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segunda-feira, 17 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27433: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (15): recordações do meu tempo de menino e moço (Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, CefInt / QG / CTIG, Bissau, 1973/74)


Aurélio Gonçalves (1901-1984), "Nhô Roque",
"nick name" que o Carlos Filipe Gonçalves 
herdou do seu tio

Foto: Bibliotwca Nacional de Cabo Verde.
1. O I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (10 de agosto-3 de outubro de 1935) e os 50 anos de independência de Cabo Verde (5 de julho de 1975) continuam a ser um pretexto para ouvirmos alguns dos nossos amigos e camaradas cabo-verdeanos, e para mais mindelenses, como é o caso do Carlos Filipe Gonçalves (n. 1950) e o Adriano Lima (n. 1943).  O Carlos vive hoje na Praia, sendo radialista e jornalista aposentado, mas continua ativo como o unvestigador musical. (Fez no passado dia 12 de outubro, très quartos de século;
o nosso blogue ainda vai a tempo de lhe desejar boa continuação da caminhada pela picada da vida, 
com a proteção dos nossos bons irãs
da Tabanca Grande.)

 O Adriano Lima, por sua vez,  vive em Tomar, é cor inf reformado, escritor e colaborador do blogue Praia do Bote e do jornal Expresso das Ilhas.  Deixou a sua terra natal em 1963 e só lá voltou 40 anos depois.

Espantosa coincidêncai, o Carlos acaba por revelar que viveram amos, nos anos 50, na mesma rua no Mindelo, Rua de Papa Fria, depois  Rua dos Descobrimentos,  atualmente, Rua António Aurélio Gonçalves,  tio do Carlos (O Aurélio Gonçalves, "Nhô Roque", 1901-1984,  é uma figura de referência da cidade do Mindelo e da cultura de Cabo Verde.)

Mensagem de Carlos Filipe Gonçalves

Data - quarta, 12/11/2025, 12:29 

Olá, Bom dia,

Desculpas, pelo atraso na resposta…. Olha, fiquei entusiasmadíssimo com os dois emails recebidos, sobre a visita a Mindelo do I Cruzeiro de Férias, em 1935. Mas, cliquei em todos os links, do «I Cruzeiro» que me enviaste…. Mas não tenho acesso! Talvez, porque o ficheiro é volumoso, deve levar um bom tempo para carregar… vou, pois, experimentar, outra vez, com mais vagar.

Mas, despertou-me logo a curiosidade para pesquisar num jornal daquela época, «Notícias de Cabo Verde»,  que publicou/publicava muitas notícias da vida social na cidade do Mindelo, sobretudo bailes e actuações de orquestras… fui ao meu arquivo, mas… não encontrei nada sobre o baile em 1935 no átrio do Liceu Infante D. Henrique! 


Carlos Filipe Gonçalves

 Mas devo ir depois ao Arquivo Histórico, verificar, pois o que tenho, são pesquisas específicas sobre músicos e orquestras que constam, do meu livro “Kab Verd Band AZ Música & Tradições” (2023). 

Naquela época, um cruzeiro deste tipo era sempre notícia, por isso, deve lá estar…, mas, faltam muitos números e só existe a colecção completa na Biblioteca Municipal de S. Vicente… e eu estou na Praia. Mas irei tentar. 

Olha, o Liceu Infante D. Henrique mudou de nome e passou a ser o Liceu Gil Eanes, no edifício onde eu estudei até o 4.º ano em 1967… Depois passou para um novo edifício mais moderno e construído de raiz… mudou de nome mais uma vez, depois do 25 de Abril de 1974 para Ludgero Lima, um antigo porteiro no tempo do tal edifício em 1967… Coisas da «revolução»!

Por falar da Guiné, ainda não enviei o que escrevi sobre «o depois da Guerra» porque, é «terrível» o que aconteceu, e eles estão agora em eleições…. Também tenho estado a testar «reacções» aos meus textos junto do pessoal amigo da Guiné, mas, infelizmente, não correspondem…

Desejos de vida e saúde.

Forte abraço
Carlos Filipe Gonçalves
Jornalista Aposentado

2. Resposta do editor LG:

Data - quarta, 12/11, 14:50 (há 3 dias)
Assunto  - Mindelo 1935

Obrigado, Carlos: o link é este:


http://www.cinemateca.pt/Cinemateca-Digital/Ficha.aspx?obraid=1378&type=Video


Atenção: o url  deve começar começa por http (e nunca por https).

O sítio é seguro. o documentário merece ser conhecido, não entrou na época no circuito comercial... (Ainda não descobri as razões, tanto mais que o Secretariado Nacional de Porpaganda entrou com 150 contos, hoje um milhão de euros, de subsídioa0o cruzeiro).

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2025/11/guine-6174-p27386-1-cruzeiro-de-ferias.html


Vou publicar a Parte II sobre o Mindelo (incluindo a cena do baile noliceu Infante Dom Henrique) (**).. A visita ao Mindelo e ao interior da ilha de São Vicente), Ribeira de Julião o Adriano Lima) deve ter sido de menos de um dia... 

Depois o "Moçanbique" seguiu para a Praia... Não sei as datas precisas. O Vapor partiu a 10 de agosto de 1935 (e regressou a 3 ou 4 de outubro).

São cerca de 15 minutos (preciosos) dedicados a Cabo Verde (Mindelo e Praia) e outro tanto à Guiné (Bissau e Bolama).. Vais gostar de ver...Ainda náo tinhas nascido...Nerm eu. Nem o Adriano Lima-.

