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segunda-feira, 9 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26900: Recordações de um fulacundense (Armando Oliveira, ex-1º cabo, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) - Parte IX

 





Foto nº 1B, 1B e 1



Foto nº 2 e 2A



Foto nº 3 e 3A





Foto nº 4B, 4A, 4

Guiné > Região de Quínara > Fulacunda 3ª C/Bart 6520/72 (1972/74) >  "Porto fluvial" de Fulacunda (a 3/4  km a su-sudoeste  do aquartelamento): reabastecimento quinzenal: mantimentos, caixas de munições, sacos de arroz para a população, etc.; como não havia pontão, ou cais, a descarga era feita manualmente para as viaturas da tropa (GMC, Berliet...). Uma tarefa penosa.

 Fulacunda era reabastecida, através do rio Grande de Buba  e do seu afluente, na margem direita, o rio Fulacunda (que ficava a sul),  com recurso a LDM (Lancha de Desembarque Média) ou barco civil (popularmente conhecido como "barco-urra").

Em geral, deslocava-se um obus (neste caso, o 14 cm), rebocado por uma Berliet, bem como um morteiro 81 para montar segurança à operação de descarga.  Nunca houve nenhuma tentativa de ataque ou flagelação do IN ao tempo da 3ª C/Bart 6520/72 (1972/74). Nem o troço foi minado ou armadilhado, segundo informação do Jorge Pinto  (parte dos "slides" que temos aqui publicados são  dele ou do Armando Oliveira: gfeneroso e solidário como ele, não faz questão de reclamar os créditos fotográficos: consideran o seu álbum como património de todos os fulacundenses).

Fotos (e legenda): © Armando Oliveira (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar_ Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]

 

1. O Armando Oliveira, natural de Marco de Canaveses, a viver no Porto, foi 1º cabo at inf, 3ª C/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74), tendo pertencido ao 3º Pelotão, comandado pelo nosso amigo, camaradada e grão-tabanqueiro Jorge Pinto. 

Era o apontador da metralhadora pesada Breda, instalada no alto do fortim. Também exercia, no quartel, a sua profissão de barbeiro. E, como "hobby", fazia fotografia. Era um d0s militares que tinha máquina fotográfica. É dele  (e do Jorge Pinto) o melhor álbum fotográfico de Fulacunda.

É membro recente da nossa Tabanca Grande (nº 901). Tem página do Facebook.

Como na maior parte dos casos as fotos que ele nos disponibilizou, não trazem legendas, temos que as tentar reconstituir, e contar com a ajuda dele como dos outros camaradas "fulacundenses" que também fazem parte da Tabanca Grande: 
  • o Jorge Pinto,
  • o José Claudino da Silva
  • e, mais recentemente (nº 905), o Joaquim Caldeira (ex-fur mil inf, CCAÇ 2314 / BCAÇ 2834, Tite e Fulacunda, 1968/69).
As fotos que hoje publicamos são interessantes para se conhecer aspetos da vida quotidiana de uma subunidade de quadrícula. Gastava-se muita energia a assegurar o abastecimento de 200 militares  (1 companhia, 1 Pel Art, 1 Pel Mil) e 400 elementos da população. 

Em Fulacunda a vida agrícola, comercial e económica estava parada (desde o início da guerra em 1963). A população dependia, no essencial,  da tropa para sobreviver: as mulheres trabalhavam como lavadeiras, os homens eram milícias...A sede da circunscrição, na região de Quinara,  passou de Fulacunda para Tite. Fulacunda ficou isolada e entrou em decadência. 

________________


Nota do editor:

quarta-feira, 21 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26824: Diálogos com a IA (Inteligência Artificial) (3): A festa do Tabaski entre os muçulmanos da Guiné-Bissau (com Armando Oliveira, Cherno Baldé, Catarina Meireles e Luís Graça)





Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1972/74 > "Festa do carneiro" ou Tabaski entre os muçulmanos da comunidade local

Fotos: © Armando Oliveira (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


I. O 
 Cherno Baldé é  o nosso "agente" em Bissau: na realidade, este "menino" de Fajonquito, hoje homem grande, pai de 4 filhos, casado com um bonita nalu (e cristã!), quadro superior com formação universitária na Ucrânia,  ex-URSS,  e em Portugal, hoje consultor independente na área de   desenvolvimento e gestão de empresas, representa todos os nossos amigos guineenses que não têm forma de comunicar connosco, e que mantêm, com os portugueses,  antigos combatentes, fortes laços afetivos, baseados numa experiência e num respeito comuns... 

