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quarta-feira, 18 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20747: Memória dos lugares (406): Visita ao Campo do Tarrafal na Ilha de Santiago, Cabo Verde, em 2018 (Hélder Valério de Sousa, ex-Fur Mil TRMS TSF)

1. Mensagem do nosso camarada Hélder Valério de Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de hoje, 15 de Março de 2020:

Caros amigos

Os artigos sobre Cabo Verde e o Campo do Tarrafal[1], posteriormente também hipocritamente chamado de “Chão Bom”, tiveram algum efeito nas minhas emoções.

De tal modo que pensei em escrever alguma coisa sobre isso mas não me atrevi a fazê-lo sem antes proporcionar algum distanciamento.

Ora bem, já será conhecido por aqui no Blogue que o meu pai [, Ângelo de Sousa Ferreira, 1921-2001 ,ex -1º Cabo n.º 816/42/5 da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do R.I. 23, São Vicente, Cabo Verde, 1943/44, foto à esquerda] fez parte das forças expedicionárias que procuraram afirmar a soberania em Cabo Verde aquando do conflito designado por II Grande Guerra Mundial, nos inícios dos anos 40 do século passado.

Dessa permanência lá, na Ilha de São Vicente, chegavam-me por vezes alguns relatos, algumas referências, algumas recordações dele, quando se dispunha a falar sobre isso ou quando se viam as fotos. E as “fomes”, e as doenças e as alusões ao “Campo da Morte Lenta”, apareceram de forma natural e acabaram por ficar gravadas na minha memória. Relacionamento meu com Cabo Verde só por os aviões que utilizei nas férias tocarem o solo da Ilha do Sal nas suas idas para a Guiné.

No entanto, em finais de Julho de 2018, integrado numa delegação da minha Ordem profissional, participei em eventos ocorridos na Ilha de Santiago (aquela, onde, segundo uma canção, “tem corpinho de algodão, saia de chita com cordão…”.

O evento correu bem, a estadia também, gostei muito de lá ter estado, ainda experimentei a temperatura da água do mar, mas como não estava de férias não tive muito tempo para fazer visitas.

Apesar disso ainda fui pela “primeira vez” à Ribeira Grande e, como não podia deixar de ser e para cumprir os versos da conhecida canção da Cesária Évora, “um passeio sabe, fui dentro dum reservado” (já que fui, com outros, numa carrinha “reservada”). Visita interessante à primeira capital do arquipélago com algumas histórias/informações curiosas, de que ressalto a placa comemorativa e evocativa da passagem do Padre António Vieira pelo local (foto 1), mas não é dela que quero dar conta.

Foto 1

Estando lá, em Cabo Verde, na Ilha de Santiago, não me sentiria bem se não conseguisse visitar o Campo do Tarrafal (“Chão Bom”…) e prestar a minha silenciosa homenagem aos que por lá pereceram e sofreram. E assim foi.

Uma viagem relativamente longa e difícil dada a orografia do terreno, por boas estradas, com toda a aparência de construção recente, fruto de, salvo erro, apoios da União Europeia, com passagem por Somada (ou Assomada, terra do pai de Amílcar Cabral, segundo disseram) (Foto 2), onde foi feita uma paragem e se aproveitou para visitar o mercado local e comprar mangos e outras coisas.

Foto 2

Visitar o mercado local e comprar mangos e outras coisas (Foto 3).

Foto 3

Antes de se ir visitar o Campo da ignomínia fomos almoçar em local sobranceiro à praia. Areia fina, limpa, mar calmo (Foto 4).

Foto 4

Na visita ao Campo o primeiro impacto é logo a entrada do mesmo. Não é uma imagem estranha. Construção concebida segundo a “moda da época” e por isso faz lembrar o que será muito conhecido na entrada de Auschwitz, sem a famosa frase e à dimensão portuguesa, mas com o torreão e uma linha ferroviária que atravessa, prossegue depois sobre o fosso que separa a vedação externa e a mais interior e entra depois então no espaço do Campo (Fotos 5, 6 e 7).

 Foto 5

 Foto 6

Foto 7

Lá dentro sente-se (senti) o peso do passado, com as “barracas” para os presos (com a configuração da utilização mais “recente”, com construções para utilizadores distintos: angolanos, guineenses e outros (Foto 8).

Foto 8

Vi, como como não poderia deixar de ser, o que disseram ser a ”entrada” para a tristemente célebre “frigideira”, vi a sua versão mais “moderna”, a “holandinha” (Fotos 9, 10 e 11) e impressionou-me particularmente a leitura de algumas frases bem ilustrativas do modo de vida, do dia-a-dia naqueles espaços (Fotos 12, 13, 14 e 15).

 Foto 9

 Foto 10

 Foto 11

Foto 12

Foto 13

Foto 14

Foto 15

No regresso à Cidade da Praia passámos por um conjunto de instalações de envergadura (residências para estudantes, complexo hoteleiro e outras realizações) em construção pela “solidariedade chinesa” e deparei com uma estátua de Amílcar Cabral (Foto 16) que ilustra o contraste da atitude que existe em Cabo Verde para com o “pai da Pátria” com o que se houve dizer que se passa (ou passava) na Guiné.

Foto 16

Em resumo, a visita a Cabo Verde, mais propriamente à capital Praia, foi muito interessante e gratificante. Seja lá o dinheiro de quem for a verdade é que estão a fazer coisas acertadas e úteis. A visita ao Tarrafal deixa sempre, pelo menos a quem não for insensível aos dramas de outros, uma tristeza interior somente compensada pela certeza de que apesar desses miseráveis comportamentos o género humano afinal foi capaz de derrotar a barbárie.

Abraços
Hélder S.
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Notas do editor

[1] - Vd. postes de:

7 de março de 2020 Guiné 61/74 - P20708: (D)o outro lado do combate (58): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte V (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)

5 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20705: (D)o outro lado do combate (57): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte IV (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)

3 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20701: (D)o outro lado do combate (56): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte III (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)

2 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20698: (D)o outro lado do combate (55): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte II (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)

29 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20695: (D)o outro lado do combate (54): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte I (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)

Último poste da série de 17 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20742: Memória dos lugares (405): Cacela, a fadista Lucinda Cordeiro e o grupo "Cantar de Amigos", num vídeo do Zeca Romão (ex-Fur Mil At Inf, CCAÇ 3461 / BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, e CCAÇ 16, Bachile, 1971/73)

terça-feira, 16 de abril de 2013

Guiné 63/74 - P11405: 9º aniversário do nosso blogue: Questionário aos leitores (9): Resposta nº 17: Hélder de Sousa,ex-fur mil de Trms TSF (Piche e Bissau, 1970/72), membro da Tabanca Grande desde abril de 2007 e nosso colaborador permanente




Guiné > Bissau > Foto nº 1 > O Hélder de Sousa junto ao cais.




