sábado, 17 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22111: Da Suécia com saudade (90): o fim da picada... ou um certo fim desta picada!... Morreu a Tabanca da Lapónia, viva a Tabanca de Key West, Flórida, EUA (José Belo)



Una especialidade do Norte da Escandinávia: caviar de ovas de salmäo "löjrom", servido com cebola crua e natas ácidas... Vai bem com um vinho branco Bucelas Velho, diz o José Belo, o nosso "exigrado", como ele próprio se intitula: misto de exilado e de emigrado...

Fotos (e legenda): J. Belo (2021)


I. Mensagem de José Belo, o nosso luso-sueco, cidadão-do-mundo, membro da Tabanca Grande, que reparte a sua vida entre a Lapónia (sueca), Estocolmo e Key-West (Flórida, EUA). Foi nomeado por nós régulo (vitalício) da Tabanca da Lapónia (. Na outra vida, foi alf mil inf, CCAÇ 2391, "Os Maiorais", Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70).

 
 Date: sexta, 16/04/2021 à(s) 21:13
Subject: Um certo...fim d'esta picada!
 

Meu Caro Luís

(1) Também se come sável por aqui (*), apesar de actualmente muito difícil de pescar por estar quase extinto.

O preco de um prato de sável grelhado nos restaurantes do norte da Suécia (quando há) varia entre o equivalente a 50 até 60 euros. Paga-se pela qualidade que realmente tem mas também pela dificuldade em o encontrar.

Uma maneira típica local é fritá-lo em gordura de bacon fumado, posteriormente misturado com cerefolho, endro e cantarelo (uma espécie de cogumelo amarelo).

De qualquer modo aqui segue uma especialidade muito típica do Norte Escandinavo: Caviar de ovas de salmäo "löjrom", servido com cebola crua e natas ácidas.

Acompanha-se com vodka e cerveja, mas... um José Maria da Fonseca BSE, ou um Bucelas Velho,  seria verdadeiramente "pôr oponto nos ii". (Se é que ainda  existem, estas marcas de vinhos,  depois de mais de 40 anos de,,,"exigrado" !)

(2) Aproveito este texto para informar os Camaradas que a já muito longa série "Da Suécia com Saudade" chegou ao fim da picada. (**) Mudo-me com "armas e bagagens" para a minha casa de Key West [, Flórida, EUA], apesar de manter casa também em Estocolmo para viagens nostálgicas às...raìzes.

Espero ter de algum modo contribuído para um maior conhecimento entre Lusitanos desta realidade exótica situada no extremo de extremo norte europeu que é a Lapónia.

Um abraço, J. Belo

 II. Comentário do editor LG:

Meu querido amigo e camarada:

Percebo que queiras estar mais próximo dos teus filhos e netos...E só posso desejar-te muita saúde e longa vida em Key West onde resto tens casa há muito...

Vamos mesmo pôr um ponto final na série "Da Suécia com saudade" ? Se sim, temos que pensar numa nova série...Porque tu vais continuar a escrever no nosso blogue... E quanto à Tabanca da Lapónia ? Para nós, continuarás a ser o 
régulo da Tabanca Lapónia, não de pedra e cal, mas de madeira e gelo. Por outras palavras, és insubstituível, inamovível, vitalício... Claro que vamos ter saudades das tuas saudades.

Obrigado por mais estas tuas sugestões gastronómicas... E um dia destes posso mandar-te uma listagem com todos os teus postes... incluindo os da série "Da Suécia com saudade" (que são noventa).

Mas deixa-me acrescentar: 

Morreu a Tabanca da Lapónia,  viva a Tabanca de Key West!

Fica bem e que lá sejas feliz, pararaseando um poema do noss Ruy Belo. Que a felicidade é onde a gente a põe, mas a maior parte de nós nunca a põe onde está... Venho de almoçar da Tabanca do Atira-te ao Mar e de deleitar-me com as nossas musiquinhas (com cavaquinho, bandolim, viola, voz...), celebrando a vida, a saúde, o desconfinamento, a amizade, a camaradagem...

Se um dia voltares à Pátria / Mátria / Fátria que te foi Madrasta, seja em viagem de  negócios ou simplesmente para rever as tuas raízes lusitanas, tens já uma convite para vir aqui comer uns marisquinhos do Mar do Cerro e beber uns vinhinhos brancos com aromes atlânticos da regão  da tua avó...

Um abraço fraterno, LG

PS - Lê e ouve aqui o poema "O Portugal Futuro", de Ruy Belo, dito por cantora Lula Pena



O Portugal Futuro

0 portugal futuro é um país
aonde o puro pássaro é possível
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
as profundas crianças desenharão a giz
esse peixe da infância que vem na enxurrada
e me parece que se chama sável
Mas desenhem elas o que desenharem
é essa a forma do meu país
e chamem elas o que lhe chamarem
portugal será e lá serei feliz
Poderá ser pequeno como este
ter a oeste o mar e a espanha a leste
tudo nele será novo desde os ramos à raiz
À sombra dos plátanos as crianças dançarão
e na avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será verão
Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o portugal futuro

Ruy Belo (1933-1978)

Guiné 61/74 - P22110: Os nossos seres, saberes e lazeres (448): Quando vi nascer a Avenida de Roma (4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Março de 2021:

Queridos amigos,
Não vos vou inquietar com os conteúdos da instrução primária, é certo e sabido que tivemos todos a obrigação de conhecer a história gloriosa, os povos que passaram por esta península, Ceuta, o Infante D. Henrique, o Cabo Bojador, Diogo Cão, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama, e tudo o mais que retivemos de memória. Circunscrevo-me à topografia do mundo circundante: Rua de Entrecampos, a vivência do bairro, o nascimento da Avenida dos Estados Unidos da América, o maravilhamento da miudagem com a chegada de novas gentes, os passeios pelo Bairro de São Miguel, as tardes na Biblioteca das Galveias, mais cedo as idas até Telheiras para jogar num pelado de futebol com os nossos companheiros que aqui viviam, passávamos ao lado do Estádio do Sporting, que tinha igualmente um campo pelado, e depois de uma azinhaga esburacada, onde despontavam figueiras e casas em ruínas tínhamos um espaço para o jogo, ala morena que se faz tarde, impunha-se regressar a casa, fazer a higiene, mudar de roupa e estudar até à hora do jantar. Eu fazia o possível, sobretudo no outono e inverno, para acompanhar a minha mãe às aulas na Campanha Nacional de Educação de Adultos, não vivi outra experiência emocionante como aquela, ver um analfabeto feliz por saber soletrar, folhear um dicionário, escrever palavra atrás de palavra, no ditado da Sr.ª Professora, a minha adorada mãe.

