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sexta-feira, 15 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26157: Casos: A verdade sobre... (49): Os "djubis" da CART 11 e da CCAÇ 12, que foram soldados... (Luís Graça)



Umaru Baldé (c. 1953- c.2004, Bambadinca, meados de 1970
Foto: Benjamim Durães (2010)



Umaru Baldé (c. 1953-c. 2004), recruta do CIM Contuboel,
 c. março de 1969 

Foto: Valdemar Queiroz (2014)


1. Resposta do editor LG ao Valdemar Queiroz (*): 

Valdemar, obrigado pela tua preciosa "lembrança"... Reconheço estes putos ou pelo menos três, os que pertenceram à CCAÇ 12, e que fizeram a guerra comigo (*)...

Quanto ao Umaru Baldé (c. 1953- c. 2004), o "menino de sua mãe", tens aqui  duas fotos dele (uma é do teu álbum, o recruta Baldé, no CIM de Contuboel, com cara e corpo de "djubi"; a outra, um ano mais tarde,  de meados de 1970, tirada em Bambadinca, já com o BART 2917).

Vamos pô-lo a nascer por volta de 1953 para salvar a "honra do convento", isto é, para que a NT não sejam acusadas de recrutar crianças para a guerra, como acontecia com o PAIGC...

Soldado do recrutamento local, nº 82115869, o Umaru tirou a recruta   (com a CART 11) e a especialidade (com a CCAÇ 12), no CIM de Contuboel (um um um "oásis de paz", como eu lhe chamei, em junho de 1969). 

Foi exímio apontador de morteiro 60, soldado arvorado e depois 1º cabo at inf  da CCAÇ 2590 /  CCAÇ 12 (1969-1972), no 4º Gr Comb,  3ª secção [comandada inicialmente pelo fur mil 11941567 António Fernando R. Marques: DFA, vive hoje em Cascais, empresário reformado, membro da nossa Tabanca Grande].

O Umaru Baldé, que era de Dembataco (ou Demba Taco),  cresceu com a guerra: Demba Taco pertencia ao subsetor do Xime, um dos primeiros a conhecer a crueldade da guerra.  Foi recrutado em 12/3/1969,  como ele conta em carta pungente que te escreveu, trinta anos depois, já a viver na Amadora. 

Tirou a recruta no CIM Contuboel e fez o juramento de bandeira em Bissau, em cerimónia a que assistiu o gen Spínola.  Em junho e julho de 1969 fez a especialidade, já com os graduados da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 como instrutores... Juntos formamos companhia e fizemos a IAO.  Em 18 de julho de 1969 ficámos à ordem do comando do sector L1, e fomos colocados em Bambadinca.  Seis dias depois tivemos o batismo de fogo em Madina Xaquili, que será abandonada, dois meses e tal depois, em outubro.

O Umaru Baldé fez a guerra  entre meados de 1969 e 1972,  foi depois colocado, nesse ano,  em Santa Luzia, Bissau, no quartel do Serviço de Transmissões, onde ficou até ao fim da guerra.  (Julgo que depois de ter sido ferido em combate, ainda na CCAÇ 12, que entretanto passará a unidade de quadrícula, colocada no Xime em março de 1973.)

Conheceu, em mais de metade da sua vida, a amargura e a solidão do exílio. Não sei se chegou a ter mulher e filhos.  Percorreu meia África, em busca de liberdade e seguranças. Veio a morrer, aos 50 anos,  em Portugal, no "terminal da morte", que era então o, hoje  já extinto,  Hospital do Barro, Torres Vedras (onde também, por ironia do destino,  viria a morrer Luís Cabral, uns anos depois, em 2009).

O "puto" Umaru,  como sempre o tratámos, contou apenas com o apoio e a ajuda de alguns dos seus antigos camaradas de armas, "tugas",  da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, mas também da CART 11 (como tu, Valdemar Queiroz,  e outros). 

Não posso confirmar, com rigor, o ano em que nasceu e o ano em que morreu. Nunca mais o vi desde que regressei a casa em 17 de março de 1971. Tenho uma foto com e com o Zé Carlos.

 

Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Fevereiro de 1970 >  Região do Xime >   1º  Grupo de Combate, comandado pelo Alf Mil Inf Op Esp Francisco Moreira, no decurso da Op Boga Destemida, uma operação sangrenta...  A CCAÇ 12, que integrava a "nova força africana" (que era a menina dos olhos de Spínola) foi uma subunidade de intervenção, duramente usada e abusada pelo comando dos BCAÇ 2852 (1968/70) e BART 2917 (1970/72) 


Foto: © Arlindo Roda (2010). Todos os direitos reservados 
[Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



2. Aproveito para retomar aqui, com algumas alterações,  um comentário meu que já tem 18 anos sobre  "a lista dos Baldés" da CCAÇ 2590 / 12, e que publicitei, em 2006 (**), depois de ponderar os prós e os contras: eram 100 os "Baldés", que foram integrados na CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), em Contuboel... Muito poucos deles estariam ainda vivos nessa altura. E hoje já não estará nenhum.