Guiné > Bissau > Foto nº 5 > O Hélder de Sousa em dia de aniversário, junto ao palácio do governador



Guiné > Zona leste  > Piche > Foto nº 11 >  Algures... em Piche

Fotos do álbum (esquecido...) do Hélder de Sousa


Fotos: © Hélder de Sousa  (2007). Todos os direitos reservados

A. Continuação da respostas ao inquérito por questionário aos nossos leitores. Resposta nº 17: Hélder de Sousa, ex-fur mil de TRMS TSF (Piche e Bissau, 1970/72), ribatejano, engenheiro técncio, residente em Setúbal, membro da Tabanca Grande desde abril de 2007 e nosso colaborador permanente:

Caros camaradas
Aqui vai a minha colaboração com as respostas às questões colocadas a propósito do 9º aniversário do nosso Blogue.

Saiu um pouco mais extenso do que o 'estilo telegráfico' que poderia ser mais fácil de ler mas fui pensando e escrevendo e reflectindo e acabou por sair o que vos envio.

Um grande abraço.


B. Resposta nº 17 >  Hélder de Sousa

Eu e o nosso Blogue

A propósito do próximo 9º aniversário deste espaço de partilha de memórias e afectos, que é o Blogue “Luís Graça e Camaradas da Guiné”, foi lançado um repto aos seus leitores, acompanhantes, membros e participantes, incluindo os ‘vigilantes’, para responderem a um pequeno inquérito, o qual poderá servir para melhor caracterizar o futuro do Blogue, conhecendo as motivações, os gostos e as expectativas daqueles que responderem.

Deste modo, segue-se o meu contributo.

As questões são:

(1) Quando é que descobriste o blogue?
(2) Como e através de quem? (por ex., pesquisa no Google, informação de um camarada)
(3) És membro da nossa Tabanca Grande (ou tertúlia) desde quando?
(4) Com que regularidade vês/lês o blogue? (diariamente, semanalmente, de tempos a tempos...)
(5) Tens mandado (ou gostarias de mandar mais) material para o Blogue (fotos, textos, comentários, etc.)
(6) Conheces também a nossa página no Facebook? (Tabanca Grande Luís Graça)
(7) Vais mais vezes ao Facebook do que ao Blogue?
(8) O que gostas mais do Blogue? E do Facebook?
(9) O que gostas menos do Blogue? E do Facebook?
(10) Tens dificuldade, ultimamente, de aceder ao Blogue? (Tem havido queixas de lentidão no acesso...)
(11) O que é que o Blogue representou (ou representa ainda hoje) para ti? E a nossa página no Facebook?
(12) Já alguma vez participaste num dos nossos sete anteriores encontros nacionais?
(13) Estás a pensar ir ao VIII Encontro Nacional, no dia 8 de junho, em Monte Real?
(14) E, por fim, achas que o blogue ainda tem fôlego, força anímica, garra... para continuar ?
(15) Outras críticas, sugestões, comentários que queiras fazer.



E as respostas são, pela mesma ordem:

1. Descobri [o Blogue]  em Fevereiro de 2007.

2. Depois de muitos anos em que a lembrança da Guiné era ‘calada’, embora cada vez mais fosse mais forte o apelo, encontrei o “Diário [da Guiné”,  de António Graça de Abreu,  e, através dele, pesquisando nos ‘links’ que lá se encontravam, cheguei ao Blogue.

Comecei a ler, cada vez de forma mais intensa, comovendo-me, irmanando-me, divertindo-me com o que ia lendo e a ‘projectar’ muitas vezes a vivência daqueles tempos.


3. Na sequência do que acima escrevi e para mais concordando inequivocamente com os ‘estatutos’, ‘regras de conduta’, ou lá o que quiserem chamar, balizando os comportamentos dos intervenientes, acabei por decidir que era um espaço que queria compartilhar e pedi para ‘entrar’ de modo a participar no II Encontro que ocorreu em Pombal, salvo erro a 28 de Abril, data do que seria o aniversário do meu Pai [, Ângelo de Sousa Ferreira,  1921-2001 ,ex -1º Cabo n.º 816/42/5 da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do R.I. 23, São Vicente, Cabo Verde, 1943/44 - foto à esquerda]

Sou, portanto, membro desde Abril de 2007. Existe o poste P1652, de 11 de Abril de 2007, que refere ‘três novos candidatos’, o José Pereira, eu e o Jorge Teixeira “Portojo”.

4. Vejo o Blogue quase diariamente, alguns dias mais do que uma vez. É uma visita ‘obrigatória’ embora a disponibilidade para poder dar maior sequência às intervenções esteja limitada por questões familiares e profissionais.

5. Sim, tenho enviado algum material para o Blogue. Comentários em quantidade razoável porque são mais rápidos de ‘produzir’ e para que aqueles que escrevem possam aferir se são lidos, sendo que isso pode ser estimulante e motivador para novos contributos.






As fotos são realmente poucas, pois a maior parte delas, as que tirei em Piche e que por lá deixei por esquecimento quando vim embora, perderam-se num ataque a uma coluna em que a caixa em que elas se encontravam foi atingida, tendo o seu portador, o que tinha sido o meu 1º Cabo Guedes, ficado ferido no pescoço.

Relativamente a textos, tenho enviado alguns, com as memórias das vivências daqueles tempos, retratando algumas situações ou personagens com as quais convivi, já que não tendo sido ‘operacional’ não tenho relatos de ‘operações’ por mim vividos, embora tenha como orientação que a nossa presença naquele território foi multifacetada e é o seu conjunto que pode fazer a “História”. Quanto a enviar mais material, pois claro que o farei, logo que seja oportuno, embora goste de ‘dar o lugar aos novos’.

