebook do antigo jornalista da agência Reuters, Joachim Raffelberg, chamada Raffelnews, Serviço comunitário, encontrámos esta "preciosidade", que faz parte de um álbum sobre Madina do Boé, com fotos (legendadas em inglês), inseridas em 29 de janeiro de 2018, incluindo recortes de jornais portugueses (Diário de Notícias e Diário de Lisboa) que reproduziram a notícia da agência noticiosa portuguesa, ANI, dando conta de uma visita de jornalistas estrangeiras, de helicóptero, à antiga Madina do Boé, acompanhados do gen Bettencourt Rodrigues, o então novo comandante-chefe do CTIG.
  (*)


Guiné > Bissau > Aeroporto >  28 de janeiro de 1974 > O CEME, Gen Paiva Brandão, recebido com honras militares à sua chegada. Fotograma de vídeo (3' 16'') da
RTP Arquivos 
Sinopse: "Chegada do Chefe do Estado-Maior do Exército à Guiné-Bissau, recebido pelo Governador e Comandante-chefe, e altas individualidades civis e militares; visita ao Quartel-General e reunião de trabalho sobre a situação administrativo-logística do Exército." imagem editada e reproduzida  com a  devida vénia...)


1.  Todas as épocas, todas as guerras, todos os regimes, todos os chefes têm a  sua 23ª hora... Muitos de nós, antigos combatentes, já não estávamos lá no CTIG, quando o gen Spínola bateu com a porta a Marcelo Caetano e foi substituído pelo gen Bethencourt Rodrigues. Este foi o último governador e comandante-chefe do CTIG: a sua história efémera passa-se entre 29 de setembro de 1973 e 26 de abril de 1974. Quem já não estava lá, tem direito a saber como foi a  23ª hora deste militar com carreira brilhante que acabou por fechar um capítulo da história de Portugal com 500 anos. 

Da Carta de Comando do Comandanmte-Chefe das Forças da Guiné, consta o seguinte no que diz respeito ao "cessar das operações": 

 (...), Salvo ordem expressa do Governo da Nação, as operações que houver de executar serão conduzidas até ao completo restabelecimento da ordem, da segurança e, sendo caso disso, da plena soberania em todo o território da Província, se necessário, até ao esgotamento dos meios de combate. (CECA, 2015, pp. 405/406)

Vamos reunir aqui memórias e histórias desse período que culminou com o 25 de Abril de 1974.  

E o primeiro momento que escolhemos foi  o da visita do CEME (Chefe do Estado Maior  do Exército), gen Paiva Brandão em 28/29 de janeiro de 1974, ao CTIG,  e  o da "reunião de trabalho" que se realizou a 29, às 18h30, hora que na Guiné era já da hiena...

É uma reunão algo "surreal" esta em que o gen João de Paiva de Faria Leite Brandão, político do regime (foi deputado na Assenbleia Nacional em 3  legislaturas), de visita ao CTIG, fez uma reunião de trabalho com  o Com-Chefe gen Bethncourt Rodrigues e seus colaboradores mais próximos...  Estamos a menos de 3 meses do 25 de Abril de 1974.

É uma reunão em que o representante do poder político-militar de Lisboa traz uma "mão cheia de nada" face às necessidades do teatro de operaçóes e da adminmistração civil...  Uma reunião em que se discutem "peanuts"...  

Repare-se: não há (ou vai faltar) arroz, gaz butano, ferro e asfalto,,,, mas também pessoal para abrir o CAOP3, bem como muniçóes 8,9 cm (bazuca) e 14 cm (obus)... A África do Sul é agora o nosso "Pai Natal"... Há subunidades sem cobertura legal: caso das africanas CCAÇ 20 e 21,,, O Com-Chefe vai assobiando para o lado e promovendo milícias...

Faz-se vista grossa das tremendas implicaçóes políticas, militares, estratégicas, diplomáticas e legais (face ao direito internacional) da declaraçáo unilateral da independència da Guiné-Bissau, em 24 de setembro de 1973, pelo PAIGC.  

Faz-se tábua rasa do profundo mal-estar que já grassa nas FA, bem como do clima de descontentamento e até conspiração no seio das FA , bem como da escalada militar: o PAIGC dispõe de armamento superior ao  das NT (morteiro 120mm, foguetão 122 mm, peça de artilharia 130 mm, míssil Strela, novas minas A/P e A/C, etc.),

As carèncias de material (e nomeadamente de munições), as dificuldades de transporte marítimo e os constrangimentos orçamentais ficam bem patentes nesta minuta da reunião que agora publicamos, com a devida vénia (CECA, 2015, pp. 482/483),


João de Paiva de Faria Leite, "2º barão de São Lázaro",  nasceu em Guimarães, Polvoreira, na Casa de Carvalho d'Arca, em 19/08/1912 e morreu, aos 85 anos, em 04/12/1997 (Fonte: Geneall)

2. CECA (2015) > Aspetos da atividade operacional: Guiné (1971/74) > Cap IV - 1974

(...) "No final do mês de Janeiro, o Chefe do Estado-Maior do Exército, General
João de Paiva de Faria Leite Brandão, acompanhado de 2 Oficiais do
CEM, visitou o TO da Guiné (...) Em 29 de janeiro realizou-se uma reunião de trabalho
com o Cmdt-Chefe das FAG" (pág. 454)

Não há detalhes da visita. (vd. aqui notícia, na RTP da chegada ao aeroporto de Bissalanca, em 28 de janeiro: vídeo de 3' 16'', infelizmente sem som). A CECA (2015) publicou em anexo (nº 1) a ata da reunião.

Anexo n° 1 - Visita do CEME - Reunião de Trabalho (pp. 482/483)

Datal / Hora: 29 Jan74 18h30

Oficiais presentes:

- Gen Paiva Brandão

- Gen Bethencourt Rodrigues

- Brig Leitão Marques

- Cor CEM Rodrigues Figueira

- Ten-Cor CEM Franco Charais

Assuntos:

a. - Situação de Unidades do TO sem cobertura legal

O Gen B. Rodrigues mais uma vez levantou o problema da existência de Unidades do TO sem cobertura legal, indicando as seguintes unidades:

- CCaç 20 e 21, totalmente africanas;

- Comp. Eventual de Cuntima.

Foi definido não haver encargos de pessoal metropolitano para estas unidades, tratando-se de legalizar a sua constituição e orçamentar a respectiva despesa.

O assunto foi anotado pelo Cor Figueira.

b. - Orçamento para 1975

Seguidamente, o Gen P. Brandão explicou superficialmente o planeamento a efectuar para se definir o Orçamento de Defesa para 1975.

Em março, o SGDN (Secretariado-Geral da Defesa Nacional) solicitará a todos os Comandos-Chefes uma informação sobre as forças atribuídas a cada TO.