Na altura, podia parecer fastidiosa, inútil, irrelevante... a minha lista de Baldés...    Mais: até imprudente, podendo pôr em risco a liberdade e a segurança dos nossos antigos camaradas guineenses,  os sobreviventes, os que ainda estariam vivos (como, por exemplo, o José Carlos Ussumane Baldé, o único 1º cabo que existia no meu tempo).

Não pensava o mesmo , em 2006: podia ter (ou vir a ter) algum interesse documental, historiográfico, eu sei lá... Podia facilitar a pesquisa de informação, de testemunhos, de depoimentos...E quanto a ajustes de contas, infelizmente já tinham sido feitos sob o regime de Luís Cabral...

Entendia que era um pequeno, modestíssimo, gesto de elementar justiça para com aqueles guineenses que lutaram ao nosso lado, que fizeram parte da CCAÇ 12 e, portanto, da 'nova força africana'  com que sonhou Spínola e que tanto atemorizou o PAIGC (eles e não apenas a "tropa especial", com destaque para os Comandos Africanos).

Infelizmente, uma grande parte deles (quantos, exactamente?) já não estariam vivos em 2006. Uns tinham sido fuzilados, como o Abibo Jau, logo em 1975, outros andaram fugidos, a maior parte terá morrido de morte natural, que a sua esperança de vida era muito menor que a nossa, em 1969...

Eu estava à vontade para publicar essa lista: sempre critiquei a africanização da guerra da Guiné, embora longe de imaginar que, no dia seguinte à nossa retirada, começasse a caça aos "traidores", aos "contra-revolucionários", aos "mercenários", aos "colaboracionistas", aos "cães dos colonialistas", aos "cachorros dos tugas"...

Eu já não estava lá, em agosto de 1974, quando foi extinta a CCAÇ 12 e as demais subunidades da "nova força africana" (incluindo a CCAÇ 11, herdeira da CART 11). E, confesso que, desde que cheguei, em março de 1971, e até ao final da década de 70, pus uma tranca à porta da "memória da guerra". E só no princípio de 1980, comecei a tentar "exorcizar os fantasmas da guerra colonial" (sic) (uma expressão minha, que paga direitos de autor...).

Em 1969, ainda estava vivo o Amílcar Cabral e eu, na metrópole,  admirava-o, em abstrato,  intelectualmente, pelo pouco tinha lido dele (náo tenho pejo em admito-lo hoje). 

Achava que na Guiné, depois da independência, "abadá a guerra e feita a paz", tudo seria diferente, e não aconteceriam os ajustes de contas que se verificaram noutras revoluções ou guerras civis, na Rússia, na China, na Espanha franquista, na França depois da libertação, na Argélia, em Cuba, etc. Pobre de mim, ingénuo...

Mas, por outro lado, também fui cúmplice da integração destes "putos" no nosso exército: mesmo sendo  da especialidade de armas pesadas, e não fazendo  parte formal, organicamente,  de nenhum dos quatro grupos de combate da CCAÇ 12, acabei como vulgar atirador de infantaria, já que a companhia não tinha instalações a defender e  era de intervenção ("uma companhia de nharros, carne de canhão", rosnávamos nós, entre os dentes, sempre que saíamos para o mato...).

Participei, por isso, em muitas das operações em que estes participaram, fui testemunha da sua coragem e do seu medo, dormi com eles nas mais diversas situações, incluindo nas suas tabancas, transportámos às costas os nossos feridos e os nossos mortos... 

Foram meus camaradas, em suma.

Alguns (ou até bastantes) vieram das milícias, a maior parte já tinha alguma experiência de combate. E quanto à sua origem geográfica, os nossos camaradas guineenses da CCAÇ 12 (originalmente, CCAÇ 2590), eram oriundos do chão fula e em especial dos regulados do Xime, Corubal, Badora e Cossé, com exceção de um mancanhe, escolarizado,  oriundo de Bissau (que se fartou de levar "porradas", por ser "reguila" e "indisciplinado").

“Todos falam português mas poucos sabem ler e escrever", lê-se na história da CCAÇ 12. (O que só era verdade 21 meses depois de os termos conhecido e instruído em Contuboel, em junho e julho de 1969: nunca tiveram tempo sequer de ter aulas regimentais, o português que aprenderam, a falar e a escrever foi connosco.)

Foram incorporados no Exército como "voluntários" (sic), acrescentou o escriba (fui que escrevi a "história da unidade"), para branquear a insustentável (historicamente falando) situação dos jovens fulas, condenados a aliarem-se aos tugas e a pagarem a fatura do "colaboracionismo" no dia a seguir à nossa partida... 