6. Sim, conheço a página no “Facebook”, sou ‘amigo’ dela. [E tem página pessoal no Facebook]

7. Vou incomparavelmente mais [vezes] ao Blogue.

Aliás, no “Face”, é mais de ‘fugida’ e um ou outro raro comentário. Mas considero importante, útil e essencial que o Blogue esteja reflectido no “Face” já que por aí ganha outra ‘visibilidade’, atinge outro público e até é possível verificar que uma quantidade apreciável dos seus ‘amigos’ não está, ainda, como membro do Blogue.

8. Do que gosto mais no “Face” é aquilo que escrevi cima, ou seja, a capacidade de o Blogue projectar para outro tipo de público, outro tipo de audiência, aquilo que é a sua essência.

No Blogue, o que gosto é, francamente, quase tudo. As memórias das diferentes vivências, dos diferentes locais, dos diferentes tempos, podendo assim ser feito o ‘filme’ da evolução daquela época.

Não é um espaço de uma “Unidade”, de “Companhia”, de “Batalhão”, é uma janela para um espaço comum transversal a todo o tempo do ‘conflito’ e a todo o espaço geográfico. Em terra, no ar e no mar. No ‘mato’ e em Bissau. Nas acções e operações e nas peripécias do dia-a-dia.

9. Do que ‘não gosto’ no “Face” não sei dizer. Insisto em que é importante e necessária a presença do Blogue no “Face”.

Do que não gosto no Blogue é a falta de contenção verbal de alguns comentários, deixando-me particularmente triste quando partem de camaradas que ‘têm obrigação’, pela sua craveira intelectual, de saber que estão a cometer infracção às regras do Blogue e ao mínimo de civilidade no relacionamento que se deve ter.

Por vezes tenho mesmo a sensação que pode ser feito propositadamente para criar um clima de animosidade contra o Blogue com vista a potenciar ‘deserções’ de camaradas ‘incomodados’ com as truculências que provocaram.

10. Não senhor, não tenho tido dificuldades [de acesso].

11. Relativamente à página no “Face” o seu significado é o mesmo que acima referi, ou seja, estar presente numa ‘rede social’ de larga utilização, potenciando o conhecimento do Blogue e dos seus conteúdos a uma mais vasta e diversificada audiência.

Relativamente ao Blogue é muito mais difícil opinar. Para mim o Blogue foi (e é) uma via de reencontrar o passado. Não por saudosismo, inconsequente, nem por revivalismo, mas sim para recuperar explicações.

Através do Blogue tenho obtido um maior, mais vasto e mais profundo conhecimento da Guiné, do ‘meu tempo’ e de outros, tomei conhecimento de episódios que nem de perto os sonhava, conheci amigos, que tenho preservado.

O Blogue é, também, um local onde encontro ‘lições de vida’ de uma forma ‘concentrada’, de revelações de camaradas com jeito para a poesia, para a escrita, para a crónica.

12. Sim, já participei em vários dos nossos “Encontros”. Falhei o “I Encontro”, apesar de ter ocorrido aqui bem mais perto de onde vivo [, na Ameira, em Montemor o Novo], pois nessa altura ainda não conhecia o Blogue, e falhei, salvo erro, o “IV Encontro”, ou seja a segunda vez em Ortigosa.

13. Embora ainda não me tenha inscrito formalmente, é de facto minha intenção estar presente no nosso VIII Encontro [Nacional],  no próximo dia 8 de Junho,  em Monte Real [, Leiria].

A minha demora na inscrição prende-se com a saúde de um amigo que gostaria de levar e que está à espera de ser alvo de uma intervenção cirúrgica.

14. Se o Blogue ‘ainda tem fôlego, força anímica, garra, para continuar'... Já li por aqui coisas bem interessantes sobre o que alguns camaradas pensam disso. Palavras de incentivo, de afirmação de vontade, de bom senso.

Também penso que sim, que ‘ainda tem’ isso tudo. O Blogue! Mas, e as pessoas que lhe dão corpo? O desgaste é grande, a ‘batalha’ já é prolongada, a idade já vai ‘pesando’.

No entanto, a razão de ser da sua ‘criação’, que se revelou extremamente acertada, útil e até indispensável, não se esgotou.

Através do Blogue criou-se uma imensa rede de amizades, de conhecimentos, de cumplicidades, fizeram-se amigos, reencontraram-se outros, potenciaram-se “tabancas” para alegres convívios comensais e não só, criaram-se ‘grupos de trabalho’ para originar obras, incentivou-se camaradas a escrever as suas memórias, criou-se um imenso acervo fotográfico, deu-se voz a acções de cooperantes para se compreender que as novas gerações também sentem pela Guiné muito do que nós sentimos, possibilitou a ‘revelação’ de escritores e poetas, ajudou em trabalhos de estudo e de pesquisa, e muito mais.

Então, a questão não é se o Blogue tem isso tudo que é perguntado mas sim se as pessoas, e essas pessoas são os que dia-a-dia corporizam o Blogue, têm esses predicados.

E as pessoas não são só os Editores são, essencialmente, todos nós, os que lemos, os que queremos mais, os que fazem (ou fizeram) ‘blogueterapia’, os que ainda não contaram tudo.

15. As “outras críticas, sugestões e comentários” vão no sentido de apelar à contínua colaboração dos leitores do Blogue para que contribuam com mais material.

Pode-se pensar, ou dizer, que ‘já foi tudo dito’, que há temas ou assuntos que ‘já não se pode ouvir falar’, que os camaradas já contaram as suas vivências e que agora não têm mais, a não ser que inventem ou que romanceiem, mas isto não é totalmente verdade, basta ver dois ou três pequenos exemplos, como o caso do “Cifra”, do Veríssimo dos ‘melhores 40 meses da vida’ e do ‘sou amanuense, porra!’ para se perceber que há mais aspectos que ainda nos podem surpreender, tanto no conteúdo como nos intervenientes.

E é tudo! Um bom aniversário e votos de “quantos muitos” ao nosso querido Blogue.

