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sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23886: Notas de leitura (1533): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (8) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Dezembro de 2022:

Queridos amigos,
Dando continuidade à recensão desta obra onde se procura passar em revista as atividades da FAP na guerra da Guiné, dá-se a palavra aos autores para fazerem uma apreciação dos condicionalismos em termos de abastecimento e recursos, uma constante que jogou a desfavor das operações aéreas, ao longo dos anos da guerra. Passa-se igualmente em revista a natureza do armamento bélico, o tipo de armas de destruição usadas pela FAP, a necessidade de desenrascar peças, canibalizando aviões avariados. Estamos já no início da guerra, vamos seguidamente apreciar a evolução dos primeiros anos, pautados, primeiro, pelas dificuldades sentidas em captar a natureza da estratégia da luta armada, a sua escolha de pontos de apoio em locais do Sul, do Leste e da região do Morés; a resposta de fixação de destacamentos para apoio das populações e a imprescindível utilização da FAP não só em missões de soberania, de acompanhamento das atividades operacionais e de transporte de feridos, tanto militares como civis.

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (8)


Mário Beja Santos

Este primeiro volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/. Depois de sumariar o prefácio, entrámos no primeiro capítulo intitulado “O Vento da Mudança”, verificaram-se as alterações operadas no início da era de descolonização e as consequências que vieram a ter na colónia da Guiné. Seguiram-se outros capítulos, fez-se a contextualização sobre a ascensão dos movimentos de libertação e estamos nesta altura já a falar sobre a implantação da FAP na Guiné num contexto de Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, 1961, prepara-se Bissalanca para as operações de combate mediante de um programa de construção para reabilitar e ampliar a pista do aeródromo, também com a construção de hangares e outras instalações para manutenção e suporte. Verificou-se que um dos problemas mais prementes que se punha à FAP eram as peças, que demoravam muito a chegar e levantavam seríssimos problemas de manutenção. A situação prolongou-se pelos anos seguintes, num relatório de 1961 escrevia-se que a frota DO-27 estava quase totalmente aterrada e só 3 dos 19 helicópteros Alouette-III estavam em perfeitas condições para o combate. Os sucessivos pedidos para estabelecer instalações de manutenção na Guiné não foram atendidos, o que forçava a FAP a canibalizar alguns aviões para obter peças. Estes problemas de manutenção afetaram também as aeronaves que serviam a Guiné: por exemplo, 1 em cada 5 voos dos transportes DC-6 da FAP sofria de falhas de motor enquanto voava de Portugal para África.

O abastecimento de munições também se revelou muito difícil, para o general Diogo Neto revelou-se um dos maiores problemas: “Utilizámos sempre o que estava disponível, o que nem sempre foi o mais adequado. O arsenal nunca esteve satisfatoriamente abastecido, o que obrigava a restrições mensais no consumo”. Dada a intensidade da guerra na Guiné, esta situação só poderia deteriorar-se. No auge da guerra, a FAP consumia mais munições na Guiné do que em Angola e Moçambique juntas. Para mitigar a carência, recorria-se ao fabrico português, incluindo metralhadoras recuperadas de aviões desmantelados.

As bombas de gravidade usadas na Guiné eram de 500 libras, havia bombas comuns de 50 kg e bombas de fragmentação de 20 libras, 15 kg e 200 kg. Usaram-se igualmente foguetes de fragmentação e a munição usada com menos frequência eram foguetes de alta velocidade de 5 polegadas lançados do Neptune e os foguetes de 68 mm disparados pelos T-6 em algumas missões. A partir de 1964, a FAP também empregaria armas incendiárias na Guiné.

Oficialmente, o napalm e o fósforo branco deveriam ser usados “apenas contra alvos militares bem referenciados e em áreas de difícil penetração”. A despeito da crítica internacional contra o uso do napalm e armas semelhantes, as autoridades portuguesas continuaram o seu uso durante a guerra.