Vamos falando. Agora estou com pressa. Luis

PS - Dou conhecimento a outros "mindelenses". E tu, divulga.


3. Resposta do  Carlos Filipe Gonçalves:

Data sexta, 14/11, 11:50 (há 1 dia)

Olá, caro amigo e camarada:

Antes de mais, Saúde e Boa disposição.

Respondendo à tua pergunta, claro que conheço o Adriano Lima, sou muito mais novo. Conheço e bem a família dele, a mãe, os irmãos… sobrinhos… moravam na minha rua, nos velhos tempos, Rua de Papa Fria, depois Rua dos Descobrimentos, actualmente, Rua António Aurélio Gonçalves, o meu tio que me criou desde os 3 anos de idade…. E saí da nossa casa, naquela rua, aos 21 anos, em meados de dezembro, rumo ao CISMI em Tavira e nunca mais voltei.

Nos seus comentários, Adriano Lima, cita pessoas, que eu conheci, claro muito mais velhas, na época eu era um miúdo dos 7 a 8 anos: Manuel de Matos, era o dono da Fábrica Favorita que fazia pão e bolachas, Julio Bento Oliveira que foi Presidente da Camara de S. Vicente até ser substituído pelo escritor Teixeira de Sousa…


Quanto aos músicos, B.Léza, não o conheci, mas lembro do dia do falecimento, tinha eu, os meus 7 anos em Julho de 1958… fiquei sozinho em casa, pois toda a gente foi ao funeral… Mochim d'Monte e o Manuel Querena, ambos violinistas, bem com o Xavier da Cruz B.Leza, constam do meu livro «Kab Verd Band AZ Música & Tradições2 (2023) (vd. capa do livro, à esquerda).


Interessante, as recordações do Adriano Lima, pois podem servir para um texto explicativo da «banda sonora» do documentário, o que ajuda a compreender e situar as imagens…. 

Olha, ainda nos anos de 1950 na minha infância, os miúdos ainda andavam nús pelas ruas, ou perto da casa… e todos nós andávamos descalços… E na praça da cidade, onde tocava a Banda Municipal aos domingos, era proibida a entrada daqueles que ainda andavam descalços… e há muitas anedotas a respeito… a polícia, fiscalizava… Enfim, pata te dizer, só entramos na «idade moderna» depois de  1960… Eu já não já não apanhei os miúdos que mergulhavam para apanhar moedas, mas ouvi dizer

A terminar desejos como sempre, de Vida e Saúde para todos nós.

Forte Abraço
Carlos Filipe Gonçalves
___________________

Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 16 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27429: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (14): a dupla "sodade", de Manuel Lema Santos (1942-2025) e de Cesária Évora, "Cize (1941-2011)

(**) Vd. poste de 13 de novembro de4 2025 Guiné 61/74 - P27416: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (12): o 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente: Mindelo, agosto de 1935 - II ( e última) Parte

sábado, 15 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27424: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (13): Mindelo, agosto de 1935: o que mostra e o que omite o filme de San Payo, de 1936 ("1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente") - Comentários -. ParteI (Adriano Lima, cor inf ref)



Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > c. 1943 > A cidade, a baía do Porto Grande e o Monte Cara ao fundo.  Ao centro,  em segundo plano, o edifício de maior volumetria é o Liceu Gil Eanes (Infante Dom Hienrique, até 1937), por onde passou a elite do Mindelo e onde estudou Amílcar Cabral (que ali completou o 7º ano do liceu, em 1944, seguindo depois para Lisboa onde se licenciou em engenharia agronómica, no Instituto Superior de Agronomia
). Mas por lá passaram também os nossos camaradas Adriano Lima e Carlos Filipe Gonçalves, que agora se reencontram através do nosso blogue. E viveram na mesma rua! O Adriano Lima só voltou a sua terra 40 anos depois. E o Carlos vive ha muito na Praia (desde que regressou da Guiné -Bissau em 1975).

Cortesia de Adriano Miranda Lima / Blogue Praia de Bote (2012). Informação complementar de Adriano Miranda Lima: Foto de origem desconhecida mas que parece ser da Foto Melo ou do José Vitória. Legenda: LG.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Outubro de 1941 > "O belo porto de mar de São Vicente; ao centro o ilhéu que se confunde com um barco [o ilhéu dos Pássaros]"... Foto (e legenda) do álbum de Luís Henriques, ex-1º cabo at inf, 3ª Companhia do 1º Batalhão do RI5, unidade mais tarde integrada no RI 23 (São Vicente, Cabo Verde), 1941/43). Origem: provavelmente Foto Melo.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2020). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.




1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Agosto de 1935 > O jovem professor Marcello Caetano, diretor cultural do Cruzeiro, discursando na câmara municipal. Visto de perfil, à esquerda. Ao meio, o fundador dos Sokols de Cabo Verde, Júlio Bento Oliveira (1905-1984), parente do Adriano Lima. Está de farda branca (a de comandante dos Sokols).





 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Agosto de 1935 > A miudagem disputando as moedas deitadas para o meio da rua pelos turistas do "Moçambique"... Um espectáculo degradante, aos olhos de hoje, mas que fazia parte do "folclore" de "Soncent". A ilha, do Barlavento, a segunda mais populosa do arquipélago, continua a perder hoje o concurso dos seus melhores filhos para a Praia (a capital política) e para emigração. Apesar do desenvolmento socioeconómico da ilha e do resto do arquipélago.