Um abraço do
Mário


Quando vi nascer a Avenida de Roma (4)

Mário Beja Santos

Há as obrigações de trazer as vitualhas para a cozinha. A minha mãe, de segunda a sexta-feira, faz compras no Mercado do Saldanha, eu espero-a na paragem do autocarro, seja a carreira 44, seja a carreira 45, um pouco mais adiante da Esquadra do Campo Grande, na Avenida, atravessamos a linha do elétrico e entramos na Rua Aboim Ascensão e rumamos para casa, durante o percurso dá-se o interrogatório sobre as aulas da manhã, à hora do almoço define-se o que poderei fazer da parte da tarde depois das aulas, com o passar dos anos fico autorizado a estar cerca de duas horas à tarde na Biblioteca das Galveias, no Campo Pequeno. Tenho responsabilidades no abastecimento. Há uma padaria dois edifícios à frente da esquadra, a seguir à esquadra segue-se uma vivenda que mais tarde será alugada pela UNITA, a seguir à independência, depois há umas fabriquetas, segue-se a padaria entalada entre um café e uma drogaria. Atravesso o estradão do que virá a ser a Avenida dos Estados Unidos da América e na esquina da Rua de Entrecampos, num prédio que foi demolido e deu depois lugar ao Centro Nacional de Pensões, fica uma mercearia. Comprava-se quase tudo a granel, as leguminosas secas estavam entulhas, havia medidas em madeira e rasoiras, faziam-se cartuchos com meio litro de grão ou meio litro de feijão-manteiga, na lista podia constar uma quarta de banha, meio quilo de açúcar, enchia-se numa maquineta uma garrafa de azeite, por detrás do balcão empedrado havia mobília imponente, armários até ao teto, alguns envidraçados, o plástico ainda não entrara no mundo dos negócios. Mas convém falar da Rua de Entrecampos como sede dos nossos abastecimentos, só com o aparecimento dos prédios verdes na Avenida dos Estados Unidos é que esta artéria comercial perdeu o seu fulgor.
Campo Grande, 22. Começou por ser escola primária, mais tarde aqui funcionou a Esquadra do Campo Grande até à demolição do edifício, a esquadra ficou bem perto, na Rua Afonso Lopes Vieira, frontal à Clínica S. João de Deus
Quando nasceu a Avenida dos Estados Unidos da América. Vê-se perfeitamente a Quinta do Visconde de Alvalade, não se distingue o muro da quinta do lado esquerdo, aí fica a Rua António Patrício, para onde fui viver em 1952. Não há comércio no Bairro, é preciso descer ao Campo Grande e fazer o abastecimento na Rua de Entrecampos
A Avenida da República do meu tempo, distingue-se claramente a linha do elétrico e do lado esquerdo vê-se o contorno da Rua de Entrecampos que acabava exatamente na ligação com a Avenida dos Estados Unidos da América, à esquerda, pode ver-se que a Avenida não passava de um estradão, nem macadamizada estava.

Era uma rua imponente, acolhia o comércio e serviços de primeira linha, como a zona habitacional estava em franca evolução, e mesmo sob o impacto da Avenida dos Estados Unidos da América, com aqueles prédios altos rapidamente arrendados, encontrava-se aqui quase tudo: livraria e tabacaria, retrosaria, barbeiro e cabeleireira, sapateiro remendão, ferrador com as carroças à porta, aqui chegou uma loja de eletrodomésticos e mais tarde uma peixaria de peixe congelado; havia taberna junto da linha, é hoje o restaurante Entre Copos, restavam ainda vivendas, algumas delas com uma certa imponência, falava-se num roceiro de São Tomé que aqui mandara construir casa apalaçada com entrada marmoreada, não faltava um talho de carne de cavalo e até uma carvoaria. O comércio no Campo Grande, no seguimento deste, e até à Igreja dos Santos Reis Magos também era variado, um pouco mais popular na medida em que ainda havia muita habitação operária e pátios ocupados por famílias altamente modestas, daí as oficinas de reparação de automóveis e de bicicletas, tascas com carvoarias (não faltavam belos azulejos com cachos de uvas), lojas de adubos e rações. Do lado oposto, o comércio era praticamente inexistente.
Pormenor da Rua de Entrecampos em 1946
Desenho publicado no jornal Público reconstituindo os negócios saloios que atravessavam a Rua de Entrecampos, os muares bebericando água no fontanário, não esquecer que era praticamente uma linha vertical que passava pelo Campo Pequeno, Arco do Cego, Estefânia, Campo dos Mártires da Pátria, descendo para o centro da cidade seja pelo Desterro e o Martim Moniz, seja pela Calçada de Santana. Havia outro itinerário para os negócios saloios que tinha a ver com o Rossio, Rua das Portas de Santo Antão, Rua de São José, São Sebastião e Estrada de Benfica.
Antiga Ponte de Entrecampos, com a linha ferroviária

Frequento quatro anos, a instrução primária, na Escola N.º 151, e a minha mãe conseguiu uma bolsa de estudo no Colégio Moderno, irei frequentá-lo durante quatro anos. Já referi que saio de casa pelas 8:10, na companhia do Luís Filipe Salgado de Matos, recentemente falecido. Irei fazer amizades e estimas inquebrantáveis. Não resisto a contar uma história. Durante dois anos, creio que no terceiro e quarto anos, fui companheiro de carteira do Pedro Chorão, um artista plástico que muito aprecio. Aí pelos anos 1990 adquiri um quadro dele a prestações na Galeria Colares. Andava a pensar em oferecê-lo à minha filha, mandei um mail ao Pedro, se ele queria confirmar a assinatura, a tela por detrás tem a referência ao seu nome. Respondeu-me encantado com o reencontro, há bem 60 anos que não púnhamos os olhos em cima, que não, que eu não me desfaria do meu quadro, tu vens ao meu ateliê, e vais ver que tenho uma surpresa para a tua filha. Passámos uma tarde de feliz convívio, trocámos livros, inevitavelmente falámos do colégio, as memórias dele traçam-se com alguma amargura, mas rimos a bom rir de várias peripécias, uma delas do nosso professor de físico-química, capitão Figueiredo, combatente na Flandres, houvesse, como aconteceu connosco, aula no dia 9 de abril, e no início o chefe de turma pediu ao Sr. Professor se tinha a amabilidade de nos narrar o que acontecera em La Lys, e nesse dia nem nada de física nem de química, ouvíamos os canhões alemães, a tentativa de reorganização do Corpo Expedicionário Português, os feitos do soldado Milhões, o herói que nos ficou. Anos mais tarde, tudo isto confirmei quando li as Memórias da Grande Guerra, de Jaime Cortesão.
Era assim a entrada e o edifício principal do Colégio Moderno do meu tempo, na Estrada de Malpique (hoje Rua Dr. João Soares, diretor do colégio). A imagem é um tanto anterior à minha frequência no Colégio.
Entrada no pátio principal para o edifício onde funcionavam as aulas. À esquerda, com as portadas entreabertas, estava o Dr. João Soares, ereto, empunhando a sua bengala, e recriminando os atrasados, era de toda a conveniência entrarmos às 8:25 para não haver advertências…
Fábrica Nally no Campo Grande

Tínhamos pausas de dez minutos, como em toda a parte, havia chuto na bola, correrias, jogos de curta duração. Se faltava um professor, vinha um perfeito, olhos nos livros, era proibido conversar, a não ser ir até ao pé do Sr. Perfeito e procurar esclarecer uma dúvida. Depois das aulas da tarde, formavam-se para dar passeios à volta do colégio. Há vivendas e casas apalaçadas no Campo Grande, aos fins de semana alugam-se bicicletas, há descampados, mas também vielas. Foi assim que descobrimos com a entrada por uma azinhaga a fábrica dos produtos Nally, linha cosmética, falei deles à minha mãe, mas ela disse-me que preferia o creme da Madame Campos. Lembro-me perfeitamente, bem adolescente, de ir à Rua Alexandre Herculano fazer-lhe compras na filial ali existente. O Campo Grande oferece boas oportunidades para passear, o lago e os seus barcos são a forte atração, o jardim é formoso, tem uma grande equipa de jardinagem que o trata primorosamente. Irá mais tarde articular-se com a Avenida da Universidade e os novos edifícios das Faculdades de Direito e de Letras e a Reitoria, não esquecendo igualmente a Biblioteca Nacional e as livrarias que funcionavam entre a Estrada de Malpique e o Campo Grande, no tempo de vida universitária eram de visita obrigatória. Resta desse mundo um ícone, a Galeria 111, fica a memória de grandes exposições que tive a dita de ali visitar. Ah, não podemos esquecer que para além do lago há uns campos de ténis, ali ficávamos especados a ver os tenistas em ação. O que é hoje o Museu de Lisboa, no Palácio Pimenta, estava fechado, mas era possível visitar o Museu Rafael Bordalo Pinheiro, guardo saudade das visitas com a minha mãe que o tratou sempre como o grande génio artístico do século XIX. Fiz esta deriva para o Campo Grande por ser o complemento da minha vida de bairro e de se ter articulado perfeitamente com aquela Avenida de Roma, também tão importante na minha vida.
Produtos da Fábrica Nally que continuam a ser comercializados
Dr.ª Nelly Campos, mais conhecida por Madame Campos, proprietária da Academia Científica de Beleza Madame Campos
Lago do Campo Grande, o Restaurante Casa do Lago continua a funcionar e a bela obra de cerâmica azulejar de Júlio Pomar continua lá
Obra de Júlio Pomar no Restaurante Casa do Lago