Mas devo acrescentar: mal ou bem, a tropa e a guerra acabaram por ser um "modo de vida" para muitos deles... Teria o Umaru Baldé alguma alternativa ? Seguramente que não. O Salazar, o Tomás, o Caetano queriam-nos,  a todos,  heróis ou... mortos!
___________

Notas do editor:

(*) Ultimo poste da série : 14 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26153: Casos: A verdade sobre... (48): Os "djubis" da CART 11 e da CCAÇ 12, que foram soldados... (Valdemar Queiroz)

quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26153: Casos: A verdade sobre... (48): Os "djubis" da CART 11 e da CCAÇ 12, que foram soldados... (Valdemar Queiroz)


Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar > Março de 1969 > Recruta dos futuros soldados das futuras CART 11 e da CCAÇ 12 > Samba Baldé (Cimba), nº mec 82110969... Futuro Ap Metr Lig HK 21, 3º Gr Com 3º Gr Comb [Comandante: alf mil inf 01006868 Abel Maria Rodrigues [bancário reformado, Miranda do Douro], 1ª secção [fur mil at inf Luciano Severo de Almeida, já falecido]...  De origem fula.


Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar > Março de 1969 > Recruta dos futuros soldados das futuras  CART 11 e da CCAÇ 12 > Salu Camara, nº mec 82103469. Provavelmente de origem futa.fula. Integrou a CART 11.


Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar > Março de 1969 > Recruta dos futuros soldados das futuras  CART 11 e da CCAÇ 12 >  Sori Baldé, nº mec 82111069,  De origem futa. Integrou a CCAÇ 12, como sold at inf. Pertenceu O 4 º Gr Comb [ comandante: alf mil  at cav  10548668 José António G. Rodrigues, já falecido, vivia em Lisboa], 3º secção [1º Cabo 00520869 Virgilio S. A. Encarnação, vive em Barcarena]... [O Valdemar Queiroz identifica-o, erradamente, como sendo o Tijana Jaló, esse sim, devia pertencer à CART 11, mas com outro nº mecanográfico... Estou bem recordado do Sori Baldé, um dos meus soldados, quando estive no 4º Gr Comb.]


Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar > Março de 1969 > Recruta dos futuros soldados das futuras CART 11 e da CCAÇ 12 > Mamadu Jaló, nº mec 821179669, De origem futa. Integrou a CCAÇ 12, como sold arvorado. . Pertenceu ao 1 º Gr Comb 3ª secção [fur mil at inf 19904168 António Manuel Martins Branquinho, reformado da Segurança Social, Évora, já falecido]


Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar > 1º trimestre de 1969 > Recruta dos futuros soldados das futuras CART 11 e da CCAÇ 12 > Alceine Jaló, nº mec 82114669, De origem futa ou futa-fula. Pertenceu à CART 11.



Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar > Narço de 1969 > Silhueta do recruta Umaru Baldé, natural de Dembataco, regulado de Badora, setor L1 (Bambadinca), nº mec 82115869.

Fotos (e legendas): © Valdemar Queiroz (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel > CIM - Centro de Instrução Militar  > c. março / abril de 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > > O Valdemar Queiroz, com os recrutas Cherno Baldé, Sori Baldé e Umarau Baldé (que irão depois para a CCAÇ 2590 / CCAÇ 12).

Estes mancebos aparentavam ter 16 ou menos anos de idade. Eram do recrutamento local. Os da CCAÇ 12 eram fulas, oriundos do chão fula e em especial dos regulados do Xime, Corubal, Badora e Cossé.

Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Bafatá > Bambadinca > Umaru Baldé (c. 1953-2004), soldado do recrutamento local,  nº 82115869, tirou a recruta e a especialidade no CIM de Contuboel. Foi apontador de morteiro 60, soldado arvorado e depois 1º cabo infantaria da CCAÇ 12 (1969-1972). Foi depois colocado, em Santa Luzia, Bissau, no quartel do Serviço de Transmissões, até ao fim da guerra. Conheceu, em mais de metade da vida, a amargura  e a solidão do exílio. Veio morrer a Portugal onde teve grandes camaradas e amigos, solidários, que o ajudaram.

Foto: © Benjamim Durães (2010). Todos os direitos reservados . [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Reedição de mensagem do Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70], só publicada quase cinco meses depois, por lapso dos editores (*):

Data: terça, 5/11/2019, 23:22

Assunto: O que será feito dos 'Putos-Soldados' do CIM de Contuboel

O que será feito dos 'Putos-Soldados'?

Passaram 50 anos que muitos 'putos' foram chamados prá tropa e receberam instrução militar em Contuboel.