E mais do que "agente", o Cherno é um grande conhecedor e apaixonado defensor do melhor que a sua terra tem, a sua cultura, a sua história, o seu património (material e simbólico), as suas línguas e as suas gentes... 

Ele é o nosso assessor  para as questões culturais, artísticas,  sociais, económicas e religiosas da comunidade fula a que pertence, com muito orgulho. E para questóes etno-linguística, em geral. 


Como já aqui o dissemos, era (e é) pouco santa mas grande a nossa ignorância em relação à religião e demais aspetos da cultura dos guineenses, fossem (ou sejam) eles animistas, muçulmanos ou cristãos ("grumetes") (*)

Há 50 anos não  havia ainda a Internet, nem muito  menos os assistentes de IA - Inteligência Artificial, que vierem tornar obsoletas as nossas enciclopédias. (Tenho algumas, em português e inglês, que os meus filhos irão vender ao quilo; por enquanto ainda não me desfaço delas, têm um valor afetivo...). 

Em muitas questões relacionadas com religião, língua, cultura, história, etc. da Guiné-Bssau, eu não dispenso o sábio e sempre ponderado e bem vindo comentário do nosso assessor Cherno Baldé, bom guineense e melhor muçulmano que sabe muito mais de nós (e dos nossos)  do que nós dele (e dos seus).


II. Perguntámos ao ChtaGPT (e ao Gemini IA /Google) (**): 

"O que é a 'festa do carneiro' entre os muçulmanos da Guiné-Bissau ?


A. Resposta pronta do ChatGPT em Português ("Chatbot adaptado à cultura e linguagem portuguesas, com foco em educação e respeito")... 

A "festa do carneiro", como é popularmente conhecida na Guiné-Bissau, refere-se à celebração do Eid al-Adha, também chamado de Tabaski em muitos países da África Ocidental. É uma das datas mais importantes do calendário islâmico, comemorada por muçulmanos em todo o mundo, incluindo a vasta comunidade muçulmana da Guiné-Bissau.

Significado religioso:

O Eid al-Adha celebra o ato de fé e obediência do profeta Ibrahim (Abraão), que, segundo a tradição islâmica, estava disposto a sacrificar o seu filho Ismael em obediência a Deus. No entanto, Deus substituiu o filho por um carneiro, que foi sacrificado no seu lugar.

Como se celebra na Guiné-Bissau:

Na Guiné-Bissau, esta celebração tem características culturais e comunitárias muito próprias:
  • Sacrifício do carneiro: Famílias muçulmanas que têm condições financeiras compram um carneiro para sacrificar, simbolizando o sacrifício feito por Abraão. O animal deve ser abatido de acordo com os preceitos islâmicos.
  • Partilha da carne: A carne do animal é geralmente dividida em três partes – uma parte para a família, uma para familiares e amigos, e outra para os mais necessitados, reforçando o espírito de solidariedade.
  • Orações comunitárias: De manhã, as pessoas reúnem-se em grandes espaços abertos para realizar orações especiais em conjunto.
  • Momentos de convívio: É também um momento de união familiar, onde se vestem roupas novas ou tradicionais e se visita familiares e vizinhos.
  • Relevância social: A festa tem um grande impacto na vida social e económica do país, com movimentações nos mercados, nas aldeias e nas cidades.

Este é um evento muito aguardado e vivido com grande fervor religioso e sentido comunitário na Guiné-Bissau.

Se quiseres saber mais sobre tradições religiosas ou culturais no mundo lusófono, explora gptonline.ai — está cheio de conteúdos úteis!
 

B. Resposta do Gemini IA / Google:

A "festa do carneiro" entre os muçulmanos da Guiné-Bissau é a celebração do Eid al-Adha, também conhecido localmente e em outras partes da África Ocidental como Tabaski.

Esta é uma das duas maiores e mais importantes festividades do calendário islâmico (a outra é o Eid al-Fitr, que marca o fim do Ramadão). 

O Eid al-Adha comemora a disposição do Profeta Ibrahim (Abraão) em sacrificar o seu filho Ismael (na tradição islâmica) como um ato de obediência a Deus. No entanto, Deus interveio e substituiu Ismael por um carneiro (ou outro animal), que foi então sacrificado em seu lugar.