(continua)
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Nota do editor

Poste anterior de 10 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22090: Os nossos seres, saberes e lazeres (446): Quando vi nascer a Avenida de Roma (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 11 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22096: Os nossos seres, saberes e lazeres (447): A minha terra, Pica, onde nasci, cresci e de onde, em 1961, parti para Mafra frequentar o CSM (Manuel Barros Castro, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCAÇ 414)

Guiné 61/74 - P22109: Fotos à procura de... uma legenda (147): Mais elementos para a compreensão de uma falsificação da História: a proclamação da independência da Guiné-Bissau, em 24 de setembro de 1973, em Madina do Boé...

 



Figura 13. Extracto da base topográfica elaborada para a Carta Geológica da Guiné-Bissau,
correspondente à região do Boé. As curvas de nível incluídas nesta base são: 0, 10, 50, 100 e 200 m, sendo ainda visíveis pontos cotados. A rede viária apresentada inclui trajectos nem sempre com garantia de trânsito, nomeadamente durante a época das chuvas, em locais de atravessamento da rede hidrográfica, ou ainda face a alterações do coberto vegetal.

Imgens e legendas: Fonte:  Paulo H. Alves, Vera Figueiredo - Carta Geológica da Guiné-Bissau: de 1982 a 2011.  LNEG - Laboratório Nacional de Energia e Geologia. Estrada da Portela, Bairro do Zambujal – Alfragide, Ap.7586, 2610-999 Amadora. Disponível aqui:

http://repositorio.lneg.pt/bitstream/10400.9/2924/1/36790.pdf


Resumo: Apresenta-se o que foi o Centro de Geologia do IICT e em particular o Projecto da Carta Geológica da Guiné-Bissau, que incluiu 40 meses de cartografia e foi marcado por limitações várias, como dispor de uma única equipa no terreno, pelo que recorreu a metodologias inovadoras. Concluído no LNEG em 2012, numa edição em formato frente e verso, inclui uma nova base topográfica do país e apresenta a geologia de superfície e do substracto, bem como informação hidrogeológica, com logs de 335 sondagens e poços, bibliografia, carta hipsométrica e divisão administrativa. 

Palavras-chave: geologia de África, cartografia digital, Bissau, Bacia do Senegal  



1. O vasto setor do Boé (que faz parte da região do Gabu) é intransitável no tempo das chuvas (que vai de meados de maio  a  meados de novembro). Dois grandes rios atravessam o Boé: o Corubal [, que corre de sul para nordeste] e o Féfiné [, que corre a norte e a leste de Béli, e a sudeste de Cabuca, sendo um afluente do rio  Corubal].

Como se pode ver na foto acima, já no início da época da chuvas o rio Féfiné tem um caudal elevado, tornando na prática difícil ou mesmo impossível a sua travessia em viatura automóvel. A alternativa para se alcançar, na época das chuvas, o complexo Dulombi-Boé-Tchetche (um conjunto de 3 parques nacionais cobrindo cerca de 319 mil hectares),  é entrar, a nordeste, por Foula Mori, na Guiné-Conacri...

Estas duas imagens podem ser usadas como complemento da informação constante do poste P22106 (*). Faz-se um convite aos nossos leitores (**) para as relacionar com a narrativa do PAIGC segundo a qual a I Assembleia Nacional Popular (, onde se terá proclamado,  a 24 de setembro de 1973,  em plena época das chuvas, a independência da Guiné-Bissau,) ter-se-ia realizado na "região libertada" de Madina do Boé... 

Há muito que sabemos que  esta narrativa é, em parte,  uma "falsificação da História". (Repare-se que na Carta Geológica da Guiné-Bissau, encomendada pelo Governo guineense, ao LNEG portugês, os geólogos continuam a considerar Madina do Boé como a mítica capital fundadora do país: vd. figura nº 13 acima).

sexta-feira, 16 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22108: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (48): A funda que arremessa para o fundo da memória

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Abril de 2021:

Queridos amigos,
Annette é uma cronista exigente, não se cinge à documentação recebida, quer interpretação das imagens, decifrar o que vem nas entrelinhas e sobretudo pede respostas para assuntos jamais mencionados: a ocupação dos tempos livres, que leituras Paulo Guilherme fazia, que conversas tinha com aquele padre de Missirá, um tal Lânsana Soncó, com quem falava de gente do passado, da fauna e da flora, do nome das árvores, o que efetivamente fundamentava a curiosidade de Paulo Guilherme? Ela nunca esquecera uma descrição do seu amado de um amanhecer em Mato de Cão, vieram os flamingos, pernaltas róseos, que alheios a quem os observava pesquisavam nas águas do Geba o seu alimento; e havia aquela versatilidade de símios, ele fazia referência aos macacos cão e fidalgo, uns com pontas de bigode e umas franjas e outros de rabo pelado, de cor avermelhada; e não esquecia os répteis, a repentina surucucu e a sempre temida cobra verde, o horror de quem subia às palmeiras.
Paulo Guilherme chegara a Bambadinca e ela pede pormenores, e então conta-se uma história hilariante da praxe que o comandante lhe fez, nomeou-o como ajudante de campo da senhora professora, senhora muito carente que gostava de se passear sentada no quadro da bicicleta, a sentir o braço do seu servidor no dorso, coitada, sofria de vertigens... Já estamos em Bambadinca, vai começar um carrossel com montanha-russa de histórias que só são possíveis para quem faz uma intervenção errante, que tanto podem ser emboscadas noturnas, como alucinantes colunas de abastecimento ao Xitole ou operações na Ponta do Inglês, tudo numa vertiginosa sequência.