Alguns apresentaram-se descalços, com as suas roupas usadas habituais e notava-se que eram muito jovens, mas diziam que tinham 18 anos.

Soube-se mais tarde que houve situações de recrutamento forçado, mas na maioria apareceram com vontade ser soldados. 'Manga de ronco' e 'manga de patacão' que lhes iria acontecer.

Não sabemos, eu não sei nem me lembro de contarem, como foram contactados e por quem (régulo/chefe de tabanca), e se lhes foi dito que iriam ser soldados para entrarem directamente na guerra, que eles já tão bem conheciam.

Não sei se vieram assentar praça, como um serviço militar obrigatório se tratasse, com a diferença de serem ainda menores, ou como uma espécie de voluntariado forçado (ideias de Spínola a fazer lembrar o recrutamento de crianças pelos nazis no final da guerra?).

E assim se formaram a CART 11 e a CCAÇ.12.

Também não soubemos se queriam ser soldados para fazerem guerra contra os 'bandidos' ou para ajudar (como já acontecera em séculos anteriores) os portugueses na guerra contra, neste caso, o PAIGC que queria a independência da Guiné.

Mas, a guerra acabou. Felizmente a guerra acabou.

Os 'putos-soldados' deixaram de ser soldados do Exército Português e passaram, automaticamente, à peluda da sua desgraça. 

Muitos houve que fugiram para não serem sumariamente executados, muitos outros não tiveram essa sorte e foram assassinados, os restantes resignaram-se voltando, já homens, às suas tabancas para serem o que já tinham sido. Foi sempre assim quando acabam as guerras.

E passados 50 anos o que será feito daqueles que conseguiram sobreviver?

Os que eram mais jovens devem ter, agora, 66/67 anos de idade. O que será feito deles?

Julgo que eram todos Fulas e maioritariamente eram das regiões de Gabu/Piche, os da CART 11, ou de Bambadinca/Xime, os da CCAÇ.12.

O Alceine Jaló era do meu Pelotão, casou-se muito novo com uma bajuda (Saco ou Taco?) e levou-a com ele para Guiro Iero Bocari. As mulheres e os filhos dos nossos soldados também dormiam connosco nas valas e aí aguentavam quando havia ataques à tabanca.

O que será feito deles?

Gostava muito de saber deles e peço um favor muito especial ao nosso grande amigo Cherno Baldé de tentar saber se eles ainda são vivos.

Como curiosidade com os 'putos', havia quatro soldados arvorados, e frequentavam a escola de cabos, em cada Pelotão sendo a escolha feita entre eles e um da nossa escolha. Dos quatro do meu Pelotão o da nossa escolha recaiu no Saliu Jau por ser impecável, mas deu algum recusa por parte dos restantes por o considerarem 'ser djubi mesmo pra cabo'.

Valdemar Queiroz

PS - Anexo fotos de alguns 'putos-soldados' , falta a do Umaru Baldé, talvez o 'puto mais puto', e que me foi oferecida quando estive com ele na Amadora.

(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)


2. Comentário do editor Luís Graça:


Vá temos falado sobre este tema, que nos é caro, tanto ao Valdemar quanto a mim e outros camaradas do blogue, o caso dos "meninos-soldados", que estiveram de um lado e do outro, do PAIGC e nas NT  (**). 

No nosso caso, podemos (e devemos) perguntar se houve "ética" (e respeito pela legalidade) no seu recrutamento...

Eu, o Valdemar e outros gradudados da CART 2479 / CART 11,  e da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 fomos instrutores destes putos, no CIM de Contuboel e eles estiveram sob as nossas ordens na guerra, uns na regiáo de Gabu, setor de Nova Lamego, outros região de Bafatá, setor L1 (Bambadicna). 

Foram extraordinários soldados e grandes camaradas, estes "meninos-soldados" que, no fina,l da guerra, tiveram um destino cruel. O mesmo que tiveram os comandos africanos cujo drama volta agora à ordem do dia,  retratado em reportagem de investigaçáo jornalística (do jornal digital "DivergenTE"), depois publicada em livro e POR FIM em documentário (de longa metragem), que está nas salas de cinema (***).

Em próximo poste serão publicados  comentártios dos nossos leitores sobre este(s) caso(s) (****).
 