Qualquer arsenal aéreo, por mais bem abastecido que esteja, será irrelevante desde que não disponha de pessoal treinado para o empregar. A FAP na Guiné avaliou sempre as suas tripulações em escassez crónica. O ex-Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, General Lemos Ferreira, observou a disparidade de haver 40 mil homens a combater em meios terrestres contra 60 ou 70 pilotos. Durante os primeiros anos da FAP na Guiné o número nunca ultrapassou os 30, número por demais insuficiente para operar com as aeronaves disponíveis. O número de pilotos aumentaria no final de 1964 e teve o seu ponto mais alto em setembro de 1963, seja como for era um número insuficiente. Em resultado da permanente falta de tripulações, os pilotos voaram um número extraordinariamente elevado de horas e em diferentes aeronaves.

No início da década de 1970, o tempo médio de voo acumulado para cada um dos pilotos é de 2731 horas, número excessivamente elevado. 2 anos de comissão era já um período de exaustão, atendendo às condições de vida, ao clima e à natureza da luta. Não se encontravam voluntários para mais 2 anos. Em 1967, o Ministro da Defesa Nacional visitou a Guiné, e pôde constatar uma série de fatores que impactavam negativamente o moral das forças portuguesas, o clima era considerado devastador. Houve mesmo um diplomata norte-americano que visitou a Guiné e que observou durante os 5 dias de estadia que era mais quente do que ele tinha experimentado na selva amazónica. Até os assessores cubanos do PAIGC se queixavam do calor e das durezas do clima. Mesmo na pacífica Bolama passavam-se tarde opressivas, esperava-se impacientemente pelas ventoinhas do teto para estar no refeitório.

A despeito deste quadro de constrangimentos, pode observar-se que a FAP na Guiné pôde a seu modo constituir-se um modelo de organização. Essa organização e a doutrina que lhe estava subjacente, pessoal e aeronaves, iriam ser postos à prova na escalada da guerra.

Estamos agora em novo capítulo, entrou-se na guerra, contrariando todas as previsões que apostavam em ataques fronteiriços, a primeira flagelação do PAIGC foi em Tite, a 25 kms em linha reta de Bissau, nessa mesma data militantes do PAIGC emboscaram forças portuguesas na região de Fulacunda, a 25 kms a leste de Tite. Entrava-se num quadro estratégico que fora esboçado em agosto de 1961, a passagem para a insurreição armada, envolvendo formas possíveis de sabotagem, flagelações e outras formas de intimidação das forças portuguesas. No segundo semestre de 1962, o PAIGC lançara uma campanha de ataques de pequena escala, cortando comunicações, desarticulando as vias comerciais, lançando em pânico as populações, isto na região sul. Em dezembro de 1962, o PAIGC anunciou publicamente “o uso de todos os meios necessários na luta pela autodeterminação e pela independência”. Nesse mesmo mês, as informações policiais colheram provas de que elementos armados do PAIGC estavam reunidos em Koundara, na fronteira da Guiné-Conacri, serão porventura estes os efetivos que atacaram Tite. Por este tempo já se tinha reforçado consideravelmente o efetivo militar no território, em termos terrestres. O contingente, em 1958, era de cerca de 900 militares do Exército, operando a partir de Bissau e Bolama, estes efeitos aumentaram em 1959. No final de 1962, o efetivo rondava os 5 mil homens distribuídos por 10 pontos em todo o território.

Neste contexto de início de guerra, os aviadores e pessoal de apoio cumpriram uma variedade de requisitos operacionais. Com efeito, as missões pré-guerra do ZACVG incluíam formação, obtenções de informações, faziam voos de soberania, sobretudo nas áreas menos acessíveis pelos meios terrestres. As aeronaves de transporte e outras revelaram-se da maior importância quando o Exército procurou estabelecer-se no interior. Mas os seus ativos eram criticamente escassos.

Todos os três teatros viram aumentar o uso de napalm, apesar do consumo ter sido mais intenso na Guiné do que em Angola ou Moçambique (Coleção Jochen Raffelberg)
Manutenção de um T-6 em Bissalanca (Coleção José Nico)
Bombas de napalm de 80 kg (Coleção Jochen Raffelberg)
Uma amostragem das munições transportadas por um F-86F (Arquivo Histórico da Força Aérea)

(continua)