Um abraço do
Mário


Rua do Eclipse (48): A funda que arremessa para o fundo da memória

Mário Beja Santos

Très, très chère Annette, muito fatigado por um dia de trabalho que culminou com aulas ao fim de tarde no Monte da Caparica, venho procurar dar-te informações ao que me pedes. Estranhas muito as referências ao nome de Infali Soncó, o avô do régulo Malã Soncó, pois fica sabendo que Infali Soncó tornou-se um nome lendário pela sua rebelião em 1907, era régulo do Cuor, com a conivência dos régulos de Badora, Joladu e Xime procuraram fechar a navegação do Geba, o que se tornou intolerável para as autoridades de Bolama (era então a capital da Guiné). Foi decidido constituir-se uma força militar de envergadura, veio muita gente de Portugal e uma unidade militar de Macuas de Moçambique, em 1908 vão dar combate ao rebelde, que foi forçado a fugir, virá mais tarde, depois do afastamento de outro rebelde, de novo Abdul Indjai, o régulo do Oio e do Cuor, fora o mais precioso auxiliar do capitão Teixeira Pinto nas campanhas de pacificação que culminaram em 1915 com a rendição dos Papéis de Bissau. Vou enviar-te um documento muito curioso escrito por Abudu Soncó, o filho mais novo do régulo Malã, vive em Portugal desde 1996, deram-lhe facilidades para vir frequentar uma ação de formação em Setúbal, ele era professor primário, passava mais de 7 ou 8 meses sem receber o ordenado, preferiu ficar a trabalhar na construção civil, visita-me regularmente, falei-lhe do assunto do bisavô, ele escreveu a memória da vida deste turbulento régulo. Ainda não tive oportunidade de te dizer que os Soncó eram Beafadas mandinguizados, quer isto dizer que aceitaram a fé muçulmana, abandonaram o animismo e incorporaram-se na família Mandinga, o mesmo aconteceu com outros régulos desta região, como o régulo Mamadu Sanhá, do Cossé, que conheci, vinha de motociclo a Bambadinca, impecavelmente fardado, exibindo orgulhosamente os seus galões de tenente de segunda linha.

Perguntas-me sobre a adaptação a Bambadinca. Vinha dolorido pela separação do Cuor, que nunca aceitei, embora percebesse perfeitamente que os meus soldados estavam saturados de viver permanentemente no interior do mato desde 1966. Não poucas vezes, quando tinha uma aberta nos meus afazeres, descia a rampa de Bambadinca até ao porto e ficava especado a ver a bolanha de Finete e todo o denso arvoredo que se estende até Mato de Cão. Cheguei a Bambadinca, fiquei num quarto com mais dois oficiais milicianos da CCAÇ 12, de nomes Magalhães e Abel Rodrigues, mantivemos uma relação altamente estimável. Conseguiu-se alojamento para todos os soldados e cabos africanos, houve que adiantar dinheiro para aluguer de moranças. Definimos as regras do jogo de quem ficava como intermediários para contatos urgentes, para qualquer tipo de saídas, desde colunas de reabastecimento ao Xitole a emboscadas noturnas; definiram-se responsabilidades para a guarda das nossas munições e armamento, ficou rigorosamente proibido que na povoação os soldados tivessem granadas de qualquer tipo, era a melhor maneira de prevenir acidentes dramáticos, eu já tinha ouvido histórias de sinistros devido a tais desleixos. E nunca esquecera o acidente de Abudu Cassamá, aquela criança de Finete que espevitada pela curiosidade viu algo dentro de um atrelado, era uma granada incendiária, tirou-lhe a cavilha, ficou brutalmente queimado.

As regras de convivência alteraram-se radicalmente. Agora tomo as refeições na messe de oficiais, sempre detestei jogos de cartas, acabei por ser atraído por um jogo simplório, verdadeiramente de fortuna ou azar, chamado lerpa, dei comigo a passar horas sem fim, foi excitante ao princípio, depois tornou-se uma sensaboria, voltei às leituras.

Tu tens razão, adorada Annette, falta na documentação que te tenho enviado, informação sobre aquilo que chamamos ocupação dos tempos livres. Como recordarás, levei centenas e centenas de livros, um espólio apreciável de discos de vinil e um gira-discos de altíssima qualidade, tudo ficou em cinzas em março de 1969. A correspondência, a leitura e a música foram os melhores lenitivos que encontrei. De tal ordem, que mesmo que regressasse estafado de madrugada de um patrulhamento a Mato de Cão havia sempre um cadinho de leitura, cheguei mesmo a amassar livros debaixo do peito quando cedia ao sono. Tens toda a razão, vou procurar nos escaninhos da memória uma possível relação daquilo que li, da música que ouvia.

Pedes-me mais imagens e tenho que confessar-te que poucas mais me restam. O que tinha até março de 1969 só se salvou o que mandei à família e aos amigos. Recebi depois algumas fotografias ou estão presentemente a facilitar-me imagens alguns antigos camaradas, mas não era para mim prioritário comprar uma boa câmara, tive que comprar roupa, tive que ajudar quem precisava, controlei as minhas despesas com livros, consegui um gira-discos a pilhas e adquiria em Bafatá discos de vinil com gravações magníficas, mas tudo moderadamente. Não sei a que propósito tirei aí uns quatro dias depois da mina anticarro, em Canturé, esta fotografia onde não escondo as dores que me vão na alma, comprei novos óculos, as lentes escuras trouxeram-me alívio para o sol incandescente. O dado curioso é que quando explodiu a mina e eu julgava que os meus óculos se tinham volatizado, alguém os encontrou, pasme-se, intactos, debaixo do chassi, evidentemente cheios de pó, comoveu-me muito este achado. Tenho dado voltas à cabeça para responder cabalmente ao que me pedes sobre o que tu chamas a minha inserção na vida de Bambadinca. Agora tenho condições para participar na missa dominical, faço visitas de rotina às instalações do batalhão, a burocracia continua, temos a nossa própria contabilidade e secretaria, são afazeres que reparto com o meu fiel ajudante, o furriel Sousa Pires.

Tenho um episódio hilariante para te contar. O comandante do batalhão entendeu que me devia praxar. O pretexto foi a saída do alferes Almeida de um outro pelotão de caçadores nativos, o n.º 63. Havia uma professora primária, Dona Violete, uma senhora de idade indefinida, de cabeleira oxigenada, gentil e faladora. Houve que a contatar, eu ficara com a incumbência de apurar quais os programas em curso para a 3.ª e 4.ª classe para o professor de Missirá e tinha um soldado que pretendia fazer a 4.ª classe, Dona Violete foi muito prestável. Contei este episódio ao comandante e ele informou-me com o ar mais sério deste mundo que com a saída do Almeida eu ficaria com a responsabilidade de acompanhar Dona Violete nas suas saídas de Bambadinca, era responsabilidade do batalhão fazer boas relações públicas com a professora, e que devia prontamente apresentar-me, dando-lhe a saber que passava a ser o seu fiel companheiro. Achei aquilo tudo insólito, mas não tugi nem mugi. Pedi ao Ussumane Mané, o meu novo guarda-costas (não te esqueças que o Cherno estava ainda hospitalizado em Bissau a tratar do seu duplo traumatismo craniano) que fosse perguntar à senhora professora se me podia receber pelas seis da tarde, e igualmente pedi ao Queta Baldé se me adquiria um ramo de flores no Mercado de Bambadinca. Tudo ajustado, apareci às seis da tarde com um bouquet de flores e com a minha farda n.º 2. Dona Violete estarrecida com a novidade da minha intendência, mandou-me entrar na sala da sua casa, apresentou-me a mãe, uma senhora esquálida vestida de preto e de idade ainda mais indefinida. Falei no alferes Almeida, a professora estava derretida, que o senhor alferes a levava no quadro da bicicleta, que esperava de mim uma gentileza tal, por exemplo descermos a Rampa de Bambadinca e irmos até Santa Helena, que a amparasse nas costas, ela às vezes tinha vertigens e gostava de estar amparada. Achei aquilo tudo estapafúrdio, mas o mais grave veio depois, Dona Violete pôs-se de pé, mantinha a sua voz melodiosa, falava da sua solidão, da necessidade que sentia de ter carinho e como o alferes Almeida era gentil com ela, e que esperava o mesmo de mim, avançava discretamente na minha direção, senti que estava encostado à parede e que a dita senhora me passava as suas mãos pelos meus braços, constrangimento maior não podia estar a ter, ocorreu-me olhar para o relógio e pedir licença para me retirar, era hora do jantar, prometia voltar a visitá-la para se marcar um passeio. Sempre com um sorriso travesso, Dona Violete pegou-me no braço, despedi-me da mãe dela, e à saída, não sabendo como rematar a minha partida, perfilei-me, curvei-me e beijei-lhe a mão, ficou em derriço.