Assim, a principal característica desta festa é o sacrifício ritual de um animal, geralmente um carneiro, mas também pode ser uma cabra, vaca ou camelo, dependendo das possibilidades da família. A carne do animal sacrificado é tradicionalmente dividida em três partes: uma para a família que realizou o sacrifício, uma para os parentes e amigos, e uma para os pobres e necessitados.

Para além do sacrifício, o Eid al-Adha na Guiné-Bissau, assim como em outras comunidades muçulmanas, é um momento de:

  • Orações especiais (Salat al-Eid): Os muçulmanos reúnem-se em mesquitas ou espaços abertos para realizar orações congregacionais;
  • Reuniões familiares e sociais: As pessoas vestem as suas melhores roupas, visitam familiares e amigos, trocam cumprimentos e partilham refeições festivas;
  • Atos de caridade e generosidade: É um momento para ajudar os menos afortunados, oferecendo-lhes comida e apoio financeiro;
  • Reflexão e renovação da fé: Os muçulmanos lembram-se da história do sacrifício de Ibrahim e reafirmam a sua fé e submissão a Deus.

É importante notar que a data exata do Eid al-Adha varia a cada ano, pois é baseada no calendário lunar islâmico. As celebrações geralmente duram alguns dias. Na Guiné-Bissau, como em outros países com populações muçulmanas significativas, o Tabaski é geralmente um feriado nacional.

Guiné-Bissau > Bissau >  2004 > Festa do Tabaski (ou do carneiro) (em árabe, Aïd el- Kebir ou Aïd el-Adha) > O nosso grã-tabanqueiro Cherno Baldé com os seus 4 filhos...  A festa do Tabaski (designação corrente nos países de forte tradição muçulmana da África ocidental)  é, a seguir à festa do fim do Ramadão, a mais importante do Islamismo, equivalente ao Natal cristão. A data é variável, em 2015, foi a 24 de setembro. (***)


"Segundo o Islamismo, o filho herdeiro de Abraão foi Ismael e não Isaac. Esta festa é a comemoração do Livramento, do filho de Abraão que foi substituído por um cordeiro no momento exato em que seu pai iria sacrificá-lo, em obediência ao Senhor. Esta providência divina livrando (segundo o Islão) a Ismael, pai da nação árabe e antepassado do profeta, é lembrada anualmente por todo o povo muçulmano, como a Festa do Sacrifício ou a Festa do Cordeiro." (Fonte: Ordidja)

Foto: © Cherno Baldé (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legenda: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné-Bissau > Região de Bissau > Tabatô > 28 de Novembro de 2009 > A festa do  Tabaski... em que pela 1ª vez participaram três europeus, não-muçulmanos, duas portuguesas e um espanhol... 

Tabatô passou-nos completamemte ao lado, ao tempo da guerra colonial. Era uma aldeia, discreta e pacífica, de músicos e construtores de instrumentos músicos, com raízes ancestrais no antigo império do Mali e depois no reino do Gabu, Fica a 10 km, a nordeste de Bafatá, do lado direito da estrada que segue para Contuboel (e a cerca de 15 km, a sul desta povoação, onde alguns de nós estiveram no respetivo Centro de Instrução Militar, em 1969). É a terra natal do nosso grão-tabanqueiro Mamadu Baio, músico. 

Uma das portuguesas que participou no Tabaski de 2009  foi a Catarina Meireles, médica (minha antiga aluna de saúde pública, em 2007, na ENSP / NOVA), que aparece  aqui com uma criança mandinga ao colo.

Foto (e legenda): © Catarina Meireles (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complemenetar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


III. Resposta do Cherno Baldé, em comentário ao poste P16801 (*)

O conjunto das fotos (*)mostra diferentes momentos da vida da tabanca, as primeiras fotos, de 1 a 3 mostram o dia da festa do Tabaski, a cerimónia que faz referência à fidelidade do Patriarca/Profeta Abraão para com o seu Deus ao sacrificar o seu único filho (Isaac para os cristaáos e Ismael para os muçulmanos). 

As outras fotos (4 e 5) podem não estar associadas à festa do Tabaski, mas de outras festividades como o Fanado de rapazes e/ou o aparecimento de Cancurans.

Cordialmente,

Cherno AB
2025 M05 15, Thu 16:46:59 GMT+1

Sobre o Ramadão (22 referências), vd. aqui (incluindo comentários do Cherno Baldé).