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Nota do editor:

Último poste da série > 16 de abril de 2013 > Guiné 63/74 - P11404: 9º aniversário do nosso blogue: Questionário aos leitores (8): Resposta nº 16: Jorge Pinto, ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74)

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Guiné 63/74 - P10282: Meu pai, meu velho, meu camarada (30): Dispositivo militar metropolitano em Cabo Verde (Ilhas de São Vicente, Santo Antão e Sal) durante a II Grande Guerra (José Martins)

1. O nosso camarada, amigo e colaborador permanente José Martins mandou-nos, em 27 de julho passado, os seguintes quadros com a seguinte nota
 

Boa tarde: Aqui vai quadro da distribuição, pelos locais de destino, das forças enviadas para Cabo Verde [durante a II Guerra Mundial].


Ab. José Martins













a) Joé Martins, maio de 2012


2. Comentário de L.G.:  

Zé, sei que estás a passar por um momento difícil, tu e a tua família (a tua ainda recente passagem à reforma, o desemprego, inesperado e litigioso,  da tua esposa, a nossa querida amiga Manuela...), mas mesmo assim ainda consegues pensar no nosso blogue e arranjar tempo e pachorra para procurares,  no silêncio dos arquivos,  preciosos dados relativos ao nosso dispositivo militar em Cabo Verde, durante a II Grande Guerra.

Sabes do carinho que eu tenho por aquela terra, onde o meu pai (e os pais de outros amigos e camaradas nossos, como o Nelson Herbert, o Hélder Sousa, o Augusto S. Santos...) estiveram como expedicionários, integrando o RI 23...Lembremos aqui os seus nomes:  Luís Henriques, Ângelo Ferreira Sousa, Porfírio Dias e Armando Lopes... 

Ainda há dias descobri mais outro, o António Caxaria, de 94 anos, ex-furriel miliciano, muito amigo do meu pai, natural de (e residente em) o concelho da Lourinhã... Irei um dia destes visitá-lo na sua quinta, em São Bartolomeu dos Galegos, e relembrar histórias do seu tempo em Cabo Verde (1º Batalhão de Infantaria do RI 5, integrado no RI 23, Mindelo, Ilha de São Vicente, 1941/43). Está com uma ótima cabeça e tem algumas fotos desse tempo. 

Em face dos teus números, pode-se concluir que cerca de 52,9% dos nossos expedicionários (de um total superior a 6300) estavam concentrados numa só ilha, a Ilha de São Vicente, dado o seu interesse estratégico (porto atlântico ligando a Europa com a América Latina, a par dos cabos submarinos). O resto distribuía-se pela Ilha do Sal (35,3%) e pela Ilha de Santo Antão (11,8%).  Menos de 1% estava afeto ao serviço de transmissões.

O meu velhote, Luis Henriques (1920-2012), se fosse vivo, teria feito ontem 92 anos... Dedico-lhe, à sua memória e à memória do Ângelo e do Porfírio (que também já nos deixaram), e em homenagem ao Armando (felizmente ainda vivo,  vai completar 92 anos em 23 deste mês), este poste que tu preparaste com a competência e o carinho que pões em tudo o que se refere aos nossos antigos combatentes, alguns dos quais foram nossos pais... Um alfa bravo para ti, um xicoração para a Manela. LG



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > 2006 > Ponta João Ribeiro > Restos da baterias de artilharia de costa, do tem,po da II Guerra Mundial...  Estas posições de bateria de artilharia de costa protegiam a baía do Mindelo. A Ponta João Ribeiro fica hoje a 3 km da cidade do Mindelo. Em frente, a uns escassos 600/800 metros, situa-se o ilhéu dos Pássaros.

Foto: © Lia Medina (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
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Nota do editor

Último poste da série > 8 de maio de 2012 >Guiné 63/74 - P9870: Meu pai, meu velho, meu camarada (29): Luís Henriques (1920-2012): Você deixou o nosso ranchinho abandonado... (Luís Graça)

sábado, 14 de abril de 2012

Guiné 63/74 - P9744: Meu pai, meu velho, meu camarada (28): O RI 23, (re)constituído na Ilha de S. Vicente (agosto de 1941/dezembro de 1944): a unidade a que pertenceram Luís Henriques, Ângelo Ferreira Sousa, Porfírio Dias e Armando Lopes (José Martins)

1. Comentário do nosso colaborador permanente José Martins, com data de 11 do corrente, ao poste P4926 (*):


A foto nº 2 [, à esquerda,] tem uma referência, com interrogação, acerca do RI 23.
[Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 2 > Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001), pai do nosso camarada Hélder Sousa, natural de Vale da Pinta, Cartaxo, ex-1º Cabo n.º 816/42/5 da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do R.I. 23 (?)... Tem a data de 18 de Outubro de 1943 e na legenda refere ser 'recordação de S. Vicente'.]


O RI 23 foi constituído em Cabo Verde, na Ilha de S. Vicente, sob o comando do Brigadeiro Augusto Martins Nogueira Soares (Agosto de 1941 a Dezembro de 1944).


Faziam parte deste regimento:


1 Batalhão do RI 5 (Caldas Raínha)
1 Batalhão do RI 7 (Leiria)
1 Batalhão do RI 15 (Tomar)
Bateria de Artilharia Costa 1
Bateria de Artilharia Costa 2
Bateria Artilharia Contra Aeronaves 9,4 cm
Bateria Artilharia Contra Aeronaves 4 cm
Bateria de Referenciação, a 2 Divisões
2ª Companhia de Sapadores Mineiros do Regimento de Engenharia 2


Mais os seguintes serviços de apoio:


Parque de Engenharia
Secção de Padaria
Depósito de Subsistências e Material
Laboratório de Análise de Águas
Hospital Militar Principal de Cabo Verde
Depósito Sanitário
Tribunal Militar


Ab
José Martins


2. Comentário do editor:


A origem do RI 23 remonta à epoca da Restauração (1641). A designação de RI 23 data de 1806. Notabilizou-se na luta contra as tropas napoleónicas (por ex., defesa de Almeida e  batalha do Buçaco, 1810). Ao RI 23, (re)constituído na Ilha de São Vicente, Cabo Verde, durante a II Guerra Mundial, pertenceram os "nossos camaradas" Luís Henriques (1920-2012) (pai do Luís Graça), Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001) (pai do Hélder Sousa), Porfírio Dias (1919-1988) (pai do Luís Dias) e Armando Lopes (felizmente ainda vivo) (pai do Nelson Herbert). (**)

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quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P4926: Meu pai, meu velho, meu camarada (12): 1º cabo Ângelo Ferreira de Sousa, S. Vicente, 1943/44 (Hélder Sousa)

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mapa de 2007, da autoria de Francisco Santos. Imagem copyleft (Fonte: Wikipédia)

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 2 > Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001), pai do nosso camarada Hélder Sousa, natural de Vale da Pinta, Cartaxo, ex-1º Cabo n.º 816/42/5 da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do R.I. (23 ?) [ou seria do R.I. 5, Caldas da Raínha ? (LG)]... A foto 2 tem a data de 18 de Outubro de 1943 e na legenda refere ser 'recordação de S. Vicente'.

