1. Mensagem de Manuel Traquina, ex-Fur Mil da CCAÇ 2382,
Buba, 1968/70, com data de 2 de Maio de 2009:
Para publicação no blog envio um texto e uma fotografia.
Abraço
Traquina
O Correio /Os Aerogramas
Em tempo de guerra o correio é sem dúvida uma das coisas mais importantes. Poderemos dizer que em situações difíceis é das poucas coisas que exerce grande efeito psicológico na mente de cada um. É o contacto com a família, com a namorada, com a madrinha de guerra, em suma, muitas vezes o único contacto com o mundo exterior.
Naqueles tempos eram utilizadas as cartas, chamadas tipo papel de avião, cujos envelopes tinham uma pequena orla descontinua a verde e vermelho. Porém, eram mais utilizados os aerogramas que ficavam inteiramente gratuitos, os militares chamavam-lhes os
aeros ou
bate estradas. Desempenhavam um papel importante, eram oferecidos pelo Movimento Nacional Feminino e, transportados gratuitamente pela TAP.
Por graça, alguns militares tinham o hábito de enviar aerogramas para determinada localidade, dirigidos
à menina mais bonita,
à menina mais simpática,
à jovem mais bela, ou outros do género, dependente da imaginação de cada um. Depois ficava o critério do carteiro, seleccionar ou, para se ver livre de mais um
aero, entregar na rua, a quem muito bem entendesse.
Desta maneira a brincar, muitos tiveram a habitual madrinha de guerra, a namorada, ou nalguns casos até mesmo esposa! Quero aqui referir e ao mesmo tempo dirigir uma palavra de agradecimento a todas aquelas que foram as nossas Madrinhas de Guerra, umas que mais tarde vieram a ser namoradas e esposas, outras que se ficaram apenas por madrinhas. Naquele ambiente de guerra, é difícil calcular a alegria que se sentia, ao receber uma carta onde por certo vinham palavras acolhedoras e amigas.
Alguns militares endereçavam
aeros uns aos outros, e no exterior escreviam
contém um gravador. Os gravadores de som tinham feito a sua aparição à pouco tempo e eram uma novidade. Numa época que em Mampatá se trabalhava duramente na abertura de abrigos, alguém terá recebido um aerograma que no exterior dizia,
contém uma picareta. Acho que foi mal recebido e rasgado de imediato, é que quem o recebeu estava já com as mãos bastante calejadas pelo uso dessa ferramenta…
A propósito recordo que um militar recebeu resposta a uma mensagem que enviara dentro de uma garrafa, arremessada ao mar quando viajava a bordo do “
Niassa”. A resposta que curiosamente não se fez tardar, veio de uma jovem espanhola, (presume-se que de corpo bronzeado desfrutando dos calores mediterrâneos) encontrou a referida garrafa numa praia do sul de Espanha. Sei apenas que se iniciou uma troca de correspondência, que chegou mesmo a namoro!
Também com frequência se escrevia às senhoras do Movimento Nacional Feminino, e pedia-se de tudo. Por vezes lá chegava esta ou aquela oferta.
No Natal de 1968 creio que houve uma oferta a todos os militares, uma pequena embalagem de plástico, que continha um maço de cigarros e um isqueiro a gasolina. Tantos terão sido os pedidos, que um dia tivemos a visita da D.ª Cilinha Supico Pinto.
Esta animada visitante, bastante alegrou os militares reunidos à sua volta na pequena parada do aquartelamento de Buba. Começou por dizer que não fizessem pedidos difíceis de satisfazer. Parece que alguém teria pedido uma namorada, em que era indicada a cor dos cabelos, as medidas da anca, de peito e outras... Mas naquele dia, a ilustre visitante vinha fazer a entrega de um instrumento musical, um saxofone, que o corneteiro da Companhia, o Gentil lhe tinha pedido.
Bastante satisfeito ficou o militar mas, logo a seguir decepcionado. Ao instrumento, já bem usado, faltava aquilo a que se chamam
sapatilhas. Mais difícil foi fazer compreender àquela senhora que as
sapatilhas (pequenas válvulas do instrumento) faziam falta ao instrumento e não ao militar...
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 12 de Março de 2009 >
Guiné 63/74 - P4019: Venturas e Desventuras do Zé do Olho Vivo (Manuel Traquina) (6): Estrada nova Buba - Aldeia Formosa