IV. O Tabaski em Tabatô, pela Catarina Meireles, é um texto de antologia do nosso blogue. Não nos cansamos de o reproduzir, aqui, pela terceira vez (****):

O Tabaski em Tabatô

por Catarina Meireles

No passado fim de  semana (26-27 de novembro de 2009) fui ao Tabaski  − cerimónia de imolação do carneiro (por analogia: Páscoa dos Muçulmanos).

Depois de muitas resistências, dúvidas, declinações... lá consegui que me deixassem assistir ao ritual ("eucaristia") numa tabanca perto de Bafatá, de seu nome Tabatô  
−  muito especial, particularmente pela sua forma de vida comunitária, que assenta na música e dança étnicas.  São fabulosos!

Fui com mais uma amiga (portuguesa) e um amigo (espanhol). Vestimos roupas típicas, ocupámos as posições indicadas (segundo a ordem social vigente) e imitámos tudo o que nos diziam para fazer... E não me senti diferente... ao contrário, até me senti mais especial!

No fim do ritual, chamaram-nos (aos 3 brancos) para junto dos Homens Grandes e ajoelhámos-nos em círculo.

Para quê? Para dar graças a Alá por esta dávida  
− pela primeira vez 3 brancos visitaram aquela tabanca no dia do Tabaski. Era um sinal divino de prosperidade e de vida longa (incluindo para nós!)

As explicações foram reforçadas várias vezes para que percebessemos o quão importante e bem-vinda era a visita dos 3 brancos.

Eu disse:

 
− Sim, 3 é número sagrado!

Eles rejubilaram com o entendimento do misticismo!

Foi-me pedido que falasse... e falei. Pedi uma cadeia de união 
−   corrente de mãos dadas. 

 Expliquei como fazer e disse:

− Não há preto, não há branco, somos todos irmãos... daí esta cadeia de união.

E do meu lado esquerdo soou uma voz meiga, dum dos homens que me acolheu nas 3 vezes que fui a essa tabanca:

 
− Obrigado, Fátima de Portugal!

Catarina Meireles

Bafatá, 1 de Dezembro de 2009 (****)

(Seleção, revisão / fixação de texto: LG)
(****) Vd. poste de 8 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6695: Memória dos lugares (89): Bafatá, Tabatô, Tabaski 2009: Não há preto nem branco, somos todos irmãos, disse a Fátima de Portugal numa cadeia de união... (Catarina Meireles)

terça-feira, 20 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26821: S(C)em Comentários (67): P*rra, dou agora conta, 50 e tal anos depois, que nunca me sentei no rancho geral, para partilhar uma refeição com os meus cabos, que eram metropolitanos, e que tinham uma barriga igual à minha... Em Bambadinca, existia o "apartheid", nobreza, clero e povo, devidamente segregados, em termos sociais e espaciais (Luís Graça)


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s/d > Os camaradas (etimologicammente, os que dormem na mesma "câmara", quarto, camarata, no mesmo "buraco", que dormem, comem, vivem e... morrem juntos), sempre presentes no dia a dia da guerra, vão substituindo a família, os vizinhos, os colegas de escola, os amigos, etc. que ficaram lá longe, na terra... São também companheiros, porque comem o mesmo mão à mesma mesa (do latim, cum + panis, o que partilha o pão connosco).


Foto (e legenda): © Armando Oliveira (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Comentário de Luís Graça ao poste P26816 (*):


Há uma coisa que muitos oficiais e sargentos do QP, bem como milicianos (alferes e furriéis) não compreendem (ou pura e simplesmente já esqueceram): as nossas praças (sobretudo o pessoal metropolitano) tiveram que se "desenrascar"... em matéria de comes & bebes.

Comiam "mal e porcamente" (e eu creio que a metáfora do porco não é insulto para ninguém!|)... No mato, nos quartéis do mato (não falo de Bissau)... Mesmo quando "a comida era igual para todos" (nos aquartelamentos das unidades de quadrícula: 1 capitão, 4 alferes, 16 sargentos e furriéis, e o resto cabos e soldados, uns 130/140), as praças comiam sempre pior...

Já não falo nos destacamentos, guarnecidos por 1 Grupo de Combate...onde nem cozinheiro havia, e o reabastecimento (genéros alimentícios, munições, etc.) era sempre um "bico de obra"...