Cortesia de Cinemateca Digital, documentário "I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente", realizado em 1936 por San Payo. Disponível aqui:

http://www.cinemateca.pt/Cinemateca-Digital/Ficha.aspx?obraid=1378&type=Video


(Seleção e edição de imagens, numeração, legendagem, revisão / fixação de texto, título, negritos: LG)

1. Comentários, por email, aos postes P27409 e P27416 (*), enviados por Adriano Lima  (cor inf ref, membro da Tabanca Grande nº 560, desde 2/12/2012; natural de Mindelo, Ilha de Sáo Vicente, Cabo Verde, reside em Tomar; fez comissões de serviço em Angola e Moçambique):

Data - quarta, 12/11/2025, 22:58 

Caro Luís.

Agradeço ter sido um dos destinatários deste mail.

Não respondi mais cedo porque andei a tentar abrir o filme, coisa que me escapava de todo. Só agora o consegui, mas sem o respectivo som. Tentei de todas as formas, mas sem sucesso.

Mas, vá lá, vi o filme. Quanto aos músicos, não consigo identificar nenhum deles. Foi pena que a ausência de som me tenha impedido de ao menos ouvir as músicas tocadas.

Abraço amigo.
Adriano

2. Resposta do editor LG:

Data - 13/11/2025, 09:42

Adriano, é mesmo "sem som". Os documentários na época não tinham som . O som síncrono ainda era tecnicamente complicado.

Olha, divulga pela Praia do Bote. Um abraço para o  Joaquim Saial e colaboradores. Ab, Luís
PS. - Descobri um texto teu,  fabuloso,  sobre a Fazenda Tentativa, Angola. Vou cita-lo mais a frente.

3. Novo comentário Adriano Lima: 

Data - 13/11/2025, 17:01 

Luís, boa tarde.

Sim, desconfiava que o filme não tinha som, mas precisava confirmar. Vale pelas imagens e pelo estilo narrativo, que nos retratam o Estado Novo na sua genuinidade. A visita destes excursionistas foi uma decisão simpática e compreensível, exemplo que estava longe do pensamento de Salazar, que nunca pôs os pés no Ultramar.

Os meus olhos centraram-se na miséria bem patente nos jovens e crianças com vestes esfarrapadas e descalças, com os miúdos mais novos completamente nus, em disputa para apanhar umas moedas que os visitantes lhes terão atirado junto ao Mercado Municipal. 

Claro que 1935 estava ainda sob os efeitos da crise mundial de 1929, que afectou drasticamente todo o mundo, mesmo os países ricos. Mas era endémica a pobreza em Cabo Verde, pois lembro-me de ver na minha infância quadros idênticos ao observado, com crianças (rapazes) completamente nuas nos atredores de Mindelo. 

Mais tarde, já na minha adolescência/juventude, o panorama melhorou um pouco, pois crianças nuas eram já raras. Em todo o caso, bem antes do meu tempo as autoridades terão proibido a ida de crianças nuas à cidade, que em crioulo se diz "morada". 

No filme vêem-se também miúdos desnudados em botes, que asssediavam os navios que chegavam. Era hábito atirar moedas para o mar para eles as irem apanhar no fundo. Desde muito cedo faziam pela vida no meio da baía.

As coisas mudaram bastante e hoje, aliás desde há muito, e já não se vêem pessoas com roupas rotas ou remendadas ou descalças.


Francisco Xavier da Criuz
(B.Leza) (1905-1958)

Voltei a mirar os músicos e não consegui reconhecer nenhum (eu só nasceria 10 anos depois deste acontecimento). Era já célebre o músico e compositor B. Leza (Francisco Xavier da Cruz), que em 1935 tinha 30 anos, mas não sei se é alguns dos músicos. À época também eram já célebres o Mochim d' Monte e o Manuel Querena, ambos violinistas. Serão alguns dos que estão no filme? O B. Leza é este da foto (à direita).

Ah, no filme reconheço o que foi o fundador dos Sokols de Cabo Verde, Júlio Bento Oliveira, meu parente. Está de farda branca (a de comandante dos Sokols) e ao lado de Marcelo Caetano quando este discursa na recepção da Câmara. 

Creio ter também identificado o industrial Manuel de Matos 
na recepção dada aos visitantes numa propriedade rural num lugar chamado Ribeira do Julião.
 
Já não me lembrava desse texto, "Sentimentos Retroactivos", que escrevi em 2016. Obrigado pela tua apreciação.

Vou enviar o mail ao Joaquim Saial.
Abraço amigo

Adriano

(Revisão / fixação de texto,negritos: LG)

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Nota do editor LG:

(*) Últimos postes da série :

quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27416: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (12): o 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente: Mindelo, agosto de 1935 - II ( e última) Parte



Fotograma nº  17 e 17A > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > O grupo musical que animou o bailo liceu Infante Dom Henrique. São seis jovens midelenses (presume-se): duas rebecas, duas violas, um cavaquinho, percussão... 


Fotograma nº 18  > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Espero que o nosso grande especialista em música de Cabo Verde, o mindelense Carlos Filipe Gonçalves,nos ajude a completar as legendas...