Cabo Verde > Ilha de São Vicente (?) > Foto nº 24 > 1º Cabo Ângelo Ferreira de Sousa (n. 1921 e, infelizmente, já falecido, em 2001). A foto 24 tem a data de 28 de Setembro de 1944 e acho que se trata de recordação já depois do regresso [à Metrópole].

Caldas da Rainha > 8 de Maio de 1943 > Foto 1 > A foto 1 é das Caldas da Raínha, com data de 8 de Maio de 1943 e tem no verso a indicação de ter sido 'tirada na véspera da minha retirada para Cabo Verde e um dia depois da promoção a 1º Cabo'. [Ao fundo, a fachada do hospital termal, (LG)]...

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Baía do Mindelo > Foto nº 3 > S/d > A foto 3 não tem referências a datas mas é visível tratar-se do [navio] Colonial [, ainda a navegar no final dos anos 40; o meu pai tem uma foto do Mouzinho de Albuquerque, que me parece ser do mesmo tipo ou série(LG)].

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > Foto nº 4 > S/d > A foto 4 é equivalente à que está no texto sobre o teu pai. Tratam-se de 'barcos hospitais' e não há dados no verso da foto. No entanto é provável serem os mesmos [, italianos,] que se estão referenciados na troca de prisioneiros e doentes em 1942 [antes, portanto, da chegada do meu pai]. Deve tratar-se de 'postal ilustrado'... [Segundo informação do nosso amigo açoriano João Coelho, ex-FAP, tratava-se do Vulcania e do seu irmão Saturnia, dois navios de passageiros italianos, transformados em hospitais durante a II Guerra Mundial; eram, conhecidos dos açorianos de São Miguel; o Vulcania terá navegado até 1974!... Segundo o meu pai, estes navios chegaram a São Vicente e ficaram ao largo da baía do Mindelo em 11 de Abril de 1942 (LG)].

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > As fotos 5 e 6 referem-se a uma parada militar ocorrida em 14 de Agosto de 1942, dia do exército. Nessa data o meu pai ainda não estava lá pelo que essas fotos devem ter sido adquiridas mais tarde e devem ter servido de recordação. [Deve tratar-se de postal ilustrado: Foto Melo. (LG)].

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 6 > Comemoração do dia do exército, 14 de Agosto de 1942. Foto: Melo. [Vê-se ao fundo o Ilhéu dos Pássaros, (LG)]


Cabo Verde> Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 7 > S/ d > A foto 7 ilustra a passagem dum zeppelin mas não tem datas. [É uma raridade esta foto: ao que parece, dataria de 1937, ano e que o Mindelo foi sobrevoado por um dirigível que pretendia abrir uma carreira entre a Europa e o Novo Mundo, o LZ 129 Hindenburg, de fabrico alemão:

(...) Reza a História, que o dito aparelho, uma das grandes apostas à época para o transporte de passageiros, adoptando os mesmos tipos de luxos dos grandes 'Paquetes Transatlânticos' que estabeleciam as ligações entre os três continentes, Europa, África e Américas, fez só uma viagem ligando os dois continentes. Partiu da Velha Europa para o Novo Mundo - o continente Americano, tendo passado sobre CV.

"Mindelo ficou na sua rota e Tuta registou esse momento, único! O aparelho passou sobre a Ilha de São Vicente, tendo largado três sacos de 'Mala Postal' - a forma complicada como se dizia correio - e teve um fim trágico ao aterrar em Lakehurst nos USA [, em 6 de Maio de 1937].

"Para os arquivos, fica mais esta imagem, só possível em Mindelo, pelo manancial de informação que corria na ilha, por causa dos cruzamentos dos cabos submarinos do Telé grafo Inglês e da Italcable (Italianos) e do seu movimentado Porto, também à época local de passagem obrigatória para os barcos que cruzavam o Atlântico Sul" (...)".


Fonte: sítio Mindel Na Coraçon


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 8 > S/d > A foto 8 é também equivalente a uma outra que o Luís mostra com tubarões. Também não tem data. [Nao se sabe quem seja a criancinha que, insolitamente, aparece em primeiro plano, (LG)]

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > S. Pedro > Foto nº 9 > As fotos 9 e 10 têm a data de 16 de Junho de 1943 e referem no verso terem sido 'tiradas nas rochas do mar em S. Pedro, [a sudoeste do Mindelo,] com amigos de 40, 41 e 42'.

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > S. Pedro > Foto nº 10 > 16 de Junho de 1943

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > Foto nº 11 > As fotos 11, 12 e 13 têm data de 21 de Agosto de 1943 (dois dias depois do 23º aniversário do pai do Luís) e no verso consta terem sido tiradas 'junto à Caserna da 4ª Companhia, estandono dia em que fiz 3 meses de África', donde eu presumir que deve ter chegado lá cerca de 21 de Maio de 43, o que estará certo.

Cabo Verde >Ilha de São Vicente > Foto nº 12 > 21 de Agosto de 1943

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > Foto nº 14 > A foto 14 não tem data mas tem no verso o seguinte 'Nos dias de S. António e S. João nativos dançando cancan ou cola-cola' [o famoso 'cola Sanjon', ponto alto, hoje, dos festejos tradicionais do São João, em Junho]

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > Foto nº 15 > A foto 15, datada de 30 de Janeiro de 44, diz que se trata de 'recordação do Quartel de Chã do Alecrim, S. Vicente, Cabo Verde'. [Chã de Alecrim ficava a nordeste do Mindelo, perto da Baía de Laginha, estando hoje integrada na cidade (LG]].