E só quando atravesso a rua e vejo os oficiais à porta com uma expressão de gozo é que se deu o toque da campainha, fora tudo montado para eu ter aquele arrepio na espinha. Entrámos na messe, o comandante perguntou-me se estava tudo a correr bem, julguei oportuno dar-lhe em voz alta a lição que ele merecia, a senhora professora agradecia, mas estava à espera que fosse o senhor comandante a visitá-la, gostava mais de se dar com gente da sua idade…

Prometo contar mais histórias hilariantes, isto de estar na guerra não são só tiroteios nem rodopios de coragem, atos de solidariedade ou quadros de horror, há a vertente parodiante, muito do bizarro da vida vem ao de cima, é o contraponto para toda aquela tensão da contraguerrilha.

E deixo uma boa notícia para o fim: aguardo a marcação para os próximos 15 dias de uma reunião da nossa Assembleia-Geral em Bruxelas. Parece que será numa segunda-feira. Se assim for, e se tu tiveres disponibilidade, pedia-te para ir quinta-feira à noite e irmos a Ypres. Porquê Ypres? O meu querido amigo Melvin Coats tem família natural do Sul da Escócia, há para ali uma prima que anda a fazer a genealogia dos Minto, procura desesperadamente dois irmãos que morreram em data diferente e estão sepultados em cemitérios de Ypres, como sabes foi nesta região da Flandres que morreram muitas centenas de milhares de homens para conter a onda alemã. Dar-te-ei mais pormenores na próxima carta. Quando hoje atravessei o Tejo, vindo das aulas no Monte da Caparica, lembrei-me do passeio que demos à Arrábida, tu estavas felicíssima com aquela vegetação mediterrânica, prometi-te voltar a levar lá e espero que seja muito em breve que tu aqui regresses, o verão está próximo. Bisous, mais bisous e muito mais bisous, bien à toi, Paulo.
Imagem de uma parte do contingente que veio, às ordens de Oliveira Muzanty, combater a rebelião de Infali Soncó, a fotografia foi tirada pelo nosso primeiro fotógrafo de guerra no interior da fortaleza da Amura. A rebelião de Infali Soncó durou de 1907 a 1908
Em Bissau, na primeira visita, março de 1969, encontrei o Barbosa (à esquerda) e o Teixeira (à minha direita) com um amigo, aproveitámos para matar saudades. O Barbosa e o Teixeira foram dois diletos colaboradores, guardo-os no meu coração.
Fotografia tirada em Bissau em outubro de 1969, vim fazer tratamento oftalmológico e comprar óculos novos, a seguir à explosão da mina anticarro
Rampa de Bambadinca
Imagem da devastação em Ypres, Bélgica, I Guerra Mundial
Homenagem aos caídos nas batalhas de Ypres, Bélgica
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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22086: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (47): A funda que arremessa para o fundo da memória

Guiné 61/74 - P22107: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis" (10): a nossa insólita, brejeira e alegre Lisboa: o Jardim das Pichas Murchas (Mário Gaspar)


Lisboa > Freguesia de São Vicente > 2021 > Topónimos lisboetas > O Jardim / Largo das Pichas Murchas fica junto à Rua e às Escadinhas de São Tomé,  

Fotos e texto: cortesia de Valter Leandro (2021)


1. Estamos a escassos dias de completar 17 (dezassete!) anos de existência, em 23/4/2021... Mas não temos (, eu não tenho,  para além do facto de estarmos vivos), grandes motivos para celebrar a  efeméride (o 17º aniversário do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné): 

(i) ainda não nos livrámos da trágica pandemia de Covid-19, com todas as funestas consequências que está a ter em termos individuais e coletivos: já morreram  mais portugueses, no espaço de 12 meses, do que em toda a guerra colonial /guerra do ultramar (falando só de militares portugueses): 

morrreram,de Covid,  até à data, cerca de 17 mil portugueses, contra 9 mil vítimas mortais na guerra colonial (e nesses 17 mil estão membros da Tabanca Grande, estão muitos outros antigos combatentes cuja identidade desconhecemos, estão familiares, amigos, vizinhos...);

(ii) a geração dos antigos combatentes está só agora a ser vacinada, esperando-se em breve a imunização dos grupos estários da população de maior risco (os de 60 e mais anos) que contribuiram para mais de 95% da mortalidade por Covid-19 até à data;

(iii) estamos ainda confinados e privados do convívio, seguro e saudável, com os nossos "mais queridos": família, amigos, camaradas, tabanqueiros;

(iv) enfim, mantém-se a perspetiva de termos, em 2021, mais um "annus horribilis", como o de 2020, embora com uma luzinha ao fundo do túnel...

Alimentar o blogue todos os dias é quase tão difícil como  alimentar uma casa de família em época de crise... E nós fazêmo-lo, a nossa pequena equipa,  há 17 anos... com pandemia ou sem pandemia, com crise ou sem crise, com vacina ou sem vacina, quer faça sol, quer faça chuva...

No princípio deste ano criámos esta nova série, "Usados & Achados", apelando ao sentido de "humor de caserna" da nossa velha guarda, com o intuito de nos ajudar, a todos, a  carregar as baterias da resiliência e da esperança de modo a podermos (a começar pela nossa Tabanca Grande)  a resistir e sobreviver, com inteligência, arte e engenho. 

Este ano de 2021 marca também os  60 anos do início da guerra colonial, ou guerra do ultramar, ou guerra de África (como cada um quiser chamar-lhe).

Os nossos camaradas mais velhos, que foram para Angola, logo em abril de 1961, "rapidamente e em força", estão agora já na casa dos 80...E os "periquitos", os "checas", os "maçaricos", os que fecharam as portas do império, em 1974 e 1975, também já não são "Sexas", estão todos a entrar nos Setentas,. são pois Septuas...

Com o peso de tantos anos (e das "medalhas da guerra e da vida") e com as apreensões que nos batem à porta (a começar pelas mazelas do corpo e da alma...), temos que saber aprender a "sorrir com meia cara", já que a parte inferior anda tapada, há muito, com a máscara sanitária...


2. Esta série , "Usados & Achados", não teve, contudo, o sucesso esperado, tínhamos a expectativa de conseguir maior colaboração dos nossos autores com talento humorístico... 

Hoje chega-nos o contributo do Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas, CART 1659, "Os Zorbas" (Gadamael e Ganturé, 1967/68), lapidador de diamantes reformado, e colaborador sénior do nosso blogue (com cerca de 125 referências no nosso blogue).

O Mário contnua a mandar-nos imenso correio, com mensagens que cabem dentro do seu vasto e eclético leque de interessses, extravasando naturalmente o "core business" do nosso blogue... É de destacar, por exemplo,  a sua colaboração regular no boletim "O Olhar do Mocho", da Associação Cultural e Social de Seniores de Lisboa. No último número,o 68, de abril de 2021, tem um artigo sobre o pensador Agostinho da Silva.