Fotograma nº 19  > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Interior do liceu Infante Dom Henrique (Gil Eanes, a partir de 1938)... Uma das figuras de referência deste importantíssimo estabelecimento de ensino e polo de desenvolvimento cultural foi o professor e escritor Baltazar Lopes 
 da Silva ( São Nicolau, 1907 — Lisboa, 1989). Fou um dos fundadores, em 1936.  da revista "Claridade". E é autor de uma das obras-primas da literatúra em língua portuguesa, "Chiquinho" (1947).




Fotograma nº 20 e 20A > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Agosto de 1935 > Damas e cavalheiros dançando a rigor a morna (1)


Fotograma nº 21 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Fachada do mercado municipal que é dos anos 20


Fotograma nº 22 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Monumento a Sacadura Cabral e Gago Coutinho (1922) (1)



Fotograma nº 23 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >Monumento a Sacadura Cabral e Gago Coutinho (1922) (2)

 

Fotograma nº 24 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Uma vendedor5a de rua com a bnandeirinha portuguesa.



Fotograma nº 25 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Dois polícias locais junto ao quiosque da Praça Nova



Fotograma nº 26 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Aspeto parcial da Praça Nova.. Ao fundo o coreto.


Fotograma nº 27 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Outra vista da Baía Grande e, ao fundo, o sempre presente Monte Cara.




Fotograma nº 28 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Uma ida ao interior, para visitar uma pequena exploração agrícola apresentada no filme como um verdadeiro oásis


Fotograma nº 29 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Marecllo Caetano em primeiro plano, vestido a rigor, de fato completo... Visita ao "oásis"... As senhoras ficaram na cidade a tomar chá... SEgundo oo nosso camarada mindelense Adriano Lima o sítio é na Ribeira do Julião.



Fotograma nº 30 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > O "ponteiro", diríamos na Guiné.. O domo do "oásis#"



Fotograma nº 31 > "1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >  Ribeira do Julião > Agosto de 1935 > Jovens da comitiva, tomando notas e fotografando...Dois deles envergam chapéus colonais... O preto parece que estava na moda: vejam-se as camisas (negras ou pretas) e as calças (brancas) dos jovens do lado direito. 


Cortesia de Cinemateca Digital, documentário "I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente", realizado em 1936 por San Payo. Disponível aqui:


(Seleção e edição de imagens, numeração, legendagem, revisão / fixação de texto, título, negritos: LG)


1. Estas imagens foram obtidas de fotogramas do filme do realizador (e fotógrafo)  San Payo (Por, 1936, 91' 13'', em formato 35 mm, a preto & branco, sem som). O detentor dos direitos é a Cinemateca Portuguesa. Mas o filme já é, presumo, do domínio público. E merece ser conhecido dos nossos amigos e camaradas mindelenses. 

E não só. Merece ser conhecido de todos nós, amigos e camaradas da Guiné. Para já ajudam- nos a seguir a seguir a rota deste l Cruzeiro de Férias as Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola).

Sobre a ilha de São Vicente e em especial o Mindelo, gostariamos que os nossos amigos e camaradas que são naturais do Mindelo ou que lá vivem ou que conhecem o Mindelo, se pronunciassem: o Carlos Gilipe Gonçalves. o Adriano Lima, o Manuel Amante da Rosa, a Lia Medina, o Nelson Herbert... (São membros da Tabanca Grande.)

O filme tem 15 minutos dedicados a Cabo Verde, São Vicente e Santiago. Durante algumas horas os nossos "excursionistas" (sic) visitaram o Mindelo (de 7 a 15') e a Praia (de 15' a 23'), com breves incursões pelo interior.

Selecionámos alguns fotogramas desta visita de cerca de 200 "turistas coloniais" (mais de 1/3 eram jovens estudantes, finalistas do liceu). O diretor cultural do cruzeiro era o então professor Marcello Caetano, que viria a ser, em plena II Guerra Mundial, o comissário nacional da Mocidade Portugueesa (1940-1944) e a seguir Ministro das Colónias (1944-1947), e já na altura apontado como delfim de Salazar.

Nunca fui ao Mindelo. Fiz apenas uma paragem técnica, no avião da TAP, na ilha do Sal.  Tenho pena. E sobretudo penitencio-me de nunca ter lá levado o meu pai, expedicionário em 1941/43, Luís Henriques (1920-2012). É também em homenagem a ele e ao seu amor a "Soncent" que edito estas imagens, que me deram uma trabalheira a visionar, selecionar, editar, legendar...

PS - Vejo, pela consulta do "Diário de Lisboa", que o paquete "Moçambique" regressou a Lisboa, em 3/10/1935. É, portanto,a data do términmus do cruzeiro, um sucesso segundoos seus organizadores.

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terça-feira, 11 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27409: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (11): o 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente: Mindelo, agosto de 1935 - Parte I



Fotograma nº 1 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > O cais do porto da Baía Grande e o casario ribeirinho, vistos do paquete a vapor "Moçambique"


Fotograma nº 2 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > A Baía de Porto Grande (e, ao fundo, o Monte Cara). Com 4 km de diâmetro, é  formada pela cratera submarina de um antigo vulcão. A construção, ampliação e modernização do porto são já de 1962 e de 1997.E muito recentemente, em junho passado, foi inaugurado um terminal de cruzeiros, refletindo a aposta do governo de Cabo Verde no setor do turismo.
 

Fotograma nº 3 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Vista panorâmica da cidade do Mindelo e do Porto  da Baía Grande.


Fotograma nº 4  > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Navio a vapor "Moçambique", que tinha partido de Lisboa a 10 de agosto... Desembarque dos excursionistas, que serão depois levados em barcos a remos para terra. Os jovens que se veem fardados,  são escoteiros, ainda não havia a Mocidade Portuguesa (será criada em 1936). 