Ninguém é capaz de admitir hoje que "passou fome" na guerra, na Guiné, até por que o "tuga" era sempre capaz de se "desenrascar"...

 Fome ?... Talvez, pontualmente, no mato, em operações... Mesmo "intragáveis", as rações de combate que nos fornecia o exército português,  ainda tinham uma ou outra coisa aceitável para enganar o estômago, sem provocar uma sede do caraças... (Depressa aprendi a prescindir delas, ou de grande parte do seu recheio!)

Mas as nossas operações podiam durar 24 h, 48, 72 h, no máximo... No regresso ao quartel, havia sempre uma sopa quente, com muita água, pouco azeite e poucos legumes, mas ainda assim quente. E havia, graças a Deus e aos bons irãs, e à Intendência (a quem tiro o quico!),  cerveja, muita cerveja, mesmo que que fosse "choca". E coca-cola, e uísque... E até barris de vinho oiu "ãgua de Lisboa"!...

O José Claudino da Silva, cantineiro, em Fulacunda, logo em finais de 1972, requisitava, 12 mil cervejas por mês, com medo do "apagão da Intendência", estamos a menos de dois anos do fim da guerra, num quartel isolado, no mato, a 3ª CART / BART 6520/72, que além dos seus 150 homens metropolitanos, tinha mais um Pel Art (em que as praças eram africanas) e um Pel Mil (também de pessoal africano).

De resto, muitos dos nossos militares, sobretudo oriundos das zonas rurais, do interior do país, de Trás-os-Montes ao Alentejo, foram habituados, desde pequeninos, à "frugalidade": 

  • quem é que bebia leite ?
  • quem é que comia queijo ?
  • quem é que sabia o que era um iorgurte ?
  • quem já tinha provado fiambre ?
  • quem comia peixe fresco ?
  • e carne (sem ser da salgadeira) ?
  • e bacalhau (sem ser no Natal e na Quaresma) ?
  • quem bebia cerveja ?
  • e leite com chocolate ?
  • e sumol ?
  • e café ?...
  • (Para não falar da "coca-cola", uma "americanice" que não entrava no Portugal do Estado Novo).

Porra, e ninguém se revoltava !... E a malta aguentuou 13 anos!... Fala-se em sangue, suor e lágrimas, mas ninguém acrescenta a merda, a fome, a sede!...13 nos anos com a canga em cima, a G3, as cartucheiras, as granadas de mão, as granadas de morteiro (ou de bazuca) às costas, mais os 2 cantis de água... Mais os feridos e os mortos em padiola!...

Eu fiz alguns milhares de quilómetros a penantes, na Guiné, com os meus/nossos "pretos" da CCAÇ 12, entre junho de 1969 e março de 1971...Sei do que falo... Mas chegava a Bambadinca, dois ou três dias depois, com 2, 3 ou 4 quilos a menos, tomava um duche reparador... e não me podia queixar da messe de sargentos..
.

Nunca me faltou o uísque com água de Perrier e duas pedras de gelo!... Nem o gin tónico com limão ou lima!... Não bebia cerveja nem "água de Lisboa", a não ser às refeições...

Mas, porra, dou agora conta, 50 e tal anos depois, que nunca me sentei no rancho geral, para partilhar uma refeição com os meus cabos, que eram metropolitanos, e que tinham uma barriga igual à minha... Em Bambidina, existia o "apartheid", nobreza, clero e povo, devidamente segregados, em termos sociais e espaciais (**)...

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(**) Último poste da série > 16 de maio de 2025 >  Guiné 61/74 - P26807: S(C)em Comentários (66): Eletrificação - As primeiras redes de energia elétrica na Guiné nas décadas de 1930 a 1950 (Manfred Stoppok)

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26801: Recordações de um fulacundense (Armando Oliveira, ex-1º cabo, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) - Parte VIII






Foto nº 1A, 1B,  e 1









Fotro nº 2, 2A, 2B, 2C




Foto nº 3 e 3A






Foto nº 4, 4A e 4B



Foto nº 5 e 5A

Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s

Festaa religiosa (o Tabaski e não o Ramadão)  (fotos nºs 1 e 2) e civis da população de Fulacunda, na sua grande maioria biafada e mulçulmana.  A NT tinham sempre alguma curiosidade em relação a estes eventos que juntavam toda a população...Vou pedir ao Cherno Baldé que  "legende" as fotos... As nºs 1, ,2 e 3  teriam a ver com a "festa do carneiro" (o do Tabaski), conforme confirma o Cherno Baldé *).