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de  10 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20720: (De)Caras (147): O que é feito destes 'putos-soldados' da CART 11 e da CCAÇ 12 ? (Valdemar Queiroz)

(***)  13 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26149: Agenda cultural (868): Por ti, Portugal, eu juro!: documentário, de Sofia Palma Rodrigues e Diogo Cardoso (Portugfal, 2024, 98 minuto), sobre o drama dos Comandos Africanos da Guiné... Estreia mundial no doclisboa 2024, e agora nos Cinema

(****) Último poste da série > 26 de julho de 2024 > Guiné 61/74 - P25777: Casos: a verdade sobre... (47) "Fogo amigo", Xime, 1/12/1973: o obus 14 cm m/43 usava a granada HE (45 kg) com alcance máximo de 14,8 km... (Morais Silva, cor e prof art AM, ref; ex-cap art, instrutor 1ª CCmds Africanos, Fá Mandinga, adjunto COP 6, Mansabá, cmdt CCAÇ 2796, Gadamael, 1970/72)

segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26115: As nossas geografias emocionais (28): Gabu, antiga Nova Lamego (Valdemar Queiroz, ex-fur mil at inf, CART 11, 1969/70)



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Nova Lamego >  Quartel de Baixo >  1969 > O Valdemar Queiroz , em frada nº 3, e com o típico capacete colonial.


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Nova Lamego > Quartel de Baixo > 1969 > O Valdemar Queiroz  em dia de... sargento de dia (1)


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Nova Lamego > Quartel de Baixo > 1969 > O Valdemar Queiroz  em dia de... sargento de dia (2)



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Nova Lamego > 
Quartel de Baixo > 1969 >Porta d' armas. À   esquerda, o Valdemar e uma lavadeira.

Fotos (e legendas): © Valdemar Queiroz  (2034). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Nova Lamego > Quartel de Baixo > 1969 >"Porta de armas": continência à bandeira nacional.

Foto (e legenda): © Abílio Duarte  (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > Sede do Governo Regional de Gabu > s/d (c. 2011) > Fonte: Página do Facebook de Rádio Gandal 104.7 FM - Gabú, Guiné-Bissau (com a devida vénia...)






Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > 16 de dezembro de 2009 > A rua comercial da nova Gabu, onde há banco (agência do BAO - Banco da África Ocidental) e multibanco... Em 2009, a velha "rainha do Gabu" havia já destronado a "princesa do Geba", do nosso tempo, Bafatá, a cidade "colonial" mais encantadora da Guiné... Mudam-se os tempos, mudam-se os lugares: aqui falava-se mais francês do que português, e corriam muitos CFA, escreveu o João Graça, médico e músico, que viajou por estas paragens...  

Fotos (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > 2008 > Rua principal; ao fundo, a sede do governo regional. Fonte: Wikimedia Commons (com a devida vénia...)


"Repare-se nos magníficos poilões existentes nas traseiras do edifício e que faziam parte das sombras no nosso Quartel." (VQ)


Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > "Núcleo histórico"... Cortesia de:  Catálogo da exposição “Urbanidades – Arquitectura e Sítios Históricos da Guiné-Bissau”  Organização: Fundação Mário Soares (Alfredo Caldeira e Victor Hertizel Ramos); Curadoria: Ana Vaz Milheiro, com Filipa Fiúza,  ISCTE-IUL, DINÂMIA’CET, Lisboa, 2016)




Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > 16/2/2005 > Edifício da Estação dos CTT



Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > 16/2/2005 > Edifício da administração do Gabu

Fotos (e legendas): © José Couto / Tino Neves (2005). Fotos gentilmente cedida por José Couto (ex-fur mil trms, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71), camarada do nosso grã-tabanqueiro Constantino Neves.



Guiné > Região de Gabu > Nova Lamego > s/d  (c. anos 1940) > Sede da circunscrição. Fonte: desconhecida



Guiné > Região de Gabu > Nova Lamego >  1955 > Visita do Presidente da República, gen Craveiro Lopes, com o cortejo passando defronte do edifício da administração. Fonte: desconhecida.

(Fotos selecionadas por Valdemar Queiroz; nem todas se publicaram por falta de resolução; revisão / fixação de texto, edição de fotos: LG)




1. Mensagem de Valdemar Queiroz (ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70), membro da Tabanca Grande desde 16 de fevereiro de 2014; tem 186 referências no nosso blogue, de que é um leitor atento e comentador assíduo):



Data - sábado, 2/11, 14:55 (há 1 dia)

Assunto - Gabu (Nova Lamego) > Edifício do Governo Regional do Gabu

Parecia um Palácio.

Julgo que fora de Bissau não existia, em 1969/70, um edifício com a grandeza do da Administração de Nova Lamego, mais tarde do Governo Regional do Gabu.
 
A parte lateral esquerda e as traseiras do edifício, assim como um vasto terreno e um grande armazém, era ocupada por instalações militares, o chamado Quartel de Baixo, de Nova Lamego.

Todo o Quartel de Baixo era ocupado pela minha CART11, de soldados fulas do recrutamento local, que anteriormente por lá tinha estado instalada, julgo que parte, da CART 1742, do Abel Santos, que deixou interessantes vasos feitos das partes inferiores de barris de vinho.