Fotograma nº 5 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Barcos a remos em redor do vapor "Moçambique". Entre eles, os "tchabetas", os miúdos caçadores de moedas.


Fotograma nº 6 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Barcos a remos aproximam-se no "Moçambique", enquanto a "miudagem", em segundo plano, em barcos a remos  mais pequenos, preparam-se para recolher, de mergulho, as moedas lançadas pelos turistas, por diversão... Fazia parte do "pitoresco" do Mindelo... Esses miúdos eram os "tchabetas".


Fotograma nº 7 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Mais uma cena de "mergulhadoires de moedas", que captou a atenção do operador de imagem... Estes miúdos, que faziam parte da paisagem portuária do Mindelo,sobretudo entre os anos de 1920 e 1960, 
eram conhecidos popularmente como “mergulhadores de moedas” ou “tchabetas” em crioulo (forma derivada de "chapeta", pequena embarcação improvisada ou frágil). Mal chegava um navio com passageiros, ao porto da Baía Grande, os rapazes aproximavam-se, perigosamente, para pedir aos turistas que atirassem moedas, mergulhando depois para as apanhar: uma mistura de destreza, necessidade económica e espetáculo "exótico e pitoresco"para o forasteiro.


Fotograma nº  8 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > O apoio ao desembarque.


Fotograma nº  9 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de!de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  Um primeiro problema logístico: onde arranjar viaturas para tanta gente? 


Fotograma nº 10 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Até carrinhas de caixa aberta serviam...


Fotograma nº 11 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  O jovem professor Marcello Caetano, diretor cultural do Cruzeiro, discursando na câmara municipal.


Fotograma nº 12 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Receção na Câmara Municipal: as senhoras sentadas na primeira fila, com a sua indumentária característica dos anos 30...



Fotograma nº 13 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Visita ao Mercado municipal


Fotograma nº 14 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 >  A miudagem disputando as moedas deitadas para o meio da rua pelos turistas do "Moçambique"... Um espectáculo degradante, aos olhos de hoje, mas que fazia parte do "folclore" de "Soncent". A ilha, do Barlavento, a segunda mais populosa do arquipélago, continua a perder hoje o concurso dos seus melhores filhos para a Praia (a capital política) e para emigração. Apesar do desenvolmento socioeconómico da ilha e do resto do arquipélago.




Fotograma nº 15 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentario de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de São Vicente >   Mindelo > Agosto de 1935 > Visita á "Oficina do Estado, instituição de ensino profissional"...




Fotograma nº 16 > 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, documentário de San Payo (1936) > Cabo Verde > Ilha de Sáo Vicente > Mindelo > Agosto de 1935 > O célebre quiosque da Praça Nova (hoje Praça Amílcar Cabral, e o quiosque ainda lá está, desde 1931; quanto á praça, o povo continua a chamar-lhe Praça Nova, e não Amílcar Cabral, designação toponímica imposta em 1975 pelo governo do PAIGC) ...

A morabeza estampada no rosto desta mulher. Ainda não havia a cerveja Sagres (só aparecerá em 1940), mas já havia a Estrella...nome decalcado da famosa cerveja belga Stella.


A "Estrela" tinha fábrica em Lisboa, desde o séc. XIX, tal como as marcas "Jansen" e "Portugália". Estas três pequenas cervejeiras foram integradas na Sociedade Central de Cervejas, criada em 1934. Na época o consumo "per capita" de cerveja em Portugal era de apenas... 1 litro.


Cortesia de Cinemateca Digital, documentário "I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente", realizado em 1936 por San Payo. Disponível aqui:

http://www.cinemateca.pt/Cinemateca-Digital/Ficha.aspx?obraid=1378&type=Video


(Seleção e edição de imagens, numeração, legendagem, revisão / fixação de texto, título, negritos: LG)



1. Estas imagens, obtidas de fotogramas do filme do San Payo (Por, 1936, 91', P&B, sem som), podem ter algum valor documental, para nós, antigos combatentes. Terão seguramente para os nossos amigos e camaradas que são naturais do Mindelo ou que lá vivem ou que conhecem o Mindelo, e a quem pedimos que comentem: a Lia Medina, o Carlos Gilipe Gonçalves, o Adriano Lima, o Manuel Amante da Rosa, o Nelson Herbert...

Para já ajudam- nos a seguir a rota deste l Cruzeiro de Férias ás Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola), que ficou registado em filme, em celulolóide, e entretanto, em boa hora, digitalizado pela Cinemateca Nacional (*)

Recorde-se o contexto:

(i) a iniciativa partiu da revista "O Mundo Português", tendo juntado cerca de duas centenas de "estudantes, professores, médicos, engenheiros, advogados, artistas, escritores, industriais e comerciantes";  o financiamento do cruzeiro teve comparticipação do Estado; 

(ii) esta "revista de cultura e propaganda, arte e literatura coloniais" era dirigida por Augusto Cunha, sendo propriedade da Agência Geral das Colónias e do Secretariado da Propaganda Nacional;

(iii) foi director cultural deste cruzeiro foi o prof doutor Marcelo Caetano (1906-1980), então um jovem, com 29 anos, intelectula orgânico do stado Novo, brilhante académico, especialista em direito administrativo, doutrinador do corporativismo e entusiástico apoiante do luso-tropicalismo (será comissário da Mocidade Portuguesa em 1940 e ministro das colónias em 1944, até chegar a sucessor de Salazar, de 1968 a 1974);