Os Comandos-Chefes no período de 1 a 15 de abril informarão quais as forças orçamentadas existentes no TO (Ex., Marinha e FA) e outras necessárias.

No período de 15 a 30  de abril, a Junta de Chefes de Estado-Maior trabalha as respostas recebidas e estabelece um sistema de forças para todo o espaço nacional, o qual é submetido posteriormente à apreciação do Conselho Superior Militar.

O trabalho da Junta de Chefes de Estado-Maior leva em conta as possibilidades orçamentais.

c. Transmissões

Seguidamente o gen B. Rodrigues falou sobre o material de transmissões em aquisição para a Guiné, com base numa informação pessoal do brig S. Grade. Os oficiais de EM presentes disseram já ter recebido indicações no Agr Tm, tendo sido especialmente focado o aspecto de substituição de 60 "AVP-1" por material "ERET", mais adequado ao TO da Guiné.

O assunto vai ser apresentado também em carta pessoal ao brig S. Grade.

d. Substituição do Cmdt CAOP 2

Seguidamente, o gen B. Rodrigues referiu a necessidade urgente de ser nomeado um dos Oficiais propostos (2) para o CAOP 2, em virtude do cor Telo dever recolher à Metrópole até  1 de abril de 74. O assunto foi anotado pelo cor Figueira.

e. Formação do CAOP 3

Seguidamente, o gen B. Rodrigues referiu ser necessário que o CAOP 3, pedido desde nov73, fosse constituído com brevidade e enviado para o TO.

O cor Figueira apresentou a informação da 3ª Rep/EME, da qual consta não ser possível nomear a maioria do pessoal antes de jul74.

Existem também problemas de verbas mas o gen P. Brandão disse serem de fácil solução.

Dado que o prazo de constituição do CAOP 3 em jul74 não satisfaz as necessidades imediatas do TO, foi sugerido que o EME estudasse uma nomeação por fases e enviasse uma proposta para o Cmd-Chefe, a qual seria trabalhada face ao recurso a pessoal já existente em Unidades.

Admitiu-se ser possível arrancar desde já com uma solução de compromisso, a qual seria melhorada até agosto de 74 à medida que fosse nomeado o pessoal em falta.

f. Material a receber no TO

Seguidamente, o ten-or Charais informou;

(i) estar para ser desembarcado do N/M "Cabo Bojador" já em Bissau o seguinte material:

- 4 obuses 14 cm

- 10 morteiros 8, 1 cm

- 20 morteiros 60 mm

(ii) estar para ser remetido no próximo transporte o seguinte material:

- 6 obuses 10,5 cm

- 4 a 7 peças 9,4 cm


g. Aproveitamento de material

Seguidamente, o ten-Cor Charais informou existir disponível em depósito material de 7,5 cm montanha (obuses italianos de montanha), com um lote de 6000 granadas que poderia ser fornecido para o TO. 

Dado o peso deste material e as suas dimensões, este pode ser transportado via aérea para Nova Lamego, Aldeia ormosa, Cufar e talvez Farim, o que dá grande flexibilidade ao seu emprego. O seu alcance permite bater o morteiro 82 mm lN, cobrindo uma lacuna do nosso morteiro 8,1 cm.

O assunto ficou de ser estudado no Cmd-Chefe e CTIG e enviada uma proposta ao EME com as conclusões.

h. Transportes

Seguidamente, o  gen B. Rodrigues focou a carência de transportes marítimo
para a Província
, na qualidade de Governador dizendo que em larga medida as dificuldades existentes resultavam da utilização pelo ME de grande parte da tonelagem disponível nas carreiras periódicas quinzenais, com prejuízo de carga civil (ou por incompatibilidade das cargas ou por insuficiência de tonelagem).

Mais disse, ter apresentado o assunto ao Snr Ministro do Ultramar para solução urgente de transporte para a Província de arroz, gaz butano, ferro e asfalto, necessidades prementes por esgotamento das existências locais.

Foi sugerido que o ME efectuasse o fretamento de 1 navio logístico entre os transportes de tropas, ficando assim a tonelagem das carreiras normais mais liberta para o transporte civil.

O ten-cor Charais disse não conhecer o assunto mas parece-lhe que as verbas disponíveis não comportavam o fretamento de um navio.

Nada ficou decidido. Para ser accionado no âmbito militar terá de haver
uma proposta ao SGDN ou EME.

i. Diversos

Depois da reunião, o ten-cor Charais informou o brig Leitão Marques que:

- a Metrópole não podia produzir em breve prazo granadas 8,9 cm e
teríamos restrições no seu fornecimento;

- as munições de 14 cm disponíveis eram de um lote à ordem do SGDN
e só seriam fornecidas com autorização superior (Lote Can);

- a África do Sul tinha uma encomenda de munições de 14 cm mas 
estas não estarão disponíveis brevemente na Metrópole. [... ]

[ Seleção / adaptação / revisão / fixação de texto / negritos, para efeitos de publicação deste poste no blogue: L.G.]

Fonte: Fonte: Excertos de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro III; 1.ª Edição; Lisboa (2015), pp. 482/483  (Com a devida vénia...).
__________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 28 fevereiro de  2021 > Guiné 61/74 - P21956: Facebook...ando (60): o gen Bettencourt Rodrigues, em 16 de novembro de 1973, em Madina do Boé, com dois jornalistas alemães, para verem "in loco" o sítio onde o PAIGC teria alegadamente proclamado a independência unilateral

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25129: Notas de leitura (1663): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (10) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Janeiro de 2024:

Queridos amigos,
Chegou a hora de fazer um balanço ao conjunto de operações da Força Aérea com o intuito de aniquilar os sistemas antiaéreos em poder do PAIGC. Numa reunião de comandos efetuada em abril de 1968, porventura em hora de despedida do general Arnaldo Schulz da Guiné, dava-se como provado que reduzira substancialmente o poder antiaéreo do PAIGC, e compulsaram-se dados de 1965 até àquela data. É notório que o PAIGC não tinha hipóteses de contrariar a supremacia aérea, naquelas circunstâncias, precisou de uma arma maleável e letal, como os mísseis terra-ar que entraram em ação em 1973. Fica para a história o que estes aviadores escreveram quanto à bravura dos artilheiros do PAIGC naqueles três pontos cruciais no Sul da Guiné e, igualmente, fica comprovado que durante a governação de Schulz se usaram de todos os meios possíveis e oferecidos àquele teatro de operações para contrariar a combatividade e mesmo o destemor de quem lutava pela sua independência.Vamos agora ver a vida operacional da Força Aérea no tempo do governador Spínola. 

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (10)


Mário Beja Santos

Deste segundo volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados na sua aquisição: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/.

