Foto: © Fernando Andrade Sousa (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Torres Vedras > Barro > O Fernando Andrade Sousa, ex- 1º cabo aux enf da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), em véspera de ir passar umas férias à Tunísia, mais o Umaru Baldé, já doente, no Hospital do Barro, nas imediações de Torres Vedras, em agosto de 2000 (e não de 2007, como erradamente foi indicado no poste P16382) (*). Foi a última vez que o Fernando (com a esposa) esteve com ele.
O Hospital do Barro (, instalado num antigo convento do séc. XVI), hoje desativado, fazia parte do Centro Hospitalar Oeste - Unidade de Torres Vedras. O Fernando lembrar-se de ele, Umaru, ter desaconselhado, ao casal, a viagem à Tunísia. Durante 24 anos, de 1975 a 1999, o Umaru Baldé andou em bolandas pela África subsariana e pelo norte de África, tentando chegar a Portugal, o que só conseguiu em 15/4/1999.
Esteve internado no Hospital do Barro em 2000 e, ao que parece, terá voltado para lá para morrer (no final do ano de 2004, segundo informação do António Fernando Marques, que foi ao seu funeral;: está sepultado do cemitério do Lumiar em Lisboa, no talhão dos muçulmanos) (**).
1. Carta do Umaru Baldé, "ex-1º Cabo [da] Força Armada Porttuguesa", datada de 15 de novembro de 2000, de agradecimento a quem o apoiou no momento difícil da sua doença (**):
(i) "obrigado minha médica [do] HJMAJ, TV - Hospital [dr.] José Maria Antunes Júnior, de Torres Vedras, ou Hospital do Barro, hoje desativado (, pertencia ao Centro Hospitalar do Oeste), a pneumologista dra. Paula Raimundo;
(ii) os drs. Júlio e Félix, do Hospital de Pulido Valente, Centro Hospitalar de Lisboa Norte, Lisboa (onde o Umaru foi operado em 11/10/2000) [julgo tratar-se, respetivamente, do dr. Júlio Semedo, pneumologista, coordenador da unidade de pneumologia de intervenção; e do dr. Francisco José Pimenta Félix, que dirige o serviço de Serviço de Cirurgia Torácica];
(iii)) antigos camaradas portugueses na Guiné, ex-alf mil Mário Pina Cabral (CART 11, 1969/70), ex-fur mil [António Fernando] Marques e ex-sold radiotelegrafista João Ramos [CCAÇ 12, 1969/71) (com quem trabalhou na Somague, durante 8 meses);
(iv) e ainda povo da freguesia de Ventosa, Torres Vedras;
A carta, escrita no dia em que teve alta do Hospital Pulido Valente, termina com dois vivas;
"Viva Médicas e Médicos Portugueses";
"Viva Portugal com os Negros Unidos" (sic).
O Umaru Baldé diz explicitamente que teve "10 meses" internado nos hospitais portugueses, entre o Hospital Curry Cabral (, especializado em doenças infetocontagiosas) e o Hospital do Barro. de retaguarda (onde funcionava um serviço de pneumologia). O Umaru Baldé não esconde a gravidade da sua doença: a dra. Paula Raimundo, do Centro Hospitalar Oeste, tratou-o durante 9 meses da doença pulmonar de que sofria, já estava "curado" há 2 meses dos pulmões, quando surgiu outra "doença muito grave", tendo sido referenciado para o Hospital Pulido Valente.
Na carta o Umaru Baldé diz que, desde que chegou a Portugal, em 15/4/1999, esteve 12 meses sem trabalhar, sem tendo sequer título de residência.
Mais diz que, ao ao fim no seu exílio de 24 anos (desde que saíra da sua terra natal. em finais de dezembro de 1974), nunca tivera confiança em hospitais que não fossem portugueses...
Tratado em Portugal, acabou por sobreviver mais alguns anos: não sabemos exatamente a data da sua morte, mas pensávamos que teria ocorrido em finais de 2004 (e não em 2007/2008, como indicado erradamente em postes anteriores).
A última carta que o Valdemar Queiroz, seu instrutor no CIM de Contuboel em março-maio de 1969, recebeu dele, tem a data de 18 de abril de 2003, quando o Umaru estava a tentar arranjar dinheiro para a viagem de regresso à sua terra, cada vez mais doente, sem trabalho e sem esperança... Seriam também os seus antigos camaradas (da CART 11 e da CCAÇ 12) que se quotizaram para lhe pagar o bilhete de regresso a Portugal, possivelmente já em 2004.
Não temos a certeza se morreu no antigo Hospital do Barro onde, ironicamente, haveria de morrer, anos mais tarde, Luís Cabral (1931-2009), também ele vítima de doença prolongada... O Umaru esteve no Hospital do Barro seguramente em 2000, falta confirmar se lá voltou depois do seu regresso da Guiné-Bissau (c. 2003/2004).
Não se encontraram, mas poderiam hipoteticamente ter-se encontrado (e essa seria uma ironia da História!), no "terminal da morte" que era então o Hospital de Barro, a "vítima" (Umaru Baldé) e o "carrasco" (Luís Cabral)...
Foi sob o regime de Luís Cabral que se assistiu à perseguição, prisão, tortura e, em muitos casos, execução brutal, sumária, de antigos militares guineenses que integraram as nossas NT (incluindo milícias e polícia administrativa). Estes crimes, qualquer que seja a sua tipificação (crimes de guerra, crimes contra a humanidade, etc.) não podem prescrever... Pelo menos na nossa memória e no nosso blogue, não prescrevem... (LG)
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 12 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16382: Álbum fotográfico de Fernando Andrade Sousa (ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 12, 1969/71) - Parte III: Lembrando, com saudade, o "puto" Umaru Baldé
(**) Vd. postes anteriores:
27 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16530: (In)citações (101): As outras cartas da guerra... Do Umaru Baldé, da CART 11 e CCAÇ 12, para o Valdemar Queiroz (Parte III): E a propósito...o Umaru Baldé e o Luís Cabral que eu conheci... Eventualmente por uma diferença de alguns anos não se encontraram, no "terminal da morte" que era então o Hospital do Barro, em Torres Vedras, a vítima (Umaru Baldé, c. 1963-2005) e o carrasco (Luís Cabral, 1931-2009) (Abílio Duarte, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70)
27 de setembro 2016 > Guiné 63/74 - P16527: (In)citações (100): As outras cartas da guerra... Do Umaru Baldé, da CART 11 e CCAÇ 12, para o Valdemar Queiroz (Parte II): "Portugal, os portugueses e os políticos que querem esquecer os passados" (sic)... Ou a Pátria portuguesa que lhe foi madrasta...
26 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16525: (In)citações (99): As outras cartas da guerra... Do Umaru Baldé, da CART 11 e CCAÇ 12, para o Valdemar Queiroz (Parte I): "Filho único e menino, minha mãe chorou quando, em 12 de março de 1969, alferes me foi buscar a Dembataco para defender a pátria portuguesa"