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Chã do Alecrim > Foto nº 16 > A foto 16, também datada de 30 de Janeiro de 44, diz o mesmo que a anterior mas acrescenta: 'Esta é a nossa querida Bandeira'. [As fotos 20, 21 e 22 não têm datas nem referências, embora nesta última se possa identificar a tal Caserna da 4ª Companhia; não têm um mínimo de qualidade, razão por que não se publicam, LG].

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > > Praia da Matiota > Foto nº 17 > As fotos 17, 18 e 19 não têm elementos para além da data e de que se trata da Matiota, local da praia, presumo.

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > Foto nº 18 > Praia da Matiota

Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo > Foto nº 19 > Praia da Matiota

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 23 > A foto 23 tem a data de 10 de Setembro de 1944 e diz ser 'recordação da despedida de Cabo Verde, com dois 2ºs Cabos nativos, amigos'. [As fotos 20, 21 e 22 não têm datas nem referências, embora nesta última se possa identificar a tal Caserna da 4ª Companhia; não têm um mínimo de qualidade, razão por que não se publicam (LG)].

Fotos: © Hélder Sousa (2009). Direitos reservados. (Legendas de HS e LG)




Vídeo (2'50''): © Luís Graça (2009). Direitos reservados (Disponível no You Tube > Nhabijoes)


Luís Henriques, de 89 anos, natural da Lourinhã, ex-1º Cabo Expedicionário na Ilha de São Vicente, Cabo Verde (1941/43), improvisa uma letra, ao som da música da conhecida morna, popular, de autor desconhecido, 'Papá Joaquim Paris', uma das jóias da música de Cabo Verde, imortalizada por nomes como o Bana, a Cesária Évora, o Tito Paris, etc.

Luís Henriques: Nascido em 19 de Agosto de 1920, na Lourinhã, foi mobilizado para Cabo Verde, durante a II Guerra Mundial, como 1º Cabo nº 188/41, 1º Pelotão, 3ª Companhia, 1º Batalhão do Regimento de Infantaria nº 5 (unidade mobilizadora, das Caldas da Rainha). É pai do Luís Graça (*)...

Tal como o pai do Hélder Sousa, o meu esteve na Ilha de São Vicente, na cidade do Mindelo, de 23 de Julho de 1941 a (?) de Setembro de 1943. Ao todo, foram 26 meses "a comer pó". Esteve aquartelado no Lazareto, a oeste da cidade do Mindelo (cidade, na época, mais importante que a Praia, capital político-administrativa do arquipélago, na Ilha de Santiago). Lembra-se de, ao regressar à sua terra, a primeira coisa que quis comer foram uvas...

Mas a peluda só veio, oficialmente, em Janeiro de 1944. O mundo inteiro vivia o pesadelo da II Guerra Mundial... E Portugal tinha milhares e milhares de homens espalhados pelos diversos territórios do seu Império, incluindo as estratégicas ilhas adjacentes, da Madeira e dos Açores. Das colónias africanas, o arquipélago de Cabo Verde era o território que ficava mais perto da Europa e do teatro de operações do Atlântico Norte... Pelo seu posicionamento geoestratégico, aero-naval, esteve na mira tanto dos Aliados como das potências do Eixo...

Do Mindelo, o meu pai lembra-se de pessoas e lugares: por exemplo, o seu impedido, o Joãozinho, com quem repartia o rancho, e que morreu, de doença, quando ele próprio estave internado (no interior da ilha ), durante 4 meses, com "problemas de pulmões... Lembra-se do Monte Cara, do Lazareto, da praia da Matiota, de São João da Ribeira, do Calhau... Sei que nunca foi à Baía das Gatas, por exemplo (hoje conhecida por ser uma estância de turismo e pelo seu famoso festival de música)... nem nunca explorou muito bem o lado meridional da ilha... (Bastavam-lhe os longos e penosos exercícios físicos e marchas que faziam no interior da ilha, para se manterem em forma, matar o tédio, esquecer a fome, a sede e a saudade)...

Lembra-se, além disso, dos nomes (e até dos números ) de alguns camaradas... Lembra-se dos nomes e de alguns histórias dos seus oficiais (alguns, bem prussianos, militaristas, germanófilos, de acordo o o figurino da época) ... Lembra-se até dos resultados dos renhidos torneios de futebol e de voleibol que se realizavam no Mindelo, entre tropas de diferentes subunidades... Escreveu centenas e centenas, senão mesmo alguns milhares, de cartas, em nome daqueles que na época (e eram muitos...) não sabiam ler e escrever... Muitas vezes eram os próprios putos cabo-verdianos, engraxadores de rua, escolarizados, que liam as cartas recebidas pelos expedicionários, metropolitanos, analfabetos... Que triste ironia!...

Mas, fantástico, os ex-expedicionários de Cabo Verde desta época continuaram a encontrar-se durante muitos e muitos anos, até à década de 1990... O meu velhote costumava ir aos encontros do 1º Batalhão do RI 5, nas Caldas da Raínha... até que as pernas começarem a falhar e a maior parte deles, dos seus camaradas, desapareceu de chez les vivants... (LG)


1. Mensagem de 1 de Setembro, do nosso camarada Hélder Sousa


Caro Luís e restantes Editores

Faz algum tempo, quando saiu o P4059, em 20 de Março passado (*), que algumas das situações lá referidas e algumas fotografias me fizeram sentir que me eram familiares. Acho que te dei conta disso em comentário.

Esse artigo ou texto ficou inserido numa série intitulada "Meu pai, meu velho, meu camarada" e nele referias a estadia do teu Pai inserido no Corpo Expedicionário Português em Cabo Verde, ao tempo da 2º Grande Guerra Mundial.

Acontece que o meu Pai, entretanto falecido faz alguns anos, também foi Expedicionário em Cabo Verde. Também esteve em S. Vicente. Curiosamente, também, no verso de algumas fotografias, tem escritos a tinta verde, como tu indicas nos escritos do teu Pai. Talvez seja só coincidência. Talvez fosse moda na época. Talvez fosse o tipo de material de escrita que havia ou era distribuída aos militares, disso, agora, por mim, não consigo aclarar, por razões óbvias.

Só agora consegui que a minha Mãe, adoentada, me facultasse as fotos que estavam guardadas "algures".

Recuperei algumas que envio em anexo. Pode ser que o teu pai identifique alguém ou consiga lembrar-se das situações.