Num piso superior, das traseiras do edifício, com acesso por uma escadaria para uma varanda a toda a volta, ficavam as instalações dos oficiais e sargentos e secretaria, sendo utilizada na parte da bela varanda virada à entrada pela messe de oficiais e sargentos.

Nas várias fotografias anexas, umas tiradas da Net e outras do nosso blogue, vê-se a parte frontal do edifício desde 1940 até à atualidade. 

Na fotografia do Abel Santos (à esquerda), embora pouco legível, vê-se a escadaria que dá acesso à grande varanda e instalações da Companhia, no rés do chão havia uma arrecadação. Como curiosidade, note-se a porta d'armas com um sentinela e usando uma simples corda a barrar a entrada.
 
É pena não haver fotografias no blogue com tropa fotografada junto da frontaria do edifício, assim como na 'parada' a apanhar a parte do Quartel instalado no edifício.

Dentro das nossas instalações havia uma porta trancada de ligação com um pátio do edifício que de uma das nossas janelas podíamos verificar tratar-se duma cadeia de penas leves de mulheres.

Havia valas e arame farpado em todo o perímetro do Quartel, tínhamos um morteiro 120 no meio da parada, um forte abrigo para o material e umas espessas paredes no edifício que aguentavam granadas de RPG-7.
 
Durante vários meses que estivemos instalados no Quartel de Baixo, apenas fomos atacados com os foguetões 122 que passaram por cima, mas os Pelotões da Companhia estavam em intervenção com acções de patrulhamento, reforço de outras unidades e segurança de outras tabancas.

Valdemar Queiroz





Guiné > Região do Gabu > Nova Lamego > CCS / BCAÇ 2893 (1969/71) > 1970 > Foto aérea > Povoação e quartel velho de Nova Lamego (hoje Gabu). Principais edifícios civis e militares 


Legendas:

(1) Caserna das Praças;
(2) Casas civis (para alugar);
(3) Loja dos irmãos Libaneses;
(4) Depósito de géneros;
(5) Estação dos CTT (civil);
(6) Destacamento de Engenharia;
(7) Messe de Oficiais;
(8) Messe de Sargentos;
(9) Parque e Oficinas Auto;
(10) Refeitório;
(11) Dormitório de alguns Sargentos;
(12) Sala do Soldado;
(13) Parque de Jogos.

Imagem aérea do quartel antigo e da vila de Nova Lamego.O quartel estava situado no centro da vila, formando um rectângulo e ocupando alguns edifícios civis. A foto já vinha com as marcas sem a respectiva legenda,que o Tino Neves completou. (Foto cedida por Roseira Coelho, que o Tino Neves presumia fosse ten pilav, mas não, segundo apurámos, trata-se de  José João Roseira Coelho, licenciado em Engenharia Eletrónica pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, ex-alf mil sapador, e professor.) .

Foto (e legendas): © Roseira Coelho / Tino Neves (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagenm complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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Nota do editor:

quarta-feira, 5 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25607: Convívios (1001): Rescaldo do XXXI Encontro da Rapaziada, e familiares, da CART 11/CART 2479, levado a efeito no passado dia 1 de Junho na Tornada, Caldas da Rainha (Valdemar Queiroz, ex-Fur Mil Art)

1. Mensagem do nosso camarada Valdemar Queiroz, ex-Fur Mil Art da CART 2479 / CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) com data de 3 de Junho de 2024 com o rescaldo do convívio da malta da CART 2479/CART 11:

Boa tarde, Luís,

No passado dia 01 de Junho realizou-se na Tornada (Caldas da Rainha) o 31.º Encontro da rapaziada e familiares da CART 11 (ex-CART 2479). 

Eu por razões de saúde e com muita pena não fui. É uma chatice.

Não apareceu muita gente, por já haver poucos, alguns terem falecido, doenças ou dificuldades financeiras para deslocações. Mas, por informação do Abílio Duarte, foi um dia bem passado em que não faltaram conversas do que se passou na Guiné há 55 anos. À última hora faltou o Macias que sempre haveria alguma conversa sobre caça no Alentejo.

Para o ano vai ser na zona do Porto, provavelmente aparecerá mais gente.

Abraço, saúde da boa para todos e que se vão repetindo estes Encontros.
Valdemar Queiroz


A Ementa apresenta os emblemas usados pela Companhia antes CART 2479 e depois CART 11 em intervenção com soldados fulas.
Na foto vemos em primeiro plano uma garrafa de bioxene do bom, os mesmos e o ex-condutor Costa, e em frente junto à parede o ex-condutor e ex-alf mil Martins e esposa 
Na foto vemos os ex-fur mil Pinto, Silva, Duarte, Pais, Canatário e Cunha em pé

 
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Nota do editor

Útimo post da série de 28 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25574: Convívios (1000): Grande Encontro de Rapazes de Mampatá na Quinta Senhora da Graça, Santa Marta de Penaguião (António Carvalho, ex-Fru Mil Enf.º)

quarta-feira, 29 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25575: (De) Caras (208): António Baldé, ex-1º cabo , CIM Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 56 (São João, 1969/70), e CART 11 (Paunca, 1970/71): "Eu tinha um sonho: ser apicultor no Cantanhez"...





