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Notas do editor

Poste anterior de 9 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23859: Notas de leitura (1530): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (7) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 16 DE DEZEMBRO DE 2022 >
Guiné 61/74 - P23885: Notas de leitura (1532): "Panteras à solta", de Manuel Andrezo (pseudónimo literário do ten gen ref Aurélio Manuel Trindade): o diário de bordo do último comandante da 4ª CCAÇ e primeiro comandante da CCAÇ 6 (Bedanda, 1965/67): aventuras e desventuras do cap Cristo (Luís Graça) - Parte VIII: O Prémio Governador da Guiné para o sold Baldé

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23815: Notas de leitura (1522): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (5) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Novembro de 2022:

Queridos amigos,
Dando continuidade à exposição que os autores fazem quanto ao elenco de aeronaves que participaram nos 3 teatros de operações, aqui se procede a uma súmula de quem foi quem no combate aéreo, no transporte de seres humanos e armamento, na vigilância aérea durante as operações terrestres, entre outras atividades. Aqui se fala nos helicópteros de que guardamos memória, os Alouette II e III, o Dakota e o DO-27, cada um de nós guarda seguramente memórias de viagens benignas ou associadas a operações ou transporte de feridos. Os autores recordam a doutrina da NATO para a defesa euro-atlântica a como esta se revelou dinâmica na preparação de pilotos que foram confrontados, sobretudo pelos franceses e pelos britânicos do que era o combate à contrainsurgência. Aparentemente, tudo levava a crer nessa fase inicial de que a superioridade aérea não merecia discussão, o fornecimento da sofisticada artilharia e mais tarde dos mísseis terra-ar ainda não estava previsto.
Veremos adiante como se processou a escalada da guerra.

Um abraço do
Mário



O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974
Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (5)


Mário Beja Santos


Este primeiro volume d’O Santuário Perdido, por ora só tem edição inglesa, dá-se a referência a todos os interessados: Helion & Company Limited, email: info@helion.co.uk; website: www.helion.co.uk; blogue: http://blog.helion.co.uk/. Depois de sumariar o prefácio, entrámos no primeiro capítulo intitulado “O Vento da Mudança”, verificaram-se as alterações operadas no início da era de descolonização e as consequências que vieram a ter na colónia da Guiné.

Dando continuidade ao capítulo “Aviões com a Cruz de Cristo”, depois de ter falado do Neptune, Invader, Harvard, Sabre e do Fiat G.91, é a vez de introduzir o Alouette II e o Alouette III. O Alouette II, de 5 lugares, foi o primeiro helicóptero a turbina, veio suplantar os motores de pistão mais pesados. Entrou em funções em junho de 1955 e a sua produção acabou 20 anos depois, foi usado em cerca de 50 países. O Alouette II teve grande desempenho na Argélia, no Congo, na Rodésia, bem como na África colonial portuguesa. Este helicóptero chegou ao Montijo em 1957, em 1960 já estava em Angola. O Alouette III beneficiou de algumas melhorias, tinha um motor mais potente e uma maior capacidade de carga (até 6 passageiros ou 2 toneladas de carga). Um piloto português observou que era uma “aeronave extraordinariamente robusta e fácil de pilotar”. Tinha fatores muito positivos do seu lado: exigia apenas meia hora de manutenção a cada hora de voo, possuía maior robustez, e era conhecido por sobreviver a fogo de armas ligeiras e até mesmo disparos de rockets antitanque. O Alouette III fez história durante décadas, andou nos combates no Zimbabué e nos conflitos fronteiriços da África do Sul, na guerra indo-paquistanesa, nos 3 teatros da guerra que Portugal travou em África. A FAP recebeu 142 Alouettes III entre 1963 e 1975, a sua carreira lendária findou em 2020.

O Auster foi muito utilizado na Segunda Guerra Mundial, era uma aeronave multiusos, possuía uma manutenção rudimental; chegou a Portugal em 1961, foram adquiridas 15 aeronaves no Reino Unido e outras 147 foram montadas nas Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, dos quais 102 estiveram ao serviço operacional em África. Não era muito apreciado por ter uma descolagem um tanto difícil e os pilotos temiam a sua tendência de fazer um loop no solo. No entanto, teve um papel de destaque na fase crucial da guerra. Transportava os feridos, servia como posto de comando e pousava em pistas rudimentares. Foi retirado do serviço da FAP em 1976.