Existem fotos repetidas, ou quase, relativamente às que fizeste acompanhar o texto referido, como as dos "barcos hospitais" e as dos "tubarões", bem como as das "festas nativas".

Segundo os dados que consegui obter dos versos das fotos, o meu Pai, nascido a 28 de Abril de 1921, fez a recruta nas Caldas da Raínha, onde passou a 1º Cabo, em 7 de Maio de 1943, e donde terá partido em 9 de Maio (?) para a sua "retirada" (como ele escreve) para Cabo Verde onde, supostamente, pelas tais notas nas fotos, terá chegado em 21 de Maio de 1943. Calculo que, tudo isto a bater certo, se terá cruzado com o teu Pai ainda lá, pois existe uma foto dele no dia de anos em 19 de Agosto de 43 em S. Vicente.

De acordo com notas que encontrei no verso de algumas fotos, o meu Pai, chamado Ângelo Ferreira de Sousa, natural de Vale da Pinta, Cartaxo, seria o 1º Cabo n.º 816/42/5 da 4ª Companhia do 1º B.I. do R.I.(23 ?) [ou seria do R.I. 5, Caldas da Raínha ?] (

Eu e o meu Pai não falámos muito destas nossa experiências africanas, ou quase. Aliás, acho que nem sequer falámos disso. Por acaso referes no teu texto o livro Hora di Bai, de Manuel da Fonseca, que também li e que na altura me deu para entender (pelo menos nos meus conceitos) os tempos por lá vivido.

É claro, também, que "não estive lá" e se calhar, por isso, não poderia entender, como agora parece ser apanágio de alguns amigos que acham que só quem "esteve" é que pode falar ou entender. Entender, todos podem. Falar, no sentido de "saber", é certo que quem viveu pode corrigir e falar talvez mais acertadamente, esclarecer melhor um ou outro pormenor, uma data, uma hora, um número de Companhia, mas não pode impedir que se fale do assunto. Por esse ponto de vista estreito não se podia falar da tomada de Lisboa aos mouros, "não se esteve lá", nem da batalha do Salado, "não se esteve lá", nem da viagem de Vasco da Gama à Índia, "não se esteve lá", e por aí fora com aberrações semelhantes.

Tive dois professores caboverdeanos. Um deles, Francelino Gomes, autor dum dos melhores livros de matemática que conheci e que muito me ajudaram na minha vida escolar, o livro e o professor. Outro foi o Terêncio Anahory, que chegou a viver no meu prédio, em Vila Franca de Xira, e que também estava referenciado como um dos autores contemporâneos de poesia caboverdiana. Como vês, os contactos com Cabo Verde são estreitos.

As fotos que te envio, com legendas, podem talvez ajudar a criar referências e a possibilidade de o teu Pai identificar algumas coisas e ou pessoas.

Um abraço

Hélder Sousa

2. Nova mensagem, de 2 de Setembro , do Hélder:


O texto que antes enviei com as fotos em anexo, tinha o objectivo inicial de apenas seguir para o Luís para ele mostrar as fotos ao Pai e a partir daí ver se haveria alguma identificação.

Por isso, em algumas partes da escrita a mesma é dirigida ao Luís. Depois, com o correr do tempo e a passagem das fotos, acabei por enviá-la para o Blogue.

Acho que se entenderem que terá matéria para publicação será necessário, talvez, algum enquadramento, pois poderão não faltar "vozes" a dizer que Cabo Verde não tem nada a ver com a nossa estadia na Guiné e o blogue é "camaradas da Guiné" e não com "velhadas em Cabo Verde".

Poderá ser qualquer coisa, como introdução, que relacione um pouco as questões do envolvimento das diferentes gerações nas épocas de guerra (o meu avô na 1ª Grande Guerrra, o meu pai contemporâneo da 2ª Guerra Mundial, eu e a minha/nossa geração nas frentes africanas).

Espera-se que os nossos netos (para os que os têm) tenham a mesma sorte que os seus pais, nossos filhos, os quais não tiveram que entrar em nenhuma situação semelhante.

Ainda bem!
Um abraço
Hélder Sousa

3. Comentário de L.G:

Hélder:

Quero publicamente agradecer-te estas autênticas preciosidades!... (Já o fiz em privado). Como te tinha prometido, aqui vão as fotos do teu pai, com as tuas legendas e o teu texto introdutório, inseridos na série Meu pai, meu velho, meu camarada.

É uma justa, justíssima, embora pequena, homenagem que fazes, não só ao teu vellho, aos nossos velhos (o meu felizmente ainda vivo, com 89 anos feitos em 19 de Agosto passado, no memso dia do Mário Fitas), mas também aos nossos amigos e irmãos de Cabo Verde... Seria uma pena que essas velhas fotos (e as memórias que elas cristalizam) se perdessem... É uma património (documental) também a preservar, e que pertence a todos... Quanto ao resto, deixa lá para trás eventuais críticas ...

Vou, de resto, fazer o mesmo com as fotos dos expedicionários que estiveram em Goa, Damão e Díu, até à data da invasão indiana, em Dezembro de 1961... Temos tendência, quando escrevemos ou falamos sobre a guerra colonial, para esquecer o caso da Índia Portuguesa, a jóia da coroa do nosso Império Colonial. Tenho um primo, o Luís Maçarico, de Ribamar, que esteve lá preso, nessa época ... A maior parte da malta ficou sem nada, incluindo os álbuns fotográficos... Ele consegiu salvar e trazer o seu...

Nunca estive em Cabo Verde (apenas duas horas no Sal, em 1970, na minha ida de férias à Metrópole, no voo Lisboa-Bissau, numa paragem técnica), mas é como que se lá tivesse vivido, nesta ou noutra incarnação... Como já aqui o disse, o álbum fotográfico do meu pai foi para mim, desde pequenino, uma fonte de maravilhamento por essa África tão próxima e tão distante, tão quente e tão estranha...

No fim de semana vou estar com o meu velhote, no casamento de um neto dele... Vou testar, mais uma vez, a sua memória... Tenho um entretanto um improviso, comovente, dele, acompanhando a música (a parte instrumental) dessa fabulosa morna que se chama Papá Joaquim Paris, imortalizada pela Cesária Évora, entre outros grandes intérpretes de Cabo Verde... Já pus no You Tube > Nhabijoes... (Escuta, entretanto, a diva aqui: http://www.youtube.com/watch?v=OhpTTXUmN64o ).