Guiné- Bissau > s/l > 2024 > O senhor apicultor e formador em apicultura, António Ussumane Baldé, membro da Tabanca Grande, desde 2013...


Fotos: © António Baldé (2024). Todos Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. De há muito que o António Baldé, nosso grão-tabanqueiro, tinha um sonho, ser apicultor.... Acaba de o realizar. (Ao fim de, pelo menos, vinte e tal anos, ou trinta. ) Fiquei muito feliz em sabê-lo. E prometi-lhe que publicava a notícia no blogue. Ele de vez em quando telefona-nos de Bissau, à Alice e a mim. Mandou-me mais de 70 fotos, pelo Whatsapp. Sem legendas.  Selecionei umas tantas. 

O Baldé, como lhe chama a Alice, foi 1º cabo art, CIM Bolama (1966/69), Pel Caç Nat 56 (São João, 1969/70) e  CART 11 (Paunca, 1970/71). 

Recapitulemos a sua história de vida, tal como eu a contei quando foi apresentado à Tabanca Grande em 25 de março de 2013 (*):

(i) António Ussumane Baldé nasceu em  Contuboel, em 1944;

(ii) foi educado, até aos 12 anos, pelo chefe de posto adinistrativo local, o português José Pereira da Silva, ainda vivo em 2013 (morava em Oeiras);

(iii) fez a 4ª classe e isso abriu-lhe outras portas que outros miúdos da sua tabanca não puderam franquear;

(iv) lembrava-se bem da serração do Albano, que ainda existia no meu tempo (junho/julho de 1969, quando Contuboel foi Centro de Instrução Militar, donde saíram, de entre outras, as futuras CART 11 e a CCAÇ 12);

(v) em 1966, foi chamado para a tropa: fez a recruta e a especialidade no CIM de Bolama ficou lá dois anos; promovido a 1º cabo, de artilharia, foi instrutor; lá se formaram diversos Pel Caç Nat;

(vi) em 1969 é transferido para o Pel Caç Nat 56, sediado em S. João, frente a Bolama;

(vii) em 1969 casou-se: será o primeiro de quatro casamentos; teve ou tem 15 filhos, o último dos quais a Alicinha do Cantanhez, filha da nalu Cadi Indjai (1985-2013) (por sua vez, filha de um antigo "combatente da liberdade da Pátria", que perdeu uma perna, na zona do Xitole, ao pisar uma mina dos "tugas", tendo estado na Alemanha de Leste, em reabilitação);

(viii) desse tempo, e do tempo do Pel Caç Nat 56, lembra-se com saudade dos furriéis Gil e Nuno, que gostaria de voltar a encontrar; não faz ideia do seu paradeiro; em São João esteve em 1969/70; 

(ix) será depois transferido para a CART 11, que estava em Paunca: esteve por lá em 1970/71: o comandante do seu pelotão era o alf mil Matos, que é de Ovar, e com quem ainda hoje convive e fala ao telefone: já foi a um (ou mais) dos convívios da companhia: esteve no destacamento de Sinchã Queuto [que eu só localizo a norte de Bafatá, e a sul de Contuboel, no mapa de Bafatá];

(x) saiu da tropa em finais de 1970 ou princípios de 1971; a mulher tinha ficado em Bolama;

(xi)  assistiu depois à independência; não tem boas memórias de Bambadinca desse tempo (teve de assistir a julgamentos populares selvagens e a execuções sumárias, bárbaras, pelo menos de um polícia administrativo e de um régulo, considerados "inimigos públicos nº 1 do PAIGC"); mas não teve, felizmente para ele,  quaisquer problemas com os novos senhores da Guiné-Bissau...

Ainda antes da independência tinha começado a trabalhar nos serviços agrícolas da província. Fez formação em floricultura, se não me engano. Foi ele e outros estagiários quem fez o jardim do Bairro da Ajuda, em Bissau, no tempo do administrador Guerra Ribeiro. 

Depois da independência começou a trabalhar com o engº agr Carlos Scwharz, no DEPA, na região de Tombali. Tem uma grande admiração pelo Pepito e pelo trabalho dele em prol do desenvolvimento da sua terra. (É cofundador, se não erro, e cooperante da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede no bairro do Quelelé, de que o Pepito  foi diretor executivo atà data da sua morte, em 2014).