A festa do Tabaski (designação corrente nos países de forte tradição muçulmana da África ocidental)  é, a seguir à festa do fim do Ramadão, a mais importante do Islamismo, equivalente ao Natal cristão. A data é variável, de ano para ano.

Fotos: © Armando Oliveira (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. O Armando Oliveira, natural de Marco de Canaveses, a viver no Porto,  foi 1º cabo at inf, 3ª C/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74), tendo pertencido ao 3º Pelotão, comandado pelo nosso amigo, camaradada e grão-tabanqueiro Jorge Pinto. Era o apontador da metralhadora pesada Breda, instalada no alto do fortim. Também exercia, no quartel, a sua profissão de barbeiro. E, como "hobby", fazia fotografia. Era um d0s militares que tinha máquina fotográfica. É dele o melhor álbum fotográfico de Fulacunda.


É membro recente da nossa Tabanca Grande (nº 901). Tem página do Facebook.  

Como na maior parte dos casos as fotos que ele nos disponibilizou, não trazem legendas, temos que as tentar reconstituir, e contar com a ajuda dele como dos outros camaradas "fulacundenses" que também fazem parte da Tabanca Grande: o Jorge Pinto e o José Claudino da Silva. (Bem como do Fernando Carolino, de quem aguardamos o OK para ser apresentado).

As fotos que hoje publicamos são interessantes para documentar o binónimo NT / População.
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

8 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6695: Memória dos lugares (89): Bafatá, Tabatô, Tabaski 2009: Não há preto nem branco, somos todos irmãos, disse a Fátima de Portugal numa cadeia de união... (Catarina Meireles)

16 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7795: Álbum fotográfico do Arménio Estorninho (CCAÇ 2381, Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70): Cherno Rachide e a festa do fim do Ramadão, Bissau, 1970


6 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P21974: Álbum fotográfico de António Marreiros, ex-alf mil, CCaç 3544, "Os Roncos", Buruntuma, 1972, e CCaç 3, Bigene e Guidage, 1973/74 - Parte VI: O Ramadão (2/3)

9 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24212: Fotos à procura de... uma legenda (174): Legendas para as fotos do Ramadão de 1971, na tabanca de Saliquinhedim (K3) (José Carvalho, ex-Alf Mil Inf / Cherno Baldé)

quinta-feira, 8 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26779: Recordações de um fulacundense (Armando Oliveira, ex-1º cabo, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) - Parte VII

 


Foto nº 1 > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s/d > Oficiais milician0s, à mesa, provavelmente em dia de anos de algum, ou numa vulgar confraternização. Em cima da mesa, uma garrafa de espumante e pelo menos três garrafas de uisque velho... Um balde de gelo. Não se vêem garrafas de água mineral (Perrier, Vichy ou Castelo). Reconhecemos o Fernando Carolino (ao fundo, ao centro) e Jorge Pinto (o segundo à esquerda). 


Foto nº 2 > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > Festa de aniversário do alf mil Jorge Pinto (que faz anos a 10 de outubro; natural de Alcobça, vive em Sintra)...



Foto nº 3> Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s/d > Festa de aniversário do Jorge Pint0


Foto nº 4 > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s/d > Militares do 3º pelotão ? Quem está de costa, parece-nos ser o alf mil Jorge Pinto, seu comandante. À hora da refeição, as praças bebiam cerveja (0,33 l, marca Cristal, neste caso)

Foto nº 5> Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s/d > Uma mesa de 1ºs cabos condutores auto ? Em primeiro plano de costas, o 1º cabo José Claudino da Silva, que também era o "cantineiro". Além de vinho verde (em garrafa), também se bebia cerveja Sagres, em lata. Esta mesa tinha por detrás uma fiada de "ventoínhas" (que só deviam funcionar à noite, quando fosse ligado o gerador).

Fotoo nº 6 > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BCART 6520/72 (1972/74) > s/d >  Os camaradas (etimologicammente, os que dormem na mesma "câmara", quarto, camarata, no mesmo "buraco",  que dormem, comem, vivem e... morrem juntos), sempre presentes no dia a dia da guerra, vão substituindo a família, os vizinhos, os colegas de escola, os amigos, etc. que ficaram lá longe, na terra... São também companheiros, porque comem o mesmo mão à mesma mesa (do latim, cum + panis, o que partilha o pão connosco). 