Mas é sobre outro tema, que vamos falar, e que queremos enquadrar na série "Usados & Achados". O Mário Gaspar mandou-nos uma cópia de um artigo deveras curioso sobre a Lisboa que muitos desconhecem, mesmo os lisboetas... Aqui vão alguns excertos, selecionados por ele, e que reproduzimoa com a devida vénia ao autor (do texto e das fotos):

Lisboa Secreta > 24 de fevereiro  de 2021 > Sítios insólitos em Lisboa: o Jardim das Pichas Murchas, by Valter Leandro


(...) Muitos sorrisos e gargalhadas já arrancou a placa do Jardim das Pichas Murchas, ali para os lados do Castelo, junto à Rua de São Tomé.

(...) O jardim foi batizado por um calceteiro da autarquia, chamado Carlos Vinagre, que adorava fazer troça dos muitos idosos que ali se juntavam. Os mais puritanos ainda tentaram mudar o nome ao jardim que também é largo, mas o povo uniu-se e acabou por ficar assim até aos dias de hoje.

(...) Junto à Rua e às Escadinhas de São Tomé, este Jardim/Largo das Pichas Murchas pertence à Freguesia de São Vicente, a caminho do castelo, e atualmente todos os que por lá passam, novos e velhos, homens e mulheres, gostam desta designação. Como é uma zona onde se costumam juntar muitas pessoas para beber uns copos ao final da tarde, ou durante a hora da bucha, para quem está a trabalhar pelas redondezas, mas também onde muitas vezes se reuniam pessoas mais velhas, para dois dedos de conversa ou para jogar às “sueca”.

(...) E, além de tudo, são agora os turistas, que sabendo o que este nome significa, fazem as mais
variadas poses fotográficas para mostrar, nos seus países, esta característica placa toponímica.

É também neste pequeno largo que, por altura dos Santos Populares, se costuma montar um daqueles restaurantes improvisados, devidamente preparados para a maior festa popular de Lisboa. (...)

(...) Muito perto do Jardim das Pichas Murchas, na Rua de São Tomé, uma das mais pisadas por visitantes de todas as partes do globo, fica ainda uma homenagem de Vhils à nossa maior fadista Amália Rodrigues. Este mural fica numa pequena praceta junto à Calçada do Menino Deus e foi todo desenvolvido com as típicas pedras da calçada portuguesa.  (...)

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Nota do editor:

Último poste da série > 14 de março de 2021 > Gué 61/74 - P22006: Usados & achados (9): pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis" (9): Morra o Eça (de Queiroz)!, viva o Caldo (Verde)!

Postes anteriores:

21 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21926: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis" (8): O casqueiro nosso de cada dia... ou a feliz história do Jobo Baldé, o improvável padeiro do Mato Cão, que nos matou... a malvada (Luís Mourato Oliveira,ex-alf mil, cmdt, Pel Caç Nat 52, Mato Cão e Missirá, 1973/74)

8 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21866: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis" (7): Receita caseira de Bourbon County, Kentucky, USA... Enquanto se aguarda a vacinação contra a Covid-19... (José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia)

4 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21851: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis" (6): A web câmera, em tempo real, de Karesuando, a localidade mais ao Norte da Suécia e na área da minha casa, município de Kiruana: o pior confimamento... é o da noite escura de 24 horas (José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia)

28 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21820: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis"(5): Contra a Covid-19 e a pérfida caixinha de Pandora que vem sempre associada às pandemias, a palavra de ordem é: Confinemo-nos, sim, camaradas!... Mas não nos (con)finemos, ámen! (Luís Graça)

21 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21791: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis": (4) A 'descoberta' da Índia

20 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21785: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis": (3) O luso-lapão

20 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21783: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis": (1) O leite; (2) A cura

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22106: Um olhar crítico sobre o Boé: O local 'misterioso' da proclamação solene do Estado da Guiné-Bissau, em 24 de setembro de 1973, em plena época das chuvas - Parte I: A variável "clima" (Jorge Araújo)


Foto 1 > Frente Leste (?) > Citação: (1973), "II Congresso do PAIGC, na Frente Leste", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_44167, com a devida vénia.


Foto 2 > Frente Leste (?) > Citação: (1973), "II Congresso do PAIGC, na Frente Leste", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_44248, com a devida vénia.


Foto 3 > Madina do Boé (?) > Citação: (1973), "Lucette Cabral, Aristides Pereira, Victor Saúde Maria, Otto Schacht e Luís Cabral durante a I Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43272, com a devida vénia.



O nosso coeditor Jorge [Alves] Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494
(Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior, ainda no ativo. Tem cerca de 290 referências no nosso blogue.


GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE

UM OUTRO OLHAR SOBRE O 'BOÉ': LOCAL "MISTERIOSO" DA PROCLAMAÇÃO SOLENE DO ESTADO DA GUINÉ-BISSAU, EM 24 DE SETEMBRO DE 1973, EM PLENA ÉPOCA DAS CHUVAS


PARTE I

- A VARIÁVEL "CLIMA" COMO "QUESTÃO DE PARTIDA" - 


1.   – INTRODUÇÃO


Estão prestes a completar quarenta e oito anos os dois acontecimentos planeados pelo PAIGC que, do ponto de vista histórico e da dinâmica política da época, acabaram por influenciar as duas dimensões do conflito: a militar e a diplomática, ambas dependentes de diferentes apoios internacionais [OUA e ONU, enquanto decisores supremos], com o propósito de pôr um ponto final no "Império Colonial" de Portugal, através do reconhecimento da independência, neste caso, da dita Província Ultramarina da Guiné.   


O sucesso da estratégia supra, concebida pelo ideólogo Amílcar Cabral (1924-1973) antes do seu assassinato em Conacri, ocorrido em 20 de Janeiro de 1973, sábado, passava pela organização de um «Congresso (II)», evento que serviria para legitimar a realização da «I Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau», durante a qual seria, de modo unilateral, proclamado o nascimento de uma nova Nação / Estado: a República da Guiné-Bissau.


Os dois exemplos identificados acima ficaram registados na Cronologia da História do conflito como tendo sido organizados, o primeiro, entre 18 e 23 de Julho de 1973; o segundo, em 23 e 24 de Setembro do mesmo ano. 


Quanto aos locais da sua realização, a literatura refere que o «II Congresso» teve lugar algures na "Frente Leste" [fotos 1 e 2], enquanto o da «I Assembleia Nacional Popular» é mais preciso, indicando "Madina do Boé" [foto 3], complementado com o conceito "região libertada".


Decorridas quase cinco décadas, os dois eventos continuam envoltos em "grande mistério", nomeadamente o último, pela ausência de factos, credíveis e seguros, que possam certificar cada uma das narrativas… e são muitas! (vd. P21956 e P15790).


Para clarificação desses "factos" da História, uma vez que se aceita 'a versão' de estarem mal contados (por fazerem parte duma estratégia de/da propaganda), seria interessante, e importante, ter respostas a questões tão básicas como, por exemplo, as referentes a: 


(i) - Logística: a) alimentação; b) dormidas; c) higiene; d) transportes; e) energia eléctrica; f) comunicação; g) segurança; 


(ii) - nome dos observadores; 


(iii) - instituições representadas; 


(iv) - convidados; 


(v) - repórteres de imagens; 


e outras, e, em particular, a relacionada com o (vi) - "clima", pois os dois encontros aconteceram em "plena época das chuvas".


Para contextualização desta última questão, objecto de análise da "Parte I" (questão de partida), socorremo-nos de depoimentos escritos na primeira pessoa, por elementos de ambos os «lados do combate», insuspeitos, como são os casos do Cap Mil Inf Jorge Monteiro, Cmdt da CCAÇ 1416, e Umaro Djaló, Cmdt militar do PAIGC na região do Boé.