Capítulo 3: “Eram eles ou nós”


Os autores têm evidenciado as alterações operadas quer nos equipamentos e armamentos da Força Aérea quer nas respostas encontradas pelo PAIGC para procurar intimidar a supremacia dos ares, graças a sistemas defensivos de origem soviética. As principais inovações do lado português deveram-se à chegada do Fiat e do Alouette III e deste com o helicanhão. Na região Sul, no Cantanhez e no Quitafine, o PAIGC pôs-se em confronto com a aviação portuguesa, e daí termos enunciado um conjunto de operações que visavam destroçar totalmente tais equipamentos.

Do lado da Força Aérea, considerava-se que o material bélico não era adequado para operações no Quitafine. O General Nico recordou que tal material não era muito eficaz naquele terreno instável, a força explosiva dissipava-se no terreno macio e arenoso. “Mesmo quando os impactos ocorreram relativamente perto deles, logo que a poeira assentava e passava a dor de ouvidos, os guerrilheiros continuavam a atirar.”, observou o general. Felizmente para os aviadores portugueses, as mesmas características do solo que silenciavam os efeitos das suas bombas também realçavam as posições dos canhões dos sistemas de defesa antiaérea. “Os revestimentos destes sistemas em terra brilhavam intensamente sob o sol fortíssimo da Guiné e tornavam a localização do alvo muito mais fácil”, continuou o General Nico. O Tenente-coronel Costa Gomes rebate tal opinião alegando que “com os alvos a dispararem contra nós, a probabilidade de colocar uma bomba em tal pequeno círculo era muito estreita.” Apesar destes prós e contras, a Zona Aérea respondeu com uma outra série de operações contra os sistemas de defesa antiaérea no Sul da Guiné, no início de 1968.

Os aviadores portugueses inauguraram o novo ano com a Operação Faísca, um ataque de dois dias a posições antiaéreas identificadas em Dameol e Banir, na Península do Quitafine, lançaram 5400 kg de bombas em dois locais em 19 surtidas, destruindo uma ZPU de 14,5 mm em Banir e uma DShK de 12,7 mm em Dameol. Os aviadores portugueses, no regresso destas surtidas, reportaram que os outros locais estavam “possivelmente destruídos, tendo sido completamente abandonados pelo inimigo”. Durante todo o mês de janeiro de 1968, os Fiat também retaliaram contra o fogo antiaéreo. Fizeram-se relatórios mencionando que se tinham destruído pelo menos mais quatro armas do sistema de defesa antiaéreo.

No entanto, estes sucessos não conseguiram afastar a ameaça da atividade antiaérea. Em fevereiro, a Zona Aérea levou a efeito uma outra campanha no Quitafine, três operações batizadas de Operação Martelada I, II e III. A primeira fase da operação procurava responder a um ataque aéreo perto da localidade de Quitafine, Calaque Manjaco, que ocorreu em 9 de fevereiro. Perto das 13 horas, quatro Fiat partiram de Bissalanca, cada um carregando quatro bombas de 50 kg e duas bombas de 200 kg, e atacaram posições em Cassebeche e Calaque Manjaco, fazendo explodir aqueles locais com 24 bombas em menos de 30 segundos; uma segunda onda aconteceu às 16 horas, e encontrou as posições do PAIGC abandonadas; os Fiat baseados em Bissalanca fizeram um total de 10 surtidas para a Operação Martelada I, lançando 4800 kg de bombas e destruindo duas das posições de defesa antiaérea na Península do Quitafine; dois dias depois, a Zona Aérea lançou a Operação Martelada II, em resposta ao fogo da metralhadora pesada dirigida contra os Fiat quando estes sobrevoavam Cassebeche; nove surtidas de Fiat atingiram no local uma DShK de 12,7 mm com oito bombas de 50 kg, seis bombas de 200 kg e oito embalagens de napalm, alegadamente destruíram uma posição de bateria antiaérea e forçaram à evacuação de outras duas. No final do dia fez-se um reconhecimento a estes locais, e não houve resposta do PAIGC. Os resultados satisfatórios das Operações Martelada coincidiram com a melhoria da disponibilidade de munições, o que induziu o comando da Zona Aérea e o GO 1201 a planear futuros ataques com ondas de quatro a cinco Fiat largando cargas máximas em tempos muitíssimo rápidos. Era tal a violência destes ataques que os guerrilheiros antiaéreos se sentiam obrigados a abandonar as posições, mas não havia a certeza de que eles e as suas armas tinham sobrevivido a tal ataque inicial.

O perigo que decorria dos aviões baseados em Bissalanca tornou-se um alvo tentador ao PAIGC, o que levou a que tivesse feito um ataque sem precedentes contra a instalação, durou 6 minutos, começou às 23h30 de 18 de fevereiro de 1968, foram 10 tiros de morteiro e usaram-se granadas de propulsão, foi tudo disparado de fora do perímetro de segurança, registaram-se dois mortos e doze feridos em milícias acampados na base, mas não teve qualquer impacto nos aviões e causou apenas danos materiais “insignificantes”. Com efeito, na manhã seguinte, de Bissalanca partiram 30 surtidas para operações que estavam a decorrer, incluindo uma missão aérea de cariz empresarial. No entanto, o PAIGC bem tentou fazer propaganda da operação, dizendo que tinha sido um grande sucesso, reivindicou a destruição de dois aviões, três hangares e a torre de controlo. O líder do PAIGC condecorou os 13 guerrilheiros que tinham participado na operação com a “Estrela Negra do Partido”. Pondo de parte a verborreia da propaganda, ficou claro que o PAIGC adquirira capacidade de infiltrar militantes fortemente armados em Bissau e arredores, atacar e retirar-se sem ser intercetado.

E ficou a pairar no ar a possibilidade do PAIGC “bombardear campos de aviação, realizar emboscadas e atacar aviões à medida que estes descolavam”, era o que já constava numa diretiva do partido de 1965. Na verdade, o PAIGC já tinha reivindicado, de uma forma totalmente irrealista, mais de 20 ataques contra pistas de aterragem, dizendo mesmo que tinham deixado o campo de aviação de Cufar “inutilizável para a aviação”, tinha sido uma destruidora operação com morteiros. Estes ataques da propaganda não perturbaram a campanha antiaérea da Zona Aérea no Quitafine, e os Fiat do GO 1201 regressaram a Cassebeche para a Operação Martelada III, em 7 de março. Uma vaga de quatro Fiat lançou 12 bombas de 50 kg, 6 bombas de 200 kg e 2 bombas de napalm contra um sistema antiaéreo ZPU-4 de 14,5 mm, destruindo-o. Os Fiat também metralharam quatro posições DShK 12,7 mm que estavam próximas, o que levou os artilheiros a transferirem-se para locais mais seguros. O reconhecimento fotográfico posterior confirmou a “aniquilação brutal do complexo” que “quebrou a capacidade de reação do inimigo”, como lembrou o General Nico.