O Broussard foi concebido para satisfazer exigências do exército francês, entrou em serviço operacional na Argélia em operações e missões de busca e salvamento, tendo seguido mais tarde para o Chade. Portugal encomendou 5 aeronaves para entrega em 1960, estiveram ao serviço até 1976. O DO-27 foi produzido em massa na Alemanha. Foi das aeronaves mais apreciadas nos diferentes teatros de operações, pelo seu desempenho, a sua capacidade operacional e a facilidade de manipulação. Precisava de apenas 70 metros para descolar e apenas de 50 para pousar. Entrou ao serviço em dezembro de 1961 e foi retirado em 1979. O Dakota era o nome por que era conhecido no Reino Unido o Douglas C-47, ganhou estatuo lendário pela sua participação nas mais célebres campanhas de transporte aéreo, logo na operação Overlord, o desembarque da Normandia em 6 de junho de 1944. Serviu para transporte de tropas, avião de carga, bombardeiro, avião de reboque planador, transporte de feridos. Entrou na FAP em 1943, esteve na guerra de África e foi retirado em 1976 do serviço da FAP. O Skymaster nunca atuou na Guiné. Foi da maior importância o seu desempenho quando os soviéticos cercaram Berlim, os Skymaster tiveram desempenho fundamental no abastecimento da cidade cercada. Foi a primeira aeronave a seguir para Luanda, perderam-se 3 em acidentes, esteve operativo até 1973.

O DC-6 era o concorrente direto da Douglas com a Lockheed, atuou na guerra da Coreia. Portugal comprou 10 aviões usados DC-6 à Pan American, foi-lhes destinado o serviço ultramarino, viagens entre Lisboa e Moçambique. Esteve operacional até 1978. O Boeing 707 gozou de uma grande popularidade, era o símbolo de uma nova tecnologia e de um moderno design, a Boeing construiu 1000 aeronaves entre 1958 e 1978; possuía variantes militares para vigilância e reconhecimento, comando e controlo. Os TAP adquiriram três 707 para uso comercial, adquiriram-se outros tantos para o serviço da frota transoceânica.

Importa acrescentar que muitas das aeronaves da FAP foram projetadas e fabricadas para cumprir os papéis do poder aéreo segundo a doutrina da NATO. O F-86F, por exemplo, distinguiu-se em combates aéreos contra caças soviéticos; o F-84G foi utilizado por Portugal em Angola; o Neptune foi otimizado para a guerra submarina e o Fiat G.91 foi explicitamente concebido para satisfazer um requisito da Aliança Atlântica. As aeronaves da FAP envolvidas na política de defesa euro-atlântica da NATO tinham base permanente em Portugal Continental e nos Açores.

A adesão à NATO teve um sério impacto nas Forças Armadas e introduziu mudanças radicais na formação, táticas e doutrina. Com o incentivo de Humberto Delgado (adido militar em Washington) e do Chefe de Estado-Maior, General Botelho Moniz, um número crescente de oficiais da Força Aérea esteve em cursos e exercícios no estrangeiro – é a geração NATO, que induziu os comandos das Forças Armadas a mudar a orientação para um uso adequado do poder aéreo. Os principais aliados nesta operação de formação foram a França e a Grã-Bretanha, eram os dois maiores impérios europeus e estavam confrontados com sublevações nacionalistas, tinham larga experiência em campanhas de contrainsurgência. A FAP não possuía experiência de combate para enfrentar estes conflitos armados, enviou oficiais para formação, vieram inclusivamente palestrantes e até docentes que lecionaram no Instituto de Altos Estudos Militares quanto ao papel da aviação em guerra subversiva.

Entre 1959 e 1963, um punhado de oficiais frequentou cursos de teoria revolucionais e contrainsurgência orientadas pelas Forças Armadas francesas, britânicas, norte-americanas e até belgas. Publicaram-se manuais de apoio aéreo na contraguerrilha. A expetativa para a FAP parecia lisonjeira, os franceses na Indochina e na Argélia, os britânicos na Malásia e no Quénia, entre outros, desfrutavam inequivocamente de uma superioridade sobre inimigos que não podiam adquirir ou operar com meios aéreos nem possuíam artilharia antiaérea. Teve-se inicialmente a ilusão de que a FAP só precisava de meios relativamente modestos e que as aeronaves da FAP poderiam ser usadas numa grande variedade de funções.