2.   – O CLIMA E A GEOGRAFIA NA REGIÃO DO BOÉ EM 1966

    - A NARRATIVA DO CAP MIL INF JORGE MONTEIRO - CCAÇ 1416


No livro «Uma Campanha na Guiné, 1965/1967», da autoria de Manuel Domingues, encontramos um depoimento do Cap Mil Inf Jorge Monteiro, Cmdt da CCAÇ 1416 (Nova Lamego; Madina do Boé; Béli e Ché-Che - 1965/1967), unidade que esteve aquartelada em Madina do Boé, entre 4 de Maio de 1966 e 10 de Abril de 1967 (onze meses), sobre a pergunta: "AFINAL O QUE É MADINA DO BOÉ?". A resposta encontramo-la no poste abaixo, da qual retirámos alguns excertos.

 


(i) - O BOÉ, a zona mais pobre de toda a Província, sofre a inclemência impiedosa do tempo que vai de Maio a Setembro, com chuvas torrenciais continuas que alagam por completo a região vedando portanto qualquer tipo de plantio para a agricultura mesmo arcaica. Só lá havia a minha companhia [CCAÇ 1416], completamente isolada nessas alturas do mundo circundante, a tal ponto que só podíamos ser abastecidos de paraquedas." (…)


(ii) - "Eu, que vivi em MADINA [do Boé] durante onze meses [de 4 de Maio de 1966 a 10 de Abril de 1967], que constatei a inutilidade daquele chão, o clima inóspito, a desolação desértica, sei que Madina não vale sequer a chuva que lá cai. E eu que me apercebi duma certa coerência por parte de quem norteava a táctica das guerrilhas do PAIGC, não posso sequer admitir que até eles apregoem Madina, uma autêntica fossa, como capital do seu orgulhoso desiderato. Se isso for verdade, se de facto eles dizem isso, então nem sequer é um grito de liberdade, mas apenas um facto ridículo, caricato até, mesmo para os olhos de quem confere as guias de despacho do armamento que eles utilizam." (…)

(iii) - "O Boé tem solo muito pouco permeável, sem elevações consideráveis e consequentes declives escoatórios causando portanto a estagnação da água… São dezenas e dezenas de quilómetros de área inundada charco imenso de que apenas as rãs parece acharem uma justificativa. Quando tínhamos uma operação, fosse de que tipo fosse, andávamos com água pela cintura. Há por lá muitos riachos e rios pequenos, mas quando a chuva cai, tanto faz caminhar pela estrada, pelo capim ou pelo leito dos rios: o "boal" imenso é raso, e a água nem sequer é mais alta aqui ou acolá. O nível é sempre igual, como se a Natureza caprichasse em transferir para ali toda a inutilidade que a chuva possa querer significar na Guiné." (…)


(iv) - "Acontece, contudo, que tínhamos uma vantagem: a exemplo do sol, a chuva quando vem também é para todos e assim os elementos do PAIGC tinham precisamente os mesmos problemas. " (…)


(v) - "Concluiu-se, portanto, que o bombardeamento sobre Madina era contínuo e eles próprios lá iam esburacando as casas, já por si a cair de podres. Pouco ficou, e se implantaram lá a Independência, então meteram água pela certa, pois não há qualquer tecto que os proteja da chuva… Madina do Boé, cinco casas esventradas, pântano perpéctuo, chão inútil. A capital do PAIGC."



3.   – O CLIMA E A GEOGRAFIA NA REGIÃO DO BOÉ EM 1965

    - A NARRATIVA DE UMARO DJALÓ - CMDT DO PAIGC NA REGIÃO



Em segundo lugar, foi seleccionado o depoimento de Umaro Djaló, cmdt militar da guerrilha na região do Boé, recuperado do comunicado remetido, por si, à Direcção do Partido em Agosto de 1965, onde refere as difíceis condições da sua missão, em razão do clima observado na "época das chuvas", cujo teor passo a citar:

▬ Madina do Boé, 14-8-1965 (sábado)

Secretariado-Geral do PAGC

Comunico à Direcção Geral do nosso Partido que na noite do dia 09 de Agosto, 2.ª feira, foi sabotado o quartel de Madina [do Boé] com três morteiros e bazucas.

Depois de estudadas concretamente todas as condições favoráveis e desfavoráveis do terreno que encontrámos, decido tomar todas as medidas preventivas para explicar à Direcção do nosso Partido que a condição para fazer qualquer trabalho de sabotagem ou ataques é completamente impossível.

● 1 – Todo o rio [Corubal] está completamente cheio de água e corre a uma velocidade que não permite passar nem um objecto que não seja levado pela água.

● 2 – Não temos uma base onde podemos passar pelo menos a chuva a não ser na fronteira da República da Guiné (-Conacri); torna-se impossível passarmos somente dois dias no interior do país para preparar ao menos uma sabotagem de três dias, devido a ordem dada pelo Secretário-Geral de não construir bases nenhuma para o exército.

● 3 – Não temos onde preparar a comida debaixo da chuva.

● 4 – Não há um meio que pode garantir o socorro urgente dos feridos; as estradas são impraticáveis nesta altura.

● 5 – O arroz que temos aqui não será suficiente para o período de um mês; o mesmo problema se põe em relação às munições.

Para mais concretizar estas informações, pode perguntar ao camarada chofer do camião.

Feito em Madina do Boé; o comandante; Umaro Djaló.

  





Citação:
(1965), Sem Título, Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_39170, com a devida vénia.

 

4.   – O MAU TEMPO NO XIME EM 16 SETEMBRO DE 1972

    - A NARRATIVA DE JORGE ARAÚJO - CART 3494


Ainda sobre a "época das chuvas", aproveito para referir uma experiência pessoal (16Set72) que faz parte das minhas "memórias" da Guiné, já narrada no poste abaixo.




(…) O sábado, 16 de Setembro de 1972, estava a ser um dia normal, em que cada um de nós fez o que tinha a fazer, cumprindo as diferentes tarefas no quadro da organização militar – internas e externas – com destaque para a segurança à Ponta Coli, às embarcações civis que sulcavam o rio Geba e à vigilância do aquartelamento feita a partir dos postos colocados em locais estratégicos.

Por outro lado, a Guiné tem um clima tropical o que significa que tem duas estações distintas – a "estação das chuvas" e a "estação seca". A primeira inicia-se em meados de Maio e a segunda em meados de Novembro, pelo que cada estação completa um ciclo de seis meses. Daí que Setembro é um mês que faz parte da primeira estação – a das chuvas – em que as precipitações são geralmente abundantes. (…)

A noite tinha chegado e os ventos fortes transportavam cada vez mais nuvens, dando origem à queda de
água com grande abundância. Estava uma noite verdadeiramente tropical. O contacto directo com este fenómeno da natureza metia respeito a qualquer um de nós, e como diz o povo: "era de meter medo ao susto". Os trovões eram cada vez mais fortes, fazendo abanar os telhados de chapa dos edifícios ali à volta, enquanto os raios rasgavam, à nossa frente, o céu do Xime, iluminando todo o espaço físico do Aquartelamento. Ainda assim a experiência estava a ser pedagogicamente interessante e daí a termos gravado na memória de longo prazo, e agora passada a escrito. (…)


5.   – O MAU TEMPO NA GUINÉ-BISSAU EM SETEMBRO DE 2020

    - A NARRATIVA DA COMUNICAÇÃO SOCIAL - RISPITO


Depois de três relatos datados de 1966, 1965 e 1972, respectivamente, os valores de precipitação pluvial na Guiné-Bissau, em Setembro, continuam a ser elevados, como provam as notícias divulgadas na Comunicação Social, estas alusivas ao ano de 2020. 