A Operação Martelada III seria a última operação planeada pela Zona Aérea, embora tivessem continuado ataques de viação contra o fogo antiaéreo do PAIGC. Estas iniciativas da Zona Aérea atacando os sistemas antiaéreos do PAIG terão feito diminuir as iniciativas destes: os ataques antiaéreos em 1966 foram em número 110 e passaram para 29 em 1968, houve uma queda acentuada no Setor Sul que, incorporava como Cantanhez e Quitafine. Numa reunião de comandos presidida por Schulz, em abril de 1968, houve consenso quanto a uma diminuição significativa no fogo hostil dirigido contra aviões portugueses. Nem um único avião português fora derrubado por fogo hostil em todo o país, entre 1965 e o primeiro semestre de 1968.

A Zona Aérea sofreu perdas acidentais durante esses anos, conforme se pode ver no anexo III. Em 21 de julho de 1966, um DO-27, em voo de rotina e transportando correspondência, desviou-se para o espaço aéreo senegalês e caiu no mar, os pilotos, os alferes José de Sousa e Manuel Lima Leite, foram resgatados por um navio alemão, detidos algum tempo em Dacar e depois devolvidos a Bissau em 4 de agosto. No início do ano seguinte, em 22 de fevereiro, a Esquadra 121 sofreu a sua primeira perda operacional de um avião Fiat. O comandante da Esquadra, Major Armando dos Santos Moreira, estava a bombardear uma suposta posição antiaérea perto de Gã Pedro, na região de Quinara, quando o seu avião ficou danificado por estilhaços da sua própria bomba de fragmentação de 200 kg, possivelmente devido a uma detonação prematura. Acompanhado pelo seu asa, Tenente Egídio Lopes, Moreira tentou trazer o seu avião de volta a Bissalanca, mas os danos eram muitíssimos elevados e foi forçado a ejetar-se a uma altitude de 2000 pés durante a sua aproximação, foi recuperado e evacuado para convalescença, o seu avião ficou totalmente perdido. Finalmente, em 15 de junho de 1968, um T-6 sofreu uma falha de motor e caiu entre Chéché e Madina do Boé. No dia seguinte, paraquedistas helitransportados recuperaram a aeronave danificada que foi posteriormente desfeita.
Operações da Zona Aérea entre janeiro e maio de 1968 (Matthew M. Hurley)
Detalhe da posição de uma ZPU-4 em Cassebeche, assinalada durante a Operação Martelada III
(Coleção José Nico)
A mesma posição antiaérea a seguir a um ataque português por Fiat (Arquivo da Defesa Nacional)
Operações helitransportadas entre janeiro e junho de 1968 (Matthew M. Hurley)
Os Alouette III foram muito ativos na primeira metade de 1968, especialmente em operações helitransportadas
(Coleção Helder Ferreira)

(continua)
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Notas do editor

Post anterior de 26 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25112: Notas de leitura (1661): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (9) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 29 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25121: Notas de leitura (1662): "Os três rostos da Igreja Católica na Guiné" (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25128: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte II: embarque de tropas expedicionárias para os Açores, em maio de 1941

 


Legenda (não há indicação do autor da foto):  "O sr. capitão Santos Costa, Subsecretário de Estado da Guerra, passa revista a mais um contingente de tropas para reforçar a guarniçáo militar dos Açores.  Desta vez foi um contingente de engenharia que embarcou para aquele arquipélago, no 'Carvalho Araújo' "... (O glorioso paquete "Carvalho Araújo" que navegou durante 4 décadas entre as ilhas e o continente e transportaria ainda tropas para a Guiné, no nosso tempo, antes de chegar oa fim dos seus dias...)

Capa da "Vida mundial ilustrada : semanário gráfico de actualidades": ano I, nº 2, 29 de maio  de 1941. Preço: 1 escudo. (*)

(A imagem foi reditada, com a devida vénia... LG; cortesia de Hemeroteca Digital de Lisboa / Câmara Municioal de Lisboa





Legenda: "Soldados Portugueses cotinuam a seguir para várias pates do Império onde a sua presença se torna necessária para afirmação da nossa soberania.  Damos, em cima, dois aspetos do último embarque de tropas para os Açores".
  

1. É desconhecido,  da maior parte dos nossos leitores, o esforço que Portugal teve que fazer na II Guerra Mundial para se defender e defender os seus territórios ultramarinos, com destaque para os arquipélagos atlânticos de maior interesse estratégico para os beligerantes: as potências do Eixo (Alemanha, Itália,  etc.) e os Aliados (Inglaterra, EUA, etc.).

Sobre os planos de defesa de Cabo Verde, já aqui temos falado (**)... Cerca de seis mil homens foram enviados para Cabo Verde, com destaque para as ilhas do Sal e de São Vicente. Para os Açores, form quase cinco vezes mais: 28 mil homens.

Era então Subsecretário de Estado da Guerra, braço direito de Salazar, considerado um "germanófilo",  o capitão Santos Costa (1899 - 1982)  (***).

Eis alguns resumos e excertos da dissertação de mestrado de Tiago Henrique Magalhães da Silva (2010), abaixo citado:

(,...) "Com o início da guerra, e até 1940, dão-se algumas alterações militares" (...) O  exército ordena uma mobilização parcial, passando de c. de 32,6 mil homens, em 1939, para 48,9 mil. Não há ainda preocupaçõea com a defesa das ilhas (e em especial dos Açores).

(...) "O Exército reforça também significativamente as ilhas a partir de Abril de 1941. Será a maior força expedicionária portuguesa, a dos Açores, contabilizando 28 000 homens, o que corresponde a duas divisões. Apesar da grandeza do dispositivo, as carências de armamento não podem ser mais claras, apenas o número das armas ligeiras está de acordo com as necessidades do exército." (...)

Há um reforço de três batalhões de infantaria expedicionários: 
  • o BI 8, para o Faial:
  • o BI 9, para S. Miguel:
  • e o BI 10, para Angra.

Em Julho de 1941, chega aos Açores a terceira vaga dos reforços, incluindo mais batalhões de infantaria: o BI 12 e o BI 14, ambos para S. Miguel. 

Em novembro de 1941, a quarta (e última) vaga vem completar, no essencial, o dispositivo militar  do arquipélago.

Nas próprias ilhas também se fazia, entretanto,  um importante esforço de mobilização: são criando-se vários batalhões de infantaria a partir das duas unidades-mãe: os batalhões independentes de infantaria, o BII 17 (Terceira) e o BII 18 (S. Miguel).

O número de 28 000 homens apontado por António José Telo (historidor, professor catedrático aposentado da Academia Militar) poderá, eventualmente, corresponder à totalidade de efectivos contabilizando substituições, ou talvez, englobando os efectivos da Marinha.