 Fotos (e legenda): © Armando Oliveira (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné >  Bissau > BNU > 1973 > Nota de 50 escudos (pesos), verso. O banco emissor era o BNU - Banco Nacional Ultramarino. Uma nota destas, em 1973,  dava para comprar, na cantina do Zé Soldado, no mato uma caixa de 12 cervejas de  0,3 l... Um 1º cabo radiotelegrafista, como o Sousa de Castro, ganhava, 1300$00 na época.  Uma nota destas davam também para comprar uma garrafa de uísque novo, e ainda sobrava uns pesos...

Foto: © Sousa de Castro (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. 

1. O marcoense Armando Oliveira foi 1º cabo at inf, 3ª C/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74), tendo pertencido ao 3º Pelotão, comandado pelo nosso amigo, camaradada e grão-tabanqueiro Jorge Pinto. Era o apontador da metralhadora pesada Breda, instalada no alto do fortim. Também exercia, no quartel, a sua profissão de barbeiro. E, como "hobby", fazia fotografia. Era uma d0s militares que tinha máquina fotográfica. É dele o melhor álbum fotográfico de Fulacunda.

É membro recente da nossa Tabanca Grande (nº 901). Tem página do Facebook. Mora no Porto. Já voltou à Guiné-Bissau 4 vezes, tendo sempre passado por Fulacunda. Pretende voltar lá em 2026

Como na maior parte dos casos as fotos que ele nos disponibilizou,  não trazem legendas, temos que as tentar reconstituir, e contar com a ajuda dele como dos outros camaradas "fulacundenses" que também fazem parte da Tabanca Grande: o Jorge Pinto e o José Claudino da Silva. (Bem como do Fernando Carolino, de quem aguardamos  o OK para ser apresentado).

2. As fotos que hoje publicamos são interessantes para documentar o consumo diferenciado de bebidas alcoólicas nos nossos aquartelamentso do mato e para estimar níveis de consumo:

(i) os oficiais e sargentos bebiam preferencialmente uísque com um pedra de gelo e água mineral, ou um gin tónico;

(ii) as praças optavam em geral pela cerveja (com os frigoríficos a petróleo, ou alimentados à noite pela energia elétrica do gerador, era possível ter bebidas sofrivelmente frescas, além de gelo).

Não sabemos quantidade de cervejas que eram fornecidas pelo BINT (Batalhão de Intendência) às subunidades no mato (150/160 homnens), mas podia ser uma méda mensal de 10 a 12 mil garrafas (de 0,33 l e 0,6,), o que levantava também problemas logísticos, de transporte e de armazenamento (que não vamos considerar aqui).

Peguemos num exemplo, o movimento da cantina da CCAV 2483, Nova Sintra:

(iii) em maio de 1970, consumiu-se cerca de 1,5 mil litros de cerveja (3977 garrafas de 0,33 l, e 268 de 0,6l, das marcas Sagres e Cristal), grossso modo 3,5 mil garrafas de 0,33 (a dividir por 150 dá 10 l de consumo médio mensal ou 30 garrafas de 0,33);

(iii) no final do mês de junho (não temos a existência de mercvadorias  no final do mês de maio), o "stock" era de 3,2 mil litros (5865 garrafas de 0,33 l e 2144, de 0,6l) (daria uma média de 21,3 l ou  cerca de 65 garrafas de 0,33 l(.

Em outubro de 1972, a 3ª C/BART 6520/72, de Fulacunda, passou a requisitar, quinzenalmente, 6 mil garrafas (quer de 0,33 l como de 0,6 l) em vez das 5 mil, segundo informação do cantineiro, o José Claudino da Silva...

12 mil garrafas por mês, numa subunidade (Fulacunda) que deveria ter 200 militares (1 companhia, 1 Pel Art e 1 Pel  Mil), dava uma previsão de consumo de 2 garrafas, por dia e "per capita" (ou 60 por mês)...Claro que havia quem não bebesse (por exemplo, os militares e milícias muçulmanos, por razões religiosas ou culturais)...