A evolução da guerra comprovou que era mesmo ilusão, havia que evoluir para adversários cada vez melhor equipados.
Alouette II
O Alouette III foi o mais importante helicóptero utilizado por Portugal em África
A enfermeira paraquedista Maria Arminda dentro de um DO-27
Um Dakota na Guiné

(continua)

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Notas do editor

Poste anterior de 18 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23794: Notas de leitura (1519): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (4) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 24 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23811: Notas de leitura (1521): "Uma longa viagem com Vasco Pulido Valente", de João Céu e Silva (Lisboa, Contraponto, 2021, 2924 pp) - O Estado Novo, a guerra colonial, o Exército e o 25 de Abril (Luís Graça) - Parte III: Salazar, Caetano e as Forças Armadas... (Considerar os capitães milicianos como "voluntários" e "mercenários", raia o insulto, não?!..)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Guiné 61/74 - P21850: FAP (122): Memórias que o tempo não apaga ou uma crónica de bons malandros! (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA)

Equipa de manutenção FIAT em 1967


1. Em mensagem de 31 de Janeiro de 2021, o nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69) fala-nos de:


Memórias que o tempo não apaga ou uma crónica de bons malandros!

A minha entrada na FAP foi registada em Maio de 1966 após rigorosa inspecção médica que me qualificou como apto para todas as especialidades da Força Aérea Portuguesa. Tinha então 17 anos de idade.
Após três meses como soldado aluno recruta, passei a integrar o GITE (Grupo de Instrução Técnica de Especialistas) que formou mais de 15.000 técnicos durante o período da Guerra do Ultramar.
A escolha de Especialidade dependia em primeiro lugar das qualificações académicas. Toda a gente tinha pelo menos o 5.° Ano do Liceu, ou o equivalente da Escola Secundária. Muitos já com o Curso Liceal concluído, o que quer dizer que em caso de "chumbo" fisico ou académico, iria tudo parar ao Exército, como Oficiais ou Sargentos Milicianos. Em caso de sonegaram habilitações académicas, era garantido que passariam ao Serviço Geral da FAP como Soldados, cumprindo apenas mais um ano de Serviço. Bastante estranho, uma vez que na FAP, todos seriam apenas e só 1.° Cabos Especialistas. A não ser que metêssem o "chico" de 1.° Cabo ninguém saía.

No meu caso, como tinha terminado recentemente o Curso Industrial na área de Tecnologia Mecânica, a escolha não foi dificil. As disciplinas eram-me quase todas familiares, exceptuando as aulas de aerodinâmica, motores, e dos sistemas hidráulicos, pneumáticos, pressurizantes etc.
Passado um ano, recebi o "meu canudo" de apto na especialidade MMA (Mecânico Material Aéreo) vulgo Mecânico de Aviões.
Como prémio pela minha boa qualificação de curso, foi-me concedida a primazia de escolher a Base Aérea onde iniciaria a minha actividade.
Como residente em Lisboa, a escolha teria que necessáriamente recair no AB1 em Figo Maduro :(Aeroporto de Lisboa)

O meu primeiro contacto com aeronaves foi assim como 3.° mecânico de bordo do DC-6.
Passados uns meses, recebi guia de marcha com destino à ZACVG (Zona Aérea Cabo Verde e Guiné)

Foi assim, que no dia 27 Setembro 1967, embarquei no DC-4 7504 Skymaster, com escala nas Ilhas Canárias e pernoita na Ilha do Sal.
A Esquadra de Tigres de Bissalanca e os Fiat's G-91 foram o meu destino a partir do inicio de Outubro 67 e até meados de 1969.
Assim, na minha curta passagem pela FAP, registei nas sucessivas décadas de operação, competentes Comandantes e Aviadores... homens de grande carácter com quem tive o privilégio de interagir.