Segundo António José Telo  ("Os Açores e o controlo do Atlântico: 1898 – 1948. Porto: ASA, 1993, pág. 276, cit, por Silva, 2010, pág. 86):

(...) "Em 1941, o comando militar dos Açores dirige já uma guarnição distribuída por três ilhas, com uma presença simbólica nas outras. O grosso das forças está em S. Miguel, sede de três regimentos de infantaria (RI 18, 21, 22), companhias de metralhadoras, artilharia antiaérea e de campanha e as baterias de defesa de costa de Ponta Delgada. O RI 17 está na Terceira e o RI 20 no Faial, ambas as ilhas reforçadas com unidades de artilharia de campanha, antiaérea e auxiliares”. (...)

Fonte; Adapt. de Tiago Henrique Magalhães da Silva - "Operação dos Açores 1941". Dissertação de Mestrado em História Contemporânea. Porto:  Universidade do Porto, Faculdade de Letras, 2010, 117 pp. (Sob a orientação do Professor Doutor Manuel Loff). 


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Notas do editor

(*) Vd.  29 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25120: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte I: embarque de tropas expedicionárias para Cabo Verde, em junho de 1941.... "Partiram alegres e confiantes"...

(***) Sobre o gen Fernando dos Santos Costa   (1899-1982)

Militar e político que foi figura destacada do regime salazarista. Entre 13 de Maio de 1936 e 6 de Setembro de 1944 ocupou o cargo de Subsecretário de Estado no Ministério da Guerra, de cuja pasta era titular o próprio Presidente do Conselho, Salazar, a quem sucederá à frente do Ministério da Guerra entre 6 de Agosto de 1944 e 2 de Agosto de 1950. Quando a pasta da Defesa substituiu a da Guerra, manteve-se à frente do novo Ministério até 4 de Agosto de 1958, data em que foi afastado do governo. Em 1961 foi promovido a General. (José Martins)

Vd. a publicação Correspondência do General Santos da Costa (1936-1982). Organização e prefácio: Manuel Braga da Cruz . Editora: Verbo, Lisboa, 2004,

"O General Fernando Santos Costa foi um dos mais estreitos colaboradores de Salazar e um dos mais longevos ministros dos seus governos. Ao longo dos 22 anos que esteve no Governo, onde ocupou os cargos de subsecretário de Estado da Guerra e de ministro da Guerra e da Defesa, foi a figura mais importante do regime junto do Presidente do Conselho de Ministros. Principal fautor da reestruturação das Forças Armadas e da sua subordinação ao poder político, Santos Costa participou ao lado de Salazar, de modo decisivo, na formulação da política de guerra, desde o deflagrar da Guerra Civil de Espanha até ao início da Guerra Fria, depois do termo da II Guerra Mundial (****), assumindo desse modo relevante papel não só nacional como internacional. 

"A documentação que se reúne nesta obra, com prefácio de Manuel Braga da Cruz, contribuirá seguramente para uma maior compreensão da personalidade de Santos Costa e de suas ideias e orientações políticas".

(****) Portugal e a II Guerra Mundial - Cronologia breve (LG):

1939

17 de Março - Assinado por Salazar e Franco o Pacto Ibérico, Tratado de Amizade e Não Agressão

1 de Setembro - Invasão alemã da Polónia. Início da II Guerra Mundial. Portugal, no dia seguinte, declara a sua posição de neutralidade no conflito europeu.

1940

Começam a afluir a Portugal dezenas e dezenas de milhares de refugiados, na sua maioria judeus, e nomeadamente em trânsito para os EUA.

6/7 de Junho - A Alemanha invade a França que irá capitular. Reafirmação da "estrita neutralidade" de Portugal. Conhecimento dos planos (secretos) da "Operação Félix" (invasão de Espanha e, eventualmente, Portugal, para a conquista e ocupação de Gibraltar, vital para o controlo do Mediterrâneo). Os ingleses fazem todos os esforços para manter a neutralidade da Península Ibérica.

Dezembro - Plano de retirada do governo português para os Açores na hipótese (temida pelos ingleses e levada a sério por Salazar) de invasão do país pela Alemanha e pela Espanha. O arquipélago dos Açores chegará a ter quase 3 dezenas de milhares de homens em armas, com equipamento inglês.

1941

22 de Junho – A URSS é invadida pela Alemanha. Aumenta a germanofilia em Portugal,  nomeadamente. Estreitam-se os laços económicos com a Alemanha.

Dezembro - Declaração de guerra dos Estados Unidos contra as pptências do Eixo, após o ataque japonês a Pearl Harbour. Reforça-se em Portugal o receio de ocupação, pelos Aliados, das ilhas atlânticas. Aumenta a importância estratégica dos Açores. Em 1941 Portugal perde 4 navios, três dos quais da marinha mercante, incluindo o Cassequel, de 122 m, da Companhia Colonial de Navegação. No final do conflito, terã perdido 18 mil t, o equivalente a 7% do total da arequeação bruta

1942

Março - Racionamento de bens essenciais, na sequência de Bloqueio económico imposto pelos Aliados. Portugal é obrigado a aceitar, no verão desse ano, um acordo comercial favorável aos interesses do seu velho aliado que lhe garante a independência da metrópole e das ilhas adjacentes bem como a soberania das colónias.

Novembro/Dezembro - A sorte das armas começa a virar-se para os Aliados.

1943

Janeiro - Capitulação dos alemães em Estalinegrado.

Maio – Queda da Tunísia a favor dos aliados. Ameaça sobre os Açores, vital para o abastecimento de aviões provenientes da América. Negociação com os ingleses e depois com os americanos.

Agosto - Cedência das bases das Lajes, nos Açores. O Governo Britânico compromete-se a dar apoio e auxílio militar a Portugal, em caso de ataque. Modernização das nossas Forças Armadas.

Junho - Portugal cancela a exportação do volfrâmio, face ao braço de ferro mantido com a Inglaterra. O principal cliente deste minério, essencial para a indústria de armamento, tinha sido a Alemanha.

1944

Maio - II Congresso da União Nacional. Delineada a estratégia de sobrevivência do regime de Salazar.

6 de Junho – O tão esperado Dia D (Desembarque nas praias da Normandia pelas forças aliadas).
Novembro - Acordo (secreto) de concessão de facilidades militares nos Açores, assinado por Portugal e os Estados Unidos.

1945

30 de Abril – Morte de Hitler em Berlim. Três dias de luto oficial decretados pelo governo português.

Maio – Capitulação das tropas alemãs.

6 e 9 de Agosto - Lançamento de bombas atómicas sobre Hiroxima e Nagasáqui, que irão apressar a rendição japonesa (a 2 de Setembro)

27 de Setembro – O território de Timor volta à administração portuguesa, depois da ocupação japonesa (mas também australiana e holandesa).