No princípio deste século, veio a Portugal fazer um curso de apicultura, que era então (e continua a ser hoje)  a sua grande paixão. Acabou por ficar. Para sobreviver, trabalhou como segurança numa empresa de construção, no concelho de Cascais. Entretanto, obteve a nacionalidade portuguesa. Tinha, em 2013, um filho, de 13 anos, o Umaro Baldé, que vivia com ele e que estava a frequentar o 7º ano de escolaridade obrigatória, em Alfragide, e queria ser  informático (está neste momento em Inglaterra).

Em 2013, quando entrou para a Tabanca Grande estava desempregado. O seu sonho era voltar a Caboxanque onde tem casa, junto ao rio Cumbijã,  e desenvolver o seu projeto de apicultura no Cantanhez. Mas tinha dois filhos pequenos para criar (o Umaru e a Alicinha do Catanhez, que ele e a Alice quiseram trazer para Portugal). 

Muçulmano, ia todas as sextas feiras à mesquita central de Lisboa. Era um bom crente. Era uma homem afável, conhecia meio mundo, e pediu-me para ingressar na Tabanca Grande. Estava interessado sobretudo em partilhar os seus conhecimentos e a sua paixão como apicultor.

Conhecia-o nessa altura, em 2013.  Era o pai, biológico, da Alicinha do Cantanhez, filha da Cadi, a sua quarta mulher.  Ele vivia na zona de Cascais, onde era segurança. A empresa fechou, o Baldé ficou no desemprego. Um advogado, seu amigo, arranjou-lhe casa em Alfragide. Éramos,  pois, vizinhos de 'tabanca'.  Só conhecia a filha de fotografias e vídeos (que o Pepito mandava para a Alice) . Mas era um pai babado. Vivia em Portugal há já cerca de 10 anos. Éramos nós que lhe  dávamos notícias da mãe e da filha. Tinha casa em Caboxanque na margem esquerda do Rio Cumbijã.  Queria que lá fossemos um dia passar férias. Queria votar à sua terra com o diploma de apicultor (**).

A Alicinha e a mãe, nalu,
Cadi Indjai (1985-2013)

Infelizmente, tudo lhe correu mal. Estava a tentar aguentar-se cá 15 anos, fazendo descontos para a Segurança Social e contando com o tempo da tropa.  Nem o tempo de tropa lhe foi descontado nem a Segurança Social lhe garantiu uma pensão de reforma. Por outro lado, a Cadi morreu (em 2013)  e a filhota, a Alicinha do Cantanhez, não conseguiu chegar a Portugal nem perfazer os 5 anos (morreu em 2014). Vi-o chorar convulsivamente quando soubemos e lhe transmitimos a notícia, devastadora para todos. Adorávamos a Cadi e a Alicinha. E o Baldé passou também a fazer parte da família...  

Voltou para Bissau, com os sonhos desfeitos e sem o diploma de apicultor. Sem um tostão, sem a pequena reforma que seria fundamental para a concretização dos seus sonhos e poder alimentar uma família numerosa. 

Os primeiros anos forma difíceis. Em meados de 2019, passava-se fome em Bissau. Telefonou-nos um dia a dizer que estava em Caboxanque a passar mal.  São situações que nos destroçam o coração...  E depois veio a maldita pandemia de Covid-19. De tempos a tempos ia dando notícias. Tem cá uma filha e netos, em Massamá ou no Cacém.

 Finalmente há dias soubemos, por ele,  que as coisas estavam a correr melhor, em Bissau e em Caboxanque, e que para o ano ele ia a fazer a sua primeira grande colheita de mel. Tanto quando dá para perceber pelas fotos que nos enviou, sem legendas, tem o seu negócio, independente... Aos 80 anos (!), continua a perseguir o seu sonho de há muito!..."Com a ajuda do Criador", diz ele, humildemente, ao telefone. Faz formação (e ele próprio elabora os seus materiais pedagógicos) e monta colmeias. Tem já bastantes no Cantanhez.  Não sei se tem algum apoio de alguma OND. Enfim, uma história feliz, desta vez, mesmo que ainda não se possa dizer que terá um final feliz. Mas Oxalá, Enxalé, Insha'Allah!.... Parabéns, Baldé, tu mereces tudo de bom.  (***)

(**) Vd. poste de 7 de janeiro de  2014 > Guiné 63/74 - P12554: Ser solidário (157): O nosso camarada, luso-guineense, natural de Contuboel, desempregado, a residir em Alfragide, António U. Baldé, pai da Alicinha do Cantanhez, tem um sonho: ser apicultor em Caboxanque...
 
(***) Último poste da série > 4 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25478: (De) Caras (207): Homenagem póstuma da sua terra natal, Mealhada, ao ex-1.º Cabo At Inf do Pel Caç Nat 58, José da Cruz Mamede (1949-1970), morto na emboscada de Infandre, em 12/10/1970