(iv) o filme, de hora e meia, foi realizado pelo conceituado fotógrafo Manuel Alves San Payo (1890-1974), natural de Melgaço, política e ideologicamente próximo do regime do Estado Novo; 

(v) o documentário acabou, ingloriamente, por não passar nas salas de cinema: merece ser hoje revisto , divulgado e comentado por todos nós, nomeadamente na comemoração dos 50 anos da independência de Cabo Verde (1975) (**);

(vi) o filme tem 15 minutos dedicados à paragem em Cabo Verde, em São Vicente (Mindelo) e Santiago (Praia) (8' - 23'), um pouco mais do que a visita à Guiné (Bissau e Bolama) (23' - 37');

(vii) ainda não  existia a Mocidade Portuguesa, criada pelo Decreto-Lei n.º 26 611, de 19 de maio de 1936, em cumprimento do disposto na Base XI da Lei n.º 1941, de 19 de abril de 1936;

(viii) pelo Decreto n.º 29 453, de 17 de fevereiro de 1939, a Organização foi alargada «à Mocidade Portuguesa das colónias, de origem europeia, e à juventude indígena assimilada" (sic).

(ix) mas a ilha de São Vicente, ou melhor, o Mindelo, já era a capital cultural do arquipélago; tinha liceu, desde 1917, o único do arquipélago, o liceu Infante Dom Henrique, rebatizado Gil Eanes, em 1938; nele estudou, entre muitos outros, Amílcar Cabral; (o outro estabelecimento de ensino secundário era o seminário-liceu de Sáo Nicolau);

(x) não há, no filme (como seria de esperar, para mais com a cenura em vigor...) uma única palavras sobre as secas e as fomes ciclicas, a morbimortalidade, o desemprego, a emigração, a história atribulada da ilha de Sáo Vicente e do Mindelo

(xi) um ano antes, em 7 de junho de 1934, tinha-se dado a "revolta de Nho Ambroze", uma revolta popular espontânea contra "a miséria e a fome", decorrentes do impacto da crise eocnómica mundial e da inação do Govermo de Lisboa; o Mindelo vivia do tráfego marítimo; houve saques da Alfândega e de casas comerciais; 1 morto e vários feridos; uma revolta á medida daquela gente pacífica e sofredora;

(xi) o Nho Ambroze será deportado a seguir para Angola; é hoje um dos heróis mindelenses, "capitão Ambroze".

(Continua)
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Notas do editor LG:

(*) Vd, postes de:

7 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27398: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 4 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte V: preços só para meninos ricos ou gente da classe média-alta... Hoje daria para dar a volta ao mundo em 100 dias.

4 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27386: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 4 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte III: um documentário de hora e meia, que diz muito (até pelo que omite) sobre o que era o "ultramar português" há 90 anos

(**) Último poste da série > 30 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27166: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (10): Secas e fomes levaram ao longo do séc. XX à morte de mais de 100 mil pessoas

quinta-feira, 6 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27391: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 3 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte IV: impressões de viagem do Ruy Cinatti: Mindelo e Bolama



Guiné > Bolama > Agosto de 1935 > Partida  do vapor "Moçambique", com os participantes do 1.º Cruzeiro de Férias às Colónias, entre os quais se contaria Ruy Cinatti (1915-1986), então com 20 anos, futuro engenheiro agrónomo, poeta, antropólogo que iria mais tarde estabelecer uma relação especial com Timor.

Fonte: Ilustração. nº 222, ano 10º, 16 de agosto de 1935, pág. 9. (A revista, quinzenal, era propriedade da Livraria Bertrand, Lisboa; editor: José Júlio da Fonseca;) custava 5$00 um número avulso (Cortesia de Hemeroteca Digigit6al / Càmara Municipal de Lisboa)


1. Continuação da publicação da série "I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 4 de outubro de 1935) (*)

Fomos "repescar" um texto do nosso crítico literário Mário Beja Santos (ex-alf mil,   Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com o título  "Ruy Cinatti e uma viagem a Bolama, 1935" (**).

O Ruy Cinatti ficará profundamente marcado por este cruzeiro. Pode- se dizer que, de facto, foi "o cruzeiro da sua vida", sem qualquer ironia (como nós dizemos do nosso para a Guiné). De resto, ele será uma das vedetas do evento, ganhando inclusive um prémio literário pela melhor composição sobre a viagem.

O texto é antecedido da seguinte mensagem do nosso  camarada  e colaborador permanente, o Beja Santos,  com data de 10 de fevereiro de 2016:

(...) Entre chuviscos intermitentes, aquele sábado de manhã na Feira da Ladra permitiu-me adquirir esta preciosidade, ao longo dos anos em que entabulei grande amizade com o Ruy Cinatti, este nunca me fizera referência à sua visita à Guiné e muito menos mencionara existir texto de tal viagem. A sua grande recordação fora a Ilha do Príncipe, deu-lhe fulgor para escrever uma pequena gema literária, o conto "Ossobó".

É bom recordar que este antropólogo e poeta tinha 20 anos quando escreveu estas recordações de viagem. (...)