Um abraço. Luis

4. Esclarecimento posterior do H.S:

Caros amigos: Em relação à data do falecimento do meu pai foi em 21 de Novembro de 2001. Problemas da próstata, por isso cuidem-se, meus amigos...Não a coloquei logo porque tinha a dúvida se teria sido em 2002 ou 2003 (pensamos sempre que o tempo não passa...) mas para tirar a dúvida a minha irmã esclareceu a data correcta.

Relativamente ao que o Luís refere sobre o facto de ter crescido com a visão das fotos, é curioso ele dizer isso, porque comigo sucedeu parecido, já que quando estava doente com anginas (antes da operação às amígdalas) era costume ficar com algumas coisas para me entreter entra as quais a caixa com as fotos do meu pai. Aí via esses exotismo e imaginava-me lá. Quem diria!

Um abraço. Hélder

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes da série:


20 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4059: Meu pai, meu velho, meu camarada (1): Memórias de Cabo Verde, São Vicente, Mindelo, 1941/43 (Luís Graça)

21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4060: Meu pai, meu velho, meu camarada (2): Militar de carreira, herói da 1ª Grande Guerra, saiu do RAP 2 como eu (David Guimarães)

21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4062: Meu pai, meu velho, meu camarada (3): No Dia Mundial da Poesia (António Graça de Abreu)

24 de Maio de 2009> Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camarada (4): Não é um elogio fúnebre que te quero dedicar... (António G. Matos)

26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4420: Meu pai, meu velho, meu camarada (5): A minha família e o RAP2 (Vila Nova de Gaia) (David Guimarães)

16 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4694: Meu pai, meu velho, meu camarada (6): Ex-Cap Pára João Costa Cordeiro, CCP 123/ BCP 12 (Pedro M. P. Cordeiro / Manuel Rebocho)

17 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4700: Meu pai, meu velho, meu camarada (7): Cap Pára João Costa Cordeiro: Um homem de carácter (António Santos / Carlos Matos Gomes)

17 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4703: Meu pai, meu velho, meu camarada (8): Sobre o Capitão-Pára João Costa Cordeiro (Manuel Peredo)

18 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4705: Meu pai, meu velho, meu camarada (9): Testemunho do Coronel Pára Sílvio Araújo sobre o Cap-Pára João Costa Cordeiro (João Seabra)

18 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4706: Meu pai, meu velho, meu camarada (10): Depoimento e fotos sobre o Cap-Pára João Costa Cordeiro (Miguel Pessoa)

24 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4731: Meu pai, meu velho, meu camarada (11): Mensagem do filho do Cap-Pára João Costa Cordeiro (Pedro Miguel Pereira Cordeiro)

(**) Outro Regimento que teve tropas destacadas, a nível de batalhão (800 homens), durante a II Guerra Mundial, em Cabo Verde, nas Ilhas de São Vicente e Santo Antão, foi o RI 15 (Tomar):

Vd. Islas de Cabo Verde > Adriano Moreira Lima > Tomar, 25 de Fevereiro de 2006 > TROPAS EXPEDICIONÁRIAS A CABO VERDE DURANTE O PERÍODO DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL - MEMÓRIA QUE PERDURA

(...) Como é sabido, Portugal não teve qualquer envolvimento na Segunda Guerra Mundial, tendo optado por uma posição de neutralidade que se manteve ao longo de todo o conflito. No entanto, sabedor da importância estratégica das suas ilhas atlânticas, nomeadamente os arquipélagos dos Açores e de Cabo Verde, alvos apetecidos por qualquer dos contendores, Portugal entendeu que seria curial guarnecer aqueles territórios com forças militares suficientes para dissuadir qualquer veleidade por parte dos beligerantes.

O conflito assumira uma dimensão considerável no Atlântico e aqueles arquipélagos eram, com efeito, detentores de elevado potencial estratégico, sobretudo do ponto de vista aero-naval. Uma fraca presença militar de forças nacionais poderia indiciar um sintoma de desleixo, susceptível de encorajar uma ocupação estrangeira à revelia do direito internacional, em manifesto atropelo da soberania portuguesa.

O Regimento de Infantaria nº 15, de Tomar, foi das unidades do exército que enviaram forças expedicionárias a Cabo Verde. Conheço muito bem o historial deste Regimento por nele ter servido durante longos anos. E é assim que me capacito a divulgar a curiosa memória afectiva que os expedicionários deste Regimento de Infantaria desde sempre vêm cultivando e perpetuando.

A par de outros Regimentos do Exército, competiu ao Regimento de Infantaria nº 15 organizar e mobilizar para Cabo Verde um Batalhão de Infantaria (cerca de 800 homens). As quatro companhias do Batalhão ficaram instaladas em S. Vicente e S. Antão, tendo partido de Portugal agrupadas em três contingentes. O primeiro embarcou em Portugal em 19 de Outubro de 1941, o segundo em 17 de Novembro do mesmo ano, e o terceiro em 8 de Janeiro de 1942.

(...) O facto é que desde a sua desactivação, os ex-militares que serviram no citado Batalhão vêm promovendo reuniões anuais em alomoços-convívio para recordar a sua passagem por Cabo Verde, nomeadamente pelas ilhas de S. Vicente e de S. Antão, por onde se distribuíram as suas companhias.

Estive presente num desses convívios pela primeira vez em 1986, pela circunstância de o mesmo ter sido realizado nas instalações do Regimento de Infantaria nº 15, por convite do seu Comandante. Competiu-me, na altura com o posto de major, ser o oficial a apoiar a organização desse evento, que se inseria nesse ano nas comemorações do aniversário do Regimento, condição que me permitiu assistir do princípio ao fim a confraternização dos ex-militares.

O leitor nem imagine a satisfação daqueles homens quando lhes disse que eu era cabo-verdiano de origem. E isto porquê? Porque quando se juntam a intenção é celebrar a memória de uma experiência militar vivida na intensidade anímica dos seus 20 anos, mas também recordar e celebrar a terra cabo-verdiana com eflúvios de uma saudade que eu não imaginava possível. (...)