Verificação do Pylon

Na FAP, ao contrário dos outros ramos das Forças Armadas, por força das circunstâncias, foi sempre previligiada a relação individual em detrimento do colectivo.
É, quanto a mim natural, que consoante as convivências nas diferentes décadas se tenham desenvolvido particulares simpatias e cumplicidades entre superiores e subordinados.
Nalguns casos, amizades que perduraram através dos tempos e ainda hoje se mantêm.
Como a vasta maioria, deixei a FAP, no terminus do meu contrato.
Muitos outros, com quem me cruzei, Militares de carreira por escolha e convicção prosseguiram até atingirem altas patentes e cargos de enorme relevância nos destinos do nosso país.
Mantenho contacto e amizades sólidas com alguns deles.
Cada um com a sua personalidade própria, rigorosos, todos eles! Afáveis alguns, outros nem tanto...
Afinal somos todos diferentes.

Alguns já não se encontram entre nós, como o
General Manuel Diogo Neto, por duas vezes meu Comandante na BA2 e BA12 já desaparecido.
O General Fernando Vasquez, meu Comandante de Esquadra, simbolo de correcção e tratamento tanto com os seus pares, como com subordinados, amistoso com toda a gente que com ele lidou. Um príncipe entre militares!
O General Fernandes Nico, uma amizade que perdura há mais de 50 anos. Militar e Historiador, homem rigoroso, frontal, educado e que viu sempre a FAP, como um todo, em que todos eram parte importante da instituição FAP.
Sargentos, Furriéis, 1.° Cabos Especialistas, como eu. Soldados do SG, Polícia Aérea, Enfermeiras Para-Quedistas, e Pilotos / Aviadores.



Formámos um todo, uma família unica à qual me orgulhei de pertencer!
Sentimento de contentamento, porque embora indirectamente, contribuímos com o nosso esforço para ajudar os camaradas do Exército e da Marinha, que por inerência de funções tinham a vida em risco permanente.
A todos as minhas saudações e abraço solidário.

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Nota do editor

Último poste de Mário Santos de 28 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21399: Efemérides (335): Cumpre-se hoje 28 de Setembro, 53 anos da minha chegada à Guiné no HC-54 Skymaster 7504. Uma memória com mais de meio século (Mário Santos, ex-1.º Cabo MMA)

Último poste da série de 8 de Outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21431: FAP (121): Cor pilav Gualdino Moura Pinto, comandante da BA 12 (1971/73), já falecido: "um grande líder" (Victor Barata, fundador e editor do blogue Especialistas da Base Aérea 12, e membro sénior da nossa Tabanca Grande)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10915: O cruzeiro das nossas vidas (18): O meu batismo de voo, em 28 de março de 1973, num DC 6 da FAP (Abílio Magro)

1. Comentário do nosso leitor e camarada Abílio Magro ao poste P10912 (*):

28MAR1973, Aeroporto de Figo Maduro, Abílio Magro, 21 anos, Fur Mil Amanuense...

Embarco num DC6 da FAP com destino ao TO da Guiné, efectuando o meu baptismo de voo, já que se tratava da minha 1ª viagem de avião.

Calhou-me em sorte um lugar à janela, junto à asa direita da aeronave.
Á minha esquerda senta-se um barbudo e espadaúdo Fuzileiro com aspecto de já ter algumas comissões no "papo".

O DC6 arranca e, à medida que a velocidade aumenta, sinto que tudo aquilo treme e fico com a sensação de que, a qualquer momento, vai saltar um qualquer parafuso ou rebite. Já nem sei se quem treme sou eu, ou a aeronave.

Passada, talvez 1 uma hora, olho pela janela e vejo um dos motores da asa direita a verter óleo às golfadas. Calculo que as minhas feições tenham tomado um aspecto de aflição tal, que o Fuzileiro barbudo sentado a meu lado se apressou a sossegar-me:
- Não se preocupe, tem 2 motores em cada asa e aguenta "x" horas com só 1 em cada lado e, se pararem os quatro, aguenta "y" tempo a planar.

Para quem voava pela 1ª vez, aquela informação "sossegou-me completamente (!!!)".
Acabamos por aterrar na ilha do Sal, onde não saímos do Aeroporto e, depois de feita a manutenção, lá seguimos para Bissau, onde chegamos passadas 4 horas, de farda nº2, com blusão e camisola interior de manga comprida.

Quarta-feira, Janeiro 09, 2013 11:53:00 a.m.
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 8 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10912: O cruzeiro das nossas vidas (17): Relembrando as nossas separações e partidas...