 


Caoa da revista "O Mundo Portuguès"


"Ruy Cinatti, um dos participantes do 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente, dá-nos a suas impressões de uma viagem ao Mindelo e a Bolama,  em agosto de 1935"

por Mário Beja Santos


Ruy Cinatti, pintado pela Maluda, Tinha traços fenotípicos chineses, do lado da mãe. O pai foi consul em Londres.
(Cortesia de Mário Beja Santos)

O 1º Cruzeiro de Férias às Colónias, coordenado por Marcello Caetano, constituiu uma novidade pelo modo como se pretendia atrair a juventude aos conhecimentos das parcelas do império. Guardaram-se vários testemunhos dessa viagem em que o regime procedera a uma rigorosa seleção de universitários de elevada craveira.

Um dos escolhidos foi Ruy Cinatti (Londres, 1915- Lisboa, 1986) que se irá afirmar como grande poeta, etnólogo, antropólogo e defensor da causa timorense. 

Tive o privilégio de receber alguns dons da sua amizade benfazeja. Conheci-o quando era membro da direção do jornal “Encontro”, a publicação da JUC – Juventude Universitária Católica, em 1966, fui pedir-lhe um poema, ofereceu-nos “O cego”, o primeiro dos seus “Sete septetos”, livro que viria a ser premiado com o Prémio Nacional de Poesia.

O meu livro,  “A Viagem do Tangomau”, arranca com um encontro em sua casa, convidar-me para jantar na véspera de eu partir para Mafra, para frequentar a recruta. Leu-me poemas de safra recente, que virão a ser publicados a título póstumo. E na correspondência que com ele troquei na Guiné, deu-me sábios conselhos, foi um lenitivo para a minha alma, daí o ter tratado sempre por “Dear father”.

Encontrei em “O Mundo Português”, revista de cultura e propaganda, arte e literatura coloniais, o seu número 24, de dezembro de 1935, o seu texto “A Mocidade Académica e o 1º Cruzeiro de Férias às Colónias”. 

Chamou-me à atenção, na chegada a S. Vicente, a descrição crua que nos faz da vida dolorosa do cabo-verdiano:

“A vegetação em S. Vicente está reduzida a pequenos oásis de verdura – as ribeiras – regiões sobrejacentes aos leitos de ribeiras subterrâneas, onde se desenvolvem plantas dos climas quentes, e a pequenas extensões de vegetação arbórea cuja ramaria, passada certa altura, se estende, se inclina horizontalmente, se prostra ante a fúria niveladora do vento do deserto, que sibila, que ecoa doidamente nos recôncavos da rocha.

O resto são campos de calhaus partidos, triturados, onde a vida vegetal é impossível, porque as águas que nas épocas de chuva se despenham em torrentes pelas encostas arrastam o pouco húmus que se tenha depositado ou os materiais terrosos provenientes da desagregação da rocha.

Todos estes aspetos, geológico, climático, ausência de vegetação na maior parte das ilhas, motivada ou pela falta de chuvas ou pelo seu desperdício quando cai, conduzem à grande tragédia do arquipélago – a fome.

Em 1924, só em S. Tiago morreram à fome 20 mil pessoas. No Fogo, o colmo é arrancado das casas indígenas para ser cozido e servir assim de alimento. As crioulas levavam os filhos já mortos ao colo, iludindo os administradores, para receberem maior ração”.


E conclui:

“Foram S. Vicente e depois o Príncipe, as ilhas que, no desfilar tumultuante de visões sucessivas, mais indelével recordação deixaram no meu espírito”.




O vapor "Moçambique", da CNN, ao largo de Bolama > Agosto de 1935

Foto: "O Mundo Português", vol II, nºs 21-22, setembro-outubro de 1935
(Exemplar pessoal de Mário Beja Santos; digitalização e edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné) (*)


E assim chegaram à Guiné, registará a sua viagem a Bolama:

“O mar muda de cor. Já não é azul ultramarino nem azul-cobalto. As águas são barrentas, com reflexos esverdeados provenientes dos aluviões arrastados pelo Geba e outros rios. A ondulação é mínima, apenas provocada pelo deslocamento do navio.

Atravessámos o dédalo das ilhas Bijagós, cobertas de intensa vegetação verde-amarelada, que me dá uma sensação muito diferente do que eu supunha vir a encontrar.

Costas baixas, em praia, abundantes em recortes e braços de mar, prolongando-se a perder de vista, a ponto de se julgar que a vegetação nasce das águas.

Era já tarde e o sol velado pela fímbria das nuvens caminhava para o ocaso. Não bulia uma folha. Estava tudo parado, tudo embebido num banho morno.

Caminhava ao longo de uma rua de Bolama, com os muros e as casas cobertas de musgo, onde o branco da cal há muito tempo dera lugar ao cinzento esverdeado da terra e das plantas. Andava e não via ninguém. Tudo estava deserto. Só ouvia o ecoar das minhas passadas no cimento do passeio.

Envolvia-me um silêncio sepulcral. Invadia-me um aniquilamento absoluto. Qualquer coisa me amolecia, tornava mais vagaroso o andar. Com a face, com o corpo a escorrer suor, bebi grandes golos de água do cantil; quanto mais bebia mais a sede me torturava.

De repente, em poucos minutos, o céu tapou-se de nuvens; uma ligeira brisa baloiçou a folhagem dos poilões; começou a chover torrencialmente e a água, rejeitada pela terra saciada de humidade, corria em regatos para as margens lodosas do mar. Ali, refrescando a alma, refrescando o corpo com a deliciosa chuva a escorrer-me pelos cabelos e pela face, reagi.