 




(continuação da notícia acima).


Cherno Mendes, dos serviços da meteorologia e responsável pela divisão da previsão disse à Lusa que "o pior ainda pode estar para vir", salientando que as autoridades esperam um "ano húmido" em que 

deve chover na Guiné-Bissau como só se viu há 30 anos. Normalmente, na Guiné-Bissau a chuva começa a perder a intensidade a partir do mês de Agosto, mas este ano, a meteorologia avisou que Setembro e Outubro poderão ter muita precipitação.

A Lusa percorreu várias zonas do centro de Bissau e dos subúrbios onde constatou a população desesperada, a repetir gritos de socorro pelos campos de cultivo do arroz completamente inundados, casas caídas ou quase a cair, dada à intensidade de chuvas.

Nos bairros de Cuntum Madina, Plubá e Djogoró, subúrbios de Bissau, onde a população vive da agricultura, as 'bolanhas' (campos de cultivo do arroz) têm mais água que o cereal plantado em Maio, logo com a chegada da época das chuvas, na esperança de colher agora em Setembro.

Em Djogoró, além das 'bolanhas' inundadas, a água cobriu por completo as minas de sal, outra fonte do sustento das mulheres.

As duas faixas das "bolanhas" de Djogoró, que têm uma estrada asfaltada pelo meio e que ainda resiste à força das chuvas, agora só servem para as crianças tomarem banho ou pesca à linha, dada a quantidade de água cor de barro que aí se encontra parada. As crianças divertem-se naquelas águas, sem se preocuparem que ali ao lado, a escassos 100 metros, esteja um cemitério municipal.


A população do novo bairro de Cabo Verde, construído sobretudo por pessoas recém-chegadas a Bissau vindas do interior ou de países vizinhos, é que não têm mesmo motivos para se divertirem com a quantidade de chuva que cai naquela zona sudeste de Bissau.

No centro de Bissau, os automobilistas disputam cada palmo de estrada que ainda não está coberto de poças de água. O cenário só é aproveitado por grupos de jovens para arrecadar moedas que pedem, quase exigem, a cada condutor que passe por uma estrada que foi alvo de um remendo com pedregulhos.

O responsável de previsão dos serviços da meteorologia disse que a população "há muito que é avisada" sobre os perigos de construção de casas em zonas húmidas e que as próprias autoridades já têm em mãos os avisos de que este ano vai cair muita chuva.

Cherno Mendes também afirmou que sem um ordenamento hidroagrícola do país e sem que a população deixe de atirar lixo doméstico nos canais de drenagem de águas das chuvas, a destruição não vai parar na Guiné-Bissau.


A ministra da Solidariedade tem um fundo de 100 milhões de francos CFA (6,5 milhões de euros), instituído pelo Governo para socorrer as vítimas do mau tempo, para já identificados em Bissau, Boé (leste) Cacine (sul) e toda a região de Cacheu (norte).

De momento, Conceição Évora tenta dar material de construção e víveres aos sinistrados, mas, dados os pedidos, tenciona lançar uma campanha de solidariedade para pedir apoios de empresários e pessoas singulares. (…)


Fonte: http://www.rispito.com/2020/09/chuvas-provocam-estragos-um-pouco-por.html, com a devida vénia.

 


Foto 4 > Bissau > (Set'2020), https://visao.sapo.pt/atualidade/politica/2020-09-08-chuvas-provocam-estragos-um-pouco-por-toda-a-guine-bissau-governo-pensa-lancar-campanha/

 

6.   – A PRECIPITAÇÃO PLUVIAL NA GUINÉ-BISSAU

    - ESTUDO CIENTÍFICO DE 2009/2010



Para concluir a estrutura deste trabalho de pesquisa, aproveito para dar conta, no Fórum, de um estudo académico publicado na Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, titulado «Distribuição espacial de valores prováveis de precipitação pluvial para períodos quinzenais, em Guiné-Bissau», disponível na Biblioteca Electrónica Scielo, 

link: www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-43662011000100010.

Em face dos resultados abaixo divulgados e das competentes explicações, que certamente não deixam margens para dúvidas, uma nova questão se coloca: "como foram organizadas as diferentes sessões dos trabalhos de cada um dos encontros (o 1.º de cinco dias e o 2.º de dois dias), perante a forte probabilidade de terem ocorrido várias intempéries climáticas (chuva e vento)?" É que naqueles dias, muito provavelmente, o "mau tempo" não deixou de passar pelo Boé… e a necessidade de corrigir esta parte da história… continua a ser um imperativo da própria HISTÓRIA.





Figura 1 – Distribuição da probabilidade diária e mensal de precipitação pluvial durante um ano na Guiné-Bissau, assinalando-se a vermelho os meses em que foram organizados os dois eventos identificados na introdução.


Figura 2 – Distribuição do resumo meteorológico durante um ano na Guiné-Bissau, assinalando-se a vermelho os meses em que foram organizados os dois eventos identificados na introdução.

(Continua… com análises de outras variáveis)

► Fontes consultadas:


Ø  (1) Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 05222.000.211. Título: II Congresso do PAIGC, na Frente Leste (?). Assunto: II Congresso do PAIGC, na Frente Leste: Aristides Pereira, Luís Cabral, José Araújo, Carmen Pereira, João Bernardo Vieira [Nino], Tiago Aleluia Lopes, Vasco Cabral e Silvino da Luz. Data: Quarta, 18 de Julho de 1973 – Domingo, 22 de Julho de 1973. Observações: Durante o II Congresso do PAIGC Aristides Pereira é eleito por unanimidade Secretário-Geral, sucedendo assim a Amílcar Cabral, assassinado em 20 de Maio de 1973 [erro; é Janeiro]. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.


 

Ø  (2) Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 05222.000.050. Título: II Congresso do PAIGC, na Frente Leste (?). Assunto: II Congresso do PAIGC, na Frente Leste: Francisco Mendes [Chico Té], João Bernardo Vieira [Nino], Aristides Pereira, Luís Cabral, Pedro Pires e Vasco Cabral. Data: Quarta, 18 de Julho de 1973 – Domingo, 22 de Julho de 1973. Observações: Durante o II Congresso do PAIGC Aristides Pereira é eleito por unanimidade Secretário-Geral, sucedendo assim a Amílcar Cabral, assassinado em 20 de Maio de 1973 [erro; é Janeiro]. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.


 

(3) Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 05247.000.137. Título: Lucette Cabral, Aristides Pereira, Víctor Saúde Maria, Otto Schacht e Luís Cabral durante a I Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau. Assunto: Lucette Cabral, Aristides Pereira, Víctor Saúde Maria, Otto Schacht e Luís Cabral durante a I Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau na região libertada de Madina de Boé (?). Data: Domingo, 23 de Setembro de 1973 - Segunda, 24 de Setembro de 1973. Observações: A I Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, presidida por Luís Cabral, aprova a Constituição da República e elege o Conselho de Estado. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.


 

Ø  (4) Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 04613.065.144. Assunto: Operação do PAIGC no quartel de Madina do Boé. Expõe à direcção do partido as dificuldades encontradas no terreno que não permitem a continuação dos ataques naquela zona. Remetente. [Umaro] Djaló, Madina do Boé. Destinatário: Amílcar Cabral, Secretário-Geral do PAIGC. Data: Sábado, 14 de Agosto de 1965. Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Correspondência 1963-1964 (dos Responsáveis da Zona Sul e Leste). Fundo DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Correspondência.


 

Ø  Outras: as referidas em cada caso.

 

 

Termino, agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

01ABR2021