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3259: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (6): Alguns esclarecimentos (Jorge Félix)

1. Mensagem do nosso camarada Jorge Félix, ex-Alf Mil Pil Av, de hélis (Bissalanca, 1968/70), com data de 24 de Setembro de 2008.

Caro Carlos,

Já sei que te caiem muitos emails em cima da mesa. Este vai ser mais um, mesmo antes de ter sido feita a emenda ao autor do poste sobre o Honório (*).

Desta vez gostaria de chamar a atenção do seguinte:

i - Quem ler no Poste 3232 - "um alferes e o piloto da aeronave, cuja identidade se desconhecia, até o membro da nossa Tabanca Grande, o Jorge Félix, ex-Alf Pil Av, identificar a aeronave (um Cessna vermelho) que pertencia aos TAGCV - Transportes da Guiné e Cabo Verde e o piloto, de nome Castro... Ou seja naquele tempo (1970/71) já havia aviação civil, mesmo que só houvesse um Cessna vermelho...", ficará com a ideia que a informação não está correcta. Como fui eu que a dei quero também acrescentar mais um ponto.

O Castro era mais um de muitos Pilotos de cor que a FAP tinha. À data, 1969/70, os TAGV tinham mais que aquele Cessna vermelho. Se fizer um esforço de memória, recordará também um não menos famoso Comandante Pombo, piloto chefe dos TAGV. Em inícios de 1971, entrou para os TAGV o furriel Duarte, ...

"Mesmo que só houvesse um Cessna ...." não está correcto. Gostaria que emendassem isso, os TAGV tinham vários aparelhos.


Guiné > Região de Tombali > Guileje CCAÇ 2617, Magriços do Guileje, Março de 1970 / Fevereiro de 1971 > CCAÇ 2617... A chegada da avioneta com o correio (e, às vezes, alguns víveres)... Na foto, em primeiro plano, da esquerda para a direita, o Fur Mil Abílio Pimentel, um alferes e o piloto da aeronave, cuja identidade se desconhecia, até o membro da nossa Tabanca Grande, o Jorge Félix, ex-Alf Pil Av, identificar a aeronave (um Cessna vermelho) que pertencia aos TAGCV - Transportes da Guiné e Cabo Verde e o piloto, de nome Castro... Ou seja naquele tempo (1970/71) já havia aviação civil.


ii - O Branquinho diz agora que estava convencido que o Honório voava T6. Na verdade o Honório voou T6 na primeira comissão, mas, e daí ficou a sua lenda, como fazia rapadas abaixo do nível do mar, a fim de acertar nos trabalhadores das bolanhas, foi impedido de voar T6 e passou a voar somente DO27.

Uns postes antes (P3224) Branquinho dizia:

- O zunir dos motores de um FIAT, que voasse baixo, era (naturalmente!) pilotado pelo Honório e por mais ninguém. Não tinham dúvidas.

Foi esta parte sem muita importância que eu pedi para corrigirem. O Honório nunca foi piloto de Fiats.

Quem é que ficou incomodado com a referência a "preto"e "mulato" no meu texto do Poste 3224 a propósito do Honório, Alberto Branquinho? Vamos a ter atenção às datas dos outros Postes.

...Escrevi um texto em que entrava a NÔNÔ, o Cap Neto (Julgo que natural do Congo ex-Belga) (se não é este, as minhas desculpas) e o Honório.

Enquanto olhava para a minha cor deparei com o meu umbigo e depois de com ele muito conversar, resolvi não falar nada dessas relações. Vejam nas reticências, ... a história que nunca será contada.

Sempre evitei falar dos acontecimentos do ultramar, porque achava que as pessoas não as entendiam. Nunca pensei que aqueles que por lá também andaram não as pudessem entender.

Vou dar conhecimento deste post aos Especialistas da BA12 por terem sido visados nesta troca de mimos.

Jorge Félix
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Nota de CV

(*) Vd. postes anteriores desta série:

22 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3224: Não venho falar de mim... nem do meu umbigo (Alberto Branquinho) (7): Honório, o aviador...