Com outra alma, caminhei com energia, embebendo-me na paisagem tropical verde cinzenta. Nas margens do rio, onde o lodo borbulhava, o mangal de folhagem miúda muito cerrada estendia-se indefinidamente numa estreita faixa, com as raízes brutescas saindo da água.

Com o mesmo imprevisto com que tinha aparecido, as nuvens foram-se, e de novo o sol inundou a terra. Atravessei a cidade; segui por uma estrada onde, dentre o verde brilhante das bananeiras, das árvores de fruta-pão e dos poilões, surgiam as tabancas cor de argila.

Em volta, em porções de terreno sem área nem contorno definido, estendem-se as plantações de mancarra cultivada pelos negros. Grupos de indígenas, diferentes na aparência física e no vestuário, seguiam ao longo da estrada e estacionavam à porta das tabancas.

Uns, quase nus, com as costas tatuadas em relevo, com folhas de palmeira-leque e um grande cutelo nas mãos. Outros, vestidos com grandes camisas grandes que quase chegam ao chão, com o peitilho bordado e um alfange pendente a tiracolo. Mulheres, ora de tanga, ora envoltas em grandes panos, caminhavam com os filhos às costas e com grandes cabaças sobre o lenço amarelo enrolado em volta da cabeça.

Entrei numa tabanca de Fulas. Casas retangulares e circulares, o telhado de colmo estendendo-se para fora das paredes a servir de alpendre ou galeria. Sentados em volta os homens conversam, as mulheres entram e saem. As crianças brincam indiferentes ao que em volta se passa.

Lá ao longe, mas dentro da tabanca, o barulho de muita gente junta a falar atraiu-me. Fui lá.
Formando uma roda, homens e mulheres olhavam, gesticulando, o começo de um batuque. O tambor começou a suar e logo um negro despindo a camisa branca, descalçando as chinelas vermelhas, saltou para o meio, os músculos salientes a brilhar, exibindo o corpo atlético de um deus grego queimado pelo sol.

Começou a andar em volta, olhando a multidão que o cercava, saracoteando o corpo, batendo ritmicamente os pés, em flexões que iam aumentando com rapidez. Dirigiu-se às raparigas que em monte o olhavam embevecidas, num conjunto de cores em que o vermelho e o amarelo predominam.

Cantava a mesma frase com intervalos em que o som fica suspenso no ar e continuava cada vez mais excitado, na sua movimentada dança, dando saltos mortais.

De vez em quando chegava-se ao pé do tocador de tambor, dobrava-se, batendo com os dedos no chão e levantava-se em seguida bem alto, apontando para alguns dos que ali estavam. Era o desafio para a luta.

Ninguém veio. Mais alguns saltaram para o centro e com as mesmas atitudes desafiaram outros. Ninguém veio. Tudo se parecia temer. Em volta, homens e mulheres procuravam animar, batendo compassadamente as palmas, acompanhamento o canto intermitente dos lutadores. Nada conseguiram. Em breve começaram a dispersar. O sol já tinha desaparecido lançando apenas no horizonte um pálido clarão, que mais fazia realçar a beleza eternas das palmeiras.

Em redor os homens, sentados à porta das cubatas, lavavam os pés, preparando-se para a oração muçulmana”.


Ruy Cinatti escreve este texto com 20 anos. Chamou-me à atenção a dedicatória que ele apõe:

“Para o muito caro José Vaz Pinto, esta recordação do nosso cruzeiro de maravilha com a amizade de Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes. Janeiro de 1936”.

(Revisão / fixação de texto, título: LG)

 2.   Comentário do editor LG:

Este foi, de facto, o primeiro e único cruzeiro de férias às colónias, com direção cultural de  Marcello Caetano, que exercerá mais tarde o cargo de ministro das colónias (1944/47), depois de ter sido comissário nacional da Mocidade Portuguesa (1940/44).

Mas em  1937 irá realizar-sen o I Cruzeiro de Férias dos Estudantes das Colónias à Metrópole, transportando estudantes dos liceus de Angola e Moçambique ao "Puto", e depois um outro que levou estudantes de Moçambique a Angola...

A moda do turismo colonial pegou: alguns anos depois iniciar-se-iam os cruzeiros da Mocidade Portuguesa e, posteriormente, da Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho (FNAT). Claro que os ingleses, os franceses, os alemães, os italianos, etc. , já faziam este tipo de cruzeiros.

O ACP (Automóvel Clube de Portugal), já dera o mote, inaugurando a prática turística do cruzeiro a terras exóticas: em 11 de Julho de 1933, organizou o primeiro cruzeiro ACP a Marrocos (Tânger e Casablanca) e Madeira, a bordo do Quanza (fretado à  Companhia Nacional de Navegação).

É interessante ligar turismo, crise económica dos anos 30 (que afetou duramente os colonos portugueses de Angola e Moçambique, com a quebra da procura de matérias-primas), companhias de navegação (CNN e CCN, em competição), colónias africanas (em disputa e em risco: os italianos e os alemães não viam com bons olhos os imensos territórios de Angola e Moçambique tão mal aproveitados, a par do Congo Belga...), sem esquecer o triunfo das teorias da supremacia racial, mas também a "incubação" do luso-tropicalismo de que o Marcello Caetano será um dos grandes arautos"...

Vd. Silva, Maria Cardeira da, et Sandra Oliveira. « Paquetes do Império ». Castelos a Bombordo, édité par Maria Cardeira da Silva, Etnográfica Press, 2013, https://doi.org/10.4000/books.etnograficapress.347.