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Nota do editor:

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25127: A minha ida à guerra (João Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72) (28): HISTÓRIA DA COMPANHIA DE CAVALARIA 2721: Capítulo II - Actividades no TO da Guiné - Julho de 1971



"A MINHA IDA À GUERRA"

28 - HISTÓRIA DA COMPANHIA DE CAVALARIA 2721: CAPÍTULO II - ACTIVIDADES NO TO DA GUINÉ

João Moreira


MÊS DE JULHO 1971

Abrigo em Nhacra
Capela no quartel de Nhacra
Instalações da Emissora Oficial da Guiné, que ficavam no terreno ao lado do quartel em Nhacra

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 25 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25110: A minha ida à guerra (João Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72) (27): HISTÓRIA DA COMPANHIA DE CAVALARIA 2721: Capítulo II - Actividades no TO da Guiné - Junho de 1971

Guiné 61/74 - P25126: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLII: No rasto do PAIGC, a última saída da CCAÇ 21: apanhada de surpresa, em Canjufa, pela notícia do golpe de estado do 25 de Abril (pp. 272/276)


Guiné > Região de Gabu > Carta de Nova Lamego (1957) ( Escala 1/50 mil) > Posição relativa dos topónimos referidos por Amadu Djaló: Unago, Canjufa (na estrada Nova Lamego-Bajocunda-Pirada), Pajama e várias tabancas com o nome de Ufoia. Não localizámos Ufra, perto de uma lagoa, que deve ser Vendu Finjor, local de transumância na época seca... Foi em Canjufa que a CCAÇ 21 foi apanhada pela notícia do golpe de estado do  25 de Abril, em Lisboa... E já, antes, numa das tabancas de Ufoia, o tenente Jamanca, comandante da CCAÇ 21, terá perdido a indispensável serenidade de espírito e o imprescindível autocontrolo emocional: desautorizando o Amadu Djal terá dito, alto e bom som, para
 "dizer(em) ao pessoal do PAIGC que, disparassem ou não contra nós, ele Abdulai Jamanca, comandante da companhia, dava ordens para atacar com toda a força". E mais acrescentando que  "ainda tinha 150 balas de AK 47 e que,  depois disparar contra a guerrilha, a última que faltava era para ele" (Amadu Djaló, p, op cit,. 2010, pag. 273)

Infografia: Blogue Luís Graça / Camaradas da Guiné (2024)


1. Continuação da publicação das memórias do Amadu Djaló (Bafatá, 1940-Lisboa, 2015), a partir do manuscrito, digitalizado, do seu livro "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada) (*).

O nosso  camarada e amigo Virgínio Briote, o editor literário ou "copydesk" desta obra,  facultou-nos uma cópia digital. O Amadu Djaló, membro da Tabanca Grande, desde 2010, tem mais de nove dezenas de referências no nosso blogue. Tinha um 2º volume em preparação, que a doença e a morte não  lhe permitaram ultimar.



Capa do livro do Amadu Bailo Djaló,
"Guineense, Comando, Português: I Volume:
Comandos Africanos, 1964 - 1974",
Lisboa, Associação de Comandos,
2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.



O autor, em Bafatá, sua terra natal,
por volta de meados de 1966.
(Foto reproduzida no livro, na pág. 149)

Síntese das partes anteriores:

(i) o autor, nascido em Bafatá, de pais oriundos da Guiné-Conacri, começou a recruta, como voluntário, em 4 de janeiro de 1962, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama;

(ii) esteve depois no CICA/BAC, em Bissau, onde tirou a especialidade de soldado condutor autorrodas;

(iii) passou por Bedanda, 4ª CCaç (futura CCAÇ 6), e depois Farim, 1ª CCAÇ (futura CCAÇ 3), como sold cond auto;

(iv) regressou entretanto à CCS/QG, e alistou-se no Gr Cmds "Os Fantasmas", comandado pelo alf mil 'cmd' Maurício Saraiva, de outubro de 1964 a maio de 1965;

(v) em junho de 1965, fez a escola de cabos em Bissau, foi promovido a 1º cabo condutor, em 2 de janeiro de 1966;

(vi) voltou aos Comandos do CTIG, integrando-se desta vez no Gr Cmds "Os Centuriões", do alf mil 'cmd' Luís Rainha e do 1º cabo 'cmd' Júlio Costa Abreu (que vive atualmente em Amesterdão);

(vii) depois da última saída do Grupo, Op Virgínia, 24/25 de abril de 1966, na fronteira do Senegal, Amadu foi transferido, a seu pedido, por razões familitares, para Bafatá, sua terra natal, para o BCAV 757;

(viii) ficou em Bafatá até final de 1969, altura em que foi selecionado para integrar a 1ª CCmds Africanos, que será comandada pelo seu amigo João Bacar Djaló (Cacine, Catió, 1929 - Tite, 1971)

(ix) depois da formação da companhia (que terminou em meados de 1970), o Amadu Djaló, com 30 anos, integra uma das unidades de elite do CTIG; a 1ª CCmds Africanos, em julho, vai para a região de Gabu, Bajocunda e Pirada, fazendo incursões no Senegal e em setembro anda por Paunca: aqui ouve as previsões agoirentas de um adivinho;

(x) em finais de outubro de 1970, começam os preparativos da invasão anfíbia de Conacri (Op Mar Verde, 22 de novembro de 1970), na qual ele participaçou, com toda 1ª CCmds, sob o comando do cap graduado comando João Bacar Jaló (pp. 168-183);

(xi) a narrativa é retomada depois do regresso de Conacri, por pouco tempo, a Fá Mandinga, em dezembro de 1970; a companhia é destacada para Cacine [3 pelotões para reforço temporário das guarnições de Gandembel e Guileje, entre dez 1970 e jan 1971]; Amadu Djaló estava de licença de casamento (15 dias), para logo a seguir ser ferido em Jababá Biafada, sector de Tite, em fevereiro de 1971;

(xii) supersticioso, ouve a "profecia" de um velho adivinho que tem "um recado de Deus (...) para dar ao capitão João Bacar Jaló"; este sonha com a sua própria morte, que vai ocorrer no sector de Tite, perto da tabanca de Jufá, em 16 de abril de 1971 (versão contada ao autor pelo soldado 'comando' Abdulai Djaló Cula, texto em itálico no livro, pp.192-195) ,

(xiii) é entretanto transferido para a 2ª CCmds Africanos, agora em formação; 1ª fase de instrução, em Fá Mandinga , sector L1, de 24 de abril a fins de julho de 1971.

(xiv) o final da instrução realizou.se no subsector do Xitole, regulado do Corunal, cim uma incursão ao mítico Galo Corubal.