23 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3226: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (1): Honório, Sargento Pil Av de DO 27 (Jorge Félix / J. L. Monteiro Ribeiro)

24 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3232: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (2): O Honório, meu amigo (Torcato Mendonça / Alberto Branquinho)

24 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3234: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (3): O Honório que eu conheci... em Luanda (Joaquim Mexia Alves)

26 de Setembro de 2008 Guiné 63/74 - P3245: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (4): Honório, o cow-boy dos ares (José Nunes)

3o de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3256: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (5): Lembrando o Ten Pil Av Bettencourt (Henrique Matos)

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3197: Os nossos regressos (16): Bendita hepatite...(Henrique Matos)


Ilustração de Joana Graça (2008), designer e filha do Luís Graça, para "Os nossos regressos". Com os nossos agradecimentos.



Um regresso... inesperado!!!


Nos finais de 1967 (isto de datas e outros pormenores varreram-se completamente da minha memória, vamos a ver se arranjo uma oportunidade para consultar o meu processo) estava colocado no Comando Chefe em Bissau, aquele edifício que ficava nas traseiras do Palácio do Governador.
Tinha como missão preparar as reuniões do então Governador Arnaldo Schultz com os comandantes dos 3 ramos, que se realizavam ao fim da tarde numa sala específica que tinha numa das paredes um grande mapa da Guiné.
O serviço, onde apenas entrava eu, um major e um coronel, consistia em receber os relatórios diários e transpôr para o mapa todos os dados (operações, mortos, feridos, capturas, acções IN, minas, bombardeamentos, etc..) de tal forma que ao fazer uma leitura do resumo no início da reunião fosse rapidamente perceptível a situação no terreno. No mesmo edifício havia ainda pelo menos outro departamento ligado à espionagem.


No jardim do Comando Chefe com um militar da Força Aérea ali colocado.


Já agora uma pequena historieta para desanuviar. Certo dia aparece-me o brigadeiro que comandava o exército com ar irritado e diz:
- Sr. Alferes, vá lá fora e ensine ao sentinela que deve apresentar armas a um oficial superior.
Fiquei admirado com a atitude até porque nem conhecia os elementos que faziam a guarda, mas havia que obedecer e lá fui. Deparei-me com um soldado com todo o aspecto de periquito acabado de desembarcar, tolhido de medo, pois tinha levado um raspanete do brigadeiro, que percebia pouco de manejo de armas e ainda menos de galões, sobretudo quando se tratatava da marinha. Lá lhe ensinei uns rudimentos, mas, como vi que cada vez se atrapalhava mais, disse-lhe:
- O melhor é apresentar armas a toda a gente porque aqui quase tudo é de coronel para cima.
Quando um dia de manhã me apresento, como era habitual, no gabinete do coronel, este fixa-se nos meus olhos e diz:
- Você está com uma bruta icterícia, vá mas é já para o hospital.
Assim mais uma vez entrei no célebre HM 241 e, após a consulta , fiquei logo internado no pavilhão de isolamento onde só havia hepatites. Passados poucos dias vem a notícia que ia ser transferido para Lisboa.


DC6 no aeroporto de Bissalanca. Foto retirada, com a devida vénia, do site Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74, criada pelo nosso camarada Victor Barata, a quem mandamos um abraço de parabéns pelo sucesso do seu blogue.


Levaram-me então para o aeroporto de Bissalanca onde já estava um DC6 da Força Aérea a carregar militares, quase tudo feridos graves, vários em macas. Dentro do avião respirava-se um ar pesado, cheirava muito a desinfectantes e lembro-me que quando levantou reparei que um dos motores da asa do meu lado deixava cair óleo e pensei:
- Será que esta traquitana chega mesmo a Lisboa?

E chegou, mas às tantas da noite, indo estacionar no Figo Maduro, longe de olhares. Ao fundo da escada de desembarque já havia ambulâncias e outras viaturas militares onde fomos metidos e conduzidos aos hospitais, a maioria para o da Estrela e no meu caso para o HMDIC (Hospital Militar de Doenças Infecto-Contagiosas). O internamento foi longo mas eficaz, chegando ao mês de Abril do ano seguinte [1968]. Então, como as análises apresentavam valores normais e já perfazia cerca de 20 meses de comissão, carimbaram um papel e mandaram-me à vida.

Henrique Matos
Pel Caç Nat 52 (Enxalé e Porto Gole, 1966/68).

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