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Nota do editor LG:

Último poste da série > 4 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26762 Recordações de um fulacundense (Armando Oliveira, ex-1º cabo, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) - Parte VI

domingo, 4 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26762 Recordações de um fulacundense (Armando Oliveira, ex-1º cabo, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) - Parte VI

Foto nº 1 > O alf mil Jorge Pinto, de oficial de dia



Foto nº 2 e 2A > A brigada de limpeza


Foto nº 3 e 3A > A equipa de manutenção e reparação da rede de arame farpado. O alf mil Jorge Pinto "fiscaliza" o trabalho.


Foto nº 4 e 4A > Uma saída para o mato


Foto nº 5 > Regresso de um patrulhamento ofensivo no subsetor de Fulacunda. O militar da frente transporta, ao ombro esquerdo, duas granadas de morteiro 60.


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Mais fotos sobre o quotidiano dos militares no aquartelamento de Fulacunda: limpeza da parada, manutenção e reparação da rede de arame farpado, patrulhamentos ofensivos... Tudo isso está bem documentado nestas excelentes imagens, obtidas a partir dos "slides", digitalizados, do Armando Oliveira.

Fotos (e legendas): © Armando Oliveira (2025). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blog Luís Graça & Camaradas da Guiné]





1. O marcoense Armando Oliveira foi 1º cabo at inf, 3ª C/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74), tendo pertencido ao 3º Pelotão, comandado pelo nosso amigo, camaradada e grão-tabanqueiro Jorge Pinto. Era o apontador da metralhadora pesada Breda, instalada no alto do fortim. Também exercia, no quartel, a sua profissão de barbeiro. E, como "hobby", fazia fotografia.

É membro recente da nossa Tabanca Grande (nº 901). Tem página do Facebook. Mora no Porto. Já voltou à Guiné-Bissau 4 vezes, tendo sempre passado por Fulacunda. Pretende voltar lá em 2026

Como na maior parte dos casos as fotos que ele nos disponibilizou,  não trazem legendas, temos que as tentar reconstituir, e contar com a ajuda dele como dos outros camaradas "fulacundenses" que também fazem parte da Tabanca Grande: o Jorge Pinto e o José Claudino da Silva. (Bem como do Fernando Carolino, que ainda está com um pé dentro e outro fora.)

2. Mais um apontamento sobre Fulacunda e o seu historial... Recorde-se que ainda antes do ínicio da guerra (que, segundo a "narrativa" do PAIGC, começaria com o ataque a Tite em 23 de janeiro de 1963), as regiões do sul, Quínara e Tombali, a partir de meados do ano anterior, já eram  alvo de sabotagens de linhas telefónicas, cortes de estradas e destruição de pontes, além de outras "atividades subversivas" (c0mo a propaganda, o aliciamento e a intimidação das populações). 

Fulacunda acabou por ficar isolada, perdeu o estatuto de sede de circunscrição (transferida para Tite) e a sua população ficou dispersa,  a maior parte no mato, sob controlo do PAIGC Em 3 de julho de 1963, na estrada Fulacunda-São João, o IN colocou a primeira mina A/C.

De acordo com a Directiva nº 3 do Comandante-Chefe, de 22 de maio de 1963, "as  regiões de Quinara e Fulacunda estão, na sua quase totalidade, fora do controlo das autoridades dada a intensa actividade desenvolvida pelo lN"

Mais concretamente:
  • "Grande maioria das tabancas estão abandonadas refugiando-se a população no mato, embora recolha durante a noite a algumas das não destruídas;
  • A população, em parte coagida, em parte de livre vontade, colabora com os terroristas, nomeadamente na colocação de abatizes e no racionamento de géneros alimentícios, este para fazer face às dificuldades que certamente surgirão na época das chuvas que se aproxima;
  • Tem criado dificuldades à movimentação das NT pela obstrução sistemática das vias de comunicação e montagem de emboscadas;
  • Tem atacado embarcações civis e até militares.
  • Já saquearam casas comerciais (S. João)." (...)

Os principais chefes de guerrilha referenciados na altura eram o Arafan Mané, o Gibril, o Malan Sanhá e o Quemo Mané. Em termos de armament0, o lN já dispunha "de pistolas e pistolas metralhadoras em quantidades apreciáveis e de elevado número de granadas de mão de muito boa qualidade".

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da actividade operacional: Tomo II - Guiné - Livro I (1.ª edição, Lisboa, 2014), pp. 100/101.
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Nota do editor LG:

Último poste da série > 1 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26751: Recordações de um fulacundense (Armando Oliveira, ex-1º cabo, 3ª C/BART 6520/72, 1972/74) - Parte V