(xv) com a 2ª CCmds, comandada por Zacarias Saiegh, participa, em outubro e novembro de 1971, participa em duas acções, uma na zona de Bissum Naga e outra na área de Farim;

(xvi) em novembro de 1971, participa na ocupação da península de Gampará (Op  Satélite Dourado, de 11 a 15, e Pérola Amarela, de 24 a 28);

(xvii) 21-24 dezembro de 1971: Op Safira Solitária: "ronco" e "desastre" no coração do Morés, com as 1ª e 2ª CCmds Africanos  (8 morts e 15 feridos graves);

(xviii) Morés, sempre o Morés... 7 de fevereiro de 1972, Op Juventude III;

(xix) o jogo do rato e do gato: de Caboiana a Madina do Boé, por volta de abril de 1972;

(xx)  tem um estranho sonho em Gandembel, onde está emboscado très dias: mais do que um sonho, um pesadelo: é "apanhado por balantas do PAIGC";

(xxi) saída para o subsetor de Mansoa, onde o alf cmd graduado Bubacar Jaló, da 2ª CCmds Africanos, é mortalmente ferido em 16/2/1973 (Op Esmeralda Negra)M

(xxii) assalto ao Irã de Caboiana, com a 1ª CCmds Africanos, e o cap cav 'cmd' Carlos Matos Gomes como supervisor;

(xxiii) vamos vê-lo a dar instrução a futuros 'comandos' no CIM de Mansabá, na região do Oio, no primeiros meses do ano de 1973, e a fazer algumas "saídas" extras (e bem pagas) com o grupo do Marcelino, ao serviço do COE (Comando de Operações Especiais), que era então comandado pelo major Bruno de Almeida; mas não nos diz uma única sobre essas secretas missões; ao fim de 12 anos de tropa, é 2º sargento e confessa que está cansado;

(xxiv) antes de ir para CCAÇ 21, como sede em Bambadinca, como alferes 'graduado" (e sob o comando do tenente graduado Abdulai Jamanca, ainda irá participar na dramática Op Ametista Real, contra a base do PAIGC, Cumbamori, no Senegal, em 19 de maio de 1973;  esta parte do seu  livro de memórias  (pp. 248-260) já aqui foi transcrita no poste P23625;

(xxv) no leste, começa por atuar no subsetor do Xime, em meados de 1973;

(xxvi) em setembro de 1973, quando estava em Piche, já na CCAÇ 21, recebe a terrível notícia da morte do seu querido irmão mais novo, Braima Djaló, da 3ª CCmds;

(xxvii)  embora amargurado com a morte do seu irmão mais novo, e cansado, ao fim de 12 anos de tropa e de  guerra, o Amadu Djaló mantem-se na CCAÇ 21, como alferes graduado; vemo-lo agora no início de 1974 em Canquelifá, em reforço da CCAÇ 3545 / BCAÇ 3883 (1972/74);

(xxviii) a CCAÇ 21 está n leste, na região de Gabu, ao serviço dfo CAOP2, e mais exatamente em Canjufa, quando sabe da notícia do golpe de estado do 25 de Abril em Lisboa; só no dia 27, de manhã, regressa a Bambadinca, onde estava sediada.


 Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLII:


No rasto do PAIGC, a última saída da CCAÇ 21: apanhada de surpresa, em Canjufa,  pela notícia do golpe de estado do 25 de Abril (pp. 272/276)


O Batalhão estacionado em Piche tinha um serviço de informadores civis que, sempre que saíamos, nos seguiam para ver se cumpríamos as missões. Havia um, fula, residente em Piche,  que se deslocava numa bicicleta de tabanca em tabanca vendendo às populações a cola, que transportava num cesto. Nas visitas que fazia às tabancas recolhia informações que transmitia, depois, ao comandante do Agrupamento[1].

Estávamos numa fase de grande actividade operacional. A minha companhia saía constantemente para operações, tanto no leste como na zona de Bambadinca.

Havia informações que na zona de Piche o PAIGC visitava as tabancas, deslocando-se de aldeia em aldeia, contactando as populações.

No dia 22 de Abril de 1974 encarregaram-nos de seguir o PAIGC, visitar também essas tabancas procurando obter informações sobre a actividade da guerrilha. O plano era sair de Piche, a pé, passar pelas tabancas de Ufoias, Pajama, Ufra e Unago e passar a noite numa tabanca abandonada, entre Unago e Canjufa.

Deixámos Piche[2], de manhã muito cedo e fomos passando de tabanca em tabanca, até à última, Ufoia. Nesta área havia três tabancas todas com o mesmo nome, Ufoia.

O meu pelotão seguia à frente e, quando estávamos a sair dessa última tabanca.  avistei um homem já velhote. Perguntei-lhe para onde é que ele ia e respondeu que vivia ali naquela tabanca. Que, em todos os anos nesta altura, os poços secavam, ficavam sem água, e, como tinham gado e precisavam de muita, então mudavam-se para Ufra, onde havia uma lagoa, com água em toda as épocas do ano. E que era por esse motivo que todas as tabancas em redor se mudavam para Ufra. E só regressavam, depois das duas ou três primeiras chuvas da época.

Quando o velhote acabou de falar, perguntei-lhe se o PAIGC andava por ali.

  − Todos os dias  −respondeu.

E contou mais coisas. Que o comandante, um dia,  lhe tinha levado o filho. E que fora ter com o PAIGC para lhes pedir para não o levarem, porque era o único que tinha e que estava velho para pastorear o gado. Deram-lhe o filho outra vez e levaram-no ao armazém. O comandante disse-lhe a ele e ao filho para levarem o que pudessem, arroz, açúcar, óleo e manteiga.

Contou ainda que o comandante o avisara de que uma companhia de africanos andava na zona, mas que o PAIGC não os atacava, nem que os vissem.

 − Se não dispararem contra nós, nós também respondemos da mesma foram, não disparaqmos contra eles  − disse eu.

O tenente Jamanca, que estava lá para trás, no meio da companhia, foi-se aproximando e chegou nesta altura da conversa. Então, o Jamanca disse para o velhote dizer ao pessoal do PAIGC que, disparassem ou não contra nós, ele Abdulai Jamanca, comandante da companhia, dava ordens para atacar com toda a força. E acrescentou ainda que tinha 150 balas de AK 47 e que,  depois de disparar contra a guerrilha,  a última que faltava era para ele. 

− Diz isto que te disse, ao PAIGC. 

Acabou a conversa assim, com o velhote.

Depois de recomeçarmos a marcha, a pouca distância dali, encontrámos uma velhota. Outra vez, a mesma pergunta, de onde vinha. 

− De Ufra  −   respondeu. 

− E para onde vai? 

 − Buscar algumas coisas que estão a fazer falta no acampamento, onde tinha o gado guardado.

 − O PAIGC vem a Ufra?  − Perguntei.

− Sim, vem.

E mais acrescventou que tinha vindo, "agora mesmo, com uma companhia do PAIGC, que foi para Pajama e que se tinha separado deles, ali no cruzamento".

 − Quantos são ?  − perguntou o tenente. 

 − Que não sabia quantos eram  −  respondeu a velhota.

Seguimos para o cruzamento e,  quando chegámos,  o tenente disse que não os íamos perseguir, porque se os atacássemos em Pajama, eles iriam resistir e iria morrer muita gente que não tinha culpa, crianças, velhotes, mulheres. Que não valia a pena, não iriam faltar oportunidades.

Saímos dali, virámos à direita na direcção de Ufra. Quando chegámos à tabanca, vimos pouca gente. Pareceram estar a olhar para nós, com medo,  e isso também nos pareceu estranho. Notava-se nos olhos daquelas pessoas que estavam a esconder qualquer coisa, qualquer segredo que não nos queriam revelar.

Perguntámos o que se estava a passar e respondiam "nada". Um soldado meu, que tinha muito gado à guarda do irmão mais novo, viu-o ao longe e chamou-o. Cumprimentaram-se, o soldado perguntou-lhe pelo gado e depois apresentou-nos o mano. Cumprimentámo-nos e nos olhos dele vimos também qualquer coisa de estranho.

 − O que se está a passar? 

 − Nada − a mesma resposta dos outros. 

Perguntou para onde íamos e eu respondi para Unano.

O meu soldado, Djao Djaló, tinha mais de 100 cabeças de gado e tinha ido para a tropa para poder defender a sua manada. O pai tinha morrido quando ainda não tinha dez anos, depois,  chegado a esta idade, o irmão mais velho que um dia estava a pastorear,  foi mordido por uma cobra venenosa e morreu. Era o único herdeiro e,  como o irmão mais novo não era filho do mesmo pai, não tinha direito à herança e foi por isso que o Djao Djaló ficou herdeiro do gado.

Depois das respostas da população, que não nos pareceram verdadeiras, tivemos que abandonar o local. Via-se mesmo na cara das pessoas que o perigo estava ali, na tabanca, a rondar-nos[3].

Na saída para Unago havia uma clareira com 500 metros, mais ou menos, e a companhia não podia entrar toda ao mesmo tempo, era perigoso. Pedi ao meu grupo quatro voluntários para a atravessar comigo.

Depois de chegarmos ao outro lado, fizemos sinal para a companhia começar a travessia, pelotão a pelotão, da mesma forma como nós tínhamos feito. Dali seguimos para uma tabanca, onde eu tinha um parente e amigo, o Adulai Djaló Unago. Ficava a pouca distância, demorou pouco mais de duas horas a chegarmos lá.

Fomos muito bem recebidos. Mandou os filhos buscar uma cabra e disse que era para o nosso almoço. Apresentei-lhe os meus colegas e almoçámos tarde, já passavam das 16h00. Depois, ainda ficámos quase uma hora na conversa até o tenente dizer que tínhamos de ir embora para o quartel.

Não fomos, deslocámo-nos para o nosso objectivo, onde chegámos pelas 18h00, e passámos a noite numa tabanca abandonada há muitos anos. Quando amanheceu, deslocámo-nos para a tabanca de Canjufa.

Quando entrámos na tabanca, dirigi-me à casa do Régulo, Serifo Inum Embaló. Mandou reunir todos os chefes das famílias para nos cumprimentarmos. Os milícias que lá estavam ofereceram-nos comida, uma cabra também, para o nosso almoço.

De manhã, tínhamos recebido, por rádio, a ordem de retirada. E depois dessa hora, nunca mais nos contactaram. Estávamos no dia 24 de Abril de 1974.

Passámos a noite em Canjufa, com a intenção de recolhermos ao Gabu 
[Nova Lamego, sede do CAOP 2]  . No dia seguinte, 25 de Abril, às 09h00, ouvimos o rádio. Golpe de estado em Lisboa?

Ficámos todo o dia à espera de mais notícias e decidimos permanecer no local até nova ordem.

Depois começámos a chamar pelo rádio, todos os postos. Piche, Pirada, Gabu, Bambadinca, ninguém respondia. Mais uma noite aqui, ordenou o Jamanca.

No dia 26, já passava das 16h00, depois de constantes chamadas pelo rádio, fomos contactados pelo comando-chefe, em Bissau. Que estavam a ouvir as nossas chamadas e perguntavam-nos quem éramos.

Jamanca respondeu, disse quem éramos e do comando-chefe mandaram-nos continuar em escuta. Ouvimo-los chamar o Gabu, dando-lhes ordem para nos virem buscar. Já passavam das 18 horas e ficámos a aguardar, até que mais ou menos uma hora depois, chegaram três Unimogues 404 para levar uma companhia inteira. Ocupámos, como pudemos, as viaturas e rumámos para o Gabu. O coronel, comandante do CAOP2, estava com um major, num gabinete, à espera que chegássemos.

Recebeu o Jamanca assim:

− Estou fodido contigo[4], Jamanca!

− Eu também estou, meu coronel.

E foi-se embora, deixou-nos ali, aos cinco oficiais, a olhar uns para os outros.

Sentámo-nos, todos calados. Uns minutos depois, chegou um major, em passo calmo.

 − Vocês estão aí, à espera de quê? Se é do nosso coronel, não adianta esperá-lo, ele só vem amanhã de manhã. É melhor irem à engenharia, para verem se há camas para vocês dormirem. E quem têm cá famílias, pode ir ter com elas passar a noite. Depois do pequeno-almoço, há uma coluna para Bambadinca. 

Assim fizemos. No dia seguinte[5], de manhã, regressámos à nossa unidade, a Bambadinca.

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Notas do autor ou do editor literário, o VB:

[1] Nota do editor: Coronel paraquedista João José Curado Leitão [o útimo comandante do CAOP Lestre / CAOP 2, extinto em 9/9/1974] 

[2] Nota do editor: em 23 de abril de 1974.

[3] Mais tarde viemos a saber que, naquela mesma altura, um grupo do PAIGC se encontrava de visita à tabanca. Os guerrilheiros estavam dentro das casas a observaram os nossos movimentos.

[4] Nós não sabíamos que o homem que andava de bicicleta a vender noz de cola quando regressou, foi falar com o coronel, comandante do CAOP2, informando-o que não tínhamos ido a Pajama e que, por esse motivo, não encontrámos o PAIGC.

[5] Nota do editor: 27 de abril de 1974.

(Seleção, fixação / revisão de texto, negritos, links, fotos, notas adicionais, título, subtítulo: síntese das partes anteriores: LG)
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Nota do editor:

Ultimo poste da série > 10 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25053: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XLI: Canquelifá, a ferro e fogo, no 1º